segunda-feira, 14 de agosto de 2017
O império ataca de novo – Agora com neocolonialismo mais destrutivo e mais desonesto
por Neil Clark [*]
Neste mês há alguns aniversários significativos da luta contra o
colonialismo do velho estilo. A questão é que este colonialismo não
desapareceu depois de os países em desenvolvimento se terem tornado
independentes das grandes potências europeias.
Aquele colonialismo foi substituído por uma nova versão que provou ser
mais destrutiva e incomensuravelmente mais desonesta do que a que existia
antes. Pelo menos o Império Britânico, que no seu máximo cobria quase um
quarto da superfície terrestre do globo, dava-se a conhecer como um
Império. Atualmente o mais sombrio Império Global do Capital-Financeiro
Monopolista não o faz.
Países inteiros tais como Jugoslávia, Líbia e Iraque são destruídos por
não se conformarem com as regras que o império impõe, enquanto os que
continuam a desafiar as elites neoconservadoras/neoliberais, como a
Venezuela, estão sob permanente assédio.
Adicionando o insulto à injúria esta nova onda de colonização, levada a
cabo para beneficiar os mais ricos dos países mais ricos do mundo, é feita
em nome da "democracia" e "garantia dos direitos humanos" com o apoio
entusiástico de muitos autoproclamados "progressistas". A hipocrisia do
imperialismo atual é realmente de nos deixar sem respiração: critica
severamente Maduro como sendo um "ditador", mas saúda os governantes não
eleitos da Arábia Saudita assim como lhes vende mortífero armamento
pesado.
Maduro que institui a Assembleia Constituinte em conformidade com a
Constituição é um vilão, os sauditas açoitam e prendem ativistas
pró-democracia…mas são apenas negócios, como de costume.
John Wight (@JohnWight1) August 3, 2017
Nos anos 40 e 50 do século passado, tudo parecia muito diferente. O
colonialismo parecia estar em retirada. Há setenta e cinco anos, em 8 de
agosto de 1942, Mahatma Gandhi iniciou o Movimento "Quit India" em
Bombaím.
Há setenta anos em 14/15 de agosto de 1947, a Índia e o Paquistão
tornaram-se independentes do Reino Unido. Há sessenta anos (31 de agosto
de 1957) a Federação Malaia (agora Malásia) tornou-se também independente
do Reino Unido.
Estas são datas importantes que certamente precisam ser celebradas,
porém, a convicção dos progressistas de que a descolonização
representaria uma genuína libertação dos países colonizados provou ser
extraordinariamente otimista. A Índia e a Malásia podem ter progredido,
mas para outras nações os "Ventos de Mudança" foram apenas ar quente.
"Independência" significou somente obter os adornos exteriores da
soberania nacional: uma bandeira, ser membro da ONU e uma equipa de
futebol. O poder económico continuou residindo noutras partes, nos bancos
e salas das administrações nas nações mais ricas.
No seu texto clássico de 1965 , "Neocolonialismo, o último estádio do
imperialismo", o grande Kwame Nkrumah, então Presidente do Gana e firme
defensor do Pan-africanismo, explicou como o neocolonialismo tinha
substituído o velho estilo colonialista. "No passado, era possível
converter um país ao qual um regime neocolonial tinha sido imposto num
território colonial – o Egito no século XIX é um exemplo. Este processo
já não é atualmente realizável" – escreveu.
Para obter o dinheiro necessário a realizar funções sociais nas
metrópoles só podia ser dada uma independência formal às colónias, isto
significava que o controlo não fosse também entregue.
Os EUA usaram a sua posição como a nação credora número um depois da 2ª
Guerra Mundial para acelerar este processo "formal" de descolonização, mas
apenas para que eles se pudessem mover para os países anteriormente
dominados pela Grã-Bretanha, França, Holanda. Nkrumah cita o exemplo do
Vietname do Sul em que o "velho" poder colonial era a França, mas o poder
neocolonial eram os EUA.
De facto, os EUA podem considerar-se os pioneiros do neocolonialismo.
Enquanto o "velho estilo" imperial dominava o resto do mundo, os EUA
usavam técnicas neocoloniais para assegurarem que os países da América
Latina subordinavam as suas economias aos interesses dos grandes negócios
dos EUA. A elite financeira e do grande capital dos EUA toma atualmente
como alvo o governo de esquerda de Maduro na Venezuela para a "mudança de
regime" tal como em 1913 o embaixador no México, Henry Lane Wilson
conspirava com o general Huerta contra a orientação esquerda de Madero.
Isto foi um padrão que se repetiu inúmeras vezes nos 100 anos seguintes.
