segunda-feira, 24 de julho de 2023

A iminente guerra contra a China

 
Michael Hudson





      *A lógica econômica foi substituída por preferências de segurança nacional*

A cúpula da OTAN de julho em Vilnius passou a sensação de um funeral,
como se tivessem acabado de perder um membro da família – a Ucrânia.
Para eliminar o fracasso da OTAN em expulsar a Rússia da Ucrânia e mover
a OTAN até a fronteira russa, seus membros tentaram reviver seus ânimos
mobilizando apoio para a próxima grande luta – contra a China, que agora
é designada como seu inimigo estratégico final. Para se preparar para
este confronto, a OTAN anunciou o compromisso de estender sua presença
militar até o Pacífico.

O plano é eliminar os aliados militares e parceiros comerciais da China,
sobretudo a Rússia, começando pela luta na Ucrânia. O presidente Biden
disse que esta guerra terá alcance global e levará muitas décadas à
medida que se expande para, por fim, isolar e dividir a China.

As sanções impostas pelos EUA contra o comércio com a Rússia são um
ensaio geral para a imposição de sanções semelhantes contra a China. Mas
apenas os aliados da OTAN se juntaram à luta. E em vez de destruir a
economia da Rússia e “reduzir o rublo a escombros” como previu o
presidente Biden, as sanções da OTAN a tornaram mais autossuficiente,
aumentando sua balança de pagamentos e reservas monetárias
internacionais e, portanto, a taxa de câmbio do rublo.

Para resumir, apesar do fracasso das sanções comerciais e financeiras em
prejudicar a Rússia e, de fato, apesar dos fracassos da OTAN no
Afeganistão e na Líbia, os países da OTAN se comprometeram a tentar as
mesmas táticas contra a China. A economia mundial será dividida entre
EUA/NATO/Cinco Olhos de um lado, e o resto do mundo – a Maioria Global –
de outro. O comissário da UE, Joseph Borrell, chama isso de divisão
entre o Jardim dos EUA/Europa (o Bilhão de Ouro) e a Selva que ameaça
engolfá-lo, como uma invasão de seus gramados bem cuidados por uma
espécie invasora.

Do ponto de vista econômico, o comportamento da OTAN desde sua
acumulação militar para atacar os estados orientais de língua russa da
Ucrânia em fevereiro de 2022 foi um fracasso drástico. O plano dos EUA
era sangrar a Rússia e deixá-la tão desamparada economicamente que sua
população se revoltaria, derrubaria Vladimir Putin do cargo e
restauraria um líder neoliberal pró-Ocidente que afastaria a Rússia de
sua aliança com a China – e então prosseguiria com o grande plano dos
Estados Unidos de mobilizar a Europa para impor sanções à China.

O que torna tão difícil avaliar para onde a OTAN, a Europa e os Estados
Unidos estão indo é que a suposição tradicional de que nações e classes
agirão em seu próprio interesse econômico não ajuda. A lógica
tradicional da análise geopolítica é assumir que os interesses
comerciais e financeiros orientam a política de quase todas as nações. A
suposição auxiliar é que os governantes têm uma compreensão bastante
realista da dinâmica econômica e política em ação. Prever o futuro é,
portanto, geralmente um exercício de explicitação dessas dinâmicas.

O Ocidente dos EUA/NATO liderou essa fratura global, mas será o grande
perdedor. Os membros da OTAN já viram a Ucrânia esgotar seu estoque de
artilharia e munições, tanques, helicópteros e outras armas acumuladas
ao longo de cinco décadas. Mas a perda da Europa tornou-se uma
oportunidade de vendas para os Estados Unidos, criando um novo e vasto
mercado para o complexo militar-industrial dos Estados Unidos
reabastecer a Europa. Para obter apoio, os Estados Unidos patrocinaram
uma nova maneira de pensar sobre comércio e investimento internacionais.
O foco mudou para “segurança nacional”, o que significa garantir uma
ordem unipolar centrada nos EUA.


