segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017
Os laços de Trump ao passado e a ressurreição da esquerda
'De Omnibus Dubitandum'
Deve-se duvidar de tudo
por James Petras
O presidente Trump está profundamente entranhado na estrutura do estado
profundo do imperialismo americano. Contrariando referências ocasionais à
não intervenção em guerras além-mar, Trump tem seguido as pegadas dos seus
antecessores.
Enquanto neoconservadores e liberais têm levando um alarido acerca dos
laços de Trump com a Rússia, suas "heresias" sobre a NATO e suas
aberturas para a paz no Médio Oriente, na prática ele tem posto de lado
seu imperialismo supostamente humanitário e tem-se envolvido nas mesmas
políticas belicosas da sua rival presidencial do Partido Democrata,
Hillary Clinton.
Uma vez que lhe falta a "demagogia" ardilosa do ex-presidente Obama e não
recobre as suas acções com apelos baratos a políticas "de identidade", os
pronunciamentos brutos e abrasivos de Trump levam jovens manifestantes às
ruas em acções de massa. Estas manifestações são não tão discretamente
apoiadas pelos principais oponentes de Trump entre os banqueiros da Wall
Street, especuladores e magnatas dos mass media. Por outras palavras, o
presidente Trump é um homem que abraça e segue os ícones e não uma
"revolucionário" ou mesmo um "agente de mudança".
Prosseguiremos discutindo a trajectória história que provocou o
nascimento do regime Trump. Identificaremos a seguir políticas e
compromissos que determinam a direcção presente e futura da sua
administração.
Concluiremos identificando como a reacção actual pode produzir
transformações futuras. Desafiaremos o actual delírio catastrofista e
apocalíptico e apresentaremos razões para uma perspectiva optimista para o
futuro. Em suma, este ensaio indicará como tendências negativas actuais
podem tornar-se realisticamente positivas.
Sequências históricas
Ao longo das últimas duas décadas presidentes dos EUA desbarataram os
recursos financeiros e militares do país em múltiplas guerras
intermináveis e perdedoras, bem como em milhões de milhões (trillion) de
dólares de dívidas comerciais e desequilíbrios orçamentais. Líderes dos
EUA enlouqueceram provocando grandes crises financeiras globais, levando à
bancarrotas os maiores bancos, destruindo pequenos possuidores de
hipotecas, devastando a indústria manufactureira e criando desemprego
maciço seguido por empregos precários e de baixo salário o que levou ao
colapso de padrões de vida para as classes trabalhadora e extractos baixos
da média.
Guerras imperiais, bail-outs de milhões de milhões de dólares para os
bilionários e fuga se peias de corporações multinacionais para o exterior
aprofundaram amplamente desigualdades de classe e deram origem a acordos
comerciais favorecendo a China, Alemanha e México. Dentro dos EUA, os
maiores beneficiários destas crises têm sido os banqueiros, bilionários da
alta tecnologia, importadores comerciais e exportadores do agro-negócio.
Confrontados com crises sistémicas, os dominadores do regime responderam
com o aprofundamento e expansão dos poderes dos presidentes dos EUA na
forma de decretos presidenciais. Para encobrir a longa série de
derrocadas, denunciantes patriotas foram encarcerados e a vigilância
estilo estado-policial infiltrou-se em todo sector da cidadania.
Os presidentes Bush, Clinton e Obama definiram a trajectória das guerras
imperiais e da pilhagem da Wall Street. A polícia de estado, as
instituições militares e financeiras estão firmemente incorporadas na
matriz do poder. Centros financeiros, como a Goldman Sachs, têm
reiteradamente estabelecido a agenda e controlado o Departamento do
Tesouro dos EUA e as agências que regulam o comércio e a banca. As
"instituições permanentes" do estado permaneceram, enquanto presidentes,
pouco importando de que partido, foram baralhados nos pormenores do
"Gabinete Oval".
