quinta-feira, 5 de junho de 2025

A teoria económica e o conceito de progresso

 


– Quem encarna o interesse nacional

Prabhat Patnaik [*]

Mumbai, foto de Sebastião Salgado.

Os mercantilistas definiram a prosperidade de uma nação em termos da quantidade de metais preciosos que possuía e o progresso de uma nação em termos do aumento do seu montante de metais preciosos. Para aumentar a sua quantidade de metais preciosos, uma nação tinha de ter uma balança comercial favorável em bens e serviços (ou seja, as suas exportações tinham de exceder as suas importações), que teria então de ser resolvida através da importação de metais preciosos, especialmente ouro, a fim de que aumentasse a quantidade de ouro na sua posse.

Os mercantilistas foram os alvos de Adam Smith quando este escreveu a sua obra A riqueza das nações. A posição de Smith era a de que não era o stock de metais preciosos que definia a riqueza de uma nação, como afirmavam empresas mercantis monopolistas tais como a Companhia das Índias Orientais, mas sim a quantidade de capital social na sua posse. O progresso consistia, portanto, em acumular stocks de capital cada vez maiores, para o que se criavam as condições mais favoráveis através da eliminação de todas as restrições impostas pelo Estado à liberdade de funcionamento dos mercados e do capital, ou seja, assegurando a prevalência de condições de laissez faire na economia. Para que isso fosse possível, era necessário eliminar o domínio das empresas monopolistas, como a Companhia das Índias Orientais, sobre o Estado.

O notável na posição de Smith é o facto de, apesar da sua ruptura revolucionária com a concepção anterior, continuar a centrar-se na nação e não no povo; é a riqueza da nação, vista como uma entidade acima do povo, que conta como o desiderato. A concepção do que deveria ser contado como riqueza havia mudado, do ouro e da prata para o capital social, mas não a entidade de cuja riqueza se falava.

Esta ideia de uma nação distinta do povo e acima dele era uma caraterística do nacionalismo burguês desenvolvida na Europa na sequência dos tratados de paz da Vestefália. Embora tenha atingido o seu apogeu com o fascismo europeu nos anos 30, a ideia em si foi um tema constante ao longo de todo o pensamento burguês.

Como seria de esperar, embora a nação estivesse supostamente acima do povo, o “interesse nacional” era necessariamente identificado com os interesses de determinados segmentos burgueses. A passagem do mercantilismo para Adam Smith implicou, portanto, uma mudança da idolatria dos interesses de companhias mercantis monopolistas, como a Companhia das Índias Orientais, como sinónimo de “interesse nacional”, para o tratamento dos interesses da burguesia manufactureira emergente como a encarnação do “interesse nacional” – promover os interesses deste último segmento da burguesia tornou-se agora sinónimo de promover os interesses da nação. Mas esta mudança foi efectuada mantendo-se sempre uma conceção da nação cujos interesses tinham de ser promovidos e que era uma entidade distinta e superior ao povo.

David Ricardo tinha exatamente a mesma noção de progresso que Adam Smith, nomeadamente a acumulação de capital social no seio da nação. O seu receio de que se caminhasse para um estado estacionário, em que a acumulação de capital deixasse de se verificar, decorria precisamente da noção de que o capital social constituía a riqueza da nação; a cessação da acumulação de capital significaria o fim do progresso. John Stuart Mill foi, sem dúvida, uma exceção a este respeito, uma vez que declarou não se preocupar com um estado estacionário se os trabalhadores estivessem em melhor situação do que quando a economia estava em fase de acumulação de capital; ou seja, ao contrário dos seus antecessores, como Smith e Ricardo, colocou o bem-estar dos trabalhadores acima da acumulação de capital, mas este seu desvio da posição da economia política clássica pode ser explicado pelo facto de se ter orientado para um certo posicionamento socialista sob a influência da sua mulher Harriet.

Os economistas clássicos, como Smith e Ricardo, não devem, no entanto, ser demasiado criticados por se centrarem na magnitude do capital social (e na quantidade de produção que este produzia) como o desiderato, e não no bem-estar da população trabalhadora. Eles tinham muita simpatia pelos trabalhadores, mas acreditavam que estes tendiam a procriar rapidamente se houvesse uma melhoria da sua condição material de vida (uma ideia que encontrou expressão na teoria malthusiana da população). Se os salários reais subissem acima de um nível de subsistência, então a população aumentaria e a oferta de trabalho também, o que faria com que os salários reais voltassem ao nível de subsistência. Por conseguinte, qualquer melhoria da sua condição de vida dependia apenas deles próprios. Eles tinham de mudar os seus hábitos e restringir o seu crescimento numérico mesmo quando se deparavam com uma melhoria nas suas condições de vida; só assim poderiam manter quaisquer melhorias verificadas nas suas vidas. Só assim poderiam manter a melhoria das suas condições de vida. Uma vez que a política nada podia fazer quanto a isto, o foco da política tinha de se concentrar no aumento do capital social total e, consequentemente, no aumento da produção; isto aumentava o montante total disponível para todos, do qual os trabalhadores poderiam obter uma parte maior se mudassem os seus hábitos.

A mesma benevolência que se pode dar a Smith e a Ricardo não pode, no entanto, ser dada à chamada economia burguesa “mainstream” de épocas posteriores. A crença na teoria malthusiana da população havia terminado há muito tempo. Na verdade, a descrição de Marx desta teoria como uma “calúnia contra a raça humana” encontraria hoje uma aceitação geral, ao contrário do que acontecia no final do século XVIII e início do século XIX. Mesmo assim, a teoria burguesa “dominante” continua a considerar o nível do Produto Interno Bruto como o índice de prosperidade de uma “nação” e a sua taxa de crescimento como o índice do seu progresso. Uma vez que o “progresso”, neste sentido, só pode ser alcançado através das acções dos capitalistas, o interesse da “nação” seria melhor servido se se fizesse a vontade aos capitalistas, dando-lhes incentivos, promovendo os seus interesses e tratando-os como seres privilegiados. Se bem que Smith e Ricardo possam ter adotado esta posição por pensarem (erradamente) que nada mais poderia ser feito até que os trabalhadores mudassem os seus hábitos, o facto de os economistas actuais adoptarem a mesma posição representa um puro viés ideológico.

O exemplo mais recente deste viés é o anúncio feito pelo CEO da Niti Aayog de que a Índia é agora a quarta maior economia do mundo, tendo acabado de ultrapassar o Japão em termos da dimensão do seu PIB que agora ultrapassou os US$4 milhões de milhões (trillion). O CEO da Niti Aayog não mencionou este facto apenas de passagem; fez questão de o referir como um grande feito e, sem surpresa, este desenvolvimento foi louvado por membros do big business indiano. Contudo, é significativo que o facto de a Índia ter uma população mais de dez vezes superior à do Japão não foi mencionado por aquele CEO. O seu cacarejar foi exatamente igual à observação de Modi, algum tempo atrás, de que a Índia teria em breve um PIB de US$5 milhões de milhões.

Mas absolutamente aparte da questão da dimensão do país, a qual torna sem sentido todas as afirmações baseadas na comparação da magnitude absoluta do nosso PIB com os dos países capitalistas avançados, concentrar-se no PIB em si representa uma perspetiva totalmente falsa. Não só é um retrocesso a uma perspetiva antiga que acreditava no malthusianismo, como é completamente desfasada de uma sociedade democrática. Numa democracia é a condição de vida do povo que importa e o progresso deve ser medido exclusivamente em função da medida em que estas condições estão a melhorar.

Esta perspetiva está também em desacordo com a perspetiva da nossa luta anti-colonial. O conceito de uma “nação” cujo PIB é supostamente superior ao do Japão é suposto ser motivo de celebração, é o de uma “nação” que se posiciona acima do povo, cuja realização ‘gloriosa’ é totalmente alheia à condição de vida do povo. Isto é um anátema completo anátema para o espírito da luta anticolonial que via a libertação da “nação” do domínio imperialista como sinónimo de libertação do povo.

Não só a condição do povo continua a ser quase tão miserável [quanto antes] após mais de três quartos de século de independência, com a Índia a ocupar em 2024 o 105º lugar no Índice Global da Fome entre os 127 países para os quais esse índice é elaborado, como também temos um governo que, ao invés de se envergonhar deste facto, se gaba da dimensão do nosso PIB.

01/Junho/2025

domingo, 1 de junho de 2025

O acordo que vendeu a Europa

 


Michael Hudson [*]
entrevistado por Nima Alkhorshid

Titanic.

NIMA ALKHORSHID: Olá a todos. Hoje é quinta-feira, 15 de maio de 2025, e o nosso amigo Michael Hudson está de volta. Bem-vindo de volta, Michael.

MICHAEL HUDSON: É bom estar aqui.

NIMA ALKHORSHID: Michael, vamos falar sobre o que está a acontecer entre os Estados Unidos e o Reino Unido. Na sua opinião, como é que a Grã-Bretanha está a ser usada pelos Estados Unidos hoje, de forma semelhante ao seu papel em 1944, durante a criação do FMI e do Banco Mundial?

MICHAEL HUDSON: Bem, é praticamente o mesmo papel.

Em 1944, os Estados Unidos estavam a planear como criar uma ordem pós-guerra que os beneficiasse. E o seu objetivo principal era dissolver o Império Britânico e o Império Francês, criando regras que beneficiassem os Estados Unidos.

Por exemplo, o fim da preferência imperial e a base do sistema financeiro no ouro e, especialmente, contrariar John Maynard Keynes, que viu os problemas que iriam surgir nos próximos 50 anos.