As técnicas de Washington aperfeiçoadas na América Latina apoiando golpes
de Estado contra governos eleitos democraticamente que queriam ter
controlo sobre as suas economias, financiando a oposição a estes governos
e eliminando os líderes políticos que lutavam por genuína independência
dos seus países. O que vimos evidenciado na Guatemala em 1954, Brasil em
1964, Chile em 1973, foi usado em todo o mundo.
"A promoção da democracia" foi sempre o código para os EUA darem suporte à
subversão de governos que não se vergavam o suficiente.
https://t.co/2Dg6lERMYm - Max Blumenthal (@MaxBlumenthal) August 1,2017
A lista de governos derrubados direta ou indiretamente pelos EUA e seus
aliados mais chegados, para alcançarem o controlo económico é demasiado
longa para incluir num simples texto, mas aqui vão alguns exemplos.
1 - Indonésia 1965/66
A sangrenta onda de assassínios em massa apoiada pelos EUA e perpetrada
pelas forças militares que derrubaram Sukarno, o primeiro Presidente
"pós-colonial", e às suas ideias de independência, sendo substituído pelo
ditador pró-ocidental General Suharto .
"A embaixada dos EUA em Jakarta forneceu a Suharto uma "zap-list" com os
nomes dos membros dos Partido Comunista da Indonésia e riscou os nomes
quando foram mortos ou capturados, escreve John Pilger que analisou o golpe
em 2001 no filme "Os novos dominadores do mundo" ( The New Rulers of the
World ).
O negócio foi que a Indonésia sob Suharto ofereceria o que Richard Nxon
chamou "a maior provisão de recursos naturais, o maior prémio do sudoeste
asiático."
Em novembro de 1967 este maior prémio foi entregue numa memorável
conferência de três dias patrocinada pela Time-Life Corporation em Genebra.
Chefiada por David Rockefeller, todos os gigantes transnacionais estavam
representados: as maiores companhias petrolíferas, General Motors, Imperial
Chemical Industries, British American Tobacco, Siemens, US Steel e muitas
outras. Na mesa sentavam-se os economistas de Suharto, treinados nos EUA que
concordaram com a conquista do seu país, sector a sector, como escreveu
Pilger .
O custo em vidas humanas da neocolonial "mudança de regime" foi enorme:
entre 500 mil e 3 milhões de pessoas mortas . Em 2016 um painel de juízes
internacionais manteve que os EUA (bem como o RU e a Austrália) tinham sido
cúmplices do genocídio .
2 – Irão, 1953
O derrube do nacionalista democraticamente eleito Mohammad Mossadegh e a
sua substituição pelo aquiescente Xá foi outra operação conjunta dos EUA/RU.
O "crime" de Mossadegh foi querer nacionalizar a indústria petrolífera do
seu país e utilizar os rendimentos da mesma para lutar contra a pobreza e as
doenças. Portanto os neocolonialistas decidiram que tinha de se ir embora.
Uma campanha de desestabilização – semelhante à que é promovida contra a
Venezuela – foi posta em marcha. "Os objetivos da propaganda da CIA e do SIS
consistiam em conduzir uma campanha crescentemente intensificada através da
imprensa, panfletos e o clero de Teerão, concebida para enfraquecer o
governo de Mossadeq de todas as formas possíveis" admitiu Donald N. Wilber,
um dos principais elementos do chamado plano TPAJAX.
Em 3013, documentos desclassificados revelaram que: "O golpe militar para
derrubar Mossadegh e a seu governo de Frente Nacional foi levado a cabo sob
a direção da CIA, como um ato de política externa dos EUA, concebido e
aprovado aos mais altos níveis do governo".
Vale a pena relembrar tudo quando ouvimos políticos dos países
neocolonialistas fingirem-se ultrajados com a não provada "interferência
Russa" nos seus processos políticos.
Qual é o principal interesse dos EUA na Venezuela? Se a história reservada
do Departamento de Estado dos EUA é um guia: petróleo.
https://t.co/xCRNDT1oMFpic.twitter.com/8Z1e0IsKND - WikiLeaks (@wikileaks)
August 2, 2017
3. Jugoslavia, 1999/2000
"Balcanização" é um dos mais importantes instrumentos do neocolonialismo e
pode ser encontrado onde quer que este seja praticado", escreveu Kwame
Nkrumah.
O líder socialista da República Federativa da Jugoslávia, Slobodan
Milosevic foi demonizado em 1990 pelas elites ocidentais não porque
quisesse partir o seu país em pedaços, mas porque queria que se mantivesse
unido.
