quarta-feira, 20 de setembro de 2017
A ofensiva do Outono: EUA, França e Brasil
por James Petras
O Outono de 2017 testemunhará o mais brutal assalto aos padrões de vida
da classe trabalhadora e média desde o fim da II Guerra Mundial. Três
presidentes e seus aliados nos congressos irão "rever" legislações
trabalhistas, leis e regulamentos fiscais progressistas sobre o rendimento
e efectivamente acabarão com as economias mistas em França, nos EUA e no
Brasil.
Durante o Verão, a opinião pública foi desviada pelas ameaças dos EUA de
lançar novas guerras além-mar; pela retórica da França acerca de um pacto
Berlim-Paris pós Brexit, o qual refará a União Europeia; e pela corrupção
e escândalos criminais de Michel Temer, presidente do Brasil.
Estas controvérsias superficiais serão esmagadas por conflitos de classe
fundamentais, os quais prometem alterar relações estruturais presentes e
futuras dentro do capitalismo ocidental.
Ofensiva de Outono de Trump: Lucros, guerras e epidemias
O presidente Trump propõe enriquecer capitalistas e intensificar
desigualdades de classes através da sua transformação radical do sistema
fiscal. Impostos corporativos serão cortados pela metade, impostos
corporativos além-mar serão abolidos e trabalhadores assalariados pagarão
mais por menos benefícios sociais.
Trump pode contar com o apoio da liderança republicana, dos negócios e da
elite da banca assim como de sectores do Partido Democrata nos seus planos
para implementar uma maciça dádiva fiscal para os bilionários.
O gabinete de Trump, liderado pelo trio da Goldman Sachs e sua troika de
generais garantirá que o orçamento incluirá cortes de fundos para a
educação e saúde a fim de aumentar o gasto militar, expandir guerras e
cortar impostos para os ricos.
Mesmo ameaças mais agressivas contra a Coreia do Norte, Rússia, Irão,
Venezuela e China, maiores gastos com a guerra e com os níveis de tropas
no Afeganistão e a militarização aberta do policiamento, controle de
imigração e inteligência interna resultarão e cortes drásticos nos
programas federais para os pobres e as classes trabalhadoras. O acesso
declinante na qualidade de cuidados de saúde para trabalhadores e a
deterioração nas condições de segurança no lugar de trabalho alimentarão
a epidemia de vício nos opióides que levam centenas de milhares de mortes
prematuras de trabalhadores por overdoses, lesões e cuidados inadequados e
incompetentes.
Presidente Emmanuel Macron: A ofensiva capitalista em França
Em França, os trabalhadores e a classe média enfrentam o mais abrangente
ataque aos seus direitos de emprego e de legislação social progressista da
história moderna.
O presidente Emmanuel Macron declarou o seu objectivo de transferir
completamente o poder sócio-económico dos trabalhadores franceses para o
capital através da remoção de todas as leis e protecções ao trabalho.
Empregados terão de negociar com os seus patrões, uma fábrica e um
escritório de cada vez, minando dessa forma o poder da negociação
colectiva de uma classe trabalhadora unida. O patronato será livre para
contratar e despedir trabalhadores sem virtualmente quaisquer restrições
ou consequências. Contratos "lixo" temporários e a curto prazo
proliferarão, destruindo a estabilidade do trabalhador a longo prazo.
Macron eliminará os empregos de mais de 100 mil empregados da função
pública enquanto corta impostos corporativos em mais de 50 mil milhões de
euros.
Em contraste com cortes fiscais maciços para a burguesia, Macron propõe
aumentar impostos sobre pensionistas franceses, afectando milhões de
reformados. Uma vez em vigor, a agenda legislativa de Macron concentrará o
poder, os lucros e a riqueza do capital enquanto aumenta desigualdades e a
polarização de classe. Respondendo aos interesses económicos dos
banqueiros, Macron promete reduzir o défice para 3% do PIB através de
cortes maciços na saúde e educação.
Sob o pretexto de "reduzir o desemprego", Macron promoverá o emprego em
tempo parcial e temporário para a juventude francesa e trabalhadores
imigrantes, removendo de todos os trabalhadores franceses os seus ganhos
arduamente combatidos quanto à segurança de emprego e direitos laborais.
Macron justifica o seu assalto ao trabalho classificando os trabalhadores
como "preguiçosos".
Brasil: A grande liquidação
Michel Temer, o presidente não eleito do Brasil, planeia privatizar 57
empresas públicas – as jóias da coroa da economia brasileira. Isto
equivalerá à maior captura capitalista de activos em dois séculos!