Ele disse que o problema seria que os Estados Unidos se tornariam um país credor. Iriam endividar outros países consigo. Estes iriam gostar especialmente da Inglaterra. E queremos um tipo de regras que, se houver um país que continue a ter excedentes e outros países que tenham défices, tenhamos de dizer: «Ok, os Estados Unidos não estão a deixar a Inglaterra ganhar os dólares para pagar as dívidas que os Estados Unidos a obrigaram a contrair com o empréstimo britânico em 1944». E descrevi tudo isso em Super Imperialism e houve debates maravilhosos na Câmara dos Lordes e na Câmara dos Comuns.

E basicamente, o teor dos seus comentários foi: não temos escolha. Dependemos completamente dos Estados Unidos. Temos de nos submeter.

E assim, as regras de Keynes foram rejeitadas e a Inglaterra concordou com regras que se tornaram a ordem económica do pós-guerra, beneficiando os Estados Unidos na criação do FMI e do Banco Mundial, de acordo com linhas que os beneficiavam em detrimento de outros países.

Bem, o que os Estados Unidos fizeram então foi ir à Europa continental e dizer: «Olhem, fizemos isto com a Inglaterra. Esse é o protótipo». Havia uma inércia e a Inglaterra era sempre a primeira a vender a Europa e outros países para se render aos Estados Unidos. E os EUA aceitavam a sua rendição e usavam essa negociação para estabelecer as regras que os outros países deveriam seguir.

Bem, foi exatamente isso que aconteceu nos últimos dias. Os Estados Unidos foram à Inglaterra e fizeram com que ela concordasse, sem mencionar especificamente a China, com regras comerciais que eram regras de segurança nacional, o que significa que qualquer coisa que a China exportasse para a Inglaterra que pudesse ser considerada segurança nacional, como tecidos que pudessem ser usados em uniformes militares, qualquer coisa que fosse proibida.

E, basicamente, Trump já tinha anunciado praticamente o que iria fazer no Dia da Libertação, a 2 de abril. Ele disse que iria impor estas tarifas a outros países. Não disse que isso iria criar o caos, mas que iria dar-lhes uma escolha.

O que ele disse foi, claro, que poderíamos reverter as tarifas se eles cedessem. E as cedências eram as políticas americanas que eles iriam aceitar. E as concessões eram praticamente exatamente o que a Inglaterra acabou de concordar.

Portanto, é óbvio que Trump não esperava realmente que toda essa questão das tarifas fosse sobre tarifas. Ele deixou muito claro que a questão das tarifas é forçar outros países a se juntarem à nossa Guerra Fria contra a Rússia e a China, especialmente a China, por tudo isso. E é basicamente disso que se tratam essas regras.

E a mesma coisa está a acontecer agora com a Alemanha, que está a juntar-se à Inglaterra sob o Sr. Merz.

Portanto, o problema para os outros países é: vão evitar esta crise de curto prazo, esta perturbação de curto prazo no seu comércio que Trump causou ao reorientar o seu comércio para longe da Rússia, da China e dos seus aliados no Leste Asiático?

Ou vão decidir que a economia dos EUA está a encolher, e está a encolher especialmente, podemos discutir isso, devido às medidas que Trump tomou, ele garantiu que estamos a entrar numa recessão aqui.

Se outros países se renderem a ele e concordarem com os seus termos de vincular o seu comércio e investimento a uma economia americana em contração, então terão de sacrificar o comércio com a Rússia, a China e a maioria global que está a crescer em vez de encolher.

Bem, todo o problema para os outros países é: o que queremos dizer quando falamos de outro país? Normalmente, queremos dizer o que os seus líderes vão dizer, e Starmer, na Inglaterra, e Merz, na Alemanha, realmente não representam o que os seus eleitores querem.

E sabemos disso por causa de todos os protestos dos eleitores contra Starmer, o Partido Trabalhista está agora no nível mais baixo que já atingiu. E o mesmo vale para os democratas-cristãos na Alemanha, os alemães não querem Merz e a remilitarização antirussa que ele quer, mas os Estados Unidos promoveram pessoas como Starmer e Merz para serem os chefes de seus países.

Portanto, temos uma situação estranha em que os líderes dos países com os quais os Estados Unidos lidam em primeiro lugar representam os interesses dos EUA ou estão dispostos a concordar com eles. Eles acreditam que as suas carreiras pessoais continuarão ligadas aos Estados Unidos, assim como os EUA os promoveram desde o início, de acordo com as suas linhas ideológicas e políticas.

Então, basicamente, é isso que está a acontecer. Outros países estão a ser solicitados a sacrificar-se pela economia dos EUA.

NIMA ALKHORSHID: Michael, mencionou a segurança nacional dos Estados Unidos. Como vê o objetivo estratégico por trás da invocação das cláusulas de segurança nacional pelos Estados Unidos nas negociações comerciais, particularmente em relação à China?

MICHAEL HUDSON: Segurança nacional significa tudo o que se quiser que signifique. É uma palavra polissémica, como dizem os linguistas. Pode significar qualquer coisa, tudo pode ser segurança nacional.

Vê os Estados Unidos a querer fechar Harvard e outras universidades com o argumento da segurança nacional, porque os seus estudantes protestam contra a guerra e o genocídio. Isso é uma ameaça à segurança nacional.

Vê-o a prender imigrantes com o argumento de que é por razões de segurança nacional. Tudo pode ser segurança nacional.

Portanto, tudo o que os Estados Unidos têm de dizer é que o comércio com a Rússia ou a China ameaça a nossa segurança nacional porque a China quer exportar algo que nós queremos exportar. Ou a China quer importar algo da Europa, como máquinas de gravação para chips de computador que pode usar militarmente.

E, essencialmente, isso significa que os Estados Unidos têm uma ditadura completamente arbitrária para decidir o que os outros países podem fazer. Significa que agora estamos a apontar para uma economia centralmente planeada pelo exército dos EUA e pelo estado profundo, em preparação para uma escalada da guerra fria contra a Rússia e a China. É isso que significa.

NIMA ALKHORSHID: Michael, que escolha os países têm entre alinhar-se com os Estados Unidos e virar-se para a China, o mercado mais dinâmico da China, se assim podemos dizer?

MICHAEL HUDSON: Bem, se não lhes é permitido negociar com a China, o que podem fazer?

Não conseguem obter receitas do comércio externo suficientes para se manterem solventes. E as principais vítimas em tudo isto são os países do Sul global em particular. Já têm dificuldades em pagar as suas dívidas externas. Estão a entrar em incumprimento.

As obrigações da América Latina e de outros países do Sul global estão a desvalorizar-se porque são realmente arriscadas. E é basicamente este o problema. E há uma solução que eles têm.

O problema é que, se aumentarem os impostos para, de alguma forma, lançar a sua moeda no mercado cambial para tentar angariar dólares para pagar aos detentores de obrigações denominadas em dólares, não terão dinheiro suficiente para os governos investirem em infraestruturas domésticas ou promoverem programas sociais justos. Terão de fazer a si próprios o que Trump, Musk e os republicanos estão a fazer aos Estados Unidos, cortando programas sociais, cortando investigação e desenvolvimento, estrangulando a economia com medidas de austeridade para pagar aos detentores de obrigações.

Por outras palavras, os países e os seus líderes, ou líderes eleitos, vão ter de colocar os interesses dos países estrangeiros acima dos seus próprios interesses nacionais. Bem, isso é uma perda de soberania. Seria de pensar que a definição de soberania é permitir que os países soberanos decidam como gerir o seu próprio sistema fiscal e monetário para promover o seu próprio desenvolvimento económico. Mas se agora são impedidos de o fazer, então o que fazer?

Bem, o que Trump fez foi dar-lhes uma dádiva de Deus em tudo isto. Já se falava sobre se iríamos voltar à situação em que estávamos na década de 1980, depois que o México entrou em incumprimento com seus Tesobonos e os países latino-americanos declararam insolvência. Então surgiu o plano Brady, que reduziu as dívidas a algo que era pagável, mas foi uma década perdida para a América Latina.

E o Fundo Monetário Internacional, basicamente um braço do exército dos EUA, usou a sua capacidade de empréstimo para apoiar líderes de direita apoiados pelos Estados Unidos e retirar o apoio a países cujos líderes a política externa dos EUA não considerava compatíveis com a política externa americana.

Assim, os países podem agora dizer:   bem, havia um contrato moral implícito no comércio internacional, e isso era exatamente o que Keynes tinha dito em 1944. Keynes tinha sido um dos principais economistas durante o debate sobre as reparações alemãs, dizendo que, se os aliados insistissem em receber as dívidas de reparação para pagar aos Estados Unidos, os Estados Unidos teriam de permitir que a Alemanha ganhasse o dinheiro exportando para os Estados Unidos.

Mas o Congresso dos Estados Unidos disse: bem, espere um minuto, não queremos que os devedores ganhem dinheiro para nos pagar competindo com a indústria dos EUA. Então, eles aprovaram uma lei sobre o comércio com países com moedas em desvalorização, o que significava uma tarifa flutuante que aumentaria para eliminar qualquer vantagem cambial que a Alemanha ou outros devedores aliados tivessem ao tentar levantar dinheiro para exportar e pagar as suas dívidas externas.

Bem, Keynes disse que era preciso eliminar as dívidas das reparações de Versalhes e as dívidas entre aliados que deveriam ser pagas com as reparações alemãs aos Estados Unidos pelas armas que os aliados usaram antes de os Estados Unidos entrarem na Primeira Guerra Mundial.

Bem, o mesmo argumento moral que foi discutido durante toda a década de 1920 acaba de reaparecer hoje. Os países do Sul Global podem dizer:   as tarifas de Trump impediram-nos de ganhar o dinheiro para pagar aos detentores de títulos que têm dólares americanos. Não podemos pagar-lhes, por isso vamos precisar exatamente do que aconteceu ao mundo em 1931, quando houve uma moratória sobre as reparações alemãs e as dívidas entre aliados, ou na década de 1980, quando surgiram os planos Brady.

