quarta-feira, 14 de setembro de 2016

OBRASIL E O PERIGOSO JOGO DA HISTÓRIA. ***





RBA - (Versão estendida, sem redução para versão impressa) - Embora
 muita gente não o veja assim, o afastamento definitivo de Dilma Roussef da Presidência da República,
 em votação do Senado, por 61 a 20 votos,
     no  final de agosto, é apenas mais uma etapa de um processo e de um embate muito mais
sofisticado e complexo, em que está em jogo o controle do país nos próximos anos.  


Desde que chegou ao poder, em 2003, o PT conseguiu a extraordinária proeza de fazer tudo
errado, fazendo, ao mesmo tempo, paradoxalmente, quase tudo certo.


Livrou o país da dependência externa, pagando a dívida com o FMI, e acumulando 370 bilhões
de dólares em reservas internacionais, que transformaram nosso país, de uma nação que passava
 o penico quando por aqui chegavam missões do Fundo Monetário Internacional, no que é,
hoje - procurem por  mayor treasuries holders no Google - o quarto maior credor individual externo dos Estados Unidos. 


E o fez, ao contrário do que dizem críticos mendazes, sem aumentar a dívida pública.


A Bruta, em 2002, era de 80% e hoje não chega a 70%.


A Líquida era, em 2002, de aproximadamente 60% e hoje está por volta de 35%.


Mas isso não veio ao caso.


Ajudou a criar milhões de empregos, fez milhões de casas populares, criou o Pronatec,
 o Ciências Sem Fronteiras e o FIES, fez dezenas de universidades e escolas técnicas
federais e promoveu extraordinários avanços sociais.


Mas isso não veio ao caso.


Voltou a produzir e a construir, depois de décadas de estagnação e inatividade, 
navios, ferrovias - vide aí a Norte-Sul, que já chegou a Anápolis - gigantescas
usinas hidrelétricas (Belo Monte é a terceira maior do mundo) plataformas e
 refinarias de petróleo, mísseis ar-ar e de saturação, tanques, belonaves,
 submarinos, rifles de assalto, multiplicou o valor do salário mínimo e da
renda per capita em dólares.


Mas isso não veio ao caso.


Porque o Partido dos Trabalhadores foi extraordinariamente incompetente em
explicar, para a opinião pública, o que fez ou o que estava fazendo.


Se tinha um projeto para o país, e que medidas  faziam, coordenadamente, na economia,
 nas relações exteriores, na infraestrutura e na defesa, parte desse projeto.


Em vez de "bandeiras" nacionais, como a do fortalecimento do país no embate
geopolítico com outras nações, que poderiam ter "amarrado" e explicado a
criação do BRICS, os investimentos da Petrobras no pré-sal, a política para
 a África e a América Latina do BNDES, o rearmamento das Forças Armadas, os
investimentos em educação e cultura, em um mesmo discurso, o PT limitou-se a
 investir em conceitos superficiais e taticamente frágeis, como,
indiretamente, o do mero  crescimento econômico, fachada para as obras do PAC.


Na comunicação, o PT confiou mais na empatia do que na informação.


Mais na intuição, do que no planejamento.


Chamou, para estabelecer sua linha de comunicação, "marqueteiros" sem nenhuma
 afinidade com as causas defendidas pelo partido, e sem maior motivação do que
 a de acumular fortunas, que se dedicaram a produzir mensagens açucaradas,
estabelecidas segundo uma estratégia eventual,  superficial, voltadas não
para um esforço permanente de fortalecimento institucional da legenda e de seu
 suposto projeto de nação, mas apenas para alcançar  resultados eleitorais sazonais.


O Partido dos Trabalhadores teve mais de uma década para explicar,
didaticamente, à população, as vantagens da Democracia, seus defeitos
e qualidades, e sua relação de custo-benefício para os povos e as nações.


Não o fez.


Teve o mesmo tempo para estabelecer, institucionalmente, uma linha de comunicação,
que explicasse, primeiro, a que tinha vindo, e os avanços e conquistas que estava
 obtendo para o país.

Como, por exemplo, a multiplicação do PIB em mais de quatro vezes, em dólar,
 desde o governo FHC - trágicos oito anos em que, segundo o Banco Mundial,
o PIB e a renda per capita em dólares andaram para trás - que foram simplesmente ignorados.


Poderia ter divulgado, também, os 79 bilhões de dólares de Investimento
 Estrangeiro Direto dos últimos 12 meses, ou o aumento do superavit no
comércio exterior, ou o fato de o real ter sido a moeda que mais se valorizou
 este ano no mundo, ou o crescimento da valorização do Bovespa desde o início
de 2016, como exemplos de que o diabo não estava tão feio quanto parecia.

Mas também não o fez.


Sequer em seu discurso de defesa ao Senado - que deveria ter sido usado
também para fazer uma análise do legado do PT para o país - Dilma Roussef tocou
nestes números, para negar a situação de descalabro nacional imputada de forma
permanente ao Partido dos Trabalhadores pela oposição, os internautas de direita
 e parte da mídia mais manipuladora e venal.