Estão incluídos na liquidação: campos petrolíferos, linhas de transporte
de energia, rodovias, aeroportos, assim como a cunhagem da moeda e a
lotaria. A Eletrobrás, o maior produtor de electricidade da América
Latina, está disponível para qualquer um. Além disso, Temer planeia
aumentar taxas de juro cobradas pelo banco de desenvolvimento de
propriedade estatal, BNDES, para aumentar a fatia dos banqueiros privados
na concessão de empréstimos e nos lucros.
Esta captura nua de empresas estatais lucrativas por investidores
internos e estrangeiros levará à perda de centenas de milhares de empregos
e à redução de salários e pagamentos de pensões. Temer começou a cortar o
passivo em pensões do estado através do aumentou da idade de aposentação
em vários anos. Salários e benefícios sociais foram congelados no futuro
previsível. Decretos presidenciais, os quais ditam os termos de contratos
de trabalho, ameaçam a negociação colectiva.
A ofensiva capitalista: Resultados e perspectivas
Estes presidentes declararam sua intenção de lançar a "guerra de classe a
partir de cima" em plena escala – cujas consequências estão para ser
vistas. Os presidentes, os quais dominam por decreto, estão a pisar
terreno frágil. Cada um deles está a enfrentar grandes desafios políticos,
económicos e sociais.
Todos os três presidentes perderam apoio público desde a tomada de posse,
especialmente entre seus eleitores de classe média baixa e da classe
trabalhadora.
A aprovação de Macron caiu de 65% para 40%; a de Trump de 49% para 35% e
a de Temer (que não foi eleito) mal retém 5% (e em queda) de aprovação
pública.
Brasil: Enfrentando o abismo
Apesar das incertezas sobre a estabilidade do regime e o futuro,
investidores estrangeiros e a imprensa financeira apoia Temer.
O isolamento de Temer em relação ao público votante do Brasil enfraqueceu
o seu poder no Congresso e entre a elite bancária interna e entre as
corporações petrolíferas e de energia. Contudo, se o apelo de sindicatos a
greves militantes generalizadas de trabalhadores manufactureiros,
empregados públicos e do movimento de trabalhadores sem terra (MST) for
eficaz e paralisar a economia, Temer pode ser forçado a renunciar antes de
o seu programa ser implementado. Enquanto isso, o presidente Temer
enfrenta numerosas investigações judiciais por corrupção.
Estrategicamente, Temer pode contar com apoio internacional,
especialmente do Departamento de Estado dos EUA, do Tesouro, do Pentágono
e da União Europeia. Os regimes neoliberais na Argentina, Uruguai, Chile,
Paraguai, Peru, Colômbia e México exprimiram forte apoio a Temer,
especialmente porque eles também receberam subornos dos mesmos oligarcas
corporativos brasileiros! Sob Temer, a economia brasileira declinou em
mais 5% desde a sua tomada de posse num golpe de estado legislativo. Seu
défice orçamental excede os 9% e o desemprego duplicou para mais de 11%.
Apesar do apoio da elite estrangeira e interna, a presidência Temer não
sobreviverá. Sob a pressão de massa e eleições a aproximarem-se, o
Congresso do Brasil pode decidir permitir os tribunais de processarem
Temer e bloquear a sua proposta de liquidação de activos públicos.
Agências de classificação de crédito estão em vias de degradar a economia
do Brasil para o status de "lixo", reduzindo novos investimentos. Com
novas eleições no horizonte em 2018, é claro que Temer nem mesmo se
candidatará à presidência e suas propostas de privatizar a principais
empresas do Brasil podem não ter êxito. A recessão económica reduziu
drasticamente receitas fiscais e a possibilidade de receber qualquer
impulso significativo com a privatização é dúbia. Mesmo a medida
regressiva inicial de Temer – o corte de pensões públicas – atolou-se em
lutas burocráticas. Entretanto, a oposição à ofensiva capitalista de Temer
tem ainda de encontrar uma pancada decisiva e organizada.
A oposição no Congresso, liderada pelo partido de centro-esquerda PT, é
uma minoria com muitos dos seus líderes a enfrentarem seus próprios
julgamentos por corrupção. O PT é incapaz de bloquear, muito menos de
expulsar, Temer. A oposição de direita no Congresso está dividida entre
aqueles que apoiam Temer – com base no clientelismo – e aqueles que querem
substituir Temer e ao mesmo tempo prosseguir com a sua agenda
anti-trabalho. Os sindicatos, liderados pela CUT, têm efectuado protestos
esporádicos e feito gestos retóricos, ao passo que o MST (os trabalhadores
sem terra) e movimentos ecológicos e de sem abrigo associados, aos quais
falta apoio militante de massa urbana, seriam incapazes de derrubar Temer.