Eles têm a oportunidade de suspender o pagamento da dívida, e isso vai forçar os Estados Unidos a fazer uma escolha. Os detentores de títulos vão fazer o que tentaram fazer com a Argentina nas últimas décadas. Dirão: bem, se não pagarem a dívida externa, vamos tratá-los como tratamos a Venezuela, a Argentina ou o Irão. Podemos confiscar todos os ativos que tiverem aqui. Podemos confiscar, se tiverem investimentos governamentais nos Estados Unidos, podemos confiscar. Podemos confiscar o vosso ouro. Podemos confiscar os vossos navios militares quando viajarem para o estrangeiro, como os americanos tentaram confiscar um navio argentino quando este visitou um porto africano amigo.

Assim, outros países enfrentarão literalmente uma força maior dos EUA a tentar confiscar os seus ativos, da mesma forma que os Estados Unidos e a Europa confiscaram US$300 mil milhões em ativos da Rússia.

O que podem fazer? Tudo o que podem fazer é unir-se e dizer: bem, se vocês confiscarem, isso é moralmente errado, e vocês não nos deixaram escrever as regras das finanças internacionais e do comércio internacional de uma forma que nos beneficie, e não a vocês. Vocês, os Estados Unidos, mudaram as regras em 1971, afastando-se do ouro. Estão a mudar as regras hoje, sob o presidente Trump, de forma unilateral. Mas vocês são 1% da população, ou 15% quando se soma toda a Europa e todos os outros. Vamos ter de criar uma ordem económica alternativa. E se vocês confiscarem os nossos ativos, nós confiscaremos todos os vossos investimentos estrangeiros nos nossos países.

E, finalmente, vamos simplesmente deixar os ativos existentes onde estão, e cada país fica com os ativos que tem no seu próprio país. Os EUA ficam com os ativos estrangeiros dos países devedores que impedem de pagar as suas dívidas. A faixa global e a maturidade global, em conjunto, assumirão o controlo dos investimentos mineiros dos EUA no estrangeiro, dos investimentos petrolíferos no estrangeiro, de todos os ativos que têm no estrangeiro. Eles colocarão os bancos americanos sob o seu próprio controlo nacional e os transformarão em serviços públicos, muito semelhantes ao banco central da China. Terão a oportunidade, feita à medida, de criar a sua própria ordem monetária. Bem, tudo o que precisam para isso é uma ideia de como será essa ordem. Eles têm de ter realmente um plano. É a única coisa que falta neste momento. Precisam de um plano e precisam da certeza de que podem fazer a América bluffar. Podem dizer:   «Está bem, não vamos assinar um acordo como o que a Inglaterra assinou e que a Alemanha vai assinar como rendição. Vamos dizer: está bem, deixem as vossas tarifas de 80% sobre o Bangladesh e outros países, deixem as vossas tarifas de 40% sobre nós. Não podemos pagar, talvez na reunião do BRICS que se realizará no próximo mês, apresentemos os planos para uma nova ordem económica internacional, tal como sempre quisemos fazer desde a Conferência de Bandung, na Indonésia, em 1955, dos países não alinhados e suas conferências subsequentes.

Assim, estes países não alinhados podem alinhar-se uns com os outros em ajuda mútua, agora que têm variedade suficiente, uma gama completa de produção e dinheiro entre si para poderem seguir sozinhos. Antes, nunca poderiam seguir sozinhos, mas agora podem. Então, tudo o que precisam de fazer é perceber a sua posição de força.

Bem, todos percebem isso, exceto os economistas [vulgares] que dizem que é preciso conformar-se ao mercado e que o mercado é exatamente o que os Estados Unidos projetaram. O mercado não é natural. Ele foi projetado nos Estados Unidos para beneficiar os Estados Unidos às custas de vocês ou, como diz Donald Trump, para tornar-nos vencedores e vocês perdedores.

Portanto, a questão é:   como vamos fazer com que a maioria global realmente aproveite esta oportunidade maravilhosa e crie esta nova ordem económica internacional que é independente e finalmente se livra do facto de que as dívidas não podem ser pagas sem sacrificar o seu próprio crescimento, para que vocês finalmente deixem os países com os seus próprios recursos naturais livres dos proprietários americanos que não pagam impostos sobre eles? E usar esses recursos naturais, rendas da terra, rendas monopolistas, rendas monopolistas dos serviços públicos e infraestruturas que as empresas americanas compraram. Agora podem usar todas essas rendas económicas para financiar o seu próprio investimento de capital e começar a desenvolver-se na mesma linha que os Estados Unidos, a Alemanha e outros países desenvolveram no século XIX, para o seu decolagem industrial. Esse é o potencial.

NIMA ALKHORSHID: Michael, com o que disse, considerando todas as informações que nos deu, acredita que o plano de Trump não é realmente reindustrializar os Estados Unidos, mas sim desmantelá-los?

MICHAEL HUDSON: Esse é o efeito do que ele está a fazer. O facto é que não há como os Estados Unidos se reindustrializarem por uma série de razões. Existem pré-requisitos necessários para a reindustrialização.

A coisa mais óbvia de que se precisa na América para reindustrializar é mão-de-obra. Mas a América não tem mão-de-obra para trabalhar na indústria porque ninguém quer trabalhar na indústria, porque os salários são muito baixos para trabalhos fabris muito duros, trabalho manual, que ganham apenas 35 cêntimos a mais por hora do que um empregado de mesa, um trabalhador do setor de serviços ou um empilhador num armazém da Amazon.

Portanto, os brancos não querem trabalhar em trabalhos manuais. No passado, esse trabalho manual era feito em grande parte por imigrantes. Mas Trump não quer imigrantes, então não há mão-de-obra imigrante disponível para fazer esse trabalho.

No passado, havia mão-de-obra negra que migrou do sul para se tornar mão-de-obra industrial e sindicalizada.

Mas, para trabalhar na indústria, é preciso algum tipo de formação. E é por isso que, durante muitos anos, os Estados Unidos tiveram um sistema de escolas profissionais altamente desenvolvido, tal como a Alemanha teve durante o seu arranque industrial. Uma formação muito, muito boa de operários, industriais e trabalhadores fabris.

Mas isso não tem sido o caso nos Estados Unidos. Afastámo-nos da ciência, da engenharia, da matemática e da industrialização em geral para algo mais, não sei bem como caracterizar o que estão a estudar, mas não é industrial.

Portanto, houve uma guerra de classes nos Estados Unidos contra os trabalhadores sindicalizados, principalmente os industriais, por meio da deslocalização. E essa deslocalização da indústria levou, de facto, a uma demanda muito pequena por mão-de-obra industrial. Portanto, não é surpresa que não haja mais uma força de trabalho industrial.

Bem, a outra coisa de que se precisa, supondo que se tivesse essa mão-de-obra, são matérias-primas como aço e alumínio, porque quase todos os produtos manufaturados são feitos de aço e alumínio.

Bem, o que Trump fez foi o contrário do que as tarifas protecionistas deveriam fazer. Toda a estratégia da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos era importar matérias-primas de baixo preço de outros países e fazer com que todos eles competissem entre si, fornecendo-nos produtos agrícolas, metais e minerais. E então monopolizaríamos a produção industrial, que é onde está o valor acrescentado. Assim, a nossa mão-de-obra pode ser trocada por muito mais mão-de-obra de matérias-primas que esses países produzem.

Bem, o que Trump fez foi essencialmente ir até os poucos sindicatos que restam, como os dos trabalhadores siderúrgicos. E ele disse: “Vocês sabem, eu quero os votos dos sindicatos”. Ele trouxe um trabalhador siderúrgico que disse: “Esta é uma tarifa maravilhosa”. Vocês sabem, nós certamente vamos votar em Trump.

Mas para o resto da indústria, o que a tarifa de Trump significa é que os fabricantes americanos vão ter de pagar muito mais ao mundo — existe um preço mundial comum para todas as matérias-primas, mas os americanos vão ter de pagar mais do que os seus homólogos europeus ou asiáticos por causa da tarifa de Trump. Portanto, ele já quebrou a regra mais básica da política tarifária.

Bem, outra coisa de que vai precisar é de maquinaria. E a maior parte da maquinaria que é utilizada nos Estados Unidos, desde porcas, parafusos e engrenagens, já não é fabricada aqui.

Eu conhecia o CEO de uma empresa que fabricava parafusos e tarraxas. Ele acabou por encerrar a empresa porque disse: «Não, não temos mais dinheiro para fabricá-los. Outros países estão a fabricá-los. E imagine que não há mais parafusos fabricados nos Estados Unidos. São todos importados.»

Bem, imagine se, de repente, com as barreiras comerciais, os Estados Unidos ficassem dependentes de países estrangeiros para coisas que deveriam ser muito fáceis de fabricar, como parafusos, mas que a indústria americana diz: «Bem, não há lucro de monopólio com alta tecnologia e taxas de patentes sobre tudo isso.»

O plano de Trump é fazer com que as exportações americanas se baseiem num tipo específico de indústria. Seja a indústria informática, a tecnologia da informação ou as armas, exportações monopolizadas que outros países não produzem e estão impedidos de produzir por uma razão ou outra.