        O mundo está se dividindo em dois blocos: um EUA/OTAN
        pós-industrial versus a maioria global

Os diplomatas americanos ficaram cada vez mais preocupados quando a
Alemanha e outros países europeus passaram a contar com gás, petróleo e
fertilizantes importados da Rússia como base para suas indústrias de
aço, fabricação de vidro e outras. Eles ficaram ainda mais preocupados
porque a China havia se tornado a “oficina do mundo” enquanto a economia
dos EUA se desindustrializava. O medo era que o crescimento da China e
de seus países vizinhos da Eurásia, beneficiados pela expansão do
Cinturão e Rota, ameaçasse tornar aquela parte do mundo a principal área
de crescimento e, portanto, um ímã para o investimento europeu. A
perspectiva lógica era que a política seguiria o interesse econômico em
detrimento da capacidade dos Estados Unidos de manter uma economia
mundial unipolar com o dólar em seu centro financeiro e o comércio
sujeito ao unilateralismo protecionista dos EUA.

Ao se juntar à cruzada dos Estados Unidos para destruir a economia russa
e promover a mudança de regime, a recusa da Alemanha e de outros países
europeus em negociar com a Rússia destruiu a base energética básica de
sua indústria. A destruição do oleoduto Nord Stream mergulhou a economia
alemã e outras economias europeias em uma depressão envolvendo falências
generalizadas e desemprego. No lugar do gás russo, os países da OTAN
devem agora pagar um preço até seis vezes mais alto pelo gás natural
liquefeito (GNL) dos EUA e devem construir novas instalações portuárias
para importar fisicamente esse gás.

Os líderes europeus patrocinados e financiados pela intromissão
eleitoral dos EUA nos últimos setenta anos fizeram o que Boris Yeltsin
fez na Rússia nos anos 1990: eles concordaram em sacrificar as economias
industriais da Europa e acabar com o que havia sido sua lucrativa
integração comercial e de investimentos com a Rússia e a China.

O próximo passo é que a Europa e os Estados Unidos deixem de negociar e
investir com a China, apesar de esses países da OTAN terem se
beneficiado do florescimento desse comércio, contando com ele para uma
ampla gama de bens de consumo e insumos industriais. Essa linha de
comércio próspero está agora para ser encerrada. Os líderes da OTAN
anunciaram que ao importar gás russo e outras matérias-primas (incluindo
hélio e muitos metais) correm o “risco” de se tornarem dependentes –
como se a Rússia ou a China achassem que é de seu interesse econômico ou
político abortar esse comércio simplesmente para prejudicar a Europa e
fazer com ela o que os Estados Unidos têm feito para forçá-la à submissão.

Mas submissão a quê? A resposta é, submissão à lógica de ganhos mútuos
ao longo de linhas deixando a economia dos EUA para trás!

Ao tentar impedir que outros países sigam essa lógica, a diplomacia
americana e europeia da OTAN trouxe exatamente o que os supremacistas
americanos mais temiam. Em vez de paralisar a economia russa para criar
uma crise política e talvez a dissolução da própria Rússia para isolá-la
da China, as sanções dos EUA/OTAN levaram a Rússia a reorientar seu
comércio para longe dos países da OTAN para integrar sua economia e
diplomacia mais estreitamente com a China e outros membros do BRICS.

Ironicamente, a política dos EUA/OTAN está forçando a Rússia, a China e
seus aliados do BRICS a seguirem seu próprio caminho, começando com uma
Eurásia unida. Este novo núcleo de China, Rússia e Eurásia com o Sul
Global está criando uma esfera de comércio e investimento multipolar
mutuamente benéfica.

Em contrapartida, a indústria europeia foi devastada. Suas economias
tornaram-se completa e abjetamente dependentes dos Estados Unidos – a um
custo muito maior para si do que no caso de seus antigos parceiros
comerciais. Os exportadores europeus perderam o mercado russo e agora
estão seguindo as exigências dos EUA para que abandonem e de fato
rejeitem o mercado chinês. Também serão rejeitados no devido tempo os
mercados dos membros do BRICS, que estão se expandindo para incluir
países do Oriente Médio, África e América Latina.

