sábado, 2 de junho de 2012

Elementos da história da ANTEAG
ELEMENTOS DA HISTÓRIA DAANTEAG
ANTEAG's HISTORY
Candido Giraldez VIEITEZl
Neusa Maria DAL RP
A Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas
de Autogestão e Participação Acionária (ANTEAG) foi criada no ano de
1994 com os objetivos de representar e assessorar as empresas industriais
de autogestão que estavam se formando na época e, também, para
impulsionar a formação de novas.
A Associação emergiu como parte de um processo de
autonomização do trabalho, que ocorre tanto em nível nacional como
internacional a partir dos anos de 1980, e que consiste na associação de
trabalhadores em empreendimentos econômicos próprios. Grande parte .
desses empreendimentos aparece em forma de cooperativas que se
estruturam de acordo com os princípios da Aliança Cooperativa
Internacional (ACI).
A maior parte das empresas daANTEAG também adquiriu
a forma jurídica de cooperativa. Contudo, originariamente a Associação
e suas empresas distinguiram-se do cooperativismo tradicional,
principalmente pela postulação do princípio autogestionário. A diferença
fundamental encontra-se no fato de que no cooperativismo tradicional
as cooperativas são dirigidas por uma diretoria eleita, enquanto que as
empresas de autogestão propõem a direção coletiva pelo conjunto dos
trabalhadores.
Além da autogestão, há dois outros elementos que
diferenciavam a ANTEAG do cooperativismo, quais sejam: o caráter de
produção industrial das empresas e a ênfase dada à educação
autogestionária dos associados.
1 Professor Assistente Doutor do Programa de Pós-graduação em Educação da
FFC, UNESP.
2 Professora Livre-docente do Departamento de Adrrúnistração e Supervisão Escolar,
FFC, UNESP, Campus de Marília.