O ex-presidente Lula da Silva recuperou algum grau de apoio em massa de
eleitores mas enfrenta acusações de corrupção, as quais podem proibi-lo
de exercer cargos políticos – a menos que haja uma grande mobilização de
massa.
Em suma, a ofensiva pró capitalista da direita no Brasil é abrangente –
oferecendo activos públicos e lucros privados – mas fraca em apoio
institucional e de fundamentos económicos.
Um grande impulso da esquerda poderia minar a base política para a equipe
económica de Temer, entretanto não está claro qual partido ou líderes o
substituiriam.
França: Bonaparte no palácio, trabalhadores nas ruas
Quando o presidente Emmanuel Macron foi eleito presidente da Quinta
República ele trouxe consigo uma base eleitoral de massa bem como o apoio
das principais organizações de negócios e da banca francesa. Contudo, nas
vésperas do lançamento da sua ofensiva capitalista a base de massa
evaporou-se. A desaprovação eleitoral está a ascender rapidamente. A ala
militante dos sindicatos (CGT) prepara-se para lançar uma greve geral. Sua
agenda fiscal regressiva alienou vastos sectores da pequena burguesia,
especialmente empregados do sector público.
A concentração do poder executivo de Macron (seu complexo bonapartista)
voltou seus aliados de direita contra ele.
O resultado da ofensiva de Macron é incerto.
Em primeiro lugar, Macron desfruta de maioria no Congresso francês. A
economia está em crescimento e investidores estão exuberantes. Grupos de
pequenos negócios com consciência fiscal estão felizes. O trabalho está
dividido com os colaboracionistas de classe da CFDT e FO a recusarem-se a
aderir à oposição sindical.
A União Europeia está unida, até certo ponto, no seu apoio a Macron.
Igualmente importante, Macron está determinado a esmagar protestos de rua
e greves esporádicas parciais com apelos demagógicos através dos mass
media corporativos, com coerção e repressão sem rodeios por parte do
estado.
Os partidos de oposição política, liderados pelos socialistas de esquerda
e pelos nacionalistas, estão divididos. O Partido Socialista mal existe.
Pensionistas e estudantes opõem-se a Macron, mas não foram às ruas. Poucos
entre a classe profissional e a academia liberal mantém quaisquer ilusões
acerca do "novo presidente centrista" mas não estão desejosos de
confrontar activamente o novo Bonaparte.
Macron moldou uma formidável aliança entre o aparelho de estado e a
classe dominante dos negócios para esmagar a oposição dos trabalhadores.
Mas a oposição popular está a crescer e está furiosa quanto à agenda e
insultos. "Eles (trabalhadores franceses) já tiveram quanto baste..." Para
derrotar Macron, devem unir a oposição e construir uma estratégia de
guerra de classe prolongada.
Macron não cederá diante de greves transitórias. Se a ofensiva
capitalista de Macron tiver êxito, haverá enormes implicações para a
classe trabalhadora francesa, especialmente os direitos de trabalhadores e
empregados assalariados para organizar e lutar. Uma vitória em favor de
Macron minará profundamente a estrutura e a militância de organizações
populares, agora e no futuro. Além disso, uma derrota dos trabalhadores
franceses repercutirá através da UE e além dela. Inversamente, uma vitória
do trabalho poderia disparar lutas de massa por toda a Europa.
Os Estados Unidos
Uma oposição poderosa poderia confrontar a ofensiva capitalista do
presidente Trump, mas não será liderada pelos sindicatos altamente
burocratizados que representam menos de 8% da força de trabalho do sector
privado. Os inimigos de Trump entre a elite dos Partidos Democrata e
Republicano etiquetaram os apoiantes de Trump da "classe trabalhadora"
como "adeptos da supremacia branca e neo-nazis". As preocupações dos
trabalhadores americanos foram banalizadas e marginalizadas pela política
divisionista da "identidade", tão descaradamente utilizada por ambos os
partidos. A ofensiva capitalista de Trump a favor de cortes fiscais
regressivos pró corporativos e do estripamento do bem estar social (saúde,
educação, habitação, ambiente e segurança do trabalhador) não conseguiu
provocar oposição social sustentada e unificada. Nos EUA, as elites pró
negócios dominam e ditam as agendas tanto do regime Trump em vigor como
das "forças de oposição da elite".