E ele espera que, de alguma forma, consiga obter esses enormes produtos monopolistas, preços em setores selecionados dos EUA e, essencialmente, obter um almoço grátis de outros países, que não os produzem. Bem, como outros comentadores apontaram na luta na Ucrânia e em outros lugares, as armas americanas não parecem funcionar muito bem. E outros países, mesmo que Trump tenha acabado de negociar uma enorme venda de armas para a Arábia Saudita, isso não significa que essas armas vão realmente funcionar. Penso que isto é uma ideia política. E, basicamente, a Arábia Saudita concordou em ser um bom cliente dos EUA, para que os Estados Unidos protejam os seus interesses e coloquem os seus terroristas wahhabitas no comando da Síria, para que a Arábia Saudita possa espalhar o terrorismo islâmico e a sua versão particular do Islão e protegê-lo contra o Islão iraniano ou formas mais civilizadas de Islão.

Portanto, o comércio já não depende da utilidade real do processo. E só nas últimas semanas vimos outras razões pelas quais a América não pode industrializar-se.

Trump declarou guerra às principais universidades americanas. Ele disse que vai cortar todo o financiamento para pesquisa em tecnologia, farmacêutica, biologia, tudo nas universidades que permitem que seus alunos digam que são contra a guerra e contra o genocídio. Isso é uma ameaça à segurança americana, porque genocídio somos nós. Guerra somos nós. É uma ameaça se eles estão fazendo isso.

Então, ele está essencialmente a tentar tirar a isenção fiscal de Harvard, como uma espécie de primeiro grande gigante a derrubar, para que ele possa assumir o controle, o que costumava ser chamado de fascismo, assumir o controle do currículo que Harvard tem permissão para ensinar. Não pode realmente ensinar estudos islâmicos, estudos do Oriente Próximo. É um controle total. E não só o dinheiro para a investigação universitária foi cortado, mas Trump também dissuadiu estudantes estrangeiros de frequentar as universidades. Bem, os estudantes estrangeiros, especialmente da China e de outros países asiáticos, da Índia, eram a sua fonte de lucro, porque eram os estudantes que pagavam propinas integrais de 50 a 90 mil dólares por semestre pelos seus estudos. Bem, agora eles não vão mais vir. Haverá uma redução drástica na sua chegada. Eles têm medo de vir porque, e se disserem que são contra a guerra? Bem, saia daqui. O teu visto de estudante está cancelado. Não podes aparecer para os teus exames finais.

E não são só os estudantes que estão bloqueados, mas também os licenciados. A sensação é que muitos dos estudantes que vieram do estrangeiro para os Estados Unidos e queriam especializar-se em engenharia, ciência e tecnologia ficaram nos Estados Unidos. E assim, os Estados Unidos fizeram com que outros países pré-educassem e arcassem com todos os custos de criar os filhos até à idade universitária. E depois obtiveram o benefício da vinda deles para cá.

Foi isso que tornou os Estados Unidos tão ricos desde o início do século XIX, a imigração de mão-de-obra qualificada.

E Trump está agora na sua guerra contra as universidades e contra qualquer pessoa que defenda a paz, perdendo todo este benefício que os Estados Unidos tiveram. Portanto, Trump está, na verdade, com a sua chamada política tarifária e as contrapartidas que anunciou, dizendo que estas tarifas são para nos ajudar a reindustrializar. Isso é apenas uma história para encobrir. Não vão ajudar a América a industrializar-se.

O que Trump realmente queria fazer era imaginar que, de alguma forma, outros países iriam render-se aos Estados Unidos. Continuariam a exportar exatamente o que exportam agora, mas reduziriam drasticamente o preço que cobram pelas suas exportações.

Trump disse que os americanos não pagarão o custo das tarifas. Os países estrangeiros pagarão o custo das tarifas. Bem, isso foi simplesmente ridículo. É claro que os americanos terão de pagar as tarifas.

Outros países não vão sacrificar-se porque não há lucro para eles. Os lucros são frequentemente de 10 a 15%. Se as tarifas forem mais altas do que isso, não é possível produzir bens para exportação com lucro. Eles terão de encontrar outro mercado.

Bem, onde vão encontrar outro mercado se tiverem de assinar um contrato com os EUA a dizer que não vão negociar com a Rússia ou a China por tudo isto? É possível ver o laço que Trump está a apertar em torno da economia dos EUA e todo o plano neoconservador da Guerra Fria para tudo.

Há muito pouco que eles possaem fazer.

Bem, o que vão fazer os outros países em relação a tudo isto? Não vão exportar, o que significa que não haverá nem de longe a enorme receita tarifária que Trump prometeu. O mesmo se passa com os cortes de Elon Musk nas despesas públicas na Doge. Muitos destes são marginais e fictícios. Ele foi mesmo atrás das despesas culturais e dos pagamentos do Medicare. Os pagamentos para as classes de baixos rendimentos foram basicamente eliminados.

Mas não haverá receita suficiente para compensar os cortes de impostos que os republicanos estão agora a apresentar esta semana no Congresso, renovando todos os cortes de impostos que Trump apresentou anteriormente e ainda mais.

Assim, o resultado é que todos os que fizeram uma análise orçamental vêem que o orçamento americano vai subir e subir e subir. E hoje, os títulos do Tesouro a 10 anos têm um rendimento (yield)superior a 4,5%. Quando os rendimentos (yields) dos títulos sobem, os preços dos títulos vão abaixo. As pessoas estão a dizer:   «Espere um minuto, será que queremos mesmo um título do Tesouro a 10 anos, sem falar dos títulos a 30 anos, se há um défice orçamental tão grande e tão pouca produção, isto vai ser inflacionário. Será que queremos mesmo investir as nossas poupanças? E isto inclui as poupanças dos bancos centrais estrangeiros e as poupanças dos governos estrangeiros. Queremos investir na dívida de um país cujos preços vão subir e não vamos chamar a isso de hiperinflação, mas o aumento dos preços continuará a subir e a taxa de câmbio dos dólares terá de cair.

E Trump disse que quer que as taxas de câmbio caiam. 10%, 20%. Bem, acho que foi 10% nos Acordos Plaza com o Japão, há muito tempo, naquela época. E se você está a perder 10% do seu dinheiro e a taxa de juro é de apenas 4%, você perdeu dois anos e meio de juros. E o valor principal de tudo isso.

Então, qual é a atração dos Estados Unidos como mercado de investimento e do dólar como moeda de reserva internacional para bancos centrais estrangeiros e meio de poupança? Todas as ações de Trump e sua economia maluca, que realmente não funcionam quando se faz as contas e se projeta as tendências estatísticas, mostram que a economia está em uma situação realmente inviável para investimentos estrangeiros.

Portanto, isto deve funcionar como uma espécie de catalisador para forçá-los a dizer:   se não atuarmos em conjunto, vamos todos ser enforcados separadamente, a não ser que nos unamos como os revolucionários americanos afirmavam.

NIMA ALKHORSHID: Michael, Donald Trump está a ameaçar proibir os navios construídos na China, uma grande estratégia de isolamento económico e possível auto-sabotagem. O que é que ele pensa? Como é que isso vai beneficiar os Estados Unidos?

MICHAEL HUDSON: Bem, uma grande parte do comércio é feita em navios construídos na China. As regras fiscais e regulatórias para os navios dos EUA são tão elevadas que quase não há navios americanos por aí.

E a China, juntamente com a Coreia do Sul e o Japão, desenvolveram a construção naval e criaram o seu próprio mercado.

Mas se proibir os navios chineses de entrar nos mercados americanos, bem, os navios costumam ir de um país para outro. E isso significa que todos os países para onde os navios vão serão, de alguma forma, impedidos de comercializar se ele fizer isso. Portanto, esta é outra questão. É uma barreira não tarifária que, em muitos aspetos, é ainda mais um obstáculo ao comércio.

A propósito, Trump também está a insistir no Panamá que os navios americanos não tenham de pagar quaisquer taxas. E o Panamá tinha acabado de dizer que os navios americanos têm de pagar taxas mais elevadas porque são tão grandes que requerem atenção especial. Trump insistiu que eles não têm de pagar nada, aumentando os custos de transporte para todos os outros países.

Portanto, não só existem barreiras tarifárias, como todo o custo do transporte e do comércio externo aumentou.

Bem, nos últimos dias, os Estados Unidos abordaram a Coreia do Sul e o Japão e disseram: digamos que precisamos de um acordo entre os três países para construir navios. E vamos chamá-los de EUA, vocês vão construí-los, mas vamos colocar uma bandeira dos EUA neles para que possamos essencialmente construí-los. E a questão é se a Coreia do Sul e o Japão farão isso.

Bem, acho que no último programa discutimos que o Japão já está a pensar:   queremos mesmo ligar o nosso futuro aos Estados Unidos agora que eles bloquearam as nossas exportações? Queremos pensar em reorientar-nos para a China?

Portanto, a questão é se o transporte para os Estados Unidos em navios que não são navios americanos ou navios que são chineses ou que negociaram com a China, então esse comércio é simplesmente interrompido. Bem, pode-se ver que o comércio não vai realmente parar. Ele apenas será redirecionado para longe dos Estados Unidos.

Portanto, mais uma vez, Trump, ao tentar isolar a China, está acabando por isolar-se a si mesmo.

E a razão pela qual ele foi para a Coreia do Sul e para o Japão é porque alguém lhe disse que são necessários 10 anos para construir um estaleiro capaz de construir um navio. Eles são para navios gigantescos . É preciso criar todo um sistema. É preciso criar um enorme planeamento antecipado e uma indústria naval cara.

A China, a Coreia do Sul e o Japão já investiram os custos irrecuperáveis em tudo isso. Mas agora esses custos para os Estados Unidos são enormes, especialmente porque acabámos de deportar uma importante fonte de mão-de-obra para a construção civil americana.

Então, basta olhar para como todas as medidas que ele tomou para tentar isolar a China acabaram por isolar os Estados Unidos e cortar o país de outros países. Jogando a decisão para outros países sobre, bem, agora que temos que negociar entre nós, quais são os termos, condições e instituições em que vamos basear o nosso próprio comércio? Bem, eles vão precisar de um novo fundo monetário internacional, um novo Banco Mundial e, em última instância, uma nova Organização das Nações Unidas.

