sábado, 14 de outubro de 2023

Alguns elementos de análise acerca da situação palestina

 
 


    CNC [*]

Cartoon Gaza, autor desconhecido.

Tudo o que publicam os grandes meios de comunicação, desde a primeira
letra até a última, e hoje mais do que nunca, é propaganda de guerra.
Sabemos, ou deveríamos saber, que seus proprietários são os grandes
fundos de investimento, as empresas multinacionais e os principais
bancos, todos eles em grande medida penetrados pelo grande capital
sionista. Por outro lado, os meios alternativos, muitos deles bem
intencionados, dão crédito a ficções propagadas por aqueles mesmos
meios, ou a análises falsas que contribuem para estender a confusão e,
em definitivo, tentar minar a solidariedade com a Palestina. Essas
“notícias” centram-se hoje em atribuir exclusivamente ao Hamas –
organização islamita e portanto pouco confiável – as ações militares
palestinas do dia 7 de Outubro contra o estado sionistas e em difundir
que o governo de Netanyahu estava a par de tudo e que teria facilitado o
ataque para distrair a atenção das suas dificuldades internas.

A confusão subjacente a estas análises e consequência dessa tendência
tão extensa de analisar os acontecimentos a partir do instantâneo do
momento, ignorando ou afastando os processos históricos que os explicam.

A linha geral que forjou o plano político implementado pelo imperialismo
sionista no Oriente Próximo foi aplicar o “divide e impera” para
submeter e dominar seus povos. Seu instrumento foi a instigação das
diferenças religiosas, étnicas ou estatais, em virtude de, nestas
últimas, de fronteiras desenhadas pelas potências coloniais. Além disso,
sua nova estratégia foi armar, organizar e por ao seu serviço o
islamismo mais integrista e retrógrado (Al Qaeda, ISIS, Boko Haram,
etc). Estas organizações funcionaram como milícias subcontratadas para
destruir e saquear esses países. Esta estratégia foi aplicada na guerra
Irão-Iraque, na ocupação do Iraque, Líbia, Iémen, Síria, muito antes na
Jugoslávia e agora na Ucrânia.

A vitória do Líbano, a primeira de um país árabe contra Israel, no ano
de 2006, marca um ponto de ruptura. O Hezbolá foi capaz de promover uma
aliança com forças cristãs, comunistas e de outros credos e ideologias
para confrontar e vencer o estado sionista. Além disso, começou a
erigir, na base desta vitória histórica, o Eixo da Resistência
Anti-imperialista e Anti-sionista, como Bloco Histórico – explicitamente
relacionaram-no com o conceito de bloco histórico gramsciano – laico, em
escala regional. Fizeram-no na base, profundamente inscrita no
sentimento árabe e muçulmano, de considerar a luta do povo palestino
contra o estado sionista, como coluna vertebral de toda a sua estratégia.

Sobre estes fundamentos, estritamente políticos, começou-se a articular
o Eixo da Resistência. Este posicionamento político levou-o a apoiar
militarmente a Síria, o Iémen e qualquer povo, sobretudo o palestino,
atuando como uma frente comum a partir da qual se lutava contra o
imperialismo sionista. Este processo permitiu algo inédito na Palestina,
que se foi forjando ao longo dos anos.

Forças que se haviam enfrentado, inclusive militarmente, como o Hamas, a
Jihad Islâmica ou a Frente Popular para a Libertação da Palestina, foram
superando suas diferenças para conseguir articular uma frente comum
contra o inimigo sionista e desmascarar a cumplicidade com o ocupante da
Autoridade Nacional Palestina praguejada de corrupção.

Foi esta nova perspectiva histórica que permitiu esta nova vitória da
Resistência Palestina. A unidade política e militar da Resistência é o
produto necessário do desenvolvimento deste caminho de confluência árabe
e muçulmana, anti-imperialista e anti-sionista que, obviamente, se vê
favorecido pelas mudanças no cenário internacional que representam o
apoio da Rússia ao governo sírio ou a nova incorporação aos BRICS do
Irão, Egito ou Emirados Árabes Unidos. Tal como o que ocorreu em 2006, e
como ocorre em qualquer vitória de um povo contra um inimigo
potencialmente mais poderoso, a capacidade da Resistência Palestina para
levar a cabo ações da envergadura que temos visto representa, sobretudo,
o mito da invulnerabilidade do inimigo. A demonstração prática de que é
possível vencer o exército mais poderoso da região, e um dos mais fortes
do mundo, é a maior potência que estrutura e se incorpora à luta de
massas, antes esmagadas pelo sentimento de impotência.

Mas qualquer um que assuma a determinação de lutar contra uma força
incomparavelmente maior, não o faz de peito descoberto, frontalmente. Um
dos elementos fundamentais é conhecer as contradições internas do
inimigo e atacar quando a sua debilidade é maior. O ataque da
Resistência Palestina preparado desde há tempos, que também tem seus
serviços de inteligência, verificou-se no momento mais adequado, quando
o Estado de Israel estava mais debilitado.

O massacre selvagem desencadeado pelo estado de Israel sobre a população
civil de Gaza que se seguiu foi acompanhado pelo infame apoio ao estado
sionista por parte dos EUA e da UE, bem como por todos os meios de
comunicação “ocidentais”.

Durante 75 anos o estado de Israel martirizou o povo palestino, apesar
de 60% das Resoluções da Assembleia da ONU desde 1948 serem de
condenação ao estado sionista e de apoio aos direitos do povo palestino,
inclusive o seu direito à defesa militar. Nenhuma foi cumprida, mas
cumpre-se sim o infame Acordo Comercial Preferencial entre a UE e Israel
de 1997, subordinado em teoria ao respeito dos Direitos Humanos do povo
palestino.

O povo palestino e suas organizações compreenderam que o direito
internacional não existe e que só sua unidade, sua determinação de
combater a qualquer preço e sua inscrição num processo mais amplo de
luta regional contra a dominação e o saqueio dos seus recursos, abre
caminhos de vitória.

A resposta solidária que se está a verificar em todos os países do mundo
e, sobretudo nos povos árabes e muçulmanos, é um abalo e uma ameaça
contra os governos subornados cúmplices do imperialismo sionista. Agora
não se trata só de denunciar os reiterados massacres e de solidariedade
com as vítimas. Na base da demonstração de que é possível efetuar
ataques como o que foi efetuado pela Resistência Palestina, o qual
mostra que inimigo supostamente todo-poderoso não é invulnerável, a
solidariedade internacional tem um novo alcance. É o apoio à luta armada
de um povo contra a ocupação.

Compreender no seu conjunto, na sua totalidade, os processos históricos
é condição indispensável para que os povos não sejam cúmplices,
involuntários ou não, da propaganda do inimigo. Os tempos estão a mudar.
Regados com o sangue dos mártires que os povos demonstraram ao longo de
tantos anos de luta e de resistência, o palestino sobretudo, mas também
os de outros lugares, estão a abrir-se caminhos de esperança que só são
possíveis mediante a luta decidida – também frente à sua propaganda –
contra o imperialismo sionista.


        14/Outubro/2023


    [*] Coordinación de Núcleos Comunistas (Espanha),
    coordinadoranucleoscomunistas@gmail.com

Em
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/palestina/analise_14out23.html#asterisco
15/10/2023

Nenhum comentário:

Postar um comentário