Em vez de isolar a Rússia e a China e torná-los dependentes do controle
econômico dos EUA, a diplomacia unipolar dos EUA isolou a si mesma, e a
seus satélites da OTAN, do resto do mundo – a Maioria Global que está
crescendo enquanto as economias da OTAN avançam rapidamente em seu
caminho para a desindustrialização. O notável é que, embora a OTAN
alerte para o “risco” do comércio com a Rússia e a China, ela não vê
como um risco a perda da viabilidade industrial e da soberania econômica
para os Estados Unidos.

Não é isso que a “interpretação econômica da história” teria previsto.
Espera-se que os governos apoiem os principais interesses comerciais de
sua economia. Assim, somos levados de volta à questão de saber se os
fatores econômicos determinarão a forma do comércio, investimento e
diplomacia mundiais. É realmente possível criar um conjunto de economias
pós-econômicas da OTAN cujos membros se parecerão muito com os estados
bálticos e a Ucrânia pós-soviética, com rápido despovoamento e
desindustrialização?

Isso seria realmente um estranho tipo de “segurança nacional”. Em termos
econômicos, parece que a estratégia americana e europeia de
auto-isolamento do resto do mundo é um erro tão grande e profundo que
seus efeitos são equivalentes a uma guerra mundial.

A luta de hoje contra a Rússia na frente ucraniana pode ser considerada
como a campanha de abertura da Terceira Guerra Mundial. De muitas
maneiras, é uma conseqüência da Segunda Guerra Mundial e seus
desdobramentos, que viram os Estados Unidos estabelecerem organizações
econômicas e políticas internacionais para operar em seu próprio
interesse nacional. O Fundo Monetário Internacional impõe o controle
financeiro dos EUA e ajuda a dolarizar a economia mundial.

O Banco Mundial empresta dólares aos governos para construir
infra-estrutura de exportação para subsidiar os investidores dos
EUA/NATO no controle do petróleo, mineração e recursos naturais, e para
promover a dependência comercial das exportações agrícolas dos EUA
enquanto promove a agricultura de plantação, em vez da produção
doméstica de grãos alimentícios. Os Estados Unidos insistem em ter poder
de veto em todas as organizações internacionais às quais se filiam,
incluindo as Nações Unidas e suas agências.

A criação da OTAN é muitas vezes mal compreendida. Ostensivamente, ela
se apresentava como uma aliança militar, originalmente para se defender
contra o pensamento de que a União Soviética poderia ter algum motivo
para conquistar a Europa Ocidental. Mas o papel mais importante da OTAN
foi usar a “segurança nacional” como desculpa para anular a política
interna e externa europeia e subordiná-la ao controle dos EUA. A
dependência da OTAN foi escrita na constituição da União Européia. Seu
objetivo era garantir que os líderes partidários europeus seguissem a
direção dos EUA e se opusessem à política de esquerda ou antiamericana,
políticas pró-trabalhistas e governos fortes o suficiente para impedir o
controle de uma oligarquia financeira cliente dos EUA.

O programa econômico da OTAN tem sido de adesão à financeirização
neoliberal, privatização, desregulamentação governamental e imposição de
austeridade ao trabalho. Os regulamentos da UE impedem que os governos
tenham um déficit orçamentario superior a 3% do PIB. Isso bloqueia
políticas de tipo keynesiano para estimular a recuperação. Hoje, os
custos elevados das armas militares e os subsídios governamentais aos
preços da energia estão forçando os governos europeus a cortar gastos
sociais. A política bancária, a política comercial e a legislação
doméstica estão seguindo o mesmo modelo neoliberal dos EUA que
desindustrializou a economia americana e a carregou de dívidas com o
setor financeiro em cujas mãos está concentrada a maior parte da riqueza
e da renda.


