quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Um balanço do governo Bolsonaro





 por João Pedro Stedile

Uma lista das 32 medidas da presidência de Jair Bolsonaro mais
prejudiciais aos trabalhadores/as rurais e à ampla maioria do povo
brasileiro.



        *do A Terra é Redonda*


        *Um balanço do governo Bolsonaro
        <https://aterraeredonda.com.br/um-balanco-do-governo-bolsonaro/>*


        *por João Pedro Stedile*

O primeiro ano do governo do capitão Jair Bolsonaro representou uma
clara opção de políticas para o campo, de favorecimento aos interesses
do capital, representados pelos latifundiários, agronegócio,
madeireiros, mineradoras, grileiros e as empresas transnacionais do
agro. Houve enormes retrocessos nas políticas agrária, agrícola e
ambiental, prejudicando a todos trabalhadores/as rurais e a ampla
maioria do povo brasileiro.

Confira a seleção que fizemos das principais medidas:

*(1) Paralisação da reforma agrária.*

Nenhuma fazenda foi desapropriada. A Constituição é clara: todas as
grandes fazendas improdutivas (em geral acima de 1.000 hectares) devem
ser desapropriadas. A legislação indica que se paga o latifundiário com
títulos da dívida agrária e distribui-se o terreno às famílias sem
terra. Nenhuma família foi assentada.

*(2) Nenhuma área indígena foi demarcada ou legalizada.*

Há 236 processos de demarcação de áreas indígenas paralisados em
diversas fases do andamento. Alguns foram acionados por decisão
judicial, tal o desmando do governo. Foram registrados no ano 160 casos
de invasões e agressões a povos indígenas por latifundiários,
madeireiros, mineradoras e garimpeiros. (fonte CPI-SP).

*(3) Nenhuma área quilombola foi demarcada ou legalizada.*

Existem 3.000 comunidades reconhecidas pelo Estado sem demarcação (mas o
movimento quilombola-CONAQ estima existirem ao redor de 6.000
comunidades) e há 1.719 processos de titulação paralisados no Incra.

*(4) Edição da MP 910.*

Essa medida provisória normatiza a legalização de terras públicas
griladas na Amazônia Legal por latifundiários, bastando autodeclaração
de que já estão ocupando.

*(5) Privatização da água.*

Aprovação pelo Congresso Nacional, por iniciativa do governo, de normas
para privatizar a venda de água potável e o saneamento, entregando esses
serviços para as empresas e para o capital estrangeiro.

*(6). Venda de terras para o capital estrangeiro.*

O governo enviou ao Congresso uma medida provisória (ainda não aprovada)
autorizando a venda de terras para o capital estrangeiro. No passado,
até as Forças Armadas se opuseram a isso, considerando que violava a
soberania nacional. Agora, no governo, calam-se!

*(7) Paralisação do programa de compra antecipada de alimentos-PAA.*

O programa administrado pela Conab chegou a aplicar mais de R$ 1 bilhão
por ano, (em 2019, foram aplicados apenas R$ 92 milhões). Representava
um estimulo importante à produção de alimentos saudáveis e uma garantia
aos camponeses que poderiam vender ao governo, recebendo à vista. A
Conab comprava mais de 360 tipos de alimentos que eram destinados a
hospitais, escolas, creches, presídios, quartéis, cestas básicas aos
pobres, etc.

*(8) Paralisação do Pronera.*

O programa estimulava as universidades públicas a construírem cursos
especiais na forma de alternância, realizando vestibular específico para
filhos de camponeses. Isso permitia que eles ficassem dois meses em
aulas e dois meses de volta às suas comunidades. Milhares de jovens do
interior tiveram acesso à universidade, formaram-se e permaneceram no
campo, graças a esse programa.

*(9) Paralisação dos programas de Ates.*

Leia também:  Fux deve suspender criação de juiz de garantias
 <https://jornalggn.com.br/justica/fux-deve-suspender-criacao-de-juiz-de-garantias/>

Foram paralisados todos os programas de assistência técnica e fomento
para agricultura familiar e assentamentos. Milhares de agrônomos,
veterinários, assistentes sociais, perderam emprego. E centenas de
comunidades perderam assistência técnica.