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VIEITEZ, C. G.; DAL RI, N M.
A seguir, apresentaremos trechos de entrevistas realizadas
no ano de 2004 com os principais dirigentes e fundadores da ANTEAG.
Essas passagens dizem respeito a alguns tópicos relevantes da história
da Anteag, mas, sobretudo, aos acontecimentos que deram origem à sua
criação.
As pessoas que lideraram a formação da Anteag eram
ativistas ou quadros do movimento sindical os quais experimentaram as
fricções internas do Movimento.
I!As pessoas todas que estavam na Anteag, todas elas com
atuação sindical, progressistas, democratas, etc".3
Vim para São Paulo trabalhar com a Isabel, nos [sindicato
dos] químicos. Tava toda a patota daqui. A Isabel falava
façam, mas sempre me avise pra não complicar. Compraram
um sítio para fazer formação sindical. Iam mulheres e
operários, crianças, etc. Começou a dar resultado. Essa é a
organização pela base. Nossos assessores não estavam
preocupados com a eleição. E eles [a vertente concorrente]
estavam preocupados com a eleição. Perdemos as eleições.
Entrou outro grupo no sindicato. Nós fomos suspensos do
sindicato. Ficamos 45 dias em casa, sem fazer nada.4
A Anteag é formada em uma conjuntura na qual o início da
aplicação das políticas neoliberais pelo governo Collor criou problemas
imediatos para o funcionamento de inúmeras indústrias.
Foi nesta época que houve quebradeiras com o plano Collor.
O Jorginho dos sapateiros de Franca disse: está quebrando
fábrica. O que podemos fazer?Vamos fazer uma coisa
diferente? A Makerli ia fechar. Tem quatrocentos e tantos
operários. Fomos negociar para comprar a fábrica deles.
Montamos uma associação de trabalhadores. Fomos no
Banespa e o pessoal começou a dar risada. Resolvemos ocupar
o Banespa. Em poucas horas saiu o financiamento. Aí
começamos a aprender o que é gerenciar uma fábrica. O
J orginho do DIESSE trouxe um monte de material dos ESOPs
[Employee Stocks Ownership Plans1dos Estados Unidos.
Começamos a estudar isso. Fábricas coletivas. Começamos a
fazer isso na Makerli com todos os erros possíveis. Os
inteligentes assumiram e acabou nada dando certo. 5
3 Marilena Nakano, ex··dirigente e técnica da Anteag.
4 Aparecido Faria, ex-dirigente e técnico da Anteag.
5 Aparecido Faria, ex-dirigente e técnico da Anteag.
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Elementos da história da ANTEAG
A experiência pioneira com a fábrica de calçados Makerli
levou os dirigentes envolvidos a promoverem a organização e expansão
do modelo de autogestão.
Surgiu a idéia de fazer algo na fábrica Cobertores Paraíba.
Surgiu com a Hidrophoenix, em Sorocaba, São Paulo. No Rio
com a Olivetti. Depois a Facit em Juiz de Fora, Minas Gerais.
Tinha a Cooperminas, em Santa Catarina, que já era urna
experiência tradicional. Em 1993, chegamos à conclusão de
que não dava para tocar empresa por empresa
individualmente. Eram duas ou três pessoas. O meu salário
era coberto porurna fábrica em Aracaju, Sergipe. O empresário
ia fechar a unidade de Vila Romana, em Aracajú. Por que não
fazer a experiência de São Paulo? 6
Diante dessas experiências e da constatação de que pessoas
trabalhando isoladamente não conseguiriam assessorar a transformação
de várias empresas falimentares em autogestionárias, surgiu a
necessidade de criação de uma entidade para representação e assessorar
os empreendimentos.
Chegamos à conclusão que precisávamosmontar urna entidade
que represente isso. Foi aí que montamos a Anteag. Fizemos
um seminário com 25, 30 pessoas. Estavam o Jorginho, o
ministro Rossetto, o Mercadante, Oscar do BNDES [Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social]. A história
da Anteag começou aí, voltada para as empresas de produção
industrial. Fornos trazendo algumas pessoas. A Marilena
Nakano que foi indicada pelo Pestana.Corno a Marilena era
cunhada do Betinho, ele pôde dar urna mão pra gente. Fornos
discutir com ele a possibilidade de discutir com o governo
Federal o apoio a nós. Ele marcou com o ministro no Rio para
discutir coisas do IBASE [Instituto Brasileiro de Análises
Sociais e Econômicas]. Mas no fundo era para discutir com a
gente. Os secretários estão aí e encaminhe com eles. Daí saiu
uns 600 mil reais para Anteag que foi uma fortuna e nos
quebrou o galho. Permitiu certa atividade. Esse recurso
acabou. Depois veio através da Coope [Incubadora
Tecnológica de Cooperativas Populares do Programa de Pósgraduação
emEngenharia da Universidade Federal do Rio de
Janeiro] e Unitrabalho [Rede Interuniversítária de Estudos e
Pesquisas sobre o Trabalho] [ ...] 7
A designação da Associação, bem como das novas fábricas
de trabalhadores associados com o termo de autogestão foi tanto um
6 Aparecido Faria, ex-dirigente e técnico da Anteag.
7 Aparecido Faria, ex-dirigente e técnico da Anteag.
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V/E/TEZ, C. G.; DALR/, N. M.
problema quanto um objeto de reflexão e pesquisa para os dirigentes
fundadores da entidade. Na época de constituição da ANTEAG, o
cooperativismo influente no Brasil era o dos capitalistas agrários. As
cooperativas de trabalhadores eram pouco conhecidas e o cooperativismo
de trabalhadores industriais não contava com mais de dois ou três
exemplos. Por outro lado, a autogestão tampouco tinha ascendência na
história do movimento operário e popular brasileiro, não tendo qualquer
peso nas pautas programáticas de partidos e sindicatos. No entanto, a
partir de meados de 1970, o movimento operário emergiu novamente eln
luta aberta contra a ditadura militar e uma das idéias-força que o
Movimento engendrou, em oposição a práticas tradicionais, foi a de que
a organização dos trabalhadores deveria atribuir às suas bases Uln papel
protagonista, idéia esta que as organizações clássicas não contemplavam.
É possível que esta idéia, que foi derrotada nas re-configurações sindicais
e partidárias pós-ditadura, mas que veio a ter um lugar estratégico na
organização do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST),
encontrava-se na raiz da opção que a Anteag fez pela autogestão.
Autogestão. Havia uma certa ressalva porque lembrava
Iugoslávia. E cooperativas era pior. Eu e alguns companheiros
começamos a estudar um pouco Proudhon, Owen Fourier,
Saint Simont, Louis Blanc. Estudamos para acertar o mal
estar que tinha a palavra. Estudamos também Marx, mas
tinha pouco de autogestão em Marx. E Lênin,. não se tocava
muito nisso. Em Lênin o poder era doPartido.8
Desde os seus primórdios, a Anteag esteve
preocupada com a educação dos trabalhadores autogestionários. Esta
característica acentuou-se a partir da atuação da educadora Marilena
Nakano, responsável pelo setor de educação da ANTEAG, que se
empenhou em incluir os trabalhadores de chão de fábrica nas atividades
educacionais, particularmente por meio do curso intitulado Bolsas
Autogestíonárias.
A Anteag privilegiou o trabalho de educação. Sem dinheiro
[...] Ter que ir para Santa Catarina, Minas, Rio de Janeiro, Rio
Grande do Sul, interior de São Paulo. Era uma coisa muito
grande para tão poucos recursos. Privilegiou preparar o
material.
Implementou dois programas: as bolsas autogestionárias e
os MBAs.
Andei muito pelas empresas tentando captar quais as questões
importantes. O material passava pela equipe toda que
8 Aparecido Faria, ex-dirigente e técnico da Anteag.
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Elementos da história da ANTEAG
referendava. Cada empresa podia utilizar como quisesse. É o
que mais gosto do trabalho na Anteag. O MBA foi muito
professora de escola. Foi pouco efetivo para as empresas.
Pensamos numa estrutura, definimos a temática, pegou em
pontos que eram importantes de serem aprofundados. A idéia
era de que à medida que pudéssemos ir para as empresas
trabalhar com essas cartilhas lá a gente escolhia como era
melhor trabalhar.Cada uma das cartilhas levava umas de
oito horas de trabalho. Dependia um pouco da fábrica. Às
vezes trabalhava uma cartilha só. Variava muito. Quase todas
as empresas passaram por esse materiaP
Em 1999, a Anteag, especialmente por intermédio de
atividades desenvolvidas no Rio Grande do Sul, passou a trabalhar
também com empreendimentos não indústrias.
A partir de 1999, a maior parte da Anteag estava no Rio
Grande do Sul. Passamos a trabalhar também com
cooperativas populares. A partir de dezembro de 1999, a
maior parte da Anteag estava trabalhando no Rio Grande do
Sul. Convênio com governo. Começou bem e terminou mal. A
estrutura que tinha no Rio Grande do Sul acabou. Tem
empresas lá, mas [ ... ]. O governo dividiu o Estado. Cobrir o
Estado. Tinlla mais de 70 técnicos. Os técnicos ocupavam
espaços da Prefeitura. À medida que o Olívio saiu tudo isso
acabou.
[... ]
Porque tinlla convênios coma Finep [Financiadora de Estudos
e Projetos] que pagava os técnicos, recursos do F A T [Fundo
de Amparo ao Trabalhador] com projetos. Aí tínhamos que
trabalhar com um programa de governo. Tínhamos que
incubar empreendimentos. Tem que ser assessoria. Durante
dois anos quase enlouquecemos. A partir desse convênio com
o Rio Grande do Sul [ ... ] foi lá que se teve a idéia de criar um
Grupo de Trabalho de economia solidária.10
Seguindo a trilha iniciada pela Anteag, posteriormente
outras organizações passaram a trabalhar com empreendimentos
industriais de trabalho associado e a estimular o seu desenvolvimento.
Entretanto, tudo indica que os números otimistas originariamente
estimados quanto ao crescimento deste setor não se verificaram. De
qualquer modo, a partir de 2004, a Anteag afrouxando o seu original
9 Marilena Nakano, ex-dirigente e técnica da Anteag.
10 Luiz Humberto Verardo e Cátia Costa, dirigentes e técnicos da Anteag.

ORG & DEMO, v . .5,n.2, p.267-272, 2004

VIEITEZ, C. G.; DAL RI, N. M.
enfoque centrado na indústria e na autogestão, praticamente passou a
integrar o campo da denominada economia solidária, a qual apresenta
como uma de suas características um leque muito mais amplo e heteróclito
de formas de organização.
VIEITEZ, C. G.; DAL RI, N. M. ANTEAG's history. Revista ORG & DEMO
(Marília), v.5, n.2, p. 267-272, 2004.
ORG & DEMO, v.5, n.2, p.267-272, 2004

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