Tendo sobrevivido a 78 dias da campanha da NATO de bombardeamentos
"humanitários" contra o seu país, em 1999, Slobo viu a operação de "mudança
de regime" para o derrubar intensificar-se. Milhões de dólares choveram
ilegalmente no seu país dos EUA para grupos da oposição e ativistas
antigovernamentais, tais como a organização Otpor! Milosevic foi destituído
por uma "Revolução Bulldozer" em outubro de 2000 e a secretária de Estado
Madeline Albright, que quatro anos antes tinha dito que a morte de meio
milhão de crianças iraquianas devido às sanções tinha sido um preço que
valera a pena pagar, comemorou o feito.
George Kenney, em tempos responsável do Departamento de Estado, revelou a
razão pela qual tudo tinha acontecido. "No período pós-Guerra Fria não havia
lugar para que um grande país independente focado no socialismo resistisse à
globalização"
Em 2012 o New York Times relatou como importantes membros da
Administração dos EUA que tinham participado no desmantelamento da
Jugoslávia tinham voltado aos Balcâs como empresários para apresentarem
propostas para a privatização de ativos.
Por que é tão difícil para alguns compreenderam em 2017 o que era óbvio em
1982? Solidarity. pic.twitter.com/EuU9aVAnho - Club des Cordeliers
(@cordeliers) July 31, 2017
Agora os neocolonialistas neoconservadores agentes das mudanças de regime
moveram-se para a República Bolivariana da Venezuela. Como Milosevic e
muitos outros antes dele que se puseram no caminho dos "Novos Senhores do
Mundo", o democraticamente eleito Nicolas Maduro é etiquetado como
"ditador".
Tal como no caso de Milosevic, os autoproclamados "progressistas" são a
vanguarda da campanha das elites para demonizar a Venezuela e a sua
liderança, exigindo que figuras públicas do Ocidente que têm expressado
apoio ao Chavismo emitam denúncias.
Todos estes críticos de "esquerda" da Venezuela descartam a interferência
dos EUA e descrevem os resultados da guerra económica como "fracasso do
governo". — Crypto Cuttlefish (@cuttlefish_btc) August 5, 2017
Nas violentas críticas ao governo da Venezuela que os media despejam
actualmente não há qualquer menção à campanha externa que prossegue sem
abrandar com vistas à desestabilização do país e à sabotagem da economia.
Nem aos milhões de dólares que os EUA tem despejado nos cofres da oposição
e de ativistas antigovernamentais. Imagine-se se o governo Venezuelano
estivesse a financiar os que efetuam protestos antigovernamentais nos EUA.
Mas quando os neocolonialistas o fazem noutros países, está bem.
Kwame Nkrumah qualificou o neocolonialismo como a pior forma de
imperialismo e tinha razão. "Para aqueles que o praticam, significa poder
sem responsabilidade e para os que o sofrem significa responsabilidade sem
poder."
E o que aconteceu a Nkrumah? – ouço-vos perguntar. Apenas alguns meses após
a publicação deste livro o pai da moderna Gana foi deposto por um golpe de
Estado. O "Conselho Nacional de Libertação" que o eliminou rapidamente
reestruturou a economia do Gana , sob a supervisão do FMI e do Banco
Mundial, em benefício do capital do ocidente.
Durante anos o ocidente negou o envolvimento, mas mais tarde John
Stockwell, um agente da CIA na África revelou : "a estação da CIA no Gana
desempenhou um papel principal no derrube de Kwame Nkrumah em 1966".
A Venezuela tem imenso petróleo, um governo socialista e é um forte apoiante
da Síria. Nem posso imaginar por que razão os neocons estão tão interessados
numa "mudança de regime"… Neil Clark (@NeilClark66) August 4, 2017
Atualmente os neocolonialistas querem que apoiemos a sua cruzada
"progressista" por "democracia" e "direitos humanos" na Venezuela tão rica
em petróleo. Se Kwame Nkrumah ainda estivesse entre nós, ele estaria a
incitar-nos a ver o quadro na sua totalidade.
Ver também:
Países latino-americanos condenan las amenazas de Trump sobre una opción
militar contra Venezuela
Bolivia responde a Trump: "Condenamos el afán intervencionista armado de
EE.UU. contra Venezuela"
[*] Jornalista, escritor, radialista e bloguista. Escreve para The
Guardian, Morning Star, Daily and Sunday Express, Mail on Sunday, Daily
Mail, Daily Telegraph, New Statesman, The Spectator, The Week,, RT e The
American Conservative. Twitter @NeilClark66
O original encontra-se em
www.rt.com/op-edge/399004-colonialism-venezuela-empire-us-britain/
In
RESISTIR.INFO
http://resistir.info/crise/clark_ago17.html#asterisco
14/8/2017
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