        Abandonar o auto-interesse econômico pela dependência de
        “segurança nacional” dos EUA

O mundo pós-Vilnius trata o comércio e as relações internacionais não
como econômicas, mas como “segurança nacional”. Qualquer forma de
comércio torna-se o “risco” de ser cortado e desestabilizado. O objetivo
não é obter ganhos comerciais e de investimento, mas tornar-se
autossuficiente e independente. Para o Ocidente, isso significa isolar a
China, a Rússia e os BRICS para depender totalmente dos Estados Unidos.
Assim, para os Estados Unidos, sua própria segurança significa tornar
outros países dependentes dele, para que os diplomatas americanos não
percam o controle de sua diplomacia militar e política.

Tratar o comércio e o investimento com outros países que não os Estados
Unidos como envolvendo “risco”, /ipso facto/, é uma projeção de como a
diplomacia dos EUA impôs sanções a países que resistem à dominação,
privatização e subordinação de suas economias aos EUA. O medo de que o
comércio com a Rússia e a China leve à dependência política é uma
fantasia. O objetivo da aliança emergente da Eurásia, BRICS e Sul Global
é se beneficiar do comércio exterior uns com os outros para ganho mútuo,
com governos fortes o suficiente para tratar dinheiro e bancos como
serviços públicos, juntamente com os monopólios básicos necessários para
fornecer direitos humanos normais, incluindo saúde e educação, e manter
monopólios como transporte e comunicação em domínio público para manter
os custos de vida e de fazer negócios baixos, em vez de cobrar preços de
monopólio.

O ódio anti-China veio especialmente de Annalena Baerbock, ministra das
Relações Exteriores da Alemanha. A OTAN é avisada para “reduzir o risco”
do comércio com a China. Os “riscos” são que (1) a China pode cortar as
principais exportações, assim como os EUA cortaram o acesso europeu às
exportações de petróleo da Rússia; e (2) as exportações poderiam ser
usadas para apoiar o poderio militar da China. Quase qualquer exportação
econômica PODERIA ser militar, até mesmo alimentos para alimentar um
exército chinês.

A viagem da secretária do Tesouro Janet Yellen à China também explicou
que todo o comércio tem um potencial militar e, portanto, um elemento de
segurança nacional. Todo o comércio tem um potencial militar, mesmo a
venda de alimentos para a China poderia ser usada para alimentar os
soldados.

A exigência dos EUA/NATO é que a Alemanha e outros países europeus
imponham uma Cortina de Ferro contra o comércio com a China, a Rússia e
seus aliados, a fim de “reduzir o risco” do comércio. No entanto, apenas
os EUA impuseram sanções comerciais a outros países, não a China e
outros países do Sul Global. O risco real não é que a China imponha
sanções comerciais para prejudicar as economias europeias, mas que os
Estados Unidos imponham sanções aos países que violarem o boicote
comercial patrocinado pelos EUA.

Essa visão de “comércio é risco” trata o comércio exterior não em termos
econômicos, mas em termos de “Segurança Nacional”. Na prática,
“segurança nacional” significa aderir à tentativa dos Estados Unidos de
manter seu controle unipolar de toda a economia mundial. Nenhum risco é
reconhecido por reorientar o comércio europeu de gás e energia para
empresas americanas. Diz-se que o risco é o comércio com países que os
diplomatas dos EUA consideram “autocracias”, ou seja, nações com
investimento e regulamentação ativa em infraestrutura governamental, em
vez do neoliberalismo ao estilo dos EUA.

O mundo está se dividindo em dois blocos – com filosofias econômicas bem
diferentes. Apenas os Estados Unidos impuseram sanções comerciais a
outros países. E apenas os Estados Unidos rejeitaram as regras
internacionais de livre comércio como ameaças à segurança nacional ao
controle econômico e militar dos EUA. À primeira vista, a fratura global
resultante entre EUA/OTAN, por um lado, e a expansão da aliança BRICS da
Rússia, China, Irã e o Sul Global pode parecer um conflito entre
capitalismo e socialismo (isto é, socialismo de estado em uma economia
mista com regulamentação pública nos interesses do trabalho).

