quinta-feira, 12 de março de 2020
Os retrocessos do governo na política agrária, agrícola e ambiental –
por Stédile
Bolsonaro favoreceu latifundiários, agronegócio, madeireiros e mineradoras
O 1º ano do governo do capitão Jair Bolsonaro representou uma clara
opção de políticas para o campo, de favorecimento aos interesses do
capital, representados pelos latifundiários, agronegócio, madeireiros,
mineradoras, grileiros e as empresas transnacionais do agro. Em
contraposição, houve enormes retrocessos nas políticas agrária, agrícola
e ambiental, prejudicando a todos trabalhadores/as rurais e a ampla
maioria do povo brasileiro. Confira a seleção que fizemos das principais
medidas:
1. Paralisação da reforma agrária. Nenhuma fazenda foi desapropriada. A
Constituição é clara: todas as grandes fazendas improdutivas (em
geral acima de 1.000 hectares) devem ser desapropriadas. Paga-se ao
latifundiário com títulos da dívida agrária e distribui-se às
famílias sem terra. Nenhuma família foi assentada;
2. Nenhuma área indígena foi demarcada ou legalizada. Há 236 processos
de demarcação de áreas indígenas paralisados em diversas fases do
andamento. Alguns foram acionados por decisão judicial, tal o
desmando do governo. Foram registrados no ano 160 casos de invasões
e agressões a povos indígenas por latifundiários, madeireiros,
mineradoras e garimpeiros. (fonte CPI-SP);
3. Nenhuma área quilombola foi demarcada ou legalizada. Existem 3.000
comunidades reconhecidas pelo Estado sem demarcação (mas o movimento
quilombola-CONAQ estima existirem ao redor de 6.000 comunidades) e
há 1.719 processos de titulação paralisados no Incra;
4. Edição da MP 910 normatizando a legalização de terras públicas
griladas na Amazônia Legal por latifundiários, bastando
autodeclaração de que já estão ocupando;
5. Aprovação no Congresso, por iniciativa do governo, de normas para
privatizar a venda de água potável e o saneamento, entregando para
as empresas e ao capital estrangeiro;
6. Envio de medida provisória autorizando a venda de terras para o
capital estrangeiro (ainda não aprovada pelo Congresso)! No passado,
até as Forças Armadas se opuseram, por ferir a soberania nacional.
Agora, no governo, calam-se!
7. Paralisação do programa de compra antecipada de alimentos-PAA. O
programa administrado pela Conab chegou a aplicar mais de R$ 1
bilhão por ano, (em 2019, foram aplicados apenas R$ 92 milhões) e
representava um estimulo à produção de alimentos saudáveis e uma
garantia aos camponeses que poderiam vender ao governo, recebendo à
vista. A Conab comprava mais de 360 tipos de alimentos que eram
destinados a hospitais, escolas, creches, presídios, quartéis,
cestas básicas aos pobres, etc;
8. Paralisação do Pronera. O programa estimulava as universidades
públicas a construírem cursos especiais na forma de alternância,
realizando vestibular específico para filhos de camponeses. Isso
permitia que eles ficassem 2 meses em aulas e 2 meses de volta às
suas comunidades. Milhares de jovens do interior tiveram acesso à
universidade, formaram-se e permaneceram no campo, graças a esse
programa;
9. Paralisação dos programa de Ates: assistência técnica e fomento para
agricultura familiar e assentamentos. Milhares de agrônomos,
veterinários, assistentes sociais, perderam emprego. E centenas de
comunidades perderam assistência técnica;
10. Paralisação do programa de habitação rural dentro do programa Minha
Casa Minha Vida. Há ainda um enorme deficit de moradias no campo. O
programa organizava a construção de moradias novas e financiava
reformas em assentamentos e comunidades rurais de agricultura familiar;
11. Paralisação da implantação do Pronaro (Programa Nacional de Redução
do Uso de Agrotóxicos) e do programa nacional de apoio à
agroecologia. Os 2 programas foram transformados em lei, porém o
atual governo simplesmente os ignorou nas políticas e no orçamento
da União;
12. Liberação de 502 novos rótulos de agrotóxicos, muitos deles
proibidos de serem vendidos nos países de origem. Flexibilizaram os
parâmetros de avaliação, monitoramento de toxidez e assim fazem a
política que interessa apenas aos interesses das 5 grandes empresas
transnacionais: Bayer/Monsanto, Basf, Dupont, Shellquimica e
Syngenta. Atualmente, mais de a metade dos alimentos que chegam aos
supermercados estão contaminados por venenos agrícolas. Que segundo
o Inca (Instituto Nacional do Câncer)e a Fiocruz, afetam a saúde de
toda população, gerando inclusive alguns tipos de câncer;
13. Liberação do porte de armas, de qualquer calibre, em toda extensão
das fazendas. Essa medida interessa apenas às fábricas de armas e
induz aos latifundiários a impunidade e a contratação de
pistoleiros. Como se os problemas de conflitos de terra ou de roubos
no meio rural se resolvessem com porte de armas. A responsabilidade
pela segurança pública é do Estado! Voltamos à idade média, à lei do
mais forte ou do melhor armado;
14. Estímulo à violência, com a impunidade garantida aos policiais. Em
diversos Estados, houve durante o ano ações de despejos de famílias
acampadas (e também em cidades) sem que houvesse autorização