*(10) Paralisação do programa de habitação rural.*

O módulo existente para a habitação rural dentro do programa Minha Casa
Minha Vida foi extinto. Há ainda um enorme déficit de moradias no campo.
O programa organizava a construção de moradias novas e financiava
reformas em assentamentos e comunidades rurais de agricultura familiar.

*(11) Paralisação da implantação do Pronaro.*

Interromperam o Programa Nacional de Redução do Uso de Agrotóxicos e o
programa nacional de apoio à agroecologia. Os dois programas foram
transformados em lei, porém o atual governo simplesmente os ignorou nas
políticas e no orçamento da União.

*(12) Liberação de agrotóxicos.*

Autorizaram a liberação de 502 novos rótulos de agrotóxicos, muitos
deles proibidos de serem vendidos nos países de origem. Foram
flexibilizados os parâmetros de avaliação, monitoramento de toxidez e
assim fazem a política que interessa apenas aos interesses das cinco
grandes empresas transnacionais: Bayer/Monsanto, Basf, Dupont,
Shellquimica e Syngenta. Atualmente, mais de a metade dos alimentos que
chegam aos supermercados estão contaminados por venenos agrícolas. Que
segundo o Inca (Instituto Nacional do Câncer) e a Fiocruz, afetam a
saúde de toda população, gerando inclusive alguns tipos de câncer.

*13. Liberação do porte de armas.*

Autorizaram o porte de arma de qualquer calibre, em toda a extensão das
fazendas. Essa medida interessa apenas às fábricas de armas e induz aos
latifundiários à impunidade e à contratação de pistoleiros. Como se os
problemas de conflitos de terra ou de roubos no meio rural se
resolvessem com porte de armas. A responsabilidade pela segurança
pública é do Estado! Assim, voltamos à Idade Média, à lei do mais forte
ou do melhor armado.

*(14) Estímulo à violência.*

Esse incentivo é agravado pela garantia de impunidade aos policiais. Em
diversos Estados, houve durante o ano ações de despejos de famílias
acampadas (e também em cidades) sem que houvesse autorização judicial ou
qualquer negociação para definir aonde seriam colocadas as famílias.
Esses abusos foram cometidos por autoridades policiais, locais, que
influenciadas pelo latifundiário e pelo discurso ideológico bolsonarista
cometerem esses abusos à revelia da lei.

Leia também:  TV GGN: O caso Adélio, o atentado da década continua um
caso mal explicado, por Luis Nassif
 <https://jornalggn.com.br/tv-ggn/tv-ggn-o-caso-adelio-o-atentado-da-decada-continua-um-caso-mal-explicado-por-luis-nassif/>

*(15)* *Aumento da violência dos latifundiários.*

No campo, em especial na fronteira agrícola, aumentou o uso da violência
pelos latifundiários nas disputas por terras. A CPT registrou aumento
dos conflitos durante 2019 e a ocorrência de 29 assassinatos de
lideranças, incluindo indígenas e quilombolas.

*(16) A aprovação da reforma da Previdência.*

Exigência do mercado financeiro, a reforma da Previdência retirou
direitos da imensa maioria dos trabalhadores/as rurais, aumentando a
idade de aposentadoria e diminuindo valores e número de benefícios do
INSS para o campo. Essa medida afeta a distribuição de renda no campo,
aumenta as dificuldades das famílias que dependiam desses benefícios e
inviabilizará a economia de diversos municípios do interior do país.

*(17) Liberalização das regras para plantas transgênicas.*

Afrouxamento das regras para registro e monitoramento de novas plantas
transgênicas (OGMs), potencializando o risco dessas tecnologias para a
saúde humana, animal e ao meio ambiente já que se isentou os necessários
estudos sobre impactos no meio ambiente e na saúde das pessoas.

*(18). Nomeações espúrias.*

Nomeou-se para Ministro de Meio Ambiente um indivíduo condenado por
crime ambiental. Junte-se a isso a escolha do deputado Valdir Colatto
(MDB-SC) para presidência do Serviço Florestal Brasileiro. Ambos
têm /curriculum/ e comportamento claramente anti-meio ambiente e
preservação da natureza.

*(19) Nomeação indiscriminada de policiais e ex-policiais.*

Nomeação de policiais e ex-policiais em substituição a especialistas no
Ministério do Meio Ambiente; ameaças a servidores públicos no
cumprimento de suas obrigações na gestão ambiental em todo o país;
desativação dos conselhos paritários de gestão ambiental,
desmantelamento do sistema nacional de monitoramento ambiental e fim do
diálogo com as organizações da sociedade.