Mas esse contraste entre capitalismo e socialismo não ajuda em um exame
mais detalhado. O problema reside no que a palavra “capitalismo” passou
a significar no mundo de hoje. No século 19 e início do século 20,
esperava-se que o capitalismo industrial evoluísse para o socialismo. Os
Estados Unidos e outras economias industrializadas acolheram e de fato
pressionaram seus governos a subsidiar uma ampla gama de serviços
básicos às custas públicas, em vez de obrigar os empregadores a arcar
com os custos de contratação de mão de obra que precisava pagar por
necessidades básicas, como saúde e educação. Os preços de monopólio
foram evitados mantendo os monopólios naturais, como ferrovias e outros
meios de transporte, sistemas telefônicos e outras comunicações, parques
e outros serviços como serviços públicos.

A China seguiu essa abordagem básica do capitalismo industrial, com
políticas socialistas para aumentar sua força de trabalho, não apenas a
riqueza dos capitalistas industriais – muito menos banqueiros,
proprietários ausentes e monopolistas. Mais importante, industrializou o
sistema bancário, criando crédito para financiar investimentos tangíveis
em meios de produção, não o tipo de crédito predatório e improdutivo
caracterizado pelo capitalismo financeiro de hoje.

Mas a política de economia mista do capitalismo industrial não é a forma
como o capitalismo evoluiu no Ocidente desde a Primeira Guerra Mundial.

Rejeitando a economia política clássica e seu impulso para os mercados
livres das classes detentoras de renda herdadas do feudalismo – uma
classe hereditária de latifundiários, uma classe de banqueiros
financeiros e monopolistas – o setor rentista lutou para reafirmar sua
privatização do aluguel da terra, juros e ganhos de monopólio. Procurou
reverter a tributação progressiva e, de fato, conceder favoritismo
tributário à riqueza financeira, aos proprietários de terras e aos
monopolistas.

O setor de Finanças, Seguros e Imóveis (FIRE) tornou-se o interesse
dominante e o planejador econômico sob o capitalismo financeiro de hoje.
É por isso que as economias costumam ser chamadas de neofeudais (ou
eufemizadas como neoliberais).

Ao longo da história, a dinâmica da financeirização polarizou riqueza e
renda entre credores e devedores, levando às oligarquias. À medida que a
dívida com juros cresce exponencialmente, mais e mais rendimentos do
trabalho e dos negócios devem ser pagos como serviço da dívida. Essa
dinâmica financeira encolhe o mercado doméstico de bens e serviços, e a
economia sofre com o aprofundamento da austeridade assolada pela dívida.

O resultado é a desindustrialização à medida que as economias se
polarizam entre credores e devedores. Isso ocorreu mais notoriamente na
Grã-Bretanha na esteira de Margaret Thatcher e do Novo Partido
[Anti-]Trabalhista de Tony Blair e da abordagem desreguladora de “toque
leve” de Gordon Brown para manipulação financeira e fraude total. Os
Estados Unidos sofreram uma mudança igualmente devastadora de riqueza e
renda para os setores de Finanças, Seguros e Imóveis (FIRE) após os
cortes de impostos de Ronald Reagan para os ricos, a desregulamentação
antigovernamental e a aquisição da “Terceira Via” de Bill Clinton por
Wall Street. A “Terceira Via” não era nem o capitalismo industrial nem o
socialismo, mas o capitalismo financeiro obtendo seus ganhos tanto
despojando quanto endividando a indústria e o trabalho de renda.

A nova ideologia do Partido Democrata de finanças desregulamentadas foi
coroada pelo enorme colapso da fraude bancária em 2008 e pela proteção
de Barack Obama aos credores de hipotecas-lixo e as execuções
hipotecárias em massa de suas vítimas financeiras. O planejamento e a
política econômica foram transferidos dos governos para Wall Street e
outros centros financeiros – que assumiram o controle do governo, do
banco central e das agências reguladoras.

Diplomatas americanos e britânicos estão tentando promover essa
filosofia econômica pró-financeira predatória e inerentemente
anti-industrial para o resto do mundo. Mas esse evangelismo ideológico é
ameaçado pelo contraste óbvio entre as economias falidas e
desindustrializadas dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha em comparação
com o notável crescimento econômico da China sob o socialismo industrial.

