quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Sair do caos



Sair do caos

Adriano Benayon



No artigo anterior, avaliei que as saídas não emergem das discussões entre
economistas monetaristas, autointitulados liberais, versus keynesianos.+

2. Quais são os problemas maiores? Desemprego, aperto financeiro e dívida
pública imensa, em contraste com a abundância de recursos naturais e de gente
querendo trabalhar e progredir na vida.+

3. Há que tratar da produção e da finança em conjunto. Finança não é problema:
cria-se crédito e emite-se moeda para realizar as produções necessárias ao
desenvolvimento econômico e social.+


4. Este deve ser assim definido: o progresso em atender as necessidades reais da
população, inclusive defesa e segurança, por meio da produção de bens e
serviços, realizada no País com tecnologia e capitais nacionais, sem deteriorar
o ambiente, e até recuperá-lo.

5. Haveria que erguer os órgãos de planejamento, financiamento e promoção das
empresas agentes dessa construção:+

1) empresas privadas em competição, basicamente médias e pequenas, e
cooperativas formadas por pequenas e micro;+

2) estatais e mistas, nas indústrias de base e na infraestrutura, regidas sob
estatuto orientado pelo mérito, admitidas demissões, se comprovado o
descomprometimento com a elevação da qualidade e outros objetivos essenciais. +

6. Tal composição pressupõe a criação de órgãos de defesa econômica aparelhados
para assegurar concorrência legítima nos mercados, avaliar a administração das
estatais e mistas, e influir nela. Há que vedar aquisições por empresa
estrangeira e modificar o conceito desta na Constituição.+

7. Conjuntos de empreendimentos formariam o setor produtivo em interação,
desenvolvendo o mercado interno, em patamar superior de tecnologia, com conexões
intersetoriais e apoio das estatais e mistas e da política econômica.

8. Estimular-se-iam, nesse patamar, indústrias baseadas em experiências
anteriores à desindustrialização (a produção industrial, 35% do PIB nos anos 80,
caiu a 10%). Também, novas produções de consumo para necessidades reais
desatendidas (em lugar das artificiais criadas pelo marketing); e dos
respectivos bens intermediários e de capital.+

9. A infraestrutura tem de ser reorientada em função das interações no mercado
interno, da lógica dos recursos naturais e posição geográfica deles e das
regiões utilizadoras.+

10. Indispensável fomentar indústrias de alta tecnologia, como
aeronáutica/espacial; eletrônica e informação; nuclear; defesa; materiais
estratégicos, como petróleo, terras raras, nióbio e quartzo e seu aproveitamento
em bens intensivos de tecnologia.

11. Na infraestrutura: 1) ênfase na energia de biomassa, com produção
descentralizada, combinando alimentos, etanol, óleos vegetais e seus
subprodutos, bases de nova química; 2) energia hidroelétrica, eclusas e
integração com os transportes aquaviários, sem ingerências pseudoambientalistas
e indigenistas a serviço de potências imperiais; 3) desenvolvimento de linhas de
transmissão; 4) estatizações no setor elétrico e supressão do escandaloso
sistema tarifário atual; 5) proibição de novas termoelétricas; 6) substituição
de importações dos equipamentos de energia solar e eólica, desenvolvendo-os em
escalas menores e melhor tecnologia; 7) destinação do petróleo a usos mais
nobres, à medida que a biomassa assegure o fornecimento de combustíveis
líquidos; 8) nacionalização do petróleo e da petroquímica; 9) desenvolvimento de
tecnologias de transportes interestaduais e urbanos de massa, trens de
velocidade, metrôs e mais meios econômicos e não poluentes; 10) fomento a
empresas nacionais de transportes fluviais, marítimos, ferroviários e
aeronáuticos; 11) constituição de empresas nacionais e estatais de
telecomunicações estratégicas.+

12. Na economia agrária, inclusive o programa da biomassa descentralizada,
criação de empregos de qualidade, prioridade ao suprimento da demanda alimentar
interna e de matérias-primas para a indústria nacional. Excluir sementes
transgênicas e limitar fertilizantes químicos e agrotóxicos; preservar matas
ciliares, nascentes e solos. Mineração com objetivos semelhantes.

13. Não haverá dificuldade de realizar os investimentos para esses
empreendimentos, que poderão ter, em 5 a 10 anos, massa bastante para
caracterizar um país em franco desenvolvimento.+

14. De fato, este não surge tanto de dinheiro, como de realizações concretas,
articuladas num conjunto de interações. Não há lógica em imaginar que possa
ser de outro modo.+

15. O Brasil precisa ganhar expressão tecnológica, antes de retomar maior volume
de comércio externo. Ponto importante é abandonar o apego a manter o País em
organizações internacionais que o atam a acordos inconvenientes, como os da
OMC.

