terça-feira, 9 de abril de 2024

É real a eventualidade de uma Guerra mundial ?

 

 
Serge Marchand , Thierry Meyssan

Uma guerra atómica é possível. A paz do mundo está suspensa pelo dedo
dos Estados Unidos que os « nacionalistas integralistas » ucranianos e
os « sionistas revisionistas » israelitas chantageam. Se Washington não
fornecer armas para massacrar os Russos e os Gazenses, eles não
hesitarão em lançar o Armagedão.


*Segundo o Livro dos Juízes, Sansão é um judeu consagrado a Deus. Tinha
feito voto de jamais cortar os cabelos e dispunha de uma força fabulosa.
No entanto, a sua amante, Dalila, cortou-lhe as tranças durante o sono,
privando-o assim do auxílio de Deus e da sua força. Ele foi feito
prisioneiro pelos Filisteus que lhe furaram os olhos e o atiraram para a
prisão em Gaza. Durante um sacrifício ao deus deles, quando os cabelos
recomeçaram a crescer, ele foi colocado entre duas colunas do palácio.
Sansão afastou-as com a força das suas mãos nuas a fim de as fazer
desmoronar. Assim, ele suicidou-se matando vários milhares de Filisteus. *

As guerras na Ucrânia e em Gaza levaram vários responsáveis políticos de
primeiro plano a comparar o período actual com os anos 30 e a evocar a
possibilidade de uma Guerra mundial. São estes temores justificados ou
trata-se de uma retórica visando criar medo ?

Para responder à esta questão, vamos resumir acontecimentos ignorados
por todos, muito embora conhecidos pelos especialistas. Fá-lo-emos
desapaixonadamente, correndo o risco de parecer indiferentes a esses
horrores.

Em primeiro lugar, temos de distinguir os conflitos na Europa Oriental e
no Médio-Oriente. Eles só têm dois pontos comuns :
*–* » Por si mesmos eles não representam nenhum desafio significativo,
mas sim uma derrota do Ocidente que, após o desaire na Síria, marcaria o
fim da sua hegemonia sobre o mundo.
*–* » Eles são alimentados por uma ideologia fascista, a dos «
nacionalistas integralistas» ucranianos de Dmytro Dontsov [1 <#nb1>] e a
dos « sionistas revisionistas » israelitas de Vladimir Ze’ev
Jabotinsky [2 <#nb2>] ; dois grupos que são aliados desde 1917, mas que
passaram à clandestinidade durante a Guerra Fria e hoje em dia são
desconhecidos do grande público.

Existe no entanto uma notável diferença entre eles :
*–* Nos dois campos de batalha é visível o mesmo furor, mais os «
nacionalistas integralistas » sacrificam os seus próprios concidadãos
(já quase não há mais homens válidos com menos de trinta anos na
Ucrânia), enquanto os « sionistas revisionistas » sacrificam pessoas que
lhes são estranhas, civis árabes.
Há o risco destas guerras se generalizarem ?

Essa é a vontade dos dois grupos pré-citados. Os «nacionalistas
integralistas» não cessam de atacar a Rússia no interior do seu
território e no Sudão, enquanto os «sionistas revisionistas» bombardeiam
o Líbano, a Síria e o Irão (mais precisamente o território iraniano na
Síria, uma vez que o Consulado em Damasco é extra-territorializado). No
entanto, ninguém responde : nem a Rússia, nem o Egipto e os Emirados, no
primeiro caso, nem o Hezbolla, nem o Exército árabe Sírio, nem os
Guardas da Revolução, no segundo caso.

Todos, incluindo a Rússia, desejosos de evitar uma réplica brutal do «
Ocidente Colectivo » que conduziria a uma Guerra Mundial, preferem
encaixar os golpes e aceitar os seus mortos.

Se houvesse uma generalização da guerra, esta já não seria só
convencional, mas sobretudo nuclear.

Se são conhecidas as capacidades convencionais de todos, ignora-se em
grande parte as suas capacidades nucleares. No máximo sabe-se que apenas
os Estados Unidos utilizaram bombas nucleares estratégicas durante a
Segunda Guerra Mundial e que a Rússia afirma dispor de portadores
nucleares hipersónicos com os quais nenhuma outra potência pode
rivalizar. Contudo, alguns peritos ocidentais põem em dúvida a realidade
destes prodigiosos avanços técnicos. No plano de fundo, qual é pois a
estratégia das potências nucleares ?

Para além dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, também
a Índia, o Paquistão, a Coreia do Norte e Israel dispõem de bombas
atómicas estratégicas. Todos, salvo Israel, as encaram como meios de
dissuasão. Os média (mídia-br) ocidentais apresentam igualmente o Irão
como uma potência nuclear, o que a Rússia e a China oficialmente
desmentem. Durante a guerra do Iémene, a Arábia Saudita comprou bombas
nucleares tácticas a Israel e utilizou-as, mas não parece dispor delas
em permanência, nem dominar a sua técnica.