Bem, por falar nas Nações Unidas, outra coisa que Trump cortou foram os gastos com saúde. Cortes drásticos, na saúde e na meteorologia. Eles cortaram a previsão do tempo aqui. Justamente quando o aquecimento global aumentou muito e o clima extremo se intensificou, coisas que ameaçam as cidades americanas. Temos deslizamentos de terra aqui. Temos inundações todas as noites no noticiário. Todo o combate ao mau tempo foi cortado e está a causar devastação.

E essas áreas ao nível do mar são onde se faz o transporte marítimo. Não se vai construir um porto no meio [estado sem litoral] de Indiana. Tem de ser construído no oceano, e é exatamente aí que o nível do mar está a subir.

E no que diz respeito ao nível do mar, Trump também retirou os Estados Unidos de todos os acordos ambientais relativos ao aquecimento global.

Além disso, os americanos estão a ficar muito doentes. Reduziram todos os relatórios sobre a COVID e outras doenças. Não há mais relatórios semanais ou mensais sobre a propagação da COVID, os testes da COVID na água potável.

Portanto, os americanos estão a ficar mais doentes. A esperança de vida dos americanos está a diminuir, enquanto em quase todos os outros países está a aumentar.

Para agravar ainda mais os problemas, todas as medidas tomadas por Trump pioram as condições, certamente para 90% da economia. E 90% da economia é basicamente responsável pela produção na economia. Os 10% são rentistas. Vivem das suas ações, obrigações e rendas imobiliárias.

NIMA ALKHORSHID: Michael, antes de encerrarmos esta sessão, uma questão muito importante neste momento no que diz respeito ao conflito na Ucrânia e no Médio Oriente. E sempre que falamos sobre isso, é o sistema SWIFT que os Estados Unidos estão a usar.

E quando impõem sanções a outros países, como a Rússia e o Irão, eles não podem utilizá-lo. Aqui está a questão, na minha opinião. A principal questão neste momento para os Estados Unidos e para a administração Trump seria:   a tentativa de monopolizar a tecnologia da informação e plataformas como o SWIFT é uma estratégia sustentável para manter a influência global dos Estados Unidos?

MICHAEL HUDSON: Desde que Marco Polo visitou a China e alguns padres católicos trouxeram bichos-da-seda para o Ocidente, tem sido quase impossível para qualquer país monopolizar qualquer tecnologia.

Os designers de moda italianos e os tecnólogos italianos foram expulsos de Itália essencialmente pela ditadura e pela Inquisição. Os industriais franceses foram novamente expulsos pela Inquisição católica para outros países.

Não é possível impedir o desenvolvimento de uma tecnologia. E também porque a tecnologia em si está a evoluir muito rapidamente e, para evoluir, é preciso investigação e desenvolvimento que, numa economia financeirizada como a dos Estados Unidos, não se apoia, porque isso leva tempo. Leva alguns anos para desenvolver algo.

E se for diretor financeiro de uma empresa de tecnologia, é pago de acordo com o dinheiro que ganha com as ações da sua empresa. Então, usa os lucros para recomprar ações ou pagar dividendos para aumentar o preço das ações, não para pesquisa e desenvolvimento.

Bem, países que não são financeirizados, como a China, não têm esse problema. Os países que não têm uma classe financeira que tomou conta da indústria e a financeirizou para ganhar dinheiro financeiramente em vez de industrialmente têm, obviamente, uma vantagem no desenvolvimento de novas tecnologias.

E é por isso que agora temos relatos quase semanais de novos avanços chineses em computadores e outras áreas. No mês passado, a China anunciou um novo tipo de sistema de cadeia de blocos para pagamentos feitos na sua moeda e na moeda de países amigos, a fim de se libertar do SWIFT.

Assim, quando se tenta proteger a tecnologia, o que se faz é forçar outros países não só a duplicá-la, mas, normalmente, como já é posterior ao momento em que a América a desenvolveu, conseguem melhorá-la e obter uma vantagem.

E assim, todos os tipos de sanções ajudaram outros países a desenvolver sua própria autossuficiência nessa tecnologia, assim como discutimos no caso da Rússia e em várias ocasiões em seu programa antes. E é exatamente isso que está a acontecer agora.

A China está a gastar dinheiro em desenvolvimento, outros países, Coreia do Sul, Japão, outros países estão a fazer isso.

Os Estados Unidos esperavam, de alguma forma, que os seus bancos de investimento pudessem tomar o controlo dessas indústrias estrangeiras ou comprá-las e consolidá-las nas empresas-mãe americanas. Indústrias de países em que grande parte da investigação e desenvolvimento é financiada pelos governos locais, tal como aqui. Mas os governos não estão dispostos a deixar que essas indústrias que financiaram sejam vendidas aos banqueiros americanos e entregues aos Estados Unidos para monopolizarem à custa das suas próprias economias domésticas.

NIMA ALKHORSHID: Muito obrigado, Michael, por estar connosco hoje. Foi um grande prazer, como sempre.

MICHAEL HUDSON: Bem, é muito bom estar aqui. Eu pergunto-me. Espero que outros países possam resolver os problemas que discutimos. Acho que mostrámos o que é necessário para resolvê-los. Acho que isso fica para programas futuros.

NIMA ALKHORSHID: Sim, exatamente.

Em

RESISTIR.INFO

https://resistir.info/m_hudson/fmi_31mai25.html

1/6/2025 

quinta-feira, 29 de maio de 2025

¿Existe todavía la OTAN?

 


por Dmitri Orlov. En Club Orlov. Publicado originalmente el 27 de mayo de 2025. Traducción de Comunidad Saker Latinoamérica

Como dice la página web de la OTAN, “La OTAN es una alianza política y militar de países de Europa y Norteamérica”. Obsérvese el orden de los adjetivos: primero política y después militar. Esto no es casualidad: resulta que la OTAN es militarmente insignificante. Su único éxito fue desmembrar Serbia para crear Kosovo. Destruir Libia difícilmente cuenta como un éxito. Pero la OTAN sin duda ha tenido éxito político, creciendo mucho más. Entre el colapso de la URSS y el inicio de la Operación Militar Especial de Rusia en la antigua Ucrania, la OTAN absorbió a la República Checa, Hungría, Polonia, Bulgaria, Estonia, Letonia, Lituania, Rumanía, Eslovaquia, Eslovenia, Albania, Croacia, Montenegro y Macedonia del Norte. La OTAN tenía planes de absorber también a Ucrania y Georgia, pero fracasó, conformándose con Finlandia y Suecia, más digeribles, como premio de consolación.

La expansión es una de las principales funciones de la OTAN. Las naciones recién incorporadas deben tener sus ejércitos entrenados y equipados con armas, principalmente de fabricación estadounidense, según los estándares de la OTAN, inspirados principalmente por la Alemania nazi, lo que requiere una burocracia enorme y extensa. Otra función importante de la burocracia de la OTAN es planificar y organizar ejercicios de entrenamiento en los que varios ejércitos miembros de la OTAN colaboran para atacar a Rusia o repeler un ataque ruso (porque no hay otros enemigos en los que pensar), sin inmutarse ante el hecho de que atacar a Rusia sería un suicidio y que Rusia no tiene ningún interés en atacar a ningún país miembro de la OTAN (pero está dispuesta a destruirlos si atacan a Rusia).

Esta última aclaración entre paréntesis requiere cierta explicación. Aunque la OTAN supuestamente es una organización defensiva, en realidad nunca ha defendido a ninguno de sus miembros. Ha participado en varias operaciones ofensivas lideradas por Estados Unidos (en la ex Yugoslavia, Irak y Afganistán). El Artículo 5 de la Carta de la OTAN estipula que, en caso de ataque contra miembros de la OTAN, los demás miembros deben consultarse sobre la posibilidad de acudir en ayuda del miembro afectado, pero cada miembro decide qué ayuda ofrecer (podría limitarse a enviarle una caja de deliciosas piruletas). Más importante aún, no se estipula que, si un miembro de la OTAN es atacado, los demás miembros deban suicidarse voluntariamente intentando defenderlo.

Consideremos un ejemplo específico. Supongamos que Rusia decide que ya está harta de la intromisión británica en países cercanos a sus fronteras y decide solucionar el problema de una vez por todas. Un arma ideal sería uno de sus nuevos misiles Sarmat. Estos misiles se disparan desde un lanzador móvil, tardan unos minutos en desplegarse, recorren trayectorias arbitrarias a través de la estratosfera (lo que los hace imposibles de interceptar) y transportan 10 vehículos hipersónicos de reentrada, cada uno de los cuales maniobra de forma independiente y precisa hacia su objetivo y lleva una carga nuclear de entre 800 kilotones y 2 megatones. Un solo cohete, con una capacidad de 20 megatones, sería suficiente para neutralizar política y militarmente a Gran Bretaña para siempre, lo que significa que el resto de la OTAN no tendría nada que defender allí.