16. Cumpre revogar a Lei de Propriedade Industrial de 1996, que reforça as
disposições leoninas dos Acordos da OMC (1994/1995), e promove o atraso
tecnológico do Brasil.+

17. Também as regras de comércio têm de ser objeto de revisão, inclusive
reinstituindo a Lei de Valoração Aduaneira, suprimida pelos acordos do GATT.+

18. Os acordos de comércio têm de ser celebrados com base no interesse dos
contratantes. O TPP (TransPacific Partnership), promovido pelos EUA, nem merece
consideração: visa a radicalizar um tipo de relações internacionais intolerável,
chegando a submeter Estados nacionais a tribunais arbitrais das
transnacionais.+

19. Impõe-se expurgar da Constituição a Emenda Kandir, que isenta de tributos
as exportações de produtos primários, ficando a mineração sujeita desprezível
imposto sobre o faturamento da extração, estimulando as mineradoras a
superfaturar despesas.

20. A hecatombe de Mariana ilustra a insana e corrupta privatização da Vale, em
1997, até hoje mantida sub judice, e salienta o despautério de incentivar a
extração de minérios, destrutiva do solo, subsolo, águas e terras adjacentes.+

21. A associação da Vale com a mineradora anglo-australiana BHP, na Samarco,
exemplifica a regra: carteis transnacionais, liderados por gigantes britânicas,
controlando os minérios estratégicos e preciosos, abuso que está sendo ampliado
com a demarcação de imensas reservas indígenas e ambientais, na Amazônia, por
pressões imperiais.+

22. O favorecimento à devastação, sem retribuição, do solo e subsolo deve ser
substituído pela exploração por empresas nacionais, tributada considerando a
natureza não-renovável dos recursos e serem eles indispensáveis à produção de
bens de elevado valor agregado.+

23. São outras fontes óbvias de arrecadação, sem falar na cobrança dos débitos
fiscais: 1) tributar rendas financeiras, como dividendos e títulos de renda
fixa, em nível, no mínimo, igual ao da alíquota mais alta do IRPF; 2) suprimir
subsídios federais, estaduais e municipais em favor de montadoras de veículos
automotores, entre outros feudos de carteis transnacionais.

24. Economistas pró-sistema de poder reinante condenam o governo por abrir mão
de R$ 264,3 bilhões em isenções ou reduções tributárias por ano, mas só aludem
às que favorecem pequenas e micro empresas.+

25. Sobram, pois, recursos financeiros para grande programa dos investimentos
produtivos, sem necessidade de criar moeda e crédito, mormente eliminando gastos
indevidos e improdutivos, como o "serviço da dívida" pública interna, que
cresce exponencialmente, sendo pago com novos títulos.

26. Convém desindexar os títulos da dívida interna e fixar para eles juros de
nível mundial: isso implica reduzir-lhe o serviço de 17,5% para 3% aa. 14,5
pontos percentuais sobre R$ 3 trilhões implica economia de R$ 435 bilhões.+

27. Maior economia, ainda, resultará da urgente auditoria da dívida pública
externa e interna, nos moldes da realizada no Equador, de que participou a
brasileira Maria Lucia Fattorelli.+

28. Se tudo isso não bastasse, poder-se-ia, sem problema algum, custear os
investimentos mediante emissão de moeda e/ou de crédito por bancos públicos
(impondo-se acabar com o art. 164 da Constituição).

29. Aos que se escandalizam com déficits orçamentários, lembre-se que os EUA
saíram da depressão econômica de 1929 a 1941, convocando 14 milhões para servir
nas Forças Armadas e financiando investimentos de armas e equipamento industrial
e militar.+

30. Os déficits federais resultantes, nos anos 1942/44, foram mais de 100% do
PIB, e nada de grave aconteceu com as finanças estadunidenses. Já os que
programaram amarrar a Europa, submeteram-na, pelo Tratado da União Europeia, em
1992, ao déficit máximo de 3% do PIB.+

31. Poderíamos mesmo importar técnicos e engenheiros - estrangeiros e
brasileiros - para se fixar entre nós, e fazer investimentos pesados em
segurança pública e na defesa. Convocar para o serviço militar, a curto prazo,
um milhão de jovens, até para se educar na disciplina, alguns para colaborar
em obras públicas. Além disso, engajar um milhão de professores em programas de
educação em tempo integral.

* - Adriano Benayon é doutor em Economia, pela Universidade de Hamburgo,
Alemanha; autor de Globalização versus Desenvolvimento.+

In
port.pravda.ru
http://port.pravda.ru/cplp/brasil/17-02-2016/40404-sair_caos-0/
17/2/2016

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