quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Comunismo ou a ressurreição de Lázaro





Marcio Sales Saraiva


... e começou a buscar sentido numa sociedade que perde seus velhos laços
sociais para viver o espetáculo do consumo e da neurose narcisista. Sou apenas
uma narrativa no caos, um recorte ou uma janela. Se for prazeroso para você,
fique aqui e tome um café comigo.



É possível defender a ideia de comunismo depois da queda do Muro de Berlim, da
União Soviética e de diversos regimes do socialismo real? Depois do fim de
diversos partidos comunistas? A resposta de Alain Badiou é desconcertante: sim,
é possível e necessário. Sua heresia intelectual em tempos de hegemonia do
chamado “capitalismo democrático” desperta, no mínimo, curiosidade.





Depois da queda do Muro de Berlim em novembro de 1989 (e lá se vão 26 anos!) e
da ex-União Soviética (URSS), fracassou em diversos outros países aliados a
experiência conhecida como “socialismo real”, tentativa de criar uma transição
para o comunismo. Depois disso, a palavra comunismo ficou associada a ideias
negativas: assassinatos, totalitarismo, improdutividade econômica, estagnação,
autoritarismo, censura, partido único etc. Diversos partidos ao redor do mundo
abandonaram a palavra “comunista” em suas siglas. Aqui no Brasil, o lendário
“Partidão”, o PCB, se transformou em “Partido Popular Socialista-PPS”, sem
martelo e foice. Um pequeno e valente grupo ainda mantém a sigla PCB (Partido
Comunista Brasileiro), mas sem grande influência social.

A hegemonia do novo liberalismo e a liquidação do Estado de bem-estar social
trouxeram tempos difíceis para as classes trabalhadoras e para quem ainda
acredita que o comunismo permanece como horizonte utópico e motivador para
diversos movimentos de ruptura com a ordem do capital e sua cultura egocêntrica,
fragmentária e consumista.

Dizer-se “comunista”, depois da queda do muro, era assumir algo tido por muitos
como “maligno”. A campanha ideológica de difamação e desconstrução da Ideia de
comunismo quase liquidou com todos os atores coletivos que reivindicam a
possibilidade de outro mundo que não seja capitalista.

Em 2009, 20 anos depois da queda, Alain Badiou, filósofo francês de origem
marroquina, reuniu algumas conferências e encontros para lançar um livro que
marcaria uma nova geração que se via órfã de uma literatura assumidamente
comunista depois do refluxo e do fracasso pós-1917 (Revolução Russa).

O livro L´hypothèse communiste foi traduzido para o português por Mariana
Echalar e lançado em 2012 pela paulista Boitempo Editorial.

No prefácio, Badiou nos convida a refletirmos com honestidade sobre o refluxo do
comunismo que se traduziu, entre outras coisas, por uma “negação resignada” onde
os velhos revolucionários retomaram os costumes eleitorais, acomodando-se aos
cargos e pequenos poderes dentro do sistema. Novamente, a esquerda abraçou um
respeito sacrossanto pela ordem do capital (e sua “democracia parlamentar”) que
nem mesmo os mais liberais mantêm.

A mediocridade tomou conta da outrora esquerda anticapitalista através da ideia
de que “querer mais é querer pior”. Acomodar-se e conquistar migalhas, esta era
a nova "utopia". Surgia aí, depois da rendição reformista da socialdemocracia no
interior da ordem do capital, uma esquerda que se transformaria em braço do
Estado oligárquico-burguês para “conter” processos radicais de ruptura e
emancipação do povo. Quando a sociedade estava “quente”, bastava chamar os
“comunistas” e seus sindicatos para “darem um jeito” nos rebelados.

Resignados diante do triunfo do mercado, os antigos revolucionários passaram a
novo lema: Aceitemos, pois, tudo tal como é. Se possível, melhoremos aqui e ali,
mas sem “totalitarismos” que possam macular o nosso “mundo livre” onde prevalece
o respeito aos “direitos humanos”. As oligarquias da ordem do capital
agradeceram e retribuíram com muitos cargos e posições de status a esta nova
vassalagem.

Eis o fracasso dos comunistas. Fracasso que, para Badiou, é de uma imensa
riqueza para rearticulação histórica da Ideia. Fracasso que o levará a escrever
sobre “o significado positivo das derrotas” e das desilusões, tanto as de
direita (eleitoralismo resignado) como as de esquerda (terrorismo e massacres).

Em Londres, no mês de março de 2009, Badiou e S. Zizek reuniram um grupo de
intelectuais dispostos a recuperar o valor positivo da palavra comunismo,
destroçado pelos aparelhos ideológicos da burguesia triunfante. Judith Balso,
Terry Eagleton, Michael Hardt, Toni Negri, Jacques Rancière, Gianni Vattimo e
outros mostraram que a Ideia de comunismo floresce, aqui e acolá, não
necessariamente usando este nome, nem ligada a um partido com o nome
“comunista”.

As experiências societárias resgatadas pelo livro – o maio de 1968, a revolução
cultural de Mao e a Comuna de Paris – são capítulos de uma história inacabada. O
capitalismo, para Alain Badiou e seus companheiros de reflexão, não é o fim da
história. Há outro futuro possível. A hipótese comunista está de pé.

In
https://br.yahoo.com/
6/1/2016

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