O PT dividiu-se, também, quando não deveria, e não estabeleceu uma estratégia
clara, de longo prazo, que pudesse manter em andamento o projeto - de certa
forma intuitivo - que pretendia implementar para o país.   


O partido e suas lideranças foram reiteradamente advertidos de que ocorreria no
 Brasil o que aconteceu no Paraguai com Lugo - a presença aqui da mesma embaixadora
norte-americana do golpe paraguaio era claramente indicativa disso.


De nada adiantou.


De que era preciso estabelecer uma defesa competente do governo e de seu projeto
 de país na internet - cujos principais portais foram desde 2013 praticamente
abandonados à direita e à extrema-direita enquanto a esquerda, sem energia para
 se mobilizar, se recolhia ao monólogo, à vitimização e à lamentação vazia em
 grupos fechados e páginas do Facebook.
De nada adiantou.


Não se deu combate às excrescências que sobraram do governo Fernando Henrique,
justamente no campo da corrupção, com a investigação de uma infinidade de escândalos
anteriores, que poderia ter levado à cadeia bandidos antigos como os envolvidos agora,
 por indicação também de outros partidos, nos problemas da Petrobras.
E erros táticos imperdoáveis - não é possível que personagens como Dilma e
 Lindbergh continuem defendendo a Operação Lava-Jato, de público, em pleno
julgamento do impeachment, quando essa operação parcial e seletiva foi justamente
o principal fator na derrubada da Presidente da República.

Sob o mote de um republicanismo "inclusivo", mas cego, criou-se um vasto ofidário,
mostrando, mais uma vez, que o inferno - o próprio, não o dos outros - pode estar
cheio de boas intenções. 


Desse processo, nasceram uma nova classe média e uma plutocracia egoístas,
 conservadoras e "meritocráticas", paridas no bojo da expansão econômica e do
 "aperfeiçoamento" administrativo, rapidamente entregues, devido à incompetência
estratégica à qual nos referimos antes, de mão beijada, para adoção institucional
 pela direita.  


Ampliaram-se a autonomia, o poder e as contratações do Ministério Público e da
Polícia Federal, medidas elogiáveis, que poderiam em princípio funcionar muito
 bem em um país verdadeiramente democrático, mas que, no Brasil da desigualdade
 e da manipulação midiática, levaram à criação de uma nova casta - majoritariamente
conservadora - de funcionários públicos educados em universidades privadas - também
ideologicamente alinhadas com a direita - com financiamento do FIES e em cursinhos
 para concurseiros, que não tem nenhuma visão real do que é o país, a República ou
 a História, e acham - ao lado de jovens juízes - que devem mandar na Nação no
lugar dos "políticos" e do povo que os elege.


Como consequência disso, há, hoje, uma batalha jurídica que está sendo travada,
principalmente, no âmbito do Congresso Nacional, voltada para a aprovação de leis
fascistas - disfarçadas, como sempre ocorre, historicamente, sob a bandeira da
anti-corrupção, que, com a desculpa de combater a impunidade - em um país em
que dezenas de milhares de presos, em alguns estados, a maioria deles, se encontra
 detido em condições animalescas sem julgamento ou acesso a advogado - pretende
alterar a legislação e o código penal para restringir o direito à ampla defesa
consubstanciado na Constituição, no sentido de se permitir a admissibilidade de
provas ilícitas, de se restringir a possibilidade de se recorrer em liberdade, e
 de conspurcar os sagrados e civilizados princípios de que o ônus da prova cabe a
 quem está acusando e de que todo ser humano será considerado inocente até que
seja efetiva e inequivocamente provada a sua culpa.


Batalha voltada, também, para expandir o poder corporativo dessa mesma plutocracia
e seus muitos privilégios.


Enquanto isso, aguerrida, organizada, fartamente financiada por fontes brasileiras
e do exterior, a direita - "apolítica", "apartidiária", fascista, violenta,
hipócrita - deu, desde o início do processo de derrubada do PT do governo, um
"show" de mobilização.

Colocou milhões de pessoas nas ruas.

E estabeleceu seu domínio sobre os espaços de comentários dos grandes portais
e redes sociais - a imensa maioria das notícias já eram, desde 2013 pelo menos,
 contra o governo do PT,  em um verdadeiro massacre midiático promovido pelos
 grandes órgãos de comunicação privados - estabelecendo uma espécie de discurso único
 que, embora baseado em premissas e paradigmas absolumente falsos, se impôs como
sagrada verdade para boa parte da população.


Entre as principais lições dos últimos anos, vai ficar a de que a História é um
 perigoso jogo que não permite a presença de amadores.


Enganam-se aqueles que acham que o confronto expõe apenas a direita e a esquerda,
ou o PT e o PSDB - que agora se assenhoreou do PMDB e dos partidos do baixo clero.


Muito mais grave é a guerra que se desenha - e que já começou, não se iludam -
entre aqueles que atacam a política, os "políticos", a democracia e o presidencialismo
 de coalizão - e aqueles que, por conveniência ou idealismo, serão chamados a
 mobilizar-se para defendê-los daqui até 2018 e além.
O futuro da República e da Nação será definido por esse embate.