*(20) Estímulo ao desmatamento e queimadas de florestas na Amazônia.*

“Eu sou o capitão motosserra”, proclamou o presidente; em 2015, foram
desmatados 6.207 quilômetros quadrados, e, agora em 2019, atingiu-se a
área de 9.762 quilômetros quadrados, com aumento de 50%.

*(21) Estímulo à invasão de áreas públicas e de proteção ambiental.*

A edição da Medida Provisória 901 pretende diminuir o percentual de
reserva legal nos imóveis dos latifundiários e diminui o número de áreas
de conservação natural pertencentes à União.

*(22) Estímulo à mineração ilegal em áreas indígenas e de proteção
ambiental.*

*(23) Suspensão da proibição do plantio de cana de açúcar nos biomas do
pantanal e da Amazônia.*

Esse monocultivo vai gerar enormes problemas ambientais nas duas
regiões, como advertiram os cientistas.

*(24) Criminalização de ONGs.*

Oficializou-se a criminalização de militantes de ONGs e movimentos em
defesa do meio ambiente; como o exemplo patético da prisão injusta de
ativistas na Amazônia, manipulada por policiais e madeireiros bolsonaristas.

Leia também:  Star Wars 9, a força segue ignorando Chewbacca, por Fábio
de Oliveira Ribeiro
 <https://jornalggn.com.br/artigos/star-wars-9-a-forca-segue-ignorando-chewbacca/>

*(25) Ataque à ciência.*

Criminalização e perseguição a pesquisadores e cientistas de
instituições públicas de pesquisa, sobretudo das voltadas para questão
ambiental.

*(26) Impunidade às mineradoras.*

Ampliação da impunidade às mineradoras que cometeram crimes ambientais e
causaram a morte de centenas de pessoas em Minas Gerais e no Pará, sem
que até agora as famílias e as regiões tenham sido reparadas. O Estado
está ausente, o Ministério Público finge que fiscaliza, e as mineradoras
seguem se apropriando de bilhões em lucros por ano.

*(27) Desmantelamento do programa de construção de cisternas no
semiárido nordestino.*

Foram mantidos apenas os contratos antigos. Os recursos caíram de R$ 26
milhões em 2015, para apenas R$ 10 milhões em 2019. Nos governos
Lula-Dilma, investiu-se mais de R$ 1 bilhão na construção de cisternas
para abastecimento de água da chuva às famílias camponesas.

*(28) Desmantelamento e aparelhamento do Incra.*

O Incra (Instituto Nacional de Colonização e reforma Ágraria) está sendo
desmantelado e aparelhado pela UDR (a famigerada União Democrática
Ruralista –entidade dos latifundiários que organiza a violência contra
os trabalhadores rurais), nomeação de pessoas que são contra a reforma
agrária. E até de policiais em superintendências estaduais.

*(29) Fechamento programa Mais Médicos.*

Centenas de comunidades de povos indígenas, quilombolas e assentamentos
perderam os cuidados e a atenção médica com o encerramento do programa
Mais Médicos. O país não conta mais com a presença de médicos cubanos,
os únicos que se dispunham a atender essas comunidades.

*(30) Adesão ao acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia.*

Felizmente contestado por diversos países europeus e que certamente será
vetado pela Argentina. O acordo colocava em risco não só a indústria
brasileira e do Cone Sul, mas também a produção da agricultura familiar,
de leite, queijos e vinho, entre outros produtos, por conta da liberação
total da entrada de produtos europeus.

*(31) Política de abandono da agricultura familiar.*

A política de abandono da agricultura familiar teve consequências também
na indústria de máquinas agrícolas. Em 2015, vendeu-se 262 mil tratores
e, em 2019, foram vendidos apenas 46.457.

*(32) Projeto de eliminar pequenos municípios.*

O projeto de lei que pretende eliminar 1.247 pequenos municípios
brasileiros caso seja aprovado dificultará o acesso da população
interiorana mais pobre aos serviços de educação, saúde, de bancos e do
correio, lá oferecidos.

**João Pedro Stedile* é membro da equipe de coordenação do MST.

In
JORNAL GGN
https://jornalggn.com.br/artigos/um-balanco-do-governo-bolsonaro-por-joao-pedro-stedile/
2/1/2020

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