Este contraste entre o sucesso econômico da China e o “jardim” de
austeridade endividado da OTAN Ocidental é a essência da campanha atual
do Ocidente contra os países da “Selva” que buscam independência
política da diplomacia dos EUA para elevar seus padrões de vida. Essa
guerra global ideológica e inerentemente política é a contrapartida
atual das guerras religiosas que separaram os países europeus por muitos
séculos.

Estamos testemunhando o que parece ser um declínio inexorável do
Ocidente. Os diplomatas dos EUA conseguiram fortalecer sua liderança de
controle econômico, político e militar sobre seus aliados europeus da
OTAN. Seu fácil sucesso nesse objetivo os levou a imaginar que de alguma
forma eles podem conquistar o resto do mundo, apesar de
desindustrializar e sobrecarregar suas economias com dívidas tão
profundas que não há maneira previsível de pagar sua dívida oficial com
países estrangeiros ou mesmo ter muito a oferecer.


        O imperialismo tradicional de conquista militar e conquista
        financeira acabou

Havia uma série de táticas para uma nação líder conquistar um império. A
forma mais antiga é pela conquista militar. Mas você não pode ocupar e
dominar um país sem um exército, e os EUA não têm um exército grande o
suficiente. A Guerra do Vietnã exauriu o recrutamento. Portanto, tem que
contar com exércitos estrangeiros como Al Qaeda, ISIS e, mais
recentemente, Ucrânia e Polônia, assim como depender de manufaturas
industriais estrangeiras. Seus armamentos estão esgotados e não pode
mobilizar um exército doméstico para ocupar nenhum país. Os EUA têm
apenas uma arma: mísseis e bombas podem destruir, mas não ocupar e
dominar um país.

A segunda maneira de criar o poder imperial era pelo poder econômico de
tornar outros países dependentes das exportações dos EUA. Após a Segunda
Guerra Mundial, o resto do mundo foi devastado e forçado a aceitar as
manobras diplomáticas dos EUA para dar à sua economia o monopólio das
necessidades básicas. A agricultura tornou-se uma arma importante para
criar dependência estrangeira. O Banco Mundial não apoiaria os países
estrangeiros que cultivassem seus próprios alimentos, mas pressionou por
colheitas de plantações de exportação e lutou contra a reforma agrária.
E para o comércio de petróleo e energia, as empresas dos EUA e seus
aliados da OTAN na Grã-Bretanha e Holanda (British Petroleum e Shell)
controlavam o comércio mundial de petróleo.


        O controle do comércio mundial de petróleo tem sido um objetivo
        central da diplomacia comercial dos EUA.

Essa estratégia funcionou para a afirmação do controle dos EUA sobre a
Alemanha e outros países da OTAN, explodindo o oleoduto Nord Stream e
cortando o acesso da Europa Ocidental ao gás, petróleo, fertilizantes e
também colheitas russos. A Europa agora entrou em uma depressão
industrial e austeridade econômica à medida que sua indústria
siderúrgica e outros setores importantes são convidados a emigrar para
os Estados Unidos, juntamente com a mão de obra qualificada europeia.

Hoje, a tecnologia eletrônica e os chips de computador têm sido um ponto
focal do estabelecimento da dependência econômica global da tecnologia
dos EUA. Os Estados Unidos pretendem monopolizar a “propriedade
intelectual” e extrair renda econômica da cobrança de preços altos para
chips de computador de alta tecnologia, comunicações e produção de armas.

Mas os Estados Unidos se desindustrializaram e se deixaram depender da
Ásia e de outros países para seus produtos, em vez de torná-los
dependentes dos EUA. Essa dependência comercial é o que faz com que os
diplomatas americanos se sintam “inseguros”, temendo que outros países
possam tentar usar a mesma diplomacia comercial e financeira coercitiva
que os Estados Unidos têm exercido desde 1944-45.