A "oposição anti-Trump oficial", a qual auto-denomina-se como uma
"resistência", promove interesses "identitários" ligados à representação
da elite política. Ela trabalha arduamente para minar qualquer
possibilidade de unidade da classe trabalhadora com base em interesses
sócio-económicos comuns ao centrar-se em questões marginais e divisivas.
Em meio à pobreza em massa, declínio da expectativa de vida e de uma
epidemia de suicídios e mortes por overdose de drogas, as forças de
"resistência" da oposição de elite concentram-se em conspirações
estrangeiras fabricada ("Russia-gate") e em questões de estilo de vida
(transgéneros nas Forças Especiais dos EUA) para o derrube do regime
Trump. Elas não têm intenção de forjar quaisquer alianças de classe que
possam ameaçar a agenda capitalista regressiva de Trump.
A luta nos EUA neste Outono não será entre trabalho e capital. Ela porá
em destaque a contradição entre o que resta da agenda proteccionista dos
negócios de Trump e as políticas neoliberais de livre comércio dos
democratas. A ofensiva capitalista contra o trabalho nos EUA já foi
determinada por defeito. Os sindicatos oficiais estado-unidenses são
actores marginais e inconsequentes, incapazes e não desejosos de
politizar, educar e mobilizar os trabalhadores.
A ofensiva capitalista de Trump apela a investidores e promove o mercado
de acções. A maior parte da sua equipe económica está ligada a banqueiros
da Wall Street contra os assim chamados nacionalistas económicos. A
retórica descuidada e chauvinista de Trump para o populacho é abertamente
desprezada pelos plutocratas dentro do seu próprio gabinete, os quais se
queixam de terem sido criticados por "fascistas e anti-semitas"
(referindo-se à base eleitoral deplorável e irada de Trump).
Os Estados Unidos são o único país no mundo industrial a lançarem uma
ofensiva maciça e sustentada sem uma oposição anti-capitalista. A classe
trabalhadora americana é abertamente "deplorada" pelos principais
elementos da oposição de elite e descaradamente manipulada pelo seu falso
"campeão", Trump.
As consequências estão pré-determinadas. A ofensiva capitalista não pode
perder; ambos os lados capitalistas "vencem". Sob o presidente-homem de
negócios Trump, as corporações multinacionais garantirão impostos mais
baixos e degradarão padrões de vida da classe trabalhadora e benefícios
sociais. Acordos bi-partidários assegurarão que os bancos sejam
completamente desregulamentados. A oposição de elite anti-Trump assegurará
que os "seus" capitalistas obtêm acordos comerciais neoliberais
favoráveis, garantindo o seu acesso ao trabalho imigrante barato e a uma
força de trabalho não sindicalizada a que é negada segurança no lugar de
trabalho e regulamentações ambientais.
Enquanto a França e o Brasil enfrentam guerra de classe real, os "sem
classe" dos EUA rumam desengonçadamente para a guerra nuclear. Macron
confronta sindicatos militantes, Temer enfrenta a fúria de vastas alianças
sociais e Donald Trump marcha atrás dos "seus generais" para a
conflagração nuclear. Ele invade propriedades diplomáticas russas, aponta
armas nucleares a Moscovo e Pequim, efectua maciços exercícios ofensivos,
estaciona mísseis THAAD na fronteira da Coreia do Norte e escala forças
operacionais de terra e ar numa guerra perdida de 16 anos no Afeganistão.
Trabalhadores na Europa e América Latina optam por combater capitalistas
em defesa dos seus interesses de classe, aos passo que trabalhadores dos
EUA tornaram-se espectadores passivos diante da possibilidade que avança
de guerra nuclear, quando não estão num estupor induzido por receitas de
opióides. Derrotando a ofensiva capitalista em França e no Brasil pode
avançar a causa da justiça social e assegurar benefícios concretos para
os trabalhadores e as massas populares; mas a ofensiva capitalista e
militar de Trump enviará nuvens de cinzas nucleares por todo o mundo.
14/Setembro/2017
O mais recente livro de James Petras: The End of the Republic and the
Delusion of Empire
O original encontra-se em
axisoflogic.com/artman/publish/Article_77404.shtml
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In
RESISTIR.INFO
http://resistir.info/petras/petras_14set17.html
14/9/2017
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