Aún quedaría la cuestión de la venganza, pero ¿qué miembros de la OTAN estarían dispuestos a suicidarse atacando a Rusia en un inútil intento de vengar a Gran Bretaña? Ninguno, en realidad. En cuanto a la represalia británica, Gran Bretaña cuenta con cuatro submarinos clase Vanguard armados con misiles balísticos Trident II D-5 de fabricación estadounidense, cada vez más poco fiables, pero es totalmente incierto si alguno de ellos se lanzaría en respuesta y, en cualquier caso, Rusia cuenta con baterías de defensa antimisiles que podrían interceptarlos. Todo esto es puramente hipotético, por supuesto, porque los rusos son pacientes hasta la médula y, con toda probabilidad, se quedarán de brazos cruzados viendo cómo el establishment británico degenera a su propio ritmo, estando a solo una o dos décadas de volverse completamente inofensivo. Por otro lado, si Rusia destruyera a Gran Bretaña profilácticamente, ninguno de los países restantes soñaría siquiera con molestar a Rusia durante mucho tiempo. “Más vale prevenir que curar”, como suelen decir los británicos. Dejemos, pues, de lado la absurda idea de que la doctrina de defensa mutua de la OTAN es un cuento para niños con retraso mental y centrémonos en las verdaderas competencias centrales de la OTAN: expansión, adquisición de armas y ejercicios de entrenamiento militar. Mientras que la parte de la burocracia de la OTAN encargada de la expansión ahora se dedica a devorar a Suecia y Finlandia, es difícil ignorar que el fracaso en absorber y devorar a Ucrania y Georgia ha frenado en seco la avalancha de expansión de la OTAN.

La absorción de Georgia en la OTAN se interrumpió con bastante rapidez. En 2008, durante los Juegos Olímpicos de Verano en Pekín, el ejército georgiano, bajo la tutela de la OTAN e Israel, atacó a las fuerzas de paz rusas en la vecina Osetia del Sur. Los rusos irrumpieron entonces en Georgia y apenas tardaron una semana en humillar por completo al ejército georgiano. Se restableció la paz, aunque algunos georgianos aún lamentan su derrota y se unen a los ucranianos como mercenarios, logrando así dos derrotas por el precio de una. Los georgianos se dieron cuenta rápidamente de que entrar en guerra con Rusia era una mala idea y que la pertenencia a la OTAN los haría vulnerables en lugar de seguros, pero persistía la posibilidad de ser absorbidos y devorados por la Unión Europea. Esta posibilidad persistió hasta 2024, año marcado por el fracaso de un intento de revolución de colores. El presidente de Georgia, instalado por la UE (de nacionalidad francesa), fue destronado y se restablecieron las relaciones civiles con Rusia.

El intento de la OTAN de absorber y devorar a Ucrania se viene gestando desde 2014 y sigue en desarrollo, aunque la mayoría de la gente sensata ahora lo considera imposible por varias razones de peso, como la falta de fronteras indiscutibles y seguras y el conflicto militar en curso con Rusia. Todo comenzó con el derrocamiento del gobierno legítimo y electo de Kiev y su reemplazo por uno ilegítimo y no electo, nombrado personalmente por Victoria Nuland, del Departamento de Estado de Estados Unidos. Los habitantes de Crimea no tendrían nada que ver con estos nuevos gobernantes, ni tampoco los de las regiones de Donetsk y Lugansk. Crimea se separó rápidamente y votó a favor de unirse a la Federación Rusa, mientras que Donetsk y Lugansk permanecieron como regiones separatistas dentro de Ucrania. El régimen de Kiev lanzó entonces lo que denominó una “operación antiterrorista” contra estas dos regiones. En respuesta, Donetsk y Lugansk organizaron fuerzas de resistencia locales.

¿Por qué los rusos aceptaron Crimea, pero no inmediatamente Donetsk y Lugansk? La respuesta es sencilla: Rusia comprendió que la guerra era inevitable, pero necesitaba tiempo. Aprovechó ese tiempo para construir nuevos sistemas de armas (Kinzhal, Tsirkon, Oreshnik, Poseidon, Sarmat/Avangard, etc.), botar 42 buques de guerra, 11 submarinos nucleares de ataque y 11 submarinos diésel-eléctricos, y reorganizar su ejército y su industria de defensa para prepararlos para el combate moderno.

Avanzamos rápidamente hasta 2022. Las fuerzas de resistencia compuesta de voluntarios, de apenas 30.000 hombres, mantuvieron una línea defensiva durante nueve largos años, sufriendo unas 10.000 bajas, en su mayoría civiles, debido al incesante bombardeo ucraniano de distritos residenciales. Para febrero de 2022, el ejército ucraniano estaba finalmente listo para aplastar la resistencia. Ambas regiones se prepararon para esta inevitabilidad celebrando referendos de independencia, declarando su independencia y solicitando asistencia militar a Rusia. Rusia respondió reconociendo a las nuevas repúblicas independientes y accediendo a ofrecer asistencia militar. Todas estas fueron maniobras perfectamente legales, de acuerdo con el derecho internacional, con Kosovo como precedente legal. El ejército ruso atacó exactamente un día antes del ataque ucraniano planeado y lo frustró. Poco después, Kiev y Moscú alcanzaron un acuerdo negociado para poner fin al conflicto: Ucrania dejaría Donetsk y Lugansk en paz, se desarmaría, derogaría las leyes antirrusas y juraría neutralidad militar.

Sin embargo, la OTAN no aceptó nada de eso. Boris Johnson voló a Kiev y ordenó a los ucranianos luchar “hasta el último ucraniano”, y eso es exactamente lo que han estado haciendo desde entonces, durante tres años consecutivos. Eso no es sorprendente; después de todo, no se puede esperar que la OTAN deje escapar a sus víctimas tan fácilmente. Lo sorprendente es que los ucranianos se han mostrado muy dispuestos, durante tres años consecutivos, a librar esta guerra inútil “hasta el último ucraniano”, sufriendo un número de bajas desproporcionadamente mayor que el de Rusia, mientras que su derrota final ha estado garantizada desde el principio. Pero este es tema para otro artículo, uno mejor escrito por un equipo de psiquiatras clínicos expertos en sectas suicidas. En cualquier caso, en resumen, la OTAN ha perdido dos veces seguidas: en Georgia y en la antigua Ucrania.

“¿Cuál es la diferencia?”, podría pensarse. “Otro país, otro fiasco; la OTAN ya debería estar acostumbrada a las derrotas sin fin”. Pero la antigua Ucrania es diferente. En primer lugar, Ucrania no es en absoluto un caso trivial. Está justo en el centro de Europa y es el país más grande de Europa en superficie. En segundo lugar, la guerra en Ucrania no es entre Ucrania y Rusia, como pretende hacer creer la propaganda occidental. Más bien, los ucranianos son meros peones, dispuestos o (cada vez más) reticentes, en un conflicto indirecto entre Estados Unidos (con el resto de la OTAN a cuestas) y la Federación Rusa. El secretario de Estado, Marco Rubio, afirmó que se trata de una “guerra indirecta”, con estas mismas palabras; ¿quiénes somos nosotros para argumentar lo contrario? Una derrota en esta guerra indirecta no sería tan mala para Estados Unidos, que se esconde tras un océano y no carga con demasiados refugiados ucranianos (unos cientos de miles están a punto de ser expulsados, junto con algunos haitianos y sirios). Pero sería un desastre para la UE (especialmente Polonia y Alemania), donde los refugiados/migrantes ucranianos se cuentan por millones y es probable que sus filas aumenten aún más tras la derrota ucraniana. Los líderes europeos, a pesar de su impopularidad, temen el daño a su reputación como partidarios del régimen de Kiev, que han impuesto medidas de austeridad a sus poblaciones para despilfarrar fondos en Kiev y los refugiados.

Ucrania es un problema local, pero existe un problema global: la OTAN se está quedando sin países que absorber y devorar. Como un cáncer, la OTAN tiene que crecer constantemente (o habría que despedir a todo un ejército de burócratas bien pagados de la OTAN por no tener nada que hacer). Ya se han tragado a todas las pequeñas naciones: Estonia, Letonia, Lituania; Montenegro y Macedonia (del Norte). Así que la OTAN no tuvo más remedio que engullir a Suecia y Finlandia, hasta entonces neutrales.

Sin embargo, existe un problema con la incorporación de Suecia y Finlandia a un bloque militar. Suecia, como saben, firmó el Tratado de Nystad con Rusia en 1721, en el que, tras ser derrotada en la Guerra del Norte, juró neutralidad militar. Y Finlandia, tras su desastroso flirteo con Hitler, firmó con Rusia el Tratado de París de 1947, en el que Finlandia juró… neutralidad militar. Ahora bien, el acto de abdicar de las responsabilidades estipuladas en un tratado de paz generalmente implica el retorno automático al estado de guerra. Al aceptar a estos dos países, la OTAN amplió su membresía con dos países que ahora se encuentran automáticamente en estado de guerra con Rusia, violando así el Capítulo 8 de la Carta de la OTAN. Quizás Yanis Varoufakis, economista y exministro de finanzas griego, tenía razón cuando dijo que Europa es ahora “el continente estúpido”.

¿Cómo sería una guerra así? Más humillación para la OTAN, debemos suponer, pero ¿será el mismo tipo de humillación que sufrió la OTAN en la antigua Ucrania o algo más severo? Debemos tener en cuenta que para Rusia, el territorio ucraniano es un caso especial, ya que es territorio históricamente ruso (Malorusia y Nueva Rusia es como se le llamó durante siglos), poblado por personas que hablan ruso como lengua materna, fueron bautizadas en la Iglesia Ortodoxa Rusa y son culturalmente rusas. Sí, han sufrido daños cerebrales hasta el punto de odiar quienes realmente son y adoptar una identidad falsa y sintética. Un ucraniano es un ruso que se vio obligado a dejar de ser ruso, pero fue más allá y dejó de ser humano. Las atrocidades cometidas por las tropas ucranianas en la región rusa de Kursk dan fe de que estos son monstruos con daños cerebrales. Ser ucraniano no es tanto una identidad étnica como una máscara. En algunos casos, se adhiere a la cara y debe ser extirpada quirúrgicamente, junto con la cabeza. Pero en muchos otros casos, la máscara se despega sin esfuerzo en cuanto se iza una bandera rusa en el centro de una ciudad y los antiguos ucranianos olvidan al instante cómo hablar ucraniano y empiezan a cantar el himno nacional ruso y a solicitar pasaportes rusos. Los rusos ven a los ucranianos como rusos que han perdido el rumbo y esperan aceptarlos de vuelta como hijos pródigos. Esto explica la lentitud del esfuerzo bélico ruso en Ucrania, impulsado por el imperativo de evitar bajas rusas, ya sean militares o civiles, en ambos bandos, dejando solo los objetivos militares ucranianos como blanco legítimo. Rusia podría demoler fácilmente todos los puentes, estaciones de ferrocarril, depósitos de combustible, estaciones de bombeo, etc., en territorio ucraniano, haciéndolo completamente inhabitable, pero ese no es su objetivo, ya que el territorio está poblado por rusos.