Os Estados Unidos ficaram com uma tática restante para controlar outros
países: sanções comerciais, impostas por eles e seus satélites da OTAN
em uma tentativa de perturbar as economias que não aceitam o domínio
econômico, político e militar unipolar dos EUA. Ele persuadiu a Holanda
a bloquear máquinas sofisticadas de gravação de chips para a China e
outros países a bloquear qualquer coisa que pudesse contribuir para o
desenvolvimento econômico da China. Um novo protecionismo industrial
americano está sendo enquadrado em termos de segurança nacional.

Se a política comercial da China espelhasse a da diplomacia dos EUA, ela
pararia de fornecer aos países da OTAN as exportações de minerais e
metais necessários para produzir os chips de computador e insumos
subsidiários que a economia americana precisa para exercer sua
diplomacia global.

Os EUA estão tão sobrecarregados de dívidas, seus preços de habitação
são tão altos e seus cuidados médicos são tão altos (18% do PIB) que não
podem competir. Não pode se reindustrializar sem tomar medidas radicais
para amortizar dívidas, desprivatizar a saúde e a educação, quebrar
monopólios e restaurar a tributação progressiva. Os interesses
financeiros, de seguros e imobiliários (sector FIRE) investidos são
demasiado poderosos para permitir estas reformas. Isso torna a economia
dos EUA uma economia falida e a América um Estado falido.

Na esteira da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos acumularam 75%
do ouro monetário do mundo em 1950. Isso permitiu impor a dolarização ao
mundo. Mas hoje, ninguém sabe se o Tesouro dos EUA e o Federal Reserve
de Nova York têm ouro que não tenha sido prometido a compradores e
especuladores privados. A preocupação é que tenha vendido as reservas de
ouro do banco central europeu. A Alemanha pediu que suas reservas de
ouro fossem devolvidas de Nova York, mas os Estados Unidos disseram que
não estavam disponíveis, e a Alemanha foi tímida demais para tornar
públicas suas preocupações e reclamações.

O dilema financeiro dos Estados Unidos é ainda pior quando se tenta
imaginar como o país poderá pagar sua dívida externa de países que
buscam sacar seus dólares. Os Estados Unidos só podem imprimir sua
própria moeda. Não está disposto a vender seus ativos domésticos, como
exige que outros países devedores o façam?

O que outros países podem aceitar no lugar do ouro? Uma forma de ativos
que podem ser tomados como garantia são os investimentos dos EUA na
Europa e em outros países. Mas se governos estrangeiros tentarem fazer
isso, as autoridades americanas podem retaliar confiscando seus
investimentos nos Estados Unidos. Ocorreria um agarramento mútuo.

Os Estados Unidos estão tentando monopolizar a tecnologia eletrônica. O
problema é que isso requer insumos de matérias-primas cuja produção
atualmente é dominada pela China, sobretudo metais de terras raras (que
são abundantes, mas ambientalmente destrutivos para refinar), gálio,
níquel (a China domina o refino), hélio russo e outros gases usados ​
​para gravar chips de computador. A China anunciou recentemente que em
1º de agosto começará a restringir essas exportações importantes. Ela
realmente tem a capacidade de cortar o fornecimento de materiais e
tecnologia vitais para o Ocidente, para se proteger das sanções de
“segurança nacional” do Ocidente contra a China. Essa é a profecia
autorrealizável que os alertas dos EUA sobre uma luta comercial criaram.

Se a diplomacia dos EUA fortalecer seus aliados da OTAN para boicotar a
tecnologia Huawei da China, a Europa ficará com uma alternativa menos
eficiente e mais cara – cujas consequências ajudam a separá-la da China,
dos BRICS e do que se tornou a Maioria Mundial em um alinhamento
autossuficiente muito mais amplo do que o criado por Sukarno em 1954.

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Fontes:

https://michael-hudson.com/2023/07/the-looming-war-against-china/
<https://michael-hudson.com/2023/07/the-looming-war-against-china/>

https://globalsouth.co/2023/07/23/michael-hudson-the-looming-war-against-china/ <https://globalsouth.co/2023/07/23/michael-hudson-the-looming-war-against-china/>

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Em
SAKER LATAM
https://sakerlatam.org/a-iminente-guerra-contra-a-china/
24/7/2023

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