judicial ou qualquer negociação para definir aonde seriam colocadas
as famílias. Esses abusos foram cometidos por autoridades policiais,
locais, que influenciadas pelo latifundiário e pelo discurso
ideológico bolsonarista cometerem esses abusos à revelia da lei;
15. Aumento da violência dos latifundiários no campo, em especial na
fronteira agrícola, para disputa de terras. A CPT registrou aumento
dos conflitos durante 2019 e a ocorrência de 29 assassinatos de
lideranças, incluindo indígenas e quilombolas;
16. A aprovação da reforma da Previdência retirou direitos da imensa
maioria dos trabalhadores/as rurais, aumentando a idade de
aposentadoria e diminuindo valores e número de benefícios do INSS
para o campo. Essa medida afeta a distribuição de renda no campo,
aumenta as dificuldades das famílias que dependiam desses benefícios
e inviabilizará a economia de diversos municípios do interior do país;
17. Liberalização das regras para registro e monitoramento de novas
plantas transgênicas (OGMs), potencializando o risco dessas
tecnologias para a saúde humana, animal e ao meio ambiente já que se
isentou os necessários estudos sobre impactos no meio ambiente e na
saúde das pessoas;
18. Nomeação de ministro de Meio Ambiente condenado por crime ambiental;
e do deputado Valdir Colatto (MDB-SC) para presidência do Serviço
Florestal Brasileiro. Ambos têm curriculum e comportamento
claramente anti-meio ambiente e preservação da natureza;
19. Nomeação de policiais e ex-policiais em substituição a especialistas
no Ministério do Meio Ambiente; ameaças a servidores públicos no
cumprimento de suas obrigações na gestão ambiental em todo o país;
desativação dos conselhos paritários de gestão ambiental,
desmantelamento do sistema nacional de monitoramento ambiental e fim
do diálogo com organizações da sociedade;
20. Estímulo ao desmatamento e queimadas de florestas na Amazônia. “Eu
sou o capitão motosserra”, pregou o presidente; em 2015, foram
desmatados 6.207 quilômetros quadrados, e, agora em 2019, atingiu a
9.762 quilômetros quadrados, com aumento de 50%;
21. Estímulo à invasão de áreas públicas e de proteção ambiental. A
edição da MP 901 pretende diminuir o percentual de reserva legal nos
imóveis dos latifundiários e diminui o número de áreas de
conservação natural pertencentes à União;
22. Estímulo à mineração ilegal em áreas indígenas e de proteção ambiental;
23. Suspensão da proibição do plantio de cana de açúcar nos biomas do
pantanal e da Amazônia. Esse monocultivo vai gerar enormes problemas
ambientais nas duas regiões, como advertiram os cientistas;
24. Criminalização de militantes de ONGs e movimentos em defesa do meio
ambiente; como o exemplo patético da prisão injusta de ativistas na
Amazônia, manipulada por policiais e madeireiros bolsonaristas;
25. Criminalização e perseguição a pesquisadores e cientistas de
instituições públicas de pesquisa voltadas para questão ambiental;
26. Impunidade às mineradoras que cometeram crimes ambientais e causaram
a morte de centenas de pessoas em Minas Gerais e no Pará, sem que
até agora as famílias e as regiões tenham sido reparadas. O Estado
está ausente, o Ministério Público finge que fiscaliza, e as
mineradoras seguem se apropriando de bilhões de lucro por ano;
27. Desmantelamento do programa de construção de cisternas no semiárido
nordestino. Mantiveram-se apenas os contratos antigos. Os recursos
caíram de R$ 26 milhões em 2015, para apenas R$ 10 milhões em 2019.
Nos governos Lula-Dilma, investiu-se mais de R$ 1 bilhão na
construção de cisternas para abastecimento de água da chuva às
famílias camponesas;
28. Desmantelamento e aparelhamento do Incra pela UDR (famigerada União
Democrática Ruralista –entidade dos latifundiários que organizava a
violência contra os trabalhadores rurais), nomeação de pessoas que
são contra a reforma agrária. E até de policiais em
superintendências estaduais;
29. Centenas de comunidades de povos indígenas, quilombolas e
assentamentos perderam atenção médica com o fim do programa Mais
Médicos e a presença dos médicos cubanos, únicos que se dispunham a
atender essas comunidades;
30. A adesão do governo Bolsonaro ao acordo de livre comércio entre
Mercosul e União Europeia. Felizmente contestado até por diversos
países europeus e certamente será vetado pela Argentina pois
colocava em risco não só a indústria brasileira e do Cone Sul, mas
também a produção da agricultura familiar, de leite, queijos e
vinho, entre outros produtos, pela liberação total da entrada de
produtos europeus;
31. A política de abandono da agricultura familiar teve consequências
também na indústria de máquinas agrícolas. Em 2015, vendeu-se 262
tratores e, em 2019, foram vendidos apenas 46.457 tratores;
32. O projeto de lei que pretende eliminar 1.247 pequenos municípios
brasileiros. Com isso, dificultará o acesso da população interiorana
mais pobre aos serviços de educação, saúde, de bancos e do correio,
lá oferecidos.
/*Editado pelo Poder 360/
In
MST
https://mst.org.br/2020/01/02/os-retrocessos-do-governo-na-politica-agraria-agricola-e-ambiental-por-stedile/
2/1/2020
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