quinta-feira, 30 de maio de 2019

Rand Corp: como abater Rússia




Manlio Dinucci

As conclusões do relatório confidencial da Rand Corp foram tornadas
publicas num "Brief". Esse documento revela como gerir a nova Guerra
Fria contra a Rússia. Algumas recomendações já estão a ser
concretizadas, mas esta apresentação sistemática ajuda a compreender o
seu ver-dadeiro objectivo.

Forçar o adversário a desdobrar-se excessivamente, a fim de
desequilibrá-lo e derrubá-lo - não é um movimento de judo, mas o plano
contra a Rússia desenvolvido pela Rand Corporation, o 'think tank' mais
influente dos EUA que, com uma equipa de milhares de peritos, representa
a fonte mundial mais fiável dos serviços secretos (inteligência) e
análise política para os governantes dos Estados Unidos e para os seus
aliados. A Rand Corp orgulha-se de ter contribuído para a elaboração da
estratégia a longo prazo que permitiu aos Estados Unidos serem os
vencedores da Guerra Fria, obrigando a União Soviética a esgotar os seus
recursos económicos no confronto estratégico.

É neste modelo que se inspira o novo plano, "/Overextending and
Unbalancing Russia/", publicado pela Rand [1
<https://www.voltairenet.org/article206556.html#nb1>]. Segundo os seus
analistas, a Rússia continua a ser um poderoso concorrente dos Estados
Unidos em alguns campos fundamentais. Por conseguinte, os Estados
Unidos, juntamente com os seus aliados, devem empenhar-se numa
estratégia abrangente a longo prazo que tire o máximo partido das suas
vulnerabilidades. Assim sendo, são analisadas as várias maneiras de
forçar a Rússia a desequilibrar-se, indicando para cada uma delas, as
possibilidades de sucesso, os benefícios, os custos e os riscos para os EUA.

Os analistas da Rand acreditam que a maior vulnerabilidade da Rússia é
de caracter económico, devido à sua forte dependência das exportações de
petróleo e gás, cujas receitas podem ser reduzidas, agravando as sanções
e aumentando as exportações de energia dos EUA. Devem fazer com que a
Europa reduza a importação de gás natural russo, substituindo-o por gás
natural liquefeito transportado por mar, de outros países.

Outra maneira de prejudicar a economia da Rússia a longo prazo, é
encorajar a emigração de pessoal qualificado, em particular, jovens
russos com um nível de educação elevado.

No campo ideológico e informativo, devem ser encorajados os protestos
internos e, ao mesmo tempo, prejudicar a imagem da Rússia no
estrangeiro, expulsando-a dos fóruns internacionais e boicotando os
acontecimentos desportivos internacionais que ela organiza.

No campo geopolítico, armar a Ucrânia permite que os EUA aproveitem o
ponto de maior vulnerabilidade externa da Rússia, mas isso deve ser
ajustado para manter a Rússia sob pressão, sem atingir um grande
conflito, em que ela teria vantagem.

No campo militar, os EUA podem ter grandes benefícios, com baixos custos
e riscos, através do aumento das forças terrestres dos países europeus
da NATO em função anti-Rússia.

Os EUA podem ter grandes oportunidades de serem bem sucedidos e altos
benefícios com riscos moderados, investindo, sobretudo, em mais
bombardeiros estratégicos e mísseis de ataque de longo alcance contra a
Rússia.

Sair do Tratado INF e instalar novos mísseis nucleares de alcance
intermédio apontados contra a Rússia asseguram grandes possibili-dades
de êxito, mas também envolvem riscos elevados. Ao discriminar cada opção
para alcançar o efeito desejado - concluem os analistas de Rand - a
Rússia acabará por pagar o preço mais alto no confronto com os EUA, mas
até mesmo os americanos terão de investir grandes recursos,
subtraindo-os a outros fins. Anuncia-se, assim, um aumento ainda maior
das despesas militares militares USA/NATO em detrimento das despesas
sociais.

Este é o futuro previsto pela Rand Corporation, o mais influente 'think
tank' do Estado Profundo, ou seja, do centro subterrâneo do verdadeiro
poder, mantido pelas oligarquias económicas, financeiras e militares, o
poder que determina as escolhas estratégicas não só dos EUA, mas do todo
o Ocidente.

As "opções" previstas pelo plano são, na realidade, apenas variantes da
mesma estratégia de guerra, cujo preço em termos de sacrifícios e
riscos, é pago por todos nós.

/Manlio Dinucci/ <https://www.voltairenet.org/auteur124610.html?lang=pt>

Tradução
Maria Luísa de Vasconcellos
<https://www.voltairenet.org/auteur126298.html?lang=pt>

Fonte
Il Manifesto (Itália)
<https://www.voltairenet.org/auteur122722.html?lang=pt>

     

[1 <https://www.voltairenet.org/article206556.html#nh1>] /Overextending
and Unbalancing Russia. Assessing the Impact of Cost-Imposing Options
<https://www.rand.org/content/dam/rand/pubs/research_briefs/RB10000/RB10014/RAND_RB10014.pdf>/,
by James Dobbins, Raphael S. Cohen, Nathan Chandler, Bryan Frederick,
Edward Geist, Paul DeLuca, Forrest E. Morgan, Howard J. Shatz, Brent
Williams, Rand Corporation, May 2019.

Fonte : "Rand Corp: como abater Rússia", Manlio Dinucci, Tradução Maria
Luísa de Vasconcellos, Il Manifesto (Itália) , /Rede Voltaire/, 22 de
Maio de 2019, www.voltairenet.org/article206556.html
<https://www.voltairenet.org/article206556.html>



In
PORT.PRAVDA.RU
http://port.pravda.ru/russa/25-05-2019/47857-russia-0/#
25/5/2019

Por uma agricultura patriótica, popular e (portanto) ecológica!



*por Guillaume Suing [*]

Nos países imperialistas do Norte, tal como nos países semicolonizados
do Sul, a questão "ecológica" é sempre mal colocada. Parte do ponto de
vista do consumidor sem nunca colocar a questão da luta de classes nas
relações de produção. É por essa razão que a ecologia, no plano
político, se tornou numa deformação da luta militante, muito oportuna
para a burguesia, que passa o tempo (e consagra uma parte do seu
capital) a desviar as acusações. Os maiores produtores de embalagens
plásticas, por exemplo, (a começar pela Coca Cola americana) são os
protagonistas de toda as campanhas de limpeza benevolente das praias e
de publicidades que criminalizam os consumidores "poluidores" a fim de
melhor se desculparem por terem abandonado o vidro, menos rentável. São
também os /lobbies / do leite em pó, alegadamente "bio", que fazem
campanha contra o aleitamento maternal – que é aconselhado pela OMS –
porque este seria suscetível de transmitir ao bebé os pesticidas
absorvidos pela mãe… Com efeito, é mais rentável para o patronato que as
mães voltem ao trabalho, graças a um desmame precoce, do que financiar
as licenças por maternidade durante um ano, a 100% do salário, como era
o caso na URSS.

A poluição dos solos, sobretudo através dos pesticidas, é no entanto uma
questão estratégica fundamental para todos os países em luta contra o
imperialismo, e não é sem razão que Cuba socialista, privada do apoio
soviético desde 1990, se tenha tornado líder mundial da agroecologia,
reconhecido pela ONU e por várias ONG, entre elas a World Wildlife Fund.
Reduzir a pegada ecológica (a pegada do homem sobre o seu ambiente) é a
primeira preocupação dos agricultores para garantir a segurança e a
soberania alimentar do seu povo, permitir a fertilidade, mais lenta é
certo a instalar-se, mas mais resistente e mais duradoura, graças à vida
do solo – vermes, cogumelos e bactérias que os produtos químicos da
agricultura intensiva matam.

Tal como a URSS que foi forçada, durante a II Guerra Mundial, a
fertilizar todas as superfícies exploráveis, incluindo nas cidades, com
métodos menos "químicos", Cuba encontrou-se numa situação semelhante nos
anos 90, sem a URSS e sob um bloqueio cada vez mais rígido. Este
"período especial em tempo de paz" foi uma crise histórica para a ilha
revolucionária, que só saiu dela impondo uma transição agroecológica
radical, cujos resultados foram para os produtores uma agradável
surpresa: a produtividade apanhara em poucos anos a anterior a 1990 e,
além disso, uma diversidade alimentar maior ao serviço duma soberania
alimentar mais segura, passando duma monocultura intensiva da
cana-de-açúcar para uma policultura agroecológica produtora de frutos e
legumes variados para o mercado interno.

Na URSS, tinham-se observado os mesmos resultados, o que, entre outras
coisas, convidou o governo a lançar de seguida um "grande plano de
transformação da natureza", em 1948. Foi o plano mais amplo de
policultura agroflorestal da História, um gigantesco repovoamento
florestal no sul do território, associado a uma forma extensiva de
"permacultura", sem pesticidas nem adubos químicos. A rotura da URSS com
a agroecologia só ocorrerá com Khrushchov, que alinhou pelo modelo
agroquímico americano, mais rentável a curto prazo e menos dispendioso
no plano do investimento estatal (formação de agrónomos, investigação em
biologia, elevação do nível social dos camponeses).

Nessa época, tal como hoje com Cuba, a agroecologia é uma questão de
relações de produção e não de consumidores: é porque o Estado possui a
terra e pode redistribuí-la de forma justa, e fixa os preços do mercado
interno, que os consumidores ficam satisfeitos com uma alimentação,
simultaneamente sã e barata.

Claro que, em Cuba, a agricultura está coletivizada, pois a revolução
socialista expulsou os proprietários (a maior deles agora sem hipótese
de prejudicar, em Miami). Os camponeses, na maior parte dos casos, estão
organizados em /kolkhozes, / coletivos de trabalhadores que, no seu
terreno, levam a efeito simultaneamente, várias atividades produtivas e
ligadas entre si. É um modelo radicalmente diferente do da Tunísia,
ainda maioritariamente feudal e sem grandes meios técnicos e científicos
para pôr em marcha uma produção variada, sã e duradoura. Há anos que
Cuba constata que a alimentação dos habitantes, baseada em sementes
locais, não modificadas pela agroindústria imperialista, produzida sem
pesticidas, melhora o seu nível de saúde, mas também produz muitos
outros serviços. Em especial, o facto de que, nos coletivos de trabalho,
mais técnico e intelectual, menos rude e menos manual, as mulheres
rurais ocupam um lugar cada vez mais importante, a par dos homens,
incluindo a tomada de decisões, o que contribui de forma indireta, mas
muito concreta, para a luta do povo contra o patriarcado. A
coletivização também permite que todas as crianças frequentem a escola e
que todos os trabalhadores, partilhando as tarefas por turnos, possam
ter férias regularmente.

No contexto tunisino, as lutas de vanguarda no campo estão, quase
sempre, ligadas aos recuos de uma falsa "reforma agrária" já antiga, mas
cujos vestígios continuam a sofrer a repressão económica, judiciária,
policial e mediática. Os trabalhadores das plantações de palmeiras de
Jemna, por exemplo, constituíram-se numa cooperativa, com a diferença de
não terem sido encorajados pelo Estado, como em Cuba, mas, pelo
contrário, pressionados por ele de todas as formas. Assim sendo, é
necessário um projeto de produção agroflorestal sem pesticidas para que
a produção venha a ser duradoura e segura, tal como a terra torna
possível. Mas são necessários meios para pôr em marcha esse projeto,
pois abandonar os pesticidas supõe conhecimentos agronómicos precisos e
máquinas especializadas na policultura, de modo a produzir pelo menos
tanto como anteriormente, a um custo menor (sem a compra de produtos
químicos). Segundo a palavra de um camarada do PPDS, na Tunísia e, sem
dúvida, em todos os países semifeudais, semicolonizados, é necessária
uma "reforma agrária duradoura", para a qual o modelo cubano, graças à
ajuda internacionalista da ANAP <https://www.ecured.cu/ANAP> , o
sindicato cubano dos pequenos agricultores, poderia ser de grande ajuda.
É, sobretudo, deste tipo de ajuda que o povo tunisino precisa, e não da
"ajuda" criminosa da União Europeia (a ALECA
<https://fr.wikipedia.org/wiki/Accord_de_libre-%C3%A9change_complet_et_approfondi>
que será imposta por Bruxelas, por Paris, com a cumplicidade da
burguesia tunisina) que pretendem fazer do país um vassalo submisso
obrigado a produzir apenas para a exportação para a Europa e dependente
cada vez mais do imperialismo no plano alimentar.

*[*] Professor agregado de Ciências da Vida e da Terra. Autor de
/Evolution: La preuve par Marx/
<http://www.librairie-renaissance.fr/9782915854930-evolution-la-preuve-par-marx-depasser-la-legende-noire-de-lyssenko-suing-guillaume/>
(2016) e de /L'Ecologie réelle, une expérience soviétique et cubaine/
<http://www.librairie-renaissance.fr/9782376071341-l-ecologie-reelle-une-histoire-sovietique-et-cubaine-suing-guillaume/>
(2018)

O original encontra-se no jornal tunisino /Al Oufouk / e em
germinallejournal.jimdo.com/...
<https://germinallejournal.jimdo.com/2018/10/06/pour-une-agriculture-patriotique-populaire-et-donc-%C3%A9cologique/>
Tradução de Margarida Ferreira. *


In
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/ambiente/agroecologia_06out18_p.html
6/10/2018
.


segunda-feira, 27 de maio de 2019

Manifiesto: No hay futuro posible en el marco de la Unión Europea



PCPE, PCE M-L, Unión Proletaria, Iniciativa Comunista y Red Roja


Ante unas elecciones europeas, ninguna de las fuerzas con representación
parlamentaria habla de lo que ha supuesto, la pertenencia a tan selecto club

El mito de la Unión Europea (UE) como símbolo del capitalismo bueno, de
rostro humano y del Estado del Bienestar ha sido uno de los instrumentos
fundamentales para la domesticación del movimiento obrero en el Estado
español.

Hoy, ante unas nuevas elecciones europeas, ninguna de las fuerzas
políticas con representación parlamentaria habla de lo que ha supuesto,
y supone, la pertenencia a tan selecto club, a pesar de que en los
anteriores comicios, tanto IU como Podemos denunciaban el Pago de la
Deuda y el sometimiento a las estructuras de la UE.

Tres años antes (en 2011) un gobierno del PSOE impulsó la reforma del
artículo 135 que sometía al Banco Central Europeo (BCE) y al Comisión
Europea (CE) los presupuestos de todas las administraciones públicas por
“recomendación” de la Comisión Europea. Esta reforma exprés conllevó
brutales recortes del gasto público, de las pensiones y las enésimas
contrarreformas laborales. Ahora todo eso se ha olvidado.

En la Transición, los representantes políticos y sindicales de la
“izquierda” sellaron la subordinación del movimiento obrero a la
burguesía. Esta empleó unas veces el soborno, otras la represión y
siempre la desmemoria. Poco después se vendió la pertenencia del Estado
español a la Comunidad Económica Europea (CEE) como la entrada en el
paraíso de los derechos sociales y laborales, ocultando que había sido
una creación del imperialismo yanqui y de las grandes patronales
europeas para destruir al movimiento obrero y al socialismo..

Ese idílico mensaje propagado unánimemente por las instituciones,los
medios de comunicación y los dirigentes de los grandes sindicatos, caló
hasta tal punto en la opinión pública que pudo esgrimirse el argumento
de que, para entrar en ese edén, bien valía pagar el peaje de la entrada
en la OTAN. Ambos hechos se produjeron, una vez más, bajo un gobierno
del PSOE con mayoría absoluta.

A pesar de que el capitalismo internacional, bajo las llamadas políticas
neoliberales, estaba procediendo desde los años 70 a liquidar derechos
sociales, laborales y servicios públicos, aquí se continuaba con la
cantinela de la entrada en el paraíso del “Bienestar”.

Con el pretexto de la modernización se acometió una gigantesca
destrucción de la industria, la agricultura y la ganadería: era la
“reconversión”.
Algunos datos dan idea de las dimensiones del desastre. El 1975 el
Estado español era la novena potencia industrial del mundo y la
industria representaba el 36% del PIB; ahora no llega al 15%. La Deuda
era el 7,3% del PIB; ahora es casi el 100%. Se perdieron 2.700.000
puestos de trabajo de alta calidad y la “reconversión” costó a las arcas
públicas más de dos billones de pesetas (más de 12.000 millones de
euros), además de los daños a la producción agropecuaria.

Esta enorme destrucción productiva respondía a una evidente
planificación del gran capital europeo y estaba destinada a eliminar la
competencia que pudiera entorpecer a los mercados de las principales
potencias. Frente a ello, la resistencia obrera – a veces durísima y
heroica – permaneció aislada. No hubo ninguna respuesta de carácter
general hasta la huelga general de 1988 que no cuestionaba sino aspectos
aislados del proceso.

Los grandes sindicatos habían aceptado, desde los Pactos de la Moncloa,
el discurso del enemigo de clase: la modernización y la competitividad.
Una tras otra las Directivas europeas iban impulsando las
privatizaciones de los grandes monopolios públicos, banca incluida,
aplicadas con entusiasmo por los sucesivos gobiernos de PSOE, PP, PNV y
CiU. Esas mismas organizaciones colocaron a sus dirigentes en los
consejos de administración de los nuevos trust privados e instauraron la
corrupción masiva, mientras se ufanaban de que “España era el país donde
más rápidamente se podían hacer grandes fortunas” y de que “la mejor
política industrial es la que no existe” (Solchaga dixit). Para los
representantes sindicales de la aristocracia obrera y de la
autodenominada izquierda quedaban los lucrativos puestos en las Cajas de
Ahorros, extendiéndose
así a ellos las migajas de la corrupción, como se ha comprobado
recientemente.

Todo resquicio de soberanía o de política alternativa al capitalismo
desapareció con el Tratado de Maastricht (1992). Años después, el
proyecto de Constitución Europea, que quedó en vía muerta tras su
rechazo en Referéndum por los Países Bajos y,sobre todo por Francia, fue
aprobado en España por un 76% de los votos, con una abstención cercana
al 60%. Los dirigentes de las grandes centrales sindicales, a diferencia
de la CGT francesa, pidieron el voto a favor “porque refuerza la
capacidad sindical y beneficia a los trabajadores europeos”.

La supeditación absoluta a los designios del gran capital europeo a
través del BCE y de la CE dio un paso decisivo con la implantación del
Euro y de la Unión Monetaria (1999). La instauración de una política
monetaria común entre países con niveles de desarrollo muy diferentes y
ejercida con mano de hierro por el BCE - controlado por Alemania - ha
tenido como consecuencia drásticos ajustes en los servicios públicos y
en los derechos laborales.

La clase obrera ha pagado con una enorme caída en sus condiciones de
vida y de trabajo el ajuste entre economías dispares, a beneficio del
capital financiero, sobre todo, alemán.

Aprovechando la crisis general desatada en 2008 y el enorme
endeudamiento público – resultado como bien sabemos de la transferencia
masiva de fondos públicos a la gran banca y a las multinacionales - se
establecieron férreos mecanismos de fiscalización. La aceleración de las
privatizaciones de los servicios sociales, junto al desmantelamiento de
lo público mediante grandes recortes del gasto, las contrarreformas
laborales y de las pensiones se garantizan mediante la reforma del
artículo 135 de la Constitución (agosto de 2011), la posterior
convalidación parlamentaria del Tratado de Estabilidad de la Zona Euro
(2012) y la Ley 2/2012. El Estado, la Seguridad Social, cada
Ayuntamiento y cada Comunidad Autónoma, son periódicamente intervenidos
por la Troika que asegura mediante todo tipo de coerciones y amenazas el
cumplimiento de los objetivos de Déficit y el Pago de la Deuda.

¿Hace falta añadir más argumentos para llegar a la conclusión de que los
programas políticos para las elecciones de quienes obtendrán
representación, y que siempre son un monumental engaño, lo son además
ahora porque ninguno de los partidos que obtendrán representación
cuestiona la ausencia total de autonomía política en el marco de la UE y
de la Zona Euro.?

La UE y el engranaje institucional de la Unión Monetaria son,
exclusivamente, instrumentos al servicio del gran capital financiero y
de los monopolios. Sirven al objetivo prioritario del capitalismo en
crisis: asegurar que los costes de la misma recaen sobre la clase obrera
y las clases populares.

Quienes desde supuestas posiciones de “izquierda” reclaman la “vuelta
del Estado del Bienestar”, cumplen el papel de servidores de las clases
dominantes. Lo hacen, tanto porque respaldan sus mentiras, como porque –
cumpliendo su papel natural – se afanan en dificultar que el movimiento
obrero y popular identifique con claridad a sus enemigos y actúe en
consecuencia.

A mantener el engaño de la UE como marco democrático en el que cabría
ejercer la soberanía de los pueblos, contribuyen también las
organizaciones independentistas que plantean ejercer el legítimo Derecho
de Autodeterminación en su marco. Hemos vivido el ejemplo de Cataluña.
Hemos visto cómo los gobiernos y las instituciones europeas miraban para
otro lado ante la brutal exhibición de represión contra un pueblo
indefenso realizada por unos aparatos del Estado atravesados por la
herencia de la Dictadura. Se ha manifestado también con toda claridad la
ingenuidad, o la trampa para los pueblos, que entrañan propuestas de
independencia en el marco de la UE. Una vez más se ha impuesto la
evidencia: es necesario articular la lucha conjunta de la clase obrera y
de los pueblos del Estado español para liquidar el Régimen heredero del
franquismo y por la República

En el escenario de la crisis, cuyo próximo estallido se anuncia ya, con
una UE debilitada por el Brexit, con sus principales potencias con
graves problemas económicos y cuando las contradicciones entre el
imperialismo norteamericano y el de las grandes potencias europeas se
agudizan, es preciso que la respuesta de los pueblos de Europea a las
nuevas agresiones, que sin duda vendrán, se articule sobre la base de
arrojar a la UE al basurero de la historia. La unificación de las luchas
obreras y populares concretas debe enmarcarse en la exigencia de No
Pagar la Deuda, salir de la UE, del Euro y de la OTAN. Todo ello junto a
la expropiación de la banca, de las grandes empresas estratégicas y la
socialización de los recursos naturales, unidas a la planificación
democrática de la economía.

Propuestas de ruptura como las que apuntamos, que señalan claramente a
los responsables de tanto sufrimiento y muestran el camino a seguir, son
las únicas que, con la coordinación necesaria, pueden permitir a los
pueblos de Europa avanzar en la construcción de la fuerza necesaria para
conquistar la soberanía y la democracia y acabar con el capitalismo y
construir el socialismo

In
LA HAINE
https://www.lahaine.org/est_espanol.php/manifiesto-no-hay-futuro-posible
25/5/2019

sábado, 25 de maio de 2019

Dois marxismos?



*por Greg Godels *

O Google sabe que tenho um interesse permanente no marxismo.
Consequentemente, recebo links frequentes para artigos que os algoritmos
do Google seleccionam como populares ou influentes. Sistematicamente, no
topo da lista, estão artigos de ou sobre o irreprimível Slavoj Žižek.
Žižek dominou os truques de um intelectual público – divertido, pomposo,
escandaloso, calculadamente obscuro e amaneirado. A pose desalinhada e a
barba desgrenhada somam-se a uma quase caricatura do professor europeu,
a presentear o mundo com grandes ideias profundamente embebidas em
camadas de obscurantismo – uma maneira infalível de parecer profundo. E
uma maneira infalível de promover o valor comercial do entretenimento.

. Seguidores próximos do "mestre" até postam vídeos de Žižek a devorar
hot dogs – um em cada mão ! Ele está actualmente a ganhar dinheiro com
um debate público com um congénere de direita que é um saco vazio, o
qual supostamente torna obscenos os preços dos ingressos. O marxismo
como empreendedorismo.

Žižek é uma das mais recentes repetições de uma longa linhagem de
académicos em grande parte europeus que constroem uma modesta
celebridade pública a partir de uma identificação com o marxismo ou a
tradição marxista. De Sartre e o existencialismo até o estruturalismo,
pós-modernismo, pós-essencialismo, pós-fordismo e política identitária,
académicos apropriaram-se de partes da tradição marxista e afirmaram
repensar aquela tradição, enquanto mantinham uma distância segura e bem
medida em relação a qualquer movimento marxista. Eles são marxistas
quando isso lhes traz uma audiência, mas raramente respondem ao chamado
à acção.

O curioso sobre este marxismo intelectual, de salão de conversa, o
marxismo diletante, é que nunca é completo; é marxismo com reservas
sérias. O marxismo é bom se for o do Marx "primitivo", do Marx
"humanista", do Marx "hegeliano", do Marx dos /Grundrisse, / do Marx sem
Engels, do Marx sem a classe trabalhadora, do Marx antes do bolchevismo,
ou antes do comunismo. Compreensivelmente, se quiser ser o próximo
grande domador de Marx, deve separar-se da manada, deve repensar o
marxismo, redescobrir o Marx "real", mostrar onde Marx errou.

Gerações anteriores de estudantes universitários bem-intencionados, mas
com confusão de classe, foram seduzidas por pensadores "radicais" que
oferecem um gostinho de rebeldia num pacote académico sexy. Estudantes
carregam montes de livros não lidos, mas livros de autores na moda como
Marcuse, Althusser, Lacan, Deleuze, Laclau, Mouffe, Foucault, Derrida,
Negri e Hardt – autores que compartilhavam características comuns com
livros de títulos exóticos e provocativos e prosa impenetrável. Livros
que prometiam muito, mas entregavam trevas.

Com uma nova geração de jovens de mentalidade radical em busca de
alternativas ao capitalismo e curiosos acerca do socialismo, é
inevitável que muitos estejam a olhar para Marx. E para onde se voltam?

Um professor de Yale desavergonhadamente apresenta na badalada /Jacobin
Magazine / uma cartilha para iniciantes intitulada /Como ser um
marxista/
<https://www.jacobinmag.com/2019/04/this-life-review-martin-hagglund-socialism>
. O professor Samuel Moyn actualmente exerce na cadeira Henry R. Luce
[1] <#nr> de jurisprudência. Aparentemente, Moyn não se sente
desconfortável em possuir uma cadeira dotada por um dos mais notórios
editores anti-comunistas e anti-marxistas do país quando apresenta o seu
guia para o marxismo.

A pretensão de Moyn de guiar os que não têm conhecimento do marxismo não
se justifica nem se explica. No entanto, ele sente-se confiante para
recomendar dois académicos recentemente falecidos, Moishe Postone e Erik
Olin Wright (juntamente com o ainda vivo Perry Anderson), como
representando os últimos da "…geração de grandes intelectuais cujas
experiências da década de 1960 levaram-nos a dedicar a vida inteira a
recuperar e re-imaginar o marxismo".

Confesso que a sua escolha de Moishe Postone deixou-me desconcertado.
Deveria eu ficar embaraçado por dizer que nunca conheci o trabalho do
professor Postone ou que não o conheci como marxista? Quando encontrei
no YouTube uma entrevista <https://www.youtube.com/watch?v=OJIaze-C2Qs>
com o estimado Professor Postone, descobri rapidamente que ele
enfaticamente e sem reservas nega ser marxista. Além disso, Postone
pretende que a maior parte do que chamamos de marxismo foi escrita por
Frederick Engels. Postone admite que Engels era "realmente um bom
rapaz", mas que Engels nunca entendeu Marx adequadamente. Postone, por
outro lado, sim. E o seu Marx não "glorifica" a classe trabalhadora
industrial.

Estou no entanto familiarizado com o outro alegado exemplar de uma
devoção de "grande intelectual" ao marxismo, Erik Olin Wright. Wright
foi um membro consagrado e proeminente da chamada escola do "Marxismo
Analítico". Wright, como os demais membros desse movimento intelectual,
tentou colocar o marxismo numa base "legítima", onde a legitimidade era
obtida submetendo o marxismo aos rigores da ciência social
anglo-americana convencional. O conceito de que a ciência social
anglo-americana é sem viézes ou que nada tem a aprender com o método de
Marx jamais é questionado com essa gente. Mas, para crédito de Wright,
ele lutou com unhas e dentes para apreender o conceito de classe social.

A fim de "salvar a esquerda de se meter em vários becos sem saída", o
professor Moyn oferece o último livro de seu "colega brilhante", Martin
Hägglund. Moyn assegura-nos que /"This Life: Secular Faith and Spiritual
Freedom" ("Esta vida: Fé laica e libertação espiritual") / é excelente
para começar por aqueles que querem estimular a teoria do socialismo, ou
mesmo construir a sua própria teoria de uma variante marxista dela".

Basta apenas um breve momento para verificar que Martin Hägglund e seu
admirável colega estão a levar-nos a outros becos sem saída, alguns
pisados por muitas gerações anteriores. A jornada de Hägglund
revisitaria o existencialismo, Hegel e as tradições cristãs em busca do
evasivo "sentido da vida". Embora muitos de nós pensassem que Marx
oferecia uma análise profundamente informada da mudança social e da
justiça social, Moyn / Hägglund, seguindo Postone, avançam com "as
perguntas finais que todos devem fazer: que trabalho deveria eu fazer?
Como deveria gastar meu tempo finito?" Acumular capital contrapõe-se,
sugerem eles, a "maximizar... o tempo livre individual a despendê-lo
como lhe agradar..."

Assim, a luta pela emancipação, neste repensar do marxismo, não é a
emancipação da classe trabalhadora, mas o arrebatar de tempo livremente
descartável das garras do trabalho. Os professores admitem que esta luta
é muito mais fácil para académicos do que para os "miseráveis da terra".

"E finalmente", conclui Moyn, "há a proposta de Hägglund de que os
marxistas podem abandonar o comunismo – que, em qualquer caso, Marx
descreveu vagamente – em favor da democracia. Não está totalmente claro
o que Hägglund quer dizer com democracia, algo que nem o próprio Marx
nem muitos marxistas optaram por investigar teoricamente. Assim,
Hägglund destila "marxismo" numa rejeição do comunismo e num abraço de
uma vaga "democracia". Eu teria de concordar com Moyn quando ele diz:
"Na verdade, é notável quão poucas pessoas pensaram que a teoria
marxista tornara-se a tentativa de Hägglund de recomeçá-la no nosso
tempo". Aparentemente, o segredo agora revelado de se tornar um marxista
é descartar Marx

Tal como muitos auto-proclamados "marxistas", que antecederam Postone,
Hägglund e Moyn, a intenção dos mesmos parece ser mais a de defraudar o
marxismo do que a de promovê-lo.

*Ideias perigosas *

A verdade nua e crua é que o marxismo – desde a época da censura de Marx
e das suas múltiplas expulsões de diferentes países – é uma ideia
perigosa. A incapacidade de Marx de assegurar nomeações académicas e a
sua constante vigilância e perseguição por parte das autoridades provou
ser um precursor do destino de quase todos os intelectuais marxistas
autênticos. O capitalismo não dá àqueles que defendem a destruição do
capitalismo honra académica ou celebridade. E aqueles "marxistas" que se
tornam aclamados por académicos, que obtêm lucrativos negócios de
livros, que desfrutam de exposição nos media, raramente representam
grande ameaça ao sistema.

É um facto revelador que, embora a história tenha produzido muitos
marxistas "orgânicos", marxistas com raízes na classe trabalhadora e em
movimentos que desafiam o capitalismo, suas contribuições raramente
povoam as bibliografias de professores universitários, a menos que sejam
para ridicularizá-las. O emprego universitário raramente está disponível
para fornecedores de ideias perigosas ou para a defesa de uma versão de
Marx que apele a mudanças revolucionárias.

Um historiador marxista como o falecido Herbert Aptheker
<https://www.bookdepository.com/search?searchTerm=Herbert+Aptheker&search=Find+book>
– que fez mais do que qualquer outro intelectual para desafiar a
representação distorcida, em /Nascimento de uma nação / E tudo o vento
levou, / de um Sul benévolo e da sua heróica defesa de um nobre estilo
de vida – não conseguiu encontrar trabalho em universidades dos EUA. Na
verdade, até foi preciso um movimento pela liberdade de expressão para
que lhe fosse permite falar nos /campi / dos EUA. Seus livros
desapareceram da circulação e poucos estudantes de história
afro-americana têm acesso às suas contribuições.

Ninguém elaborou uma história do movimento trabalhista americano que
rivalizasse com a do falecido marxita Phillip Foner
<https://www.bookdepository.com/search?searchTerm=Phillip+Foner&search=Find+book>
, os 10 volumes de /History of the Labor Movement. / Os cinco volume de
/The Life and Writings of Frederick Douglass / , também de Foner,
restabeleceram Douglasse como uma figura proeminente na abolição da
escravatura nos EUA. Uma universidade historicamente negra, a Lincoln
University, corajosamente contratou Foner após anos de listas negras.
Infelizmente, hoje, suas obras são amplamente ignoradas nos campos em
que foi pioneiro.

As sérias contribuições de muitos outros intelectuais marxistas dos EUA
podem ser encontradas em edições antigas de publicações como /Science
and Society <http://www.scienceandsociety.com/> , Political Affairs,
Masses, Masses and Mainstream e Freedomways / a descansarem em
prateleiras recônditas e poeirentas, diminuídas pelo macarthismo, pelas
listas negras, pela covardia académica e pelo anticomunismo grosseiro.

As portas e o discurso público da academia e dos mass media foram
igualmente fechados aos marxistas da classe trabalhadora (a menos que
renunciem a seus pontos de vista!). Apesar de sua liderança dos
movimentos da classe trabalhadora e de escrever prolificamente, os
trabalhos marxistas de William Z. Foster
<https://www.bookdepository.com/search?searchTerm=William+Z.+Foster&search=Find+book>
sobre organização, estratégia e tácticas trabalhistas e economia
política estão em grande medida esquecidos, a menos que reapareçam como
o pensamento de outra pessoa. A outras importantes figuras marxistas
responsáveis por alguns dos melhores momentos da força de trabalho e
pela sua interpretação, como Len De Caux e Wyndham Mortimer, é-lhes
negada a entrada no clube.

Analogamente, pioneiros marxistas nos movimentos de igualdade dos negros
e das mulheres, como Benjamin Davis, William Patterson e Claudia Jones,
não são nem louvados como tais nem são apresentados como exemplos de
"Como ser um marxista".

A obra do economista político marxista Victor Perlo
<https://www.bookdepository.com/search?searchTerm=Victor+Perlo&search=Find+book>
na identificação dos mais altos limites do capital financeiro e da
teoria económica do racismo estão curiosamente ausentes de qualquer
conversação académica relevante.

O que todos esses marxistas compartilham é uma vida política activista
no Partido Comunista dos EUA, um distintivo orgulhoso, mas denegrido
pela maior parte dos intelectuais americanos.

Os melhores escritos da venerável /Monthly Review / sofrem a mesma
marginalização. Seus fundadores foram ameaçados o suficiente para serem
vitimizados pelo /Red scare/ <https://en.wikipedia.org/wiki/Red_Scare> .
E o seu co-fundador Paul Sweezy, um sério economista político marxista,
nunca foi entusiasticamente recebido nos círculos académicos.

Hoje, Michael Parenti
<https://www.bookdepository.com/search?searchTerm=Michael+Parenti&search=Find+book>
é o mais perigoso intelectual marxista nos EUA. Sei disto porque apesar
de incontáveis livros, vídeos e palestras, apesar de um compromisso
intransigente com uma interpretação marxista da história e dos
acontecimentos actuais, apesar de um profundo, mas fundamentado ódio ao
capitalismo, e apesar de um estilo admiravelmente acessível e com
grandes ideias, ele não tem emprego em universidades e é-lhe negado
acesso a todos os media, excepto os mais à esquerda ou marginais.

Outro impressionante estudioso marxista dos EUA, Gerald Horne
<https://www.bookdepository.com/search?searchTerm=Gerald+Horne&search=Find+book>
, embora desfrutando de estabilidade académica, merece ser estudado por
todos os "esquerdistas" nos EUA pela integridade, acessibilidade e
qualidade do seu trabalho.

O marxismo autêntico, em oposição ao marxismo da moda, do modismo, ou do
marxismo caprichoso, é implacável, agressivo e inspirador de acção. Ele
disseca diligentemente o funcionamento interno do sistema capitalista. É
implacável e impiedoso na sua rejeição ao capitalismo. Ele desafia o
pensamento convencional, fazendo poucos amigos na imprensa capitalista e
abalando a gentileza e a colegialidade do liberalismo tranquilo da
academia. O marxismo não é um avanço de carreira, mas um compromisso
ingrato.

Os marxistas reais são necessariamente anómalos /(outliers). / Até as
condições para mudanças revolucionárias amadurecerem, eles são
frequentemente sujeitos a cepticismo, desinteresse, até escárnio e
hostilidade. Os que posam como marxistas são alérgicos a organizações
políticas, activismo e risco intelectual, ao passo que marxistas
comprometidos são obrigados a buscar e unir movimentos pela mudança.
Eles são levados a servir a muito citada tese de Marx e raramente
atendida na décima primeira tese sobre Feurbach: "Os filósofos só
interpretaram o mundo de várias maneiras; a questão no entanto é mudá-lo".

30/Abril/2019

[1] Magnata da imprensa, en.wikipedia.org/wiki/Henry_Luce
<https://en.wikipedia.org/wiki/Henry_Luce>

*O original encontra-se em https://mltoday.com/two-marxisms/
<https://mltoday.com/two-marxisms/> *

In
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/crise/dois_marxismos.html
24/5/2019

terça-feira, 21 de maio de 2019

Novos caminhos à esquerda




Na dialética da luta política, ação e organização se retroalimentam.
Organização sem ação produz o burocratismo diletante, ação sem
organização produz aventureirismo. Pela organização do povo em comitês!




        *por Francisco Celso Calmon*

Precisou a casa ruir após o golpe parlamentar-judicial de 2016 e
instalar-se o golpismo aos direitos dos trabalhadores, ao patrimônio e à
soberania nacional, para acordar a todos da letargia política no
exercício da luta de classes.

A luta pela redemocratização, iniciada nos anos 80 após a anistia, levou
a esquerda gradativamente a abandonar a concepção de luta de classes
como eixo central das transformações (ou retrocessos) sociais. Adotou,
em substituição, uma visão bonapartista do Estado, a serviço de todas as
classes, e a crença na sua conciliação, como foram os governos de Lula e
Dilma.

Quando a casa começou a ruir com o golpe de 2016, o diagnóstico de que a
esquerda estava desconectada das bases foi unânime.

Mas parou por aí e nas críticas ao PT.

Na verdade, era mais do que isso: a esquerda estava de calças curtas na
luta de classes.

A causa das causas ficou na margem, à espera de ser resgatada para o
centro da questão.

“De tempos em tempos os operários triunfam, mas é um triunfo efêmero. O
verdadeiro resultado de suas lutas não é o êxito imediato, mas a união
cada vez mais ampla dos trabalhadores” (Marx e Engels, Manifesto Comunista).

A concepção e operação da luta de classes se concentram no eixo perene
de Formar, Organizar, Protagonizar – FOP – os trabalhadores, para
construir o empoderamento e a consciência de classe de um projeto
alternativo ao capitalismo e à democracia burguesa.

Ao abandonar a concepção de luta de classes e adotar a da conciliação, a
arena de atuação ficou especialmente circunscrita ao cercadinho
institucional, e as relações republicanas foram a expressão
comportamental do bonapartismo caboclo. Como efeito em cadeia,
produziu-se a burocratização e alienação dos partidos de esquerda e das
entidades dos trabalhadores como sujeitos da transformação estrutural.

Essa adoção vai ocasionar, na dialética das lutas sociais, um divórcio
amigável entre as lutas segmentais, como a pugna dos negros, indígenas,
mulheres, LGBTs, de um lado, e a luta matriz, que é a luta coletiva de
classes, de outro. Amigável, mas que nutriu a concepção
bonapartista-republicana, consolidou o peleguismo, ampliou a atomização,
e gerou uma plêiade de líderes sociais que viveram – e parte ainda vive
– às custas e como satélites dos governos, melhor ainda: como pirilampos.

Nestas últimas décadas o vermelho da esquerda desbotou. Daí a
adjetivação de esquerda desbotada, esquerda rosinha-salmon e esquerda
cosmética – que é a minha preferida. Com quaisquer denominações,
estamos, como sempre estivemos na história, entre a predominância do
peleguismo ou do esquerdismo bravateiro.

A debacle do Estado Democrático de Direito pelo golpismo comprovou que,
em última instância, a democracia popular é incompatível com o
capitalismo, sobretudo com o capitalismo no Brasil, patrimonialista e
sem riscos aos capitalistas, cuja classe dominante é marcadamente
conservadora e reacionária, portadora de preconceitos e autoritarismo. A
democracia burguesa serve aos interesses dos capitalistas, assim como no
futuro a democracia popular servirá aos interesses dos trabalhadores.
Nesse entendimento, o Poder Judiciário sempre foi o garantidor dos
interesses do poder dominante. Oportunidade de alteração qualitativa nos
tribunais superiores houve e fora desperdiçada, por método errado, pelos
governos de Lula e Dilma.

Por tudo, a evolução da democracia terá limites, via golpes das classes
dominantes, ou terá ruptura, via classes trabalhadoras. Golpes e
rupturas fracassados fazem parte do cardápio da história. A construção
perene da democracia sustentada dependerá das classes trabalhadoras,
especificamente do seu estágio de consciência e organização.

Meia sola, isto é, organização tradicional e consciência reformista, não
sustenta a democracia e muito menos protagoniza uma ruptura.

A organização deve ser de base, produzindo a consciência coletiva de um
projeto capaz de ser agregador da maioria da sociedade, inclusive da
classe média.

Reformas executadas por governo popular devem estar em sintonia com a
Formação, Organização e Protagonização – FOP – dos trabalhadores, sob
pena de ficarem sujeitas a retrocessos sem efetiva e pronta resistência.

A teoria libertadora se tornará em força material à medida que a
intelectualidade de esquerda seja organicamente da classe trabalhadora
e/ou das organizações dela. A intelectualidade acadêmica fechada em
guetos não colaborará com o movimento transformador consoante a sua
potencialidade. Será necessário ligar-se às comunidades nos seus
entornos e realizar a mediação entre o saber e a práxis. Nesse sentido,
os trabalhadores do magistério, mormente do ensino médio, têm
potencialmente o papel da interseção dialética entre a teoria
revolucionária e a prática da luta de classes.

O Sistema, através dos seus aparelhos ideológicos, mantém a hegemonia.
Construir aparelhos para o contraponto faz parte do eixo FOP. O
enfretamento ao Sistema deve ser amplo, continuado e permanente.

Se entendermos a luta de classes como fenômeno objetivo (motor da
história), que independe de querer ou não, e perene, consoante à
concepção materialista da história, a estratégia terá que estar em
conformidade a essa concepção, com variações e adequações táticas.

A história da esquerda no Brasil é pendular entre o peleguismo e o
infantilismo. Como romper é um desafio tão importante quanto a busca da
unidade.

A compreensão de alguns conceitos que foram deformados na teoria e na
prática pode ser um primeiro passo.

A luta de classes ocorre em três níveis, em termos didáticos: o primeiro
no econômico, o segundo no social e o terceiro no político.

No primeiro, a demanda é basicamente por melhores salários e
eventualmente por melhorias nas condições de trabalho. Muitos líderes,
ainda repetindo o século dezoito, acreditam que essa luta atinge o
capital, quando às vezes até trabalham em seu favor, pois os patrões
aproveitam para reestruturar os meios de produção e as folhas de
pagamento. Numa falsa impressão de terem cedido, dão com uma mão e
retiram muito mais com a outra. Na luta econômica, o trabalhador mantém
a consciência de classe em si, ou seja, de preservar a sua sobrevivência
enquanto tal, ou cai na ilusão de conquistar elevados salários que
possibilitem comprar os direitos sociais, sem ir além disso.

Destaco nesse nível a importância dos trabalhadores do setor financeiro
(bancos, bolsas, corretoras de valores etc), uma vez que no ápice do
sistema econômico está o capital financeiro.

Na luta social, a classe trabalhadora amplia seus interesses e a sua
visão da estrutura do sistema e incorpora segmentos médios da sociedade,
possuidores das mesmas demandas pelos direitos sociais. Saúde,
educação/cultura, emprego/lazer, moradia, transporte, segurança e
seguridade, compõem a plêiade pelo bem-estar social dos trabalhadores.

Cada demanda social possibilita agregar a maioria da sociedade carente
de cada um desses direitos. Do salário mínimo ao transporte gratuito aos
necessitados, aos idosos e à juventude, saúde e educação gratuita para
toda a população, passando pela aposentadoria digna, compõem uma
plataforma de luta que agrega todos os segmentos de trabalhadores, da
base estrutural aos segmentos intermediários.

É na luta social que a classe trabalhadora amplia a sua consciência e
organização e começa a construir sua liderança por uma sociedade
alternativa à atual, que oprime e explora a maioria esmagadora do país.

Destaco nessa categoria a importância da luta pela valorização do
salário mínimo.

Na luta política é onde se dá a disputa pelo poder, tanto institucional
quanto não institucional. Os poderes institucionais reais, como o
Executivo, Legislativo, Judiciário, Ministério Público, Policia Federal
e Forças Armadas, são ocupados por sufrágio ou por concurso. Os poderes
ocupados via concursos estão hipertrofiados quando deveriam ser hipo,
pois não são oriundos da soberania popular. Os poderes fora do campo
institucional são os partidos, sindicatos, federações, centrais,
frentes, fóruns, movimentos sociais, conselhos, enfim, entidades
organizatórias da sociedade.

É na luta política que se concentra a disputa decisiva da luta de
classes. Dos três andares na estrutura da sociedade, é a política o
andar mais alto. Entretanto, na dialética da luta há mediações entre
eles, que se encontram e se reforçam mutuamente, e por isso se diz que
toda luta de classe é uma luta política.

Nos três campos de luta pode e deve-se travar a luta ideológica, quer
dizer, diagnosticar os males do sistema capitalista e contrapor com
outros valores. Nessa seara conscientizar que a corrupção, por exemplo,
tem origem no sistema de classes e está no coração do atual capitalismo
de desastre.

Estratégia e Projeto de nação precisam focar no modo de conquistar a
paridade de armas com vistas a construir a hegemonia ideológica (a
maioria da sociedade favorável a um sistema alternativo), que permitirá
a ruptura e transição. Nesse vetor a soberania e o patrimônio nacional
são outros valores a defender. É preciso galvanizar todos os segmentos
sociais vítimas do Sistema.

A maioria da sociedade é de mulheres, 52,5%. A maioria da sociedade é de
negros, 54,5%. A maioria da sociedade é de trabalhadores, em torno de
66% da população.

Na outra ponta, os capitalistas no país constituem uma minoria tão
ínfima que têm nome e sobrenome.

Se as mulheres são discriminadas, se os negros são discriminados, e
todos os trabalhadores são explorados e oprimidos, por que a correlação
de forças na política é favorável aos representantes da classe dominante?

As lutas segmentais/identitárias devem ser matizadas à luz da luta de
classes. Todas elas devem apontar e se inserir nesse leito, caso
contrário servirão aos carreiristas, arrivistas, que almejam chegar às
elites ao invés de objetivarem as transformações estruturais.

Estratégia e Projeto serão os instrumentos potencias da unidade na
prática. Não é a busca da unidade pela unidade, mas da unidade na
práxis. Sua construção não depende de uma pré-unidade, mas de estarem
abertos para correções e inclusões na dinâmica da política, pois, nem
uma e nem o outro são acabados.

Com os fundamentos e alicerces argamassados, as torres de edificação
sustentarão transições e impedirão, com resistência, retrocessos rumo à
barbárie.

Os parlamentares no Congresso, Assembleias e Câmaras; governadores e
prefeitos democráticos apoiando a resistência em conexão e trincheiras
próprias; juristas, advogados e demais operadores do direito, no
judiciário, nos ministérios públicos e em suas respectivas entidades;
intelectuais, artistas e demais, nas cátedras, palestras, manifestos,
teatros, cinemas, meios de comunicação; trabalhadores nas suas
organizações preparando e disparando greves – geral, locais,
departamentais, operações tartaruga e outras formas mais; movimentos
sociais em seus acampamentos, marchas e ocupações; a juventude, com sua
ousadia e destemor característicos, em passeatas, ocupações e criativas
formas de protestação; e TODOS nos Comitês Populares pela Democracia –
CPD, criando uma rede com o objetivo geral de derrubar a tirania
protofascista instalada nas instituições do Estado e de construir a
democracia de todas e todos.

Os comitês Lula livre podem e devem ser ampliados para o objetivo maior
da luta pela democracia, sem perder a centralidade de curto prazo. O
trabalho de construir uma democracia popular sustentável é de médio para
longo prazo. Recomeçar evitando os mesmos erros é a autocrítica prática,
com os ensinamentos da história.

No combate à ditadura militar tivemos a experiência exitosa dos Comitês
Brasileiros pela Anistia – CBAs –, no país e no exterior, de composição
ampla e de estruturação e ação horizontal.

Cada CPD – Comitê Popular pela Democracia – deverá definir o que fazer
no seu chão: chão da moradia, chão do trabalho, chão da terra, chão do
estudo, usando das características conhecidas como guerrilhas
democráticas: fustigamentos, constrangimentos, surpresas, ocupações
temporárias, avanços e recuos, et caterva, com inteira autonomia e
mobilidade, com os focos centrais imediatos na luta pela liberdade do
Lula e por dar um basta ao governo protofascista e seus aliados
institucionais. (Basta de Bosta!).

Parafraseando Carlos Marighella, nenhum comitê precisa pedir licença
para realizar ações contra a tirania.

Na dialética da luta política, ação e organização se retroalimentam.
Organização sem ação produz o burocratismo diletante, ação sem
organização produz aventureirismo.

Pela organização do povo em comitês!

Pela democracia popular de todas e todos os brasileiros.

* Texto escrito há dois anos, atualizado em abril/2019.

*/Francisco Celso Calmon é Advogado, Administrador, Coordenador do Fórum
Memória, Verdade e Justiça do ES; autor do livro Combates pela
Democracia (2012) e autor de artigos nos livros A Resistência ao Golpe
de 2016 (2016) e Comentários a uma Sentença Anunciada: O Processo Lula
(2017)./*

In
GGN
https://jornalggn.com.br/artigos/novos-caminhos-a-esquerda-por-francisco-celso-calmon/
21/5/2019

domingo, 19 de maio de 2019

EMPRESAS RECUPERADAS: LA UNIDAD COMO GRAN DESAFÍO





Se llevó a cabo el penúltimo encuentro del ciclo de charlas en el marco
del décimo aniversario de la CNCT. Empresas recuperadas y gestionadas
por sus trabajadores y trabajadoras fue el eje del conversatorio.


En un contexto en el que los caminos se cierran cada vez más para las y
los trabajadores, las empresas recuperadas que fueron puntapié e
insignia de lucha hace algunos años atrás, también se ven atravesadas
por la crisis que gestionó y fomentó el gobierno neoliberal.

Con este marco no muy prometedor, se realizó el encuentro de
trabajadores de empresas recuperadas de diversos rubros. Del panel
participaron: José Sancha, de cooperativa Decosur, primer presidente de
CNCT. Federico Tonarelli, de la cooperativa BAUEN; Claudia Moreno, de la
escuela cooperativa Mundo Nuevo. Fabio Resino, de cooperativa La Ciudad;
Hugo Cabrera, de gráfica Campichuelo, Francisco "Manteca" Martínez, de
textiles Pigüé y Jorge Reisch, de cooperativa Cueroflex y del sindicato
de obreros curtidores. Allí, sin animos de desanimar, sino con el firme
compromiso de continuar luchando, se plantearon estrategias de
articulación y el desafío de generar unidad dentro de las diversas
corrientes que tiene el sector.

A modo de reflexión, Federico Tonarelli, hizo las veces de moderador del
panel y antes de comenzar, se refirió a los diez años de la CNCT, y lo
que esto significa. “Hace diez años nos encontrábamos frente al desafío
de lograr lo que muchísimos cooperativistas de trabajo no habían podido
logran en décadas que era conformar una organización que nos represente
a todos, finalmente hicimos algo que debemos reivindicar y con mucho
orgullo tenemos que llevar adelante, que es haber conformado finalmente
aquella organización que es la CNCT. Diez años después, estamos acá, en
nuestra casa y listos para seguir trabajando y haciendo crecer al
cooperativismo de trabajo”.

*Enseñanza hacia adentro y hacia afuera*

Luego, quien tomó la palabra fue Claudia Moreno quien hizo un repaso
histórico y cronológico de la creación y constitución de su cooperativa
que se encuentra en el barrio porteño de Villa Crespo. Hablamos de la
escuela Mundo Nuevo que tras su momento “de quiebre y refundación en el
año 2007”, explica, hoy tiene 300 alumnos y 75 asociados y asociadas.
Moreno, teniendo en cuenta su experiencia propia no solo en el proceso
de recuperación sino también en los más de veinte años que viene
construyendo y aportando al crecimiento de su cooperativa, hace especial
hincapié en la necesidad de desarrollar y profundizar al interior de las
entidades un lazo más fuerte “para que realmente pueda surgir un
espíritu de pertenencia, identificación, identidad, participación. Si
queremos más democracia, creo que el camino es ese”, dice.

Entre las dificultades actuales, una de las más difíciles de afrontar es
la económica y la edilicias, ya que no cuentan con edificio propio y
tienen un gasto muy grande de alquiler, sin embargo redobla la apuesta:
“la autogestión la entendimos como esa posibilidad de salir a pelear lo
que es nuestro”.

Jorge Reisch hizo un diagnóstico crítico de la situación: “estamos muy
mal, esto no lo vivimos nunca”, afirmó con el dato certero de que las
fábricas están funcionando con un 40 por ciento de su capacidad
instalada y operativa. “Hacemos 50 toneladas mensuales cuando antes
hacíamos 120, 130 trabajando tranquilos”.

A su turno, Martínez explicó que el desafío no es solamente organizar y
conducir las empresas sino también ser solidarios y estar a disposición
en todo el territorio nacional para quienes están en una situación
difícil. “Nosotros no podemos permitirnos más la situación de lo que
provocan estos contextos en la fragmentación familiar, después en lo que
tiene que ver con esta cacería a la industria argentina”, afirmó.

Por su parte, José Sancha hizo referencia a la crisis que se vivió en la
Argentina en 2001, reivindicó al movimiento de empresas recuperadas que
pudo perdurar en el tiempo y, en el caso de su cooperativa, con un
crecimiento exponencial durante el gobierno kirchnerista. Todo esto,
aclara: “con un contexto de políticas que favorecieron a la clase
trabajadora”, marcando una clara diferencia con la actualidad donde
también “la crisis es diferente a la que hicimos frente en aquellos
años”, explica. “Hoy las pymes no dan más y sin embargo como
cooperativistas y como empresas recuperadas no sé si estamos en
condiciones de dar aquellas respuestas que dimos en el 2001, creo que
cambia la situación económica y cambia la sociedad. Hoy, la sociedad no
es como la de aquel entonces, sacudida y dispuesta a votar por ejemplo
leyes de expropiación, o una sociedad dispuesta a re armar la cadena de
pagos, hoy el mercado está agresivo y la sociedad está en otra
situación”, reflexiona.

*La unidad como desafío*

Y no solo se habla aquí de unidad del peronismo para terminar con el
gobierno de Macri en las elecciones, sino dentro del propio sector
autogestivo, con ejes de comercialización, políticas, capacitación y
sentido de pertenencia como un nuevo desafío hacia adelante. Es un punto
en el que coincidieron todos los participantes del panel.

Hugo Cabrera sugirió hacer una mesa en la cual “más allá de las
diferencias que haya podamos sentarnos todas las organizaciones a
charlar, conversar y a empezar a armar una propuesta inteligente para
poder desarrollarla hacia adelante”, con puntos para trabajar *(ver
abajo)**.

En este punto, Fabio Resino llamó a “generar espacio de solidaridad y
unión” con todos los actores de la economía social,  “con compañeros que
producen alimentos orgánicos, textiles, gráficas y otras experiencias
que antes no existían hace más de diez años atrás cuando nosotros
formamos la CNCT, incluso no existía este tipo de organización”. En ese
aspecto, rescató a la confederación como “herramienta para discutir
fuertemente una alianza y una profundización con otros sectores de la
economía social de unión y de debate de toda la economía social”.

“Si estamos pidiendo unidad a los sectores políticos, deberíamos hacerlo
primero nosotros para formar un grupo homogéneo que pueda poner a los
mejores cuadros de cada organización en los lugares estratégicos,
creemos firmemente que ya es verdaderamente la hora de las y los
trabajadores en los puestos de decisión que justamente van a entender a
compañeros y compañeras que se dedican a la producción y a la
industria”, afirmó Martínez. Y Sancha agregó además la necesidad de
pensar estas estrategias teniendo en cuenta la renovación de cuadros en
las organizaciones. 

**Puntos de una agenda común propuestos por Hugo Cabrera.*

  * Eficiencia en la gestión: que se asegure una actividad que sostenga
    la calidad de vida de los integrantes de una cooperativa y que ese
    trabajo le garantice un mínimo nivel de ingreso y sostenimiento en
    el futuro.
  * Democracia en el lugar de trabajo: que asegure la horizontalidad de
    las decisiones estratégicas y la capacidad colectiva de tomar esas
    decisiones organizativas.
  * Formación y capacitación: que consoliden los valores de la
    autogestión y el sentido de pertenencia
  * Herramientas de planificación: para corto, mediano y largo plazo
  * Desarrollar una estrategia de comercialización para trabajar en
    función de desarrollar estrategias en el intercambio propio y en la
    posibilidad de vender al exterior
  * Mejoramiento tecnológico
  * Estrategia de financiamiento autónomo para fortalecer al sector que
    genere también independencia del estado
  * Discutir nuevas políticas públicas
  * Articulación con la economía popular que no necesariamente
    desarrollan una dinámica autogestiva
  * Vínculo con los sindicatos

In
CNCT
http://www.cnct.org.ar/empresas-recuperadas-la-unidad-como-gran-desafio
16/5/2019

sexta-feira, 17 de maio de 2019

Eduardo Moreira para Stedile: Brasil precisa deixar de ser refém do 1% mais rico





Em conversa com João Pedro Stedile, da direção nacional do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o ex-banqueiro Eduardo Moreira
analisa os motivos e as saídas da crise para a retomada do
desenvolvimento econômico e social do país: "No Brasil, as pessoas que
detêm esses meios de produção não têm a menor ideia de como gerar riqueza"




-* A crise econômica brasileira se arrasta com altos níveis de
desemprego e um aprofundamento da crise de representação política. Em
conversa com João Pedro Stedile, da direção nacional do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), para o Brasil de Fato, o
ex-banqueiro Eduardo Moreira analisa os motivos e as saídas da crise
para a retomada do desenvolvimento econômico e social do país.

Moreira fez carreira no mercado financeiro, tendo sido sócio do BTG
Pactual, mas recentemente tem se destacado por denunciar desmandos da
elite econômica brasileira. Sua participação na Comissão de Direitos
Humanos, questionando os efeitos sociais da reforma da Previdência (PEC
06/2009), viralizou nas redes sociais. O ex-banqueiro também publicou um
documento chamado "44 coisas que você precisa saber sobre a reforma da
Previdência".

Para ele, o principal motivo da crise brasileira é a concentração de
riquezas nas mãos de poucos.

Em sua análise, o Brasil "está refém" do 1% mais rico, que um ambiente
de chantagens em que o crescimento econômico está condicionado as suas
regras. Quando as demandas desse grupo privilegiado são acatadas, o
resultado tem data de validade curta, produzindo o que chama de "voos de
galinha".

Posta como uma solução para a crise, a reforma da Previdência de
Bolsonaro, teria dois objetivos, de acordo com Moreira: liberar recursos
para pagamento de juros da dívida pública e condicionar trabalhadores
brasileiros a trabalhar sem parar até morrer.

Da “economia” de R$1 trilhão nos primeiros 10 anos prometida pelo
governo, 84% viria do INSS, onde ninguém ganha mais que o teto de R$5,8
mil e 90% ganha até três salários mínimos.

Para Moreira, a única saída é distribuição de renda, o combate à
desigualdade.

*João Pedro Stedile: O Brasil vive uma grave crise econômica, e como
resultante dela, uma crise social com os índices de desemprego,
precarização do trabalho. Quem é o culpado por essa crise?*

*Eduardo Moreira:* Culpado é o fato de estarmos sentados num baú de
tesouros, com imensas riquezas. Poucos países têm tanta riqueza quanto o
Brasil. Temos petróleo, água potável, vento, incidência de luz, costa
pesqueira, minérios. Tudo o que você puder imaginar.

Mas a chave desse baú está na mão de pouquíssimas pessoas. Não existe
nenhum país no mundo que tenha tanta concentração das terras, dos meios
de produção, do capital tecnológico, como a gente tem aqui.

Essas pessoas, a iniciativa privada que concentra essa riqueza, usam
esse poder para tornar a nação inteira refém dela e, de crise em crise,
ir negociando condições cada vez mais favoráveis para ela, para poder
continuar exercendo esse poder que ela tem e manter a desigualdade que
só privilegia a ela.

A gente tem no Brasil uma crise enorme, onde a maior parte das pessoas
sabe gerar riqueza, pode gerar riqueza – como a gente vê nos
acampamentos e assentamentos do MST, por exemplo –, mas não têm como
gerar essa riqueza, porque essas pessoas que são os donos dos meios
simplesmente não deixam.

O que é o desemprego que temos? Colocam o país inteiro como refém e
dizem: "Já que o Estado não têm capacidade de investir, e é preciso
investir para gerar riqueza, eu só invisto se você cumprir minhas
regras." Igual quando você tem um refém.

Começa a pedir benefício, quer pagar menos impostos, quer que a mão de
obra, que trata como um tijolo, como se não houvesse uma vida, tenha
menos direitos, custe mais barato. Quando tudo isso for cumprido, vai
investir.

O Brasil vive esses vôos de galinha. Ele vive uma crise, vira refém,
cria essas condições todas, essas poucas pessoas investem, crescemos um
pouco, e o resultado desse crescimento vai para a mão deles. Aí, o
pessoal que trabalhou não têm condições de gerar riqueza, e entramos em
outra crise. No dado mundial, de toda a riqueza que foi gerada no mundo,
82% ficou com o 1% mais rico.

A metade mais pobre ficou com zero. E zero é nada!

*Quem é esse 1%?*

Esse 1% são os donos do capital financeiro, principalmente os bancos,
corretoras, seguradoras; os donos do capital industrial, que cada vez
perdem mais importância, porque estamos vivendo um mundo de serviços e
tecnologia, mas ainda têm importância em vários lugares do mundo; os
donos do capital fundiário, porque no Brasil se tem menos de 1% de donos
das terras tendo mais de 50% das terras cultiváveis.

São esses donos dos meios que colocam o país inteiro de joelhos como refém.

*Diante desse cenário da crise econômica que está aí, o governo
Bolsonaro tem apresentado que a solução para a crise é privatizar,
retirar direitos dos trabalhadores e privatizar a previdência. Você acha
que esse plano do governo vai tirar a economia brasileira da crise?*

Não tem a menor chance. Podemos viver um vôo de galinha, porque esses
poucos que detém o capital no Brasil vão se aproveitar dessa condição
para investir um pouco e dar essa falsa impressão, se tudo der certo, de
que começou a crescer, mas já é um movimento natimorto.

No Brasil, as pessoas que detêm esses meios de produção não têm a menor
ideia de como gerar riqueza. Não sabem colocar um tijolo em cima do
outro, não sabem fazer uma camisa, não sabem plantar uma semente, nada.

Dependem 100% das pessoas que produzem a riqueza, que são os
trabalhadores. Isso dá para ele uma força muito grande, de fazer essa
chantagem, mas ao mesmo tempo os coloca em uma posição de fragilidade.
Porque se esse trabalhador consegue se associar, se unir, e fala para
ele: "da gente você não tira mais nada, agora se vira sozinho". Ele não
é ninguém. Ele desmonta e um dia.

O que o governo está fazendo é simplesmente proteger essa classe,
aprofundando essa dependência, e criando uma barreira entre os que não
têm os meios de produção e os meios de produção.

E como você cria essa barreira? Primeiro, não deixando se associarem.
Segundo, mantendo a taxa de juros alta na ponta, porque o trabalhador ou
trabalhadora que sabe como fazer as coisas não têm a condição de pegar
um dinheiro emprestado para comprar o meio de produção, gerar a riqueza,
numa taxa de retorno maior do que ela tem que pagar de juros.

Se conseguisse fazer isso, inverteria a situação. Por isso os juros são
tão altos no Brasil.

A reforma da Previdência, por exemplo, faz o seguinte: não deixa, em
momento algum, as pessoas terem uma condição em possam parar de
trabalhar. O trabalhador tem que ir até o último dia da vida só com uma
condição para sobreviver: gerar riqueza para os donos dos meios de produção.

No final, estarão se matando no trabalho. Mas não tem problema porque
ele é só um número de planilha. Esse governo mostra e trata as pessoas
como um número de planilha. O governo quer fazer a reforma da
Previdência dizendo que temos que economizar um trilhão. Então, admite
que está lidando com vidas como se fosse uma planilha.

É um governo que aprofunda essa dependência, e nos trata como seres
econômicos de planilhas de Excel. Não somos seres econômicos, somos
seres humanos.

*O governo têm dito que sem a reforma da Previdência não sai da crise.
Explica por que isso é uma falácia.*

Sem a reforma trabalhista não íamos criar emprego também, né. Tem muito
emprego que foi perdido e criado de novo com um valor mais baixo. Além
do desemprego ter aumentado, foi pior que isso, porque os empregos que
substituíram os antigos foram em condições piores e em um valor de
remuneração pior.

A reforma da Previdência, na PEC apresentada pelo governo, mostra de
onde vem o um trilhão que promete economizar. Nos primeiros 10 anos, 84%
vem das pessoas que fazem parte do regime geral de previdência social,
que é o INSS, onde ninguém ganha mais que o teto de R$5,8 mil, e onde
90% ganham até dois ou três salários mínimos. Ou seja, não tem nenhum
privilegiado. E das pessoas que ganham abono salarial, ou BPC, que são
miseráveis, que tem invalidez, ou ganham até dois salários mínimos por
ano. 84% da economia de um trilhão vem dessas pessoas. E aí piora,
quando vemos a previsão do 11º ao 20º ano, 94% vem dessas pessoas.

Os privilégios que o governo diz estar combatendo, que são os altos
salários do funcionalismo público, com alíquotas maiores, corresponde a
0,4% da economia. Faz o seguinte: acima de R$39 mil, do servidor
público, coloca uma alíquota de 100% e cumpre o teto constitucional (risos).

O governo diz estar acabando com a desigualdade, que tem pessoas
ganhando muito com a aposentadoria e estão tirando dinheiro dos pobres.
Mas não é tirando do rico e do pobre que se reduz desigualdade. Todo
mundo está pior com a reforma do que antes.

Mas você chega para a grande parcela da população, para 30 milhões de
pessoas, e corta o que essas pessoas tem hoje em dia para sobreviver,
que é o que aquece as economias da maioria dos pequenos municípios do
país. Corta isso. Como isso vai aquecer a economia?

Tem um estudo do IPEA que mostra que um real que cai na população via
previdência tem um efeito multiplicador de 1,36 no PIB. O dinheiro que
cai para o aposentado é gasto, e isso volta para o governo como imposto,
volta para a economia.

O estudo também mostra que o dinheiro que cai para os ricos via
pagamento de juros, o multiplicador dele é 0,7, o que significa que
freia a economia, porque o dinheiro cai na mão dele e fica parado no
banco, é um dinheiro que não volta para a economia.

É obvio que ao tirar renda da parcela mais pobre da população, em um
país que já é desigual como o nosso, você está freando a economia.

Imagina que estamos no meio de várias árvores. Quando você rega uma
planta, se você rega na folha não vai molhar a raiz. Se você rega na
raiz, tudo é absorvido pela planta. E um pouco chega até na folha. O que
eles não entendem é que se regar na raiz do Brasil, vai chegar até o
empresário também, vai chegar no banco, vai chegar em todo mundo. Eles
vão ter os lucros deles.

*A solução para a crise seriam políticas de distribuição de renda?*

Não tenho a menor dúvida. O Brasil só tem um problema, que é a
desigualdade. O resto é consequência.

Se você pega países que eram extremamente desiguais, como a Noruega, a
Suécia e vários outros, hoje, menos de 100 anos depois, são alguns dos
países mais desenvolvidos do mundo. A Noruega era o país mais pobre da
Europa. Eu desafio qualquer pessoa a falar o contrário.

Como começaram a mudar a realidade? Foi falando sobre matar bandido e
combater a corrupção? Ou foi garantindo a universalidade da saúde, da
educação, uma distribuição de renda melhor e pleno emprego?

Eles falam sobre as músicas das favelas só falarem baixaria e palavrão.
A música é um retrato do que é vivido, não adianta matar o mensageiro, a
música, e o que inspira a música continuar igual. A gente tem que mudar
o que inspira isso tudo. A cultura só representa o que acontece.

*Qual o verdadeiro objetivo da reforma da Previdência?*

Garantir o dinheiro que é necessário para continuar pagando os juros da
dívida pública, que está 25% na mão dos bancos, 25% na mão dos fundos de
pensão dos ricos, 25% na mão dos fundos de investimento dos ricos e 12%
na mão dos investidores estrangeiros. Ou seja, quase 90% na mão das
pessoas mais ricas da nossa elite.

Então, a reforma da Previdência arranja mais R$1 trilhão para garantir
esse pagamento sem que fiquem preocupados e possam continuar acumulando
riquezas em cima do trabalho dos outros.

Além disso, garantir a dependência do trabalhador. O trabalhador tem
que, até o último dia da vida dele, doar a única coisa que tem, que é a
capacidade de trabalho, para acumular riqueza. E a reforma da
Previdência garante que até o último dia da vida o cara vai fazer isso.

*Diante desse cenário econômico, qual a verdadeira saída popular que
você defende?*

A gente tem que gerar riqueza no Brasil. E a gente tem muita riqueza
para ser gerada no Brasil.

Para gerar a riqueza que temos a capacidade, temos que redistribuir os
meios de produção, as terras, o capital tecnológico.

Não existe como fazer o que precisa ser feito no Brasil para as pessoas
poderem viver uma vida melhor sem passar pela redistribuição. Não tem
solução matemática.

Se quisermos que as pessoas mais pobres ganhem R$1,5 mil a mais por mês,
seguindo a mesma distribuição de renda que temos hoje, vamos passar 50
anos com taxa de crescimento alta e não vamos chegar lá. É
matematicamente impossível.

Eu aprendi no MST, quando fui na Copran [Cooperativa de Comercialização
e Reforma Agrária União Camponesa], que tem a agroindústria do leite,
que em 7 anos eles fizeram uma agroindústria que parece que você está na
Europa. Chegam a processar quase 100 mil litros de leite por dia.
Trabalham em três turnos. Conseguem servir ao município, ao estado, à
vários em volta. O que motivou foi o lucro? Ou foi ter uma estrutura que
permitisse que todos construíssem a comunidade que sempre sonharam em
construir?

Isso mostra que a ideia que a academia neoliberal, que é a academia que
reina nas universidades do país, que diz o lucro deve ser perseguido e
isso faz com que o capital acabe se distribuindo da maneira mais justa.
Então o que aconteceu na Copran? Se as outras agroindústrias do leite
estão quebradas no Brasil inteiro, tivemos uma crise enorme por causa do
preço do leite alguns anos atrás, e ela não parou de crescer.

Qual livro explica isso que eu não li?

Se a gente distribuir a riqueza e o acesso ao capital fundiário,
tecnológico, intelectual, industrial, financeiro, a gente vira da água
para o vinho em menos de 20 anos. Viramos uma potência que ninguém vai
entender o que aconteceu.

*O que você acha que está por trás das medidas do governo de querer
cortar recursos da educação?*

O problema é a balbúrdia. Qual balbúrdia? O grande