O "Primeiro Negro" presidente Barack Obama prometeu paz e prosseguiu com
sete guerras. Seu sucessor, Donald Trump, foi eleito com promessas de
"não-intervenção" e imediatamente adoptou o "bastão de bombardeamento" de
Obama: o minúsculo Iémen foi atacado pelas forças dos EUA; aliados da
Rússia na região do Donbass da Ucrânia foram atacados de modo selvagem
pelos aliados de Washington em Kiev e o "mais realista" representante de
Trump, Nikki Haley, adoptou uma atitude belicosa na ONU no estilo da
"Madame Intervenção Humanitária" Samantha Power, zurrando invectivas
contra a Rússia.
Onde está a mudança? Trump seguiu Obama ao aumentar sanções contra a
Rússia, enquanto ameaça a Coreia do Norte com aniquilação nuclear no
rastro da grande acumulação militar de Obama na península coreana. Obama
lançou uma guerra por procuração contra a Síria e Trump escalou a guerra
aérea sobre Raqqa. Obama cercou a China com bases militares, navios e
aviões de guerra e Trump marchou em frente com retórica guerreira. Obama
expulsou um recorde de dois milhões de trabalhadores mexicanos ao longo de
oito anos; Trump seguiu-o ao prometer deportar ainda mais.
Por outras palavras, o presidente Trump obedientemente juntou-se à marcha
de acordo a trajectória dos seus antecessores, bombardeando os mesmos
países alvos enquanto plagia os seus discursos maníacos nas Nações Unidas.
Obama aumentou o tributo anual (ajuda) a Tel Aviv para uns entusiásticos
US$3,8 mil milhões enquanto balia umas poucas críticas pro-forma acerca
da expansão israelense ao sequestro de terras na Palestina; Trump propôs
deslocar a Embaixada dos EUA para Jerusalém enquanto choramingava um pouco
quanto às suas próprias mini-críticas aos colonatos judeus ilegais em
terras roubadas aos palestinos.
O que é esmagadoramente gritante é a semelhança das políticas e
estratégias de Obama e de Trump em política externa, seus meios e aliados.
O diferente é o seu estilo e retórica. Ambos os presidentes "Agentes de
mudança" imediatamente romperam as mesmas falsas promessas pré-eleitorais
e funcionam bem dentro dos limites das instituições permanentes do estado.
Quaisquer que sejam as diferenças que tenham elas são um resultado de
contextos históricos contrastantes. Obama assumiu no momento do colapso do
sistema financeiro e procurou regular bancos a fim de estabilizar
operações. Trump assumiu após a "estabilização" de um trilião de dólares
de Obama procura eliminar regulações – nas pegadas do presidente Clinton!
Assim, "demasiado barulho" acerca da "desregulação histórica" de Trump!
O "Inverno do descontentamento" na forma de protestos em massa contra a
proibição de Trump a imigrantes e visitantes de sete países
predominantemente muçulmanos segue-se directamente às "sete guerras
mortais" de Obama. Os imigrantes e refugiados são resultados directos das
invasões e ataques de Obama a estes países que levaram a assassinatos,
mutilações, deslocamentos forçados e miséria para milhões de
"predominantemente" (mas não exclusivamente) de muçulmanos. As guerras de
Obama criaram dezenas de milhares de "rebeldes", insurgentes e
terroristas. Os refugiados, que fogem pelas suas vidas, foram amplamente
excluídos dos EUA sob Obama e a maior tem procurado abrigos seguros nos
campos asquerosos e caóticos da UE.
Por terrível e ilegal que seja o encerramento da fronteira feito por
Trump a muçulmanos e por esperançosas que pareçam os protestos públicos
em massa, tudo isso é o resultado da política de quase uma década de
assassinato e agressão sob o presidente Obama.
Seguindo a trajectória da política, Obama derramou o sangue e Trump, no
seu estilo racista vulgar, é deixado a "limpar a confusão". Enquanto Obama
foi agraciado com um "Prémio Nobel da Paz", o irado Trump é fortemente
atacado por limpar o sangue!
Trump optou por pisar o caminho do opróbrio e enfrenta a ira do
purgatório. Enquanto isso, Obama está a jogar golf, a surfar ao vento e
exibir o seu sorriso despreocupado aos escrevinhadores que o adoram nos
mass media.