¿Están los países de la OTAN (Finlandia y Suecia incluidas ahora) poblados por rusos? No, no lo están. Por lo tanto, Rusia no tiene la obligación de evitar daños colaterales mientras destruye militarmente a estos países. Los líderes occidentales y los funcionarios de la OTAN cometen un grave error al pensar que las acciones rusas en la antigua Ucrania son, de alguna manera, representativas de cómo Rusia libraría una guerra con los países de la OTAN. Realmente necesitan entender que los países de la OTAN no son rusos; por lo tanto, Rusia no tiene motivos para ser indulgente con ellos. ¿Quizás Varoufakis tenga razón y los líderes de la OTAN sean simplemente demasiado estúpidos para asimilar este hecho?

Como señaló recientemente Nikolai Patrushev, asesor de Putin, la OTAN está “realizando ejercicios en nuestras fronteras a una escala sin precedentes en décadas… Se están entrenando para lanzar una amplia ofensiva desde Vilna hasta Odesa, tomar la región de Kaliningrado, imponer un bloqueo naval en los mares Báltico y Negro y ejecutar ataques preventivos contra las bases de las fuerzas de disuasión nuclear rusas”. Algo no cuadra. Por un lado, la OTAN ha dedicado 11 años a entrenar y equipar al ejército ucraniano, que actualmente es la segunda formación militar más grande y con mayor capacidad de combate de Europa, solo superada por la rusa, y ha perdido, porque la derrota de Ucrania es ahora, según la mayoría de los expertos, un hecho inevitable. Por otro lado, la OTAN se prepara para luchar contra Rusia, ¿y qué? ¿Perder incluso más rápido que Ucrania? ¿Es un plan razonable? ¿Es realista en algún sentido?

¡Para nada! Estados Unidos, aunque sus fuerzas representan casi la mitad de la OTAN, quiere poner fin a su guerra indirecta contra Rusia en la antigua Ucrania y no tiene intención de librar más guerras con Rusia. Estados Unidos posee numerosos reactores nucleares peligrosamente antiguos que necesitan ser reemplazados, y el mayor proveedor de tecnología nuclear del planeta, con una cuota de mercado del 74 %, es el consorcio estatal ruso Rosatom. Este es solo el ejemplo más claro de por qué Estados Unidos necesita mantener buenas relaciones con Rusia.

La negativa de Estados Unidos a combatir a Rusia deja a la otra mitad de la OTAN —”el continente estúpido”— en una situación desesperada. Sí, constituye la mitad de la OTAN, pero es una mitad que no puede hacer nada sin Estados Unidos. Las fuerzas de la OTAN están comandadas por el general estadounidense Christopher G. Cavoli, utilizan principalmente armas estadounidenses y dependen de la logística y la inteligencia estadounidenses. En esencia, la OTAN no puede actuar sin órdenes de Washington, y Washington no autorizará un ataque contra Rusia.
Los ejercicios de entrenamiento de la OTAN para combatir a Rusia no reflejan la realidad; reflejan falta de imaginación. ¿Qué se preparan entonces las naciones de la OTAN para hacer? Malgastar el dinero de los contribuyentes, por supuesto —es obvio—, y los estadounidenses están totalmente de acuerdo, ya que la mayor parte de ese dinero de los contribuyentes europeos se destina a contratistas militares estadounidenses, quienes luego financian las campañas electorales de los políticos estadounidenses. Pero ¿para qué se preparan militarmente? He aquí una sorpresa: ¡se preparan para luchar entre sí!

En realidad, no debería ser una sorpresa: los últimos 80 años, desde el final de la Segunda Guerra Mundial, han sido un período de paz excepcionalmente largo en la historia europea. Es bastante normal que las naciones europeas estén en guerra de forma más o menos continua. Y ahora que la OTAN ha seguido su larga serie de fiascos con su mayor fiasco hasta la fecha (el fiasco ucraniano), es hora de que los europeos abandonen este marco fallido y busquen conflictos más ganables. Atacar a Rusia no sería ganable —sería suicida—, pero atacarse entre sí podría considerarse una diversión sana y bastante deportiva.

¿Hay alguna evidencia de que los europeos estén tramando algo similar? ¡Claro que sí! Varias naciones europeas están empezando a conspirar y maquinar fuera de la OTAN, prácticamente dándola por muerta. Tan pronto como Suecia y Finlandia se unieron a la OTAN, comenzaron a trabajar en la creación de una Alianza Escandinava, compuesta por Suecia, Finlandia, Dinamarca y Noruega. Han supuesto que no tienen nada que hacer como parte de la OTAN, ahora que Trump los ha traicionado al hacer la paz con Rusia. “¡No necesitamos a Estados Unidos!”, pensaron, y se pusieron manos a la obra:

  • Suecia, que aún conserva algo de industria, fabricará armas: tanques, aviones, etc. Tiene bastante escasez de energía y recursos naturales… pero puede comprárselas a Rusia, ¿no?
  • Los finlandeses tienen el mayor ejército per cápita de Europa y han demostrado repetidamente su disposición a morir sin una buena razón. Noruega controla importantes vías marítimas y cuenta con una poderosa armada: seis submarinos antiguos (de unos 35 años de antigüedad), cinco fragatas (antes eran seis, pero una se hundió mientras estaba comandada por una tripulación exclusivamente femenina después de que una barcaza no se apartara con la suficiente rapidez) y numerosas lanchas patrulleras.
  • Dinamarca puede ofrecer dos compañías enteras de tropas de élite que fueron fundamentales para los fiascos de la OTAN en Irak y Afganistán. Los daneses necesitarán ayuda para repeler los ataques estadounidenses a Groenlandia. Suplican a los franceses que les presten una o dos armas nucleares. Si los franceses aceptan, los rusos suspirarán, menearán la cabeza y… añadirán Copenhague a su lista de lugares que borrarán automáticamente de la faz de la Tierra en caso de problemas graves. Qué triste sería, considerando que los daneses firmaron el “Tratado de Amor y Hermandad” con Rusia en 1493.
  • Islandia también quería unirse a la Alianza Escandinava, pero no se le permitió por carecer de fuerzas armadas.

Pero de inmediato surgieron problemas en el paraíso: los finlandeses anunciaron de inmediato que no lucharían junto a sus hermanos daneses en defensa de Groenlandia. Tienen una frontera de 1.272 km con Rusia y están ocupados construyendo refugios antiaéreos. Parecen haberse fijado como objetivo poder ocultar bajo tierra a toda su población de 5,5 millones. Por qué los rusos perderían el tiempo atacando Finlandia es una pregunta que no parecen haberse planteado. Los rusos simplemente no ven a los finlandeses como una amenaza. Son los sospechosos habituales de quién se bebió todo el vodka, pero eso no es un delito capital.

Pero los finlandeses no se detuvieron ahí. Se buscaron a un esquizofrénico golfista llamado Alexander Stubb, quien invitó a contingentes de la OTAN para… librar una guerra contra Rusia, y luego pidió armas nucleares. Los rusos suspiraron, negaron con la cabeza y… organizaron el Distrito Militar de Leningrado que borrará a Finlandia de la faz de la Tierra en caso de problemas graves.

¿Es la Alianza Escandinava la única entidad nueva que se ha desprendido del cadáver en descomposición de la OTAN? ¡Para nada! El rey Guillermo Alejandro de los Países Bajos acaba de alzar la voz y opinar públicamente que los Países Bajos deberían estar armados hasta los dientes. Debió de mirar a sus vecinos —Alemania y Bélgica— y sentirse amenazado. Yo también me sentiría amenazado, dado lo que Alemania hizo con los Países Bajos bajo el régimen de Hitler y lo que Bélgica hizo en el Congo bajo el régimen del rey Leopoldo. Para estar seguros, quizás los Países Bajos deberían atacar primero.

Al otro lado del cadáver en descomposición, se encuentra Hungría, que parece estar buscando la salida de la Unión Europea, ya que está a punto de perder su poder de veto en esta augusta organización. Hungría se prepara para unirse a una alianza con Serbia. Ambos países tienen objetivos militares que lograr. Hungría necesita arrebatarle un pedazo a la antigua Ucrania, que en su día formó parte de Austria-Hungría y aún está habitada por húngaros cuyos derechos han sido gravemente violados por el régimen de Kiev. Serbia necesita recuperar Kosovo y la República Srpska. Contra Serbia se alza una poderosa alianza entre Albania y Croacia.

¡Será una lucha durísima! Albania cuenta con 6.600 valientes soldados (7.500 si contamos a los reservistas) equipados con 40 tanques anticuados, 19 aviones y 19 helicópteros. La poderosa fuerza de Croacia cuenta con 18 mil soldados, 10 antiguos aviones de combate soviéticos Su-21 (además, los franceses les están dando 12 aviones Rafale igualmente antiguos) y algunos vehículos blindados de época yugoslava.

Serbia es la nación neutral mejor armada de la región. Cuenta con 82 sistemas de misiles, 117 aviones de combate, algunos helicópteros Mi-35M, 262 tanques, sistemas de defensa aérea rusos Pantsir-C1 y S-400, y algunos equipos donados por China. Serbia también es el mayor productor de armas de la región. En 2021, vendió armas por valor de 384 millones de dólares a Chipre, Argelia, Estados Unidos, Azerbaiyán, Turquía, Bulgaria y Arabia Saudita. Serbia fue víctima de los bombardeos de la OTAN en 1999, como resultado de los cuales perdió territorios habitados por serbios. La constitución serbia exige que Serbia defienda los derechos de los serbios dondequiera que se encuentren. Mientras la OTAN se desintegra, Serbia se prepara para reparar estas pérdidas.

Mientras tanto, en el corazón del subcontinente europeo occidental se encuentran Gran Bretaña, Francia, Alemania y Polonia. Sus líderes están jugando a ser el rey de la colina (cuando no están esnifando cocaína juntos) intentando averiguar quién será el desastre económico más poderoso de toda Europa. Dados los ínfimos índices de aprobación de estos líderes, parece improbable que consigan movilizar a las tropas y no está claro qué podrán lograr, si es que lograrán algo.

  • El británico Kir Starmer parece no haber pagado a sus tres prostitutos ucranianos, quienes han incendiado casas y coches que creían suyos.
  • El francés Emmanuel Macron parece ser víctima de maltrato conyugal.
  • Los polacos se sienten un poco más poderosos en una alianza con Estonia, Letonia y Lituania, pero se sienten amenazados porque, como descubrieron recientemente, ¡la mayoría de sus pepinos son importados de Rusia! ¡Imaginen su angustia!
  • Y luego está Merz, quien se esforzó por declararle la guerra a Rusia, lo que provocó que Rusia convocara al Consejo de Seguridad de la ONU para debatirlo, aunque convocar a algunos hombres con batas blancas y jeringas cargadas con haloperidol, lorazepam o prometazina habría sido más útil.

Sería un descuido no mencionar al segundo ejército más grande de toda la OTAN, que es Turquía. Turquía es su propio peor enemigo, pero puede sentirse orgullosa porque se ha ganado muchos otros enemigos por sí sola. Está, por supuesto, Grecia, siempre dispuesta a atacar a Turquía y recuperar algunas de sus islas cuando Turquía se debilite. Y, por supuesto, están los kurdos, uno de los grupos étnicos más grandes que se han visto privados de su propio país, repartidos entre Turquía, Siria, Irak, Irán y Armenia, con una presencia particularmente numerosa e insatisfecha en Turquía. Y ahora Turquía ha decidido arrebatarle una parte del estado fallido de Siria, enemistándose así tanto con árabes como con israelíes simultáneamente, una hazaña que requiere talentos especiales. Es imposible predecir qué será de Turquía, pero la coexistencia pacífica con sus vecinos parece un resultado particularmente improbable.

¿Existe aún la OTAN? Existen diferentes grados de existencia:

  • Para que se diga que las organizaciones existen, deben estar organizadas; las organizaciones desorganizadas pueden decirse que no existen, lo cual es una contradicción en sus términos.
  • La realidad de las alianzas militares cuyos miembros se dedican a formar otras alianzas militares parece bastante cuestionable.
  • Las organizaciones también deben ser eficaces, aptas para su propósito declarado. El propósito declarado de la OTAN es la defensa mutua, pero pocos miembros, si es que hay alguno, parecen particularmente dispuestos a arriesgar su vida y su integridad física en defensa de los demás. El tan mencionado Artículo 5 de la Carta de la OTAN solo exige a los miembros mantener conversaciones, algo que sin duda están dispuestos a hacer, especialmente si la reunión cuenta con servicio de catering y hay cócteles después.
  • La existencia de organizaciones políticas es particularmente difícil de determinar porque los políticos (como el Secretario General de la OTAN, Mark Rutte) pueden hablar sin parar, haciendo que parezca que la organización que representan existe, cuando en realidad es un mero producto de su imaginación enfermiza. Los narcóticos pueden exacerbar este efecto. En particular, la cocaína tiende a hacer que las personas sean excesivamente habladoras y se sientan mucho más interesantes e importantes de lo que son.

Podemos imaginarnos a la OTAN navegando hacia el ocaso sobre olas de adicción a la cocaína que emanan de la oficina del narcoführer Zelenski en Kiev. Diversos representantes del “continente estúpido” se reunirán sin cesar, se estrecharán la mano, se abrazarán, se besarán… esnifarán cocaína… balbucearán incoherencias… mientras la realidad se aleja cada vez más de su alcance.

Em

SAKERLATAM

https://sakerlatam.blog/existe-todavia-la-otan/

29/5/2025 

segunda-feira, 26 de maio de 2025

Esclavitud moderna

 


Brigada de médicos cubanos en imagen de archivo. Foto
Brigada de médicos cubanos en imagen de archivo. Foto Afp / Archivo
08 de mayo de 2025 00:03

En un ejercicio de cinismo diplomático que raya en lo grotesco, el gobierno de Estados Unidos acusa a Cuba de “esclavitud moderna” por su cooperación médica internacional, mientras practica, a plena luz del día y con aparente cobertura legal, formas brutales de trata institucionalizada contra migrantes latinoamericanos.

La paradoja no es menor: mientras médicos cubanos salvan vidas en las regiones más empobrecidas del planeta, el gobierno de Trump encadena a seres humanos de pies y manos, los embarca como ganado hacia terceros países y los entrega para que desaparezcan en las entrañas de centros de tortura.

A lo largo de décadas, Cuba ha sostenido un programa de colaboración médica sin precedentes, con la presencia de más de 600 mil cooperantes sanitarios en 165 naciones.

Esos médicos han enfrentado pandemias, huracanes, hambrunas y crisis humanitarias sobre la base de un principio descrito por Fidel Castro a propósito de la colaboración cubana en salud: “En las relaciones internacionales practicamos nuestra solidaridad con hechos, no con bellas palabras” (https:// acortar.link/usRGWt).

Pero Washington, desde Bush hasta Trump, no ha dejado de intentar desacreditar ese modelo, acusándolo de “tráfico humano” y “trabajo forzoso”, cuando en realidad lo que molesta es que Cuba exporta dignidad, tal y como la definió Kant: el filósofo alemán distinguía entre lo que tiene precio y lo que tiene dignidad. Tienen precio aquellas cosas que pueden ser sustituidas por algo equivalente, mientras que aquello que trasciende todo precio y no admite nada equivalente, eso tiene dignidad.

Contrasta profundamente con lo que ocurre al norte del río Bravo. La nueva administración Trump, decidida a implementar una política migratoria de “tolerancia cero” bajo parámetros supremacistas, ha reactivado el mecanismo de deportaciones encadenadas y sin el debido proceso de la ley. Los inmigrantes son deportados, sin juicio ni oportunidad de responder a los alegatos contra ellos.

Son expulsados con grilletes en los tobillos y esposas en las muñecas, amontonados en aviones que los llevan no necesariamente a su país de origen, sino al país que Washington designe como “tercero seguro”.

El caso de los venezolanos deportados a El Salvador es especialmente escandaloso.

El país centroamericano, convertido por Bukele en una distopía vigilada con drones, ha ofrecido al gobierno estadunidense una infraestructura de represión sin rendición de cuentas: el Centro de Confinamiento del Terrorismo (Cecot), la megacárcel donde el hacinamiento, la tortura, la desaparición y la negación del debido proceso y del vínculo con familiares son moneda corriente, según organizaciones de derechos humanos. Así, Washington externaliza su violencia migratoria con las lecciones bien aprendidas de la era Bush: si los detenidos están fuera del territorio nacional, no tienen derechos ante la justicia estadunidense. Esa fue la doctrina para Guantánamo. Hoy, Trump la recicla para deportar y reprimir sin costo judicial.

Mientras, la maquinaria propagandística del Departamento de Estado y sus satélites mediáticos en Miami repiten el mantra de que “los médicos cubanos son esclavos”.

Pero ¿dónde está la esclavitud? ¿En el bisturí que opera gratis a un niño en Haití? ¿En la vacuna que se administra en Angola? ¿O en las manos encadenadas del migrante que huye de situaciones de violencia en su país de origen y acaba en una celda salvadoreña sin nombre ni abogado? ¿Qué diferencia esta situación de los desaparecidos en Argentina, Uruguay, Guatemala o Chile, durante la guerra sucia de los años 70 y 80?

La hipocresía no es nueva, pero sí más descarada. Acusar a Cuba de lo que EU practica a escala industrial es una vieja estrategia: culpar a la víctima para ocultar los propios crímenes. Los grilletes con que deportan a los migrantes no pueden ocultar el verdadero rostro del imperio que se dice libre y democrático, mientras reproduce, con nueva tecnología, las cadenas de los barcos negreros que siguen navegando por la conciencia moderna de Occidente.

En Barco de esclavos (Capitán Swing, 2023), el historiador estadunidense Markus Rediker analiza la trata a través del Atlántico desde finales del siglo XV hasta casi terminar el XIX, durante 400 años. “Los compartimentos estaban tan atestados que casi no había espacio para darse la vuelta. Las cadenas que llevaban para evitar cualquier tentación de fuga les dejaban en carne viva muñecas, cuellos y tobillos”. Exactamente como ahora.

El trumpismo es la ausencia oficial de máscaras: hay barra libre de fascismo y al que se pase no lo echan de la fiesta, sino que lo ponen a organizar otra, como ésta de culpar a Cuba de “esclavitud moderna”, mientras los aviones “negreros” vuelan rasantes de norte a sur, por encima de nuestras cabezas.

Em

LA JORNADA

https://www.jornada.com.mx/noticia/2025/05/08/opinion/esclavitud-moderna

8/5/2025