Adunesp - Associação dos docentes da Universidade Estadual Paulista, Seção sindical de Marília.
Neste
momento de crise sanitária, institucional e econômica pelo qual passamos, cabe
à Adunesp, enquanto sindicato de trabalhadores cuja prerrogativa é a dedicação
ao saber e a compreensão do mundo, não apenas deliberar sobre direitos
trabalhistas, mas promover a reflexão sobre a conjuntura e estabelecer um
diagnóstico que unifique os diversos aspectos envolvidos na questão.
Com
relação à PANDEMIA que nos assola, podem-se levantar questões
que vão muito além de soluções pontuais para o problema da impossibilidade de
praticar o ensino presencial. A Adunesp não pode se furtar de discutir sobre:
1. As medidas do governo federal,
estadual e municipal na condução de políticas públicas de saúde, e a
importância do Sistema Único de Saúde (SUS).
2. A pandemia tem sido um
subterfúgio utilizado na esfera federal e estadual para a retirada de direitos
do trabalhador brasileiro, tais como a interrupção do pagamento de salário por
parte dos empregadores. O segmento do funcionalismo público tem sofrido
sucessivas perdas, como a redução salarial dos aposentados; na Unesp em
especial, bem antes da crise sanitária já se vinha implementando uma série de
medidas de arrocho, tais como a extinção, na prática, da isonomia salarial com USP e Unicamp,
dívida acumulada de reajustes salariais, suspensão das progressões horizontais,
precarização acelerada do trabalho de funcionários docentes e técnicos
administrativos por suspensão de concursos.
3. É necessário situar a pandemia no
panorama geopolítico, levando-se em conta os interesses do BigPharma,
bem como a investida do bloco atlanticista, contra os avanços da economia
chinesa.
Em vista
do isolamento social prescrito como medida preventiva contra a COVID 19, a
Unesp instituiu a toque de caixa o ENSINO A DISTÂNCIA, travestido
de atividades remotas, que vem se instalando como única saída possível para
cumprimento do calendário escolar. Entretanto, não é de agora que a reitoria da
Unesp vem incentivando o trabalho remoto, principalmente atividades de
docência.
Antes de
optar por um ou outro tipo de atividade remota menos prejudicial ao alunado, a
categoria docente deveria se indagar: Cui bono? A quem interessa o
ensino a distância? Há algum tempo a Adunesp vem chamando a atenção para a
ingerência de conglomerados estrangeiros, tais como a Kroton, na elaboração de
diretrizes da educação, em consonância, por exemplo, com a atual gestão do
ministério da economia do Brasil.
Como
resultado da assim chamada parceria público-privada na educação, cuja expressão
maior é o FIES, ocorre a sistemática degradação da qualidade do ensino público,
agora mediante substituição do ensino presencial pelo ensino a distância. Sendo
assim, o ensino a distância seria um capítulo a mais do extenso histórico de
políticas de sucateamento da universidade pública no Estado de São Paulo e na
federação.
A
implementação do trabalho remoto configura-se como medida do enxugamento de
pessoal na Unesp, pois um professor que ministre aula a distância atinge um
número muito maior de alunos. Trata-se da superexploração do trabalho docente,
com home office e gravação das aulas para reprodução
indiscriminada. Ademais, os professores de nossa universidade não dispõem em
suas casas de computadores, microfones e filmadoras adequados, nem sinal de
internet com capacidade para dar conta dessa demanda, portanto, têm de arcar
com todos esses gastos, têm de pagar para trabalhar. As aulas gravadas
concorrem ainda para a privatização do ensino, na medida em que se tornam uma
atrativa fonte de lucro para a universidade, através de transações financeiras
do material audiovisual.
Ao
disponibilizar aulas na rede, a categoria perde liberdade de cátedra, por
sujeitar-se a instâncias de controle vinculadas às tecnologias de ensino a
distância e por se expor à intimidação de grupos hostis. Além disso, a maioria
dos docentes da Unesp não tem formação para esse tipo de trabalho, em parte por
idiossincrasia, pois, no caso de cursos como o de filosofia, que desde sempre
implicou diálogo presencial, há total incompatibilidade entre o conteúdo do curso
e o ensino remoto.
Por fim,
o trabalho docente só se efetiva quando atinge o alunado, o que de pronto está
inviabilizado, frente à falta de condições dos estudantes para assimilar
atividades remotas. Para sanar esse problema, a reitoria da Unesp limitou-se a
oferecer um chip aos discentes, enquanto a UNIFESP forneceu
notebooks, logo, a retomada das aulas terá de ser precedida de um diagnóstico
sobre a real situação de nossa comunidade e um levantamento sobre alternativas
propostas por outras universidades.
O
corolário de tudo aquilo de que se falou até aqui é a discussão sobre o PAPEL
DO INTELECTUAL NO BRASIL, pois o docente não pode ser entendido apenas como
transmissor de conteúdos, do contrário perderá a autonomia que caracteriza a
profissão.
Em defesa
de sua autonomia, é necessário, diante das investidas que o ensino público e
gratuito vem sofrendo – em grande parte devido ao interesse de corporações
privadas estrangeiras –, é premente que o professor universitário de
instituições públicas brasileiras preze pela soberania do país.
O que
está em jogo é muito mais que a reposição de aulas. Mudanças estruturais estão
impondo um modelo de universidade submisso ao grande capital, às perdas
direitos sociais de estudantes e trabalhadores e ao aprofundamento dos
prejuízos à produção do conhecimento, como instrumento de compreensão e
transformação da realidade, numa sociedade tão desigual como a brasileira. Os
docentes de modo algum podem ceder a estas forças políticas, que visam, em
última instância, ao fim da universidade pública, gratuita e de qualidade, a
qual, mesmo com as problemas e contradições, cumpre papel estratégico na vida
nacional.
28/7/2020
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