Só a Rússia realiza regularmente exercícios de Guerra nuclear. Durante
os de Outubro passado, ela admitia perder um terço da sua população em
poucas horas, depois simulando o combate saía vencedora.

Em última análise, o conjunto das potências nucleares não pensa disparar
primeiro, pois isso levaria, sem dúvida nenhuma, à sua destruição. À
excepção de Israel que, pelo contrário, parece ter adoptado a « Doutrina
Sansão » («Quero morrer com os Filisteus»). Seria, portanto, a única
potência a imaginar o sacrifício final, o «Crepúsculo dos Deuses», tão
caro aos nazis.
Duas obras criticas foram consagradas ao átomo militar israelita : /The
Samson Option : Israel’s Nuclear Arsenal and American Foreign Policy/ (A
Opção Sansão : O Arsenal Nuclear de Israel e a Política Externa
Americana-ndT) de Seymour M. Hersh (Random House, 1991) e /Israel and
the Bomb/ (Israel e a Bomba-ndT) de Avner Cohen (Columbia University
Press, 1998, traduzido em francês pelas edições Demi-Lune) [3 <#nb3>].

O átomo militar jamais foi encarado como uma forma de dissuasão
clássica, apenas como a garantia que Israel não hesitará em se suicidar
para matar os seus inimigos mais do que aceitar ser vencido. Este é o
complexo de Massada [4 <#nb4>]. Esta maneira de pensar inscreve-se na
linha da « Directiva Hannibal » segundo a qual as FDI devem matar os
seus próprios soldados em vez de os deixar cair prisioneiros do
inimigo [5 <#nb5>].

Durante a Guerra dos Seis Dias, o Primeiro-Ministro israelita, o
Ucraniano Levi Eshkol, deu ordens preparar uma das duas bombas de que
Israel dispunha na altura a fim de a fazer explodir não muito longe de
uma base militar egípcia no Monte Sinai. Este plano não foi executado,
já que as IDF venceram muito rapidamente esta guerra convencional. Se
tal tivesse tido lugar, as repercussões teriam morto grande numero não
só Egípcios, mas também de Israelitas [6 <#nb6>].

Durante a Guerra de Outubro de 1973 (dita no Ocidente « Guerra do Yom
Kippur »), o Ministro da Defesa, o Israelita de origem ucraniana Moshe
Dayan, e a Primeiro-Ministro, a Ucraniana Golda Meir, pensaram de novo
em utilizar 13 bombas atómicas [7 <#nb7>].

*As revelações de Mordechai Vanunu na manchete do Sunday Times. *

Em 1986, um técnico nuclear da Central de Dimona, o Marroquino Mordechaï
Vanunu, revelou o programa nuclear militar secreto de Israel ao /Sunday
Times/ [8 <#nb8>]. Ele foi raptado pela Mossad em Roma, a ordens do
Primeiro-Ministro israelita e pai da bomba atómica, o Bielorusso Shimon
Peres. Foi julgado à porta fechada e condenado a 18 anos de prisão, dos
quais 11 passados em isolamento total. Ele foi de novo condenado a 6
meses de prisão por ter ousado dar uma entrevista à Rede Voltaire.

Em 2009, Martin van Creveld, o principal estratega de Israel,
declarava : «Possuímos várias centenas de ogivas atómicas e de foguetes
e podemos atingir os nossos alvos em todos os azimutes, até mesmo Roma.
A maior parte das capitais europeias fazem parte dos alvos potenciais da
nossa Força Aérea (…) Os Palestinianos devem ser todos expulsos. As
pessoas que lutam com este fim esperam simplesmente a chegada da “pessoa
certa na hora certa”. Há apenas dois anos, 7 ou 8 % dos Israelitas eram
da opinião que essa seria a melhor solução, há dois meses eram 33 % e
agora, segundo uma sondagem Gallup, o número é de 44 % a favor».

Assim é razoável pensar que nenhuma potência nuclear, excepto Israel,
ousará cometer o irreparável.

Precisamente, foi o que o Ministro do Património, Amichai Eliyahu (Otzma
Yehudit/Força Judaica), imaginou na Rádio/Kol Berama/, em 5 de Novembro
passado. A propósito da arma atómica contra Gaza, ele declarou : « É uma
solução... é uma opção » Em seguida comparou os residentes da Faixa de
Gaza aos « nazis », garantindo que « não existem não-combatentes em Gaza
» e que este território não merece ajuda humanitária. « Não há gente que
não esteja implicada em Gaza ».
Estas declarações levantaram a indignação no Ocidente. Mas, apenas
Moscovo se espantou que a Agência Internacional de Energia Atómica não
agisse [9 <#nb9>]]].

