segunda-feira, 26 de abril de 2021
MPF oferece nova denúncia contra agentes que participaram de operação para extermínio do PCB na ditadura
Segunda, 26 de abril de 2021
Foto: Arquivo Nacional
Ex-integrantes do DOI-Codi sequestraram e mataram o militante comunista Elson Costa em 1975; crime ocorreu em unidade clandestina de tortura em SP
O
Ministério Público Federal (MPF) ofereceu nova denúncia contra os
ex-agentes da ditadura Audir Santos Maciel e Carlos Setembrino da
Silveira pelo assassinato de um ex-integrante do Partido Comunista
Brasileiro (PCB) na chamada Casa de Itapevi, na região metropolitana de
São Paulo. Em 1975, eles foram responsáveis pela prisão, tortura, morte e
ocultação do cadáver de Elson Costa, então membro da direção da
legenda. A dupla, entre outras pessoas já falecidas, mantiveram o
militante sob intensa tortura durante 20 dias no local onde funcionava
um dos centros clandestinos da repressão. Incinerado, esquartejado e
lançado no Rio Novo, em Avaré, o corpo da vítima permanece desaparecido
até hoje.
Maciel
e Setembrino tiveram intensa participação nas ações da chamada Operação
Radar, executada entre 1973 e 1976 para o extermínio de lideranças do
PCB em todo o país, entre elas Elson Costa. O jornalista Vladimir Herzog, o operário Manoel Fiel Filho, o técnico em edificação José Montenegro de Lima e o advogado Jayme Amorim de Miranda também foram vítimas dessa iniciativa.
Maciel
comandava o Destacamento de Operações de Informação - Centro de
Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do II Exército, uma das unidades
que coordenavam a perseguição aos comunistas. Setembrino, além de
integrar a equipe de buscas da unidade sob a chefia do capitão Dalmo
Cirillo, era um dos responsáveis pelo funcionamento da Casa de Itapevi,
também conhecida como Boate Querosene. O imóvel, que pertencia a seu
irmão, situava-se em uma área afastada, sem vizinhos que pudessem
testemunhar os abusos cometidos contra as vítimas.
Elson
Costa fazia parte do setor de agitação e propaganda do PCB e atuava na
produção e distribuição da Voz Operária, o jornal do partido. Sua prisão
ocorreu no bairro paulistano de Santo Amaro em 15 de janeiro de 1975,
dois dias após agentes da repressão descobrirem a gráfica clandestina
onde o periódico era impresso, no Rio de Janeiro. As circunstâncias da
morte de Elson são comprovadas por documentos do Exército e pelo
depoimento do ex-analista de informações do DOI-Codi Marival Dias Chaves
do Canto, que, em 1992, revelou detalhes sobre as atrocidades cometidas
em Itapevi.
O
desaparecimento de dirigentes do PCB foi a solução encontrada pelos
militares para dizimar o partido, que era contrário à luta armada. Sem
possibilidade de forjar versões oficiais que tratassem de “confrontos” e
“trocas de tiros” com os comunistas, os órgãos da repressão optaram por
sequestrá-los e matá-los clandestinamente, à margem de qualquer ação
pública. A partir de 1974, com o fechamento da Casa da Morte, em
Petrópolis (RJ), a Casa de Itapevi tornou-se o principal destino ilegal
dos militantes capturados.
Maciel
e Setembrino são acusados de homicídio duplamente qualificado e
ocultação de cadáver. Na denúncia, o MPF pede que a Justiça Federal
considere uma série de fatores agravantes para a condenação dos
ex-agentes, entre eles o emprego de tortura, o motivo torpe para o crime
(perseguição política), o abuso de poder e a violação do dever inerente
aos cargos que os denunciados ocupavam. Os pedidos incluem ainda o
cancelamento de aposentadorias que eles recebam atualmente, bem como de
condecorações com as quais tenham sido agraciados por sua atuação
durante a ditadura.
O
MPF destaca que a morte de Elson Costa é imprescritível e impassível de
anistia, uma vez que ocorreu em um contexto de ataque sistemático e
generalizado do Estado brasileiro contra a população e, por isso,
constitui crime contra a humanidade. Diversos testemunhos e registros
atestam a coordenação centralizada da repressão na época, entre eles,
relatório de abril de 1974, assinado pelo então diretor da CIA William
Colby.
O
documento, dirigido à Secretaria de Estado dos EUA, descreve uma
reunião na qual o presidente Ernesto Geisel deu aval para que o Serviço
Nacional de Informações (SNI) prosseguisse com as mortes de militantes
políticos, desde que autoridades superiores fossem antes consultadas. “O
presidente não apenas tinha conhecimento, mas autorizava a continuação
da política de execuções sumárias e desaparecimentos dos opositores,
exigindo-se, todavia, que o Centro de Informações do Exército (CIE)
solicitasse autorização prévia do próprio Palácio do Planalto para as
mortes”, destacou o procurador da República Andrey Borges de Mendonça,
autor da denúncia. “Nesse contexto se insere a Operação Radar".
O número processual da denúncia é 5002674-87.2021.4.03.6181. A tramitação pode ser consultada aqui.
Íntegra da denúncia do MPF
Fonte: MPF
In
gamalivre.com.br
26/4/2021
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