E é o conjunto de erros e circunstâncias que vivemos até agora, e o que faremos
a partir de agora, que poderá levar, ou não, para o Palácio do Planalto e o
 Parlamento, um governo fascista e autoritário em 2019.


Os opositores do PT  tiveram com o processo de afastamento de Dilma, iniciado
 ainda em 2013, à época da Copa do Mundo, uma vitória de Pirro.


A  judicialização da política, a ascensão da Antipolítica e de uma plutocracia
 que acredita, piamente, que não precisa de votos, nem de maior legitimação do que
sua condição de concursada para "consertar" o país e punir vereadores, prefeitos,
deputados, senadores, governadores, Presidentes da República, em defesa de
 "homens de bem" que desfilam com as cores da bandeira e com uniformes negros
de inspiração nazista,  ajudará a sepultar, no lugar de aperfeiçoar, o regime
presidencialista anteriormente vigente, e introduzirá um novo elemento, ilegítimo
e espúrio, no universo político brasileiro, transformando-se em permanente ameaça
para o funcionamento e a essência da Democracia.


Infelizmente, para o país e para a República, a permanência de Dilma no poder
tornou-se, devido à irresponsabilidade da mídia e da oposição - vide as pautas
bomba do ano passado - ao sucesso da estratégia de fabricação do consentimento
levada a cabo pela direita e à incompetência política do Partido dos Trabalhadores
 - de tal forma insustentável, que, se ela voltasse, caminharíamos para uma situação
de confronto em que o fascismo - como ocorreu em 1964, no Brasil, e, mais tarde,
no Chile e na Argentina - ficaria - como já está ficando, de fato -  com todas
as armas, e a esquerda, com todas as vítimas.
Nações e pessoas precisam aprender que, às vezes, é preciso saber dar um passo
para trás para depois tentar avançar de novo.
É preciso resistir, mas com um projeto claro  para o país.
A corajosa defesa do governo Dilma por parte de grandes lideranças  da agricultura
 e da indústria brasileira, como os senadores Kátia Abreu, ex-Presidente da
Confederação Nacional da Agricultura, e Armando Monteiro, ex-Presidente da
Confederação Nacional da Indústria, mostram que não é impossível sonhar com
uma aliança que una empresários e trabalhadores nacionalistas em torno de um
projeto vigoroso e coordenado de desenvolvimento, que possa promover
o fortalecimento do país, do ponto de vista econômico, militar e  geopolítico -
 é preciso preservar e concluir os programas concebidos e iniciados nos
últimos anos, como o dos caças Gripen NG BR, o do submarino atômico nacional,
 o do cargueiro multipropósito KC-390, o dos tanques leves Guarani, o projeto
de enriquecimento de urânio da Marinha - e evitar, ao mesmo tempo, a   abjeta
entrega de nossas riquezas, como os principais poços do pré-sal, já descobertos,
desenvolvidos e produzindo, aos   estrangeiros (até mesmo a estatais estrangeiras,
como estão defendendo, em absurda contradição, parte de nossos privatistas de plantão).
A costura de uma aliança que evite a subordinação e o caos e a transformação do
 país em uma nação fascista, na prática, em pouco mais de dois anos, deveria ser,
 daqui pra frente, a primeira missão de todo cidadão brasileiro - ou ao menos
daqueles que tenham um mínimo de consciência e de informação - neste país assolado
 pelo ódio e pela mentira, a hipocrisia e a ignorância.

A divisão da Nação, a crescente radicalização e o isolamento antidemocrático das
forças de esquerda - que devem combater esse isolamento também internamente e
 rapidamente se organizar sob outras legendas e outras condições - a fratura da
sociedade nacional; a desqualificação da política e da democracia; só interessam
 àqueles que pretendem consolidar seu domínio sobre o nosso país, evitando que
o Brasil fortaleça sua soberania e a sua sociedade, em todos os aspectos, e que
venha a ocupar o lugar que lhe cabe no mundo, como quinta maior nação do planeta
 em população e território.

É preciso costurar uma ampla aliança nacional, que parta, primeiramente, do
 centro nacionalista - se não existir, é preciso criar-se um - suprapartidária,
politicamente includente, equilibrada e conciliatória, que una militares
nacionalistas da reserva - e eles existem, vide o Almirante Othon, por
exemplo - empresários como Armando Monteiro e Kátia Abreu, técnicos e engenheiros
desenvolvimentistas, grandes empresas de capital majoritariamente nacional e os
trabalhadores, começando pelos de grandes estatais como a Petrobras, em torno de
 um projeto que possa evitar a descaracterização e a destruição da Democracia,  o
 estupro das liberdades democráticas e dos direitos individuais, o  pandemônio
 político e institucional e a "fascistização" do país, com a entrega de nossas
riquezas e de nosso futuro aos ditames internacionais.

Vamos fazê-lo?
In
Mauro Santayana (blog)
http://www.maurosantayana.com/
12/9/2016
.........
*** O blog não está necessariamente de acordo, no todo ou em parte, com o teor dos
materiais publicados.

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