É muito provável que seja esta a razão que leva Washington a continuar a
armar Israel enquanto reclama um cessar-fogo imediato : se os Estados
Unidos não fornecerem mais armas a Telavive para massacrar os gazenses,
esta poderia recorrer à arma nuclear contra todos os povos do região,
Israelitas incluídos.
Na Ucrânia, os « nacionalistas integralistas » haviam previsto fazer
“dançar” os Estados Unidos com o mesmo argumento : a ameaça nuclear ou,
à falta, a das armas biológicas [10 <#nb10>]. Em 1994, a Ucrânia, que
dispunha de um vasto arsenal de bombas atómicas soviéticas, assinou o /
Memorando de Budapeste/. Os Estados Unidos, o Reino Unido e a Rússia
deram-lhe garantias de integridade territorial em troca da transferência
de todas as suas armas nucleares para a Rússia e da assinatura do
Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP). No entanto, após o
derrube do Presidente eleito, Viktor Yanukovych, em 2014 (EuroMaidan),
os «nacionalistas integralistas» trabalharam para voltar à nuclearização
do país. Aos seus olhos isso indispensável para erradicar a Rússia da
face da Terra.

Em 19 de Fevereiro de 2022, o Presidente ucraniano, Voloymyr Zelensky,
anunciou durante a Conferência anual de Segurança de Munique que ia por
em causa o /Memorando de Budapeste/, a fim de rearmar o seu país no
plano nuclear. Cinco dias depois, em 24 de Fevereiro de 2022, a Rússia
lançou a sua operação especial contra o governo de Kiev com vista à
aplicação da Resolução 2202. Ela colocou como objectivo ultra-
prioritário tomar o controlo das reservas secretas e ilegais da Ucrânia
em urânio enriquecido. Após oito dias de combates, a central nuclear
civil de Zaporizhia foi ocupada pelo Exército russo.

*Laurence Norman, enviado especial do Wall Street Journal ao Fórum de
Davos sobre o nuclear iraniano, relatou no Twitter a declaração de
Rafael Grossi sobre o nuclear ucraniano, mas não publicou nenhum artigo
a respeito. A informação foi confirmada por um outro jornalista, do New
York Times desta vez, sempre no Twitter. *

Segundo o Argentino Rafael Grossi, Director da Agência Internacional de
Energia Atómica, que se pronunciou três meses mais tarde, em 25 de Maio,
no Fórum de Davos, a Ucrânia tinha secretamente armazenado 30 toneladas
de plutónio e 40 toneladas de urânio em Zaporizhia. A preços de mercado,
esse stock (estoque-br) representava, pelo menos, US$ 150 mil milhões
(bilhões-br) de dólares. O Presidente Russo, Vladimir Putin, declarou :
«A única coisa que falta [à Ucrânia] é um sistema de enriquecimento de
urânio. Mas é uma questão técnica e para a Ucrânia isso não é um
problema insolúvel». No entanto, o seu Exército havia já retirado uma
grande parte desse stock da Central. Os combates prosseguiram aí durante
meses. Se os nacionalistas integralistas ainda as tivessem, teriam feito
como os «sionistas revisionistas» hoje : teriam exigido sempre cada vez
mais armas e, em caso de recusa, teriam ameaçado utilizá-las, quer
dizer, lançar o Armagedão.

Regressemos aos campos de batalha actuais. Que observamos ? Na Ucrânia e
na Palestina, os Ocidentais continua a fornecer um arsenal
impressionante aos «nacionalistas integralistas» e, em menor grau, aos
«sionistas revisionistas». No entanto, eles não têm nenhuma esperança
razoável de fazer recuar os Russos, nem de massacrar a totalidade dos
gazenses. Na pior das hipóteses podem levar os aliados a esvaziar os
seus arsenais, a sacrificar todos os Ucranianos em idade de combater e
em isolar diplomaticamente o Estado rúfia de Israel. Aliás, era Moshe
Dayan que dizia : «Israel deve ser como um cão raivoso, demasiado
perigoso para ser controlado».

Imaginemos que estas consequências, aparentemente catastróficas, sejam
na realidade o seu objectivo.

O mundo ver-se-ia então dividido em dois como durante a Guerra Fria,
exceptuando que Israel se teria tornado um pária. No Ocidente, os Anglo-
Saxões continuariam a ser os mestres, tanto mais porque seriam os únicos
a dispor de armas, tendo os seus aliados esgotado as suas na Ucrânia.
Israel isolado, como no fim dos anos 70 e princípio dos anos 80, quando
só era verdadeiramente reconhecido pelo regime do apartheid da África do
Sul, cumpriria ainda a missão que lhe foi originalmente confiada :
mobilizar, ao serviço do Império, a diáspora judaica que temeria uma
nova vaga “anti-semita”.

Esta sombria visão é a única que pode permitir aos Anglo-Saxões não se
afundarem e continuar a ter vassalos, mesmo que isto já não tenha maior
relação com o seu poderio da época do «mundo global». É por isso que
eles se colocaram na inextricável situação actual. Os «nacionalistas
integralistas» e os «sionistas revisionistas» fazem-nos “dançar”, mas
eles entendem manipulá-los para dividir o mundo em dois e preservar o
que podem da sua supremacia.

Em
REDE VOLTAIRE
https://www.voltairenet.org/article220705.html
9/4/2024

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