Quando Trump pisa com força o caminho preparado por Obama, centenas de
milhares de manifestantes enchem as ruas para protestar conta o
"fascista", com grande número das principais redes de mass media, dúzias
de plutocratas e "intelectuais" de todos os géneros, raças e credos a
retorcerem-se em ultraje moral! Fica-se confuso com o silêncio
ensurdecedor destes mesmos activistas e forças quando as guerras
agressivas os ataques de Obama levaram às mortes e deslocamentos de
milhões de civis, principalmente muçulmanos e principalmente mulheres –
quando seus lares, festas de casamento, mercados, escolas e funerais foram
bombardeados.
Chega de confusionismo americano! Dever-se-ia tentar entender as
possibilidades que se levantam de um sector maciço finalmente a romper seu
silêncio quando o belicismo do loquaz Obama foi transformado na marcha
bruta de Trump para o juízo final.
Perspectivas optimistas
Há muitos que desesperam mas há mais que se tornaram conscientes.
Identificaremos as perspectivas optimistas e as esperanças realistas
enraizadas na realidade e tendências actuais. Realismo significa discutir
desenvolvimentos contraditórios e polarizadores e portanto não aceitamos
quaisquer resultados "inevitáveis". Isto significa que resultados são
"terreno contestado" onde factores subjectivos desempenham um papel
importante. A interface de forças em conflito pode resultar numa espiral
ascendente ou descendente – rumo a maior igualdade, soberania e libertação
ou maior concentração de riqueza, poder e privilégio.
A mais retrógrada concentração de poder e riqueza encontra-se na
oligárquica União Europeia de dominação alemã – uma configuração que está
sob assédio por forças populares. Os eleitores do Reino Unidos optaram por
sair da UE (Brexit). Em consequência, a Grã-Bretanha enfrenta uma ruptura
com a Escócia e Gales e uma ainda maior separação da Irlanda. O Brexit
levará a uma nova polarização quando banqueiros com base em Londres
partirem para a UE e líderes do mercado livre confrontarem trabalhadores,
proteccionistas e a massa crescente dos pobres. O Brexit fortalece forças
nacionalistas-populistas e de esquerda na França, Polónia, Hungria e
Sérvia e estilhaça a hegemonia neoliberal na Itália, Espanha, Grécia,
Portugal e alhures. O desafio aos oligarcas da UE é que a insurgência
popular intensificará a polarização social e pode trazer à tona movimentos
de classe progressistas ou partidos e movimentos
autoritários-nacionalistas.
A ascensão de Trump ao poder e seus decretos executivos levou a polarizar
muitos os eleitorados, aumentou a politização e a acção directa. O
despertar da América aprofunda fissuras internas entre democratas com "d"
minúsculo, mulheres progressistas, sindicalistas, estudantes e outros
contra os oportunistas do Partido Democrata com "D" maiúsculo,
especuladores, antigos belicistas Democratas, burgueses negros do Partido
"D" (os líderes extraviados) e um pequeno exército de ONGs financiadas por
corporações.
O abraço de Trump à agenda militar Obama-Clinton e da Wall Street levará
a uma bolha financeira, gastos militares inchados e guerras mais custosas.
Isto dividirá o regime dos seus apoiantes sindicais e da classe
trabalhadora agora que o gabinete de Trump é compostos inteiramente de
bilionários, ideólogos, sionistas raivosos e militaristas (em oposição à
sua promessa de nomear homens de negócios e realistas duros para
negociar). Isto poderia criar uma oportunidade rica para a ascensão de
movimentos que rejeitariam a cara realmente feia do regime reaccionário de
Trump.
A animosidade de Trump à NAFTA (Acordo de Livre Comércio da América do
Norte) e a defesa do proteccionismo e da exploração financeira e de
recursos minará os regimes corruptos, assassinos e narco-liberais que têm
dominado o México durante os últimos 30 anos desde os dias de Salinas. A
política anti-imigração de Trump levará mexicanos a escolherem "combater
ou fugir" ao confrontar o caos social criado pelos gangs narco e da
polícia. Isto forçará o desenvolvimento de mercados internos e indústrias
do México. O consumo de massa interno e a propriedade abarcará movimentos
nacionais-populares. O cartel da droga e seus patrocinadores políticos
perderão os mercados estado-unidenses e enfrentarão oposição interna.
O protecionismo de Trump limitará o fluxo ilegal de capital a partir do
México, o qual montou a US$48,3 mil milhões em 2016, ou 55% da dívida do
México. A transição do México da dependência e do neocolonialismo
polarizará profundamente o estado e a sociedade; o resultado será
determinado pelas forças de classe.
As ameaças económicas e militares de Trump contra o Irão fortalecerão
forças nacionalistas, populistas e colectivistas em relação a políticos
neoliberais "reformistas" e pró ocidentais. A aliança anti-imperialista do
irão com o Iémen, Síria e Líbano solidificar-se-á contra o quarteto
conduzido pelos EUA da Arábia Saudita, Israel, Grã-Bretanha e EUA.
O apoio de Trump ao apresamento maciço de terra palestina por Israel e
sua proibição "só judeus" contra muçulmanos e cristãos levará ao sacudir
dos quislings multi-milionários da Autoridade Palestina e a ascensão de
muitos mais levantamentos e intifadas.
A derrota do ISIS fortalecerá forças governamentais independentes no
Iraque, Síria e Líbano, enfraquecendo a alavancagem imperial dos EUA e
abrindo a porta a lutas populares democráticas e laicas.
A campanha anti-corrupção em grande escala e a longo prazo do presidente
da China, Xi Jinping, levou à prisão e remoção de mais de um quarto de
milhão de responsáveis e homens de negócios, incluindo bilionários líderes
de topo do Partido. As prisões, processos e encarceramentos reduziram do
abuso do privilégio, mas, mais importante, melhorou as perspectivas para
um movimento de desafio às vastas desigualdades sociais. Aquilo que
começou "de cima" provocou movimentos "de baixo". O ressuscitar de um
movimento rumo a valores socialistas pode ter um grande impacto sobre
estados vassalos dos EUA na Ásia.
O apoio da Rússia a direitos democráticos no Leste da Ucrânia e a
reincorporação da Crimeia através de referendo pode limitar regimes
fantoches dos EUA no flanco sul da Rússia e reduzir a intervenção
estado-unidense. A Rússia pode desenvolver laços pacíficos com estados
europeus independentes com a ruptura da UE e a vitória eleitoral de Trump
sobre a ameaça de guerra nuclear do regime Obama-Clinton.
O movimento à escala mundial contra o globalismo imperialista isola a
direita apoiada pelos EUA que tomou poder na América do Sul. A procura do
Brasil, Argentina e Chile de pactos comerciais neoliberais está na
defensiva. Suas economias, especialmente na Argentina e Brasil,
assistiram a um triplicar do desemprego, quadruplicar da dívida externa,
estagnação até crescimento negativo e agora enfrentam greves gerais com
apoio de massa. A adulação do neoliberalismo está a provocar luta de
classe. Isto pode derrubar a ordem pós Obama na América Latina.
Conclusão
Por todo o mundo e no interior dos países mais importantes, a ordem
ultra-neoliberal do último quarto de século está em desintegração. Há uma
ascensão maciça de movimentos a partir de cima e de baixo, de democratas
de esquerda a nacionalistas, de populistas independente a reaccionários da
direita "velha guarda". Um universo polarizado e fragmentado emergiu. O
começo do fim da actual ordem imperial-globalista está a criar
oportunidades para uma nova ordem dinâmica democrático colectivista. Os
oligarcas e as elites da "segurança" não cederão facilmente a exigências
populares nem se afastarão. Facas serão afiadas, decretos executivos
avançarão e golpes eleitorais serão encenados para tentar tomar poder. Os
movimentos democrático-populares emergentes precisam ultrapassar a
fragmentação da identidade e estabelecer líderes unificados e igualitários
que possam actuar decisivamente e independentemente afastando-se dos
líderes políticos existentes que fazem gestos dramáticos, mas falsos,
enquanto procuram um retorno ao fedor e imundície do passado recente.
09/Fevereiro/2017
O original encontra-se em http://petras.lahaine.org/?p=2127
In
RESISTIR.INFO
http://resistir.info/petras/petras_09fev17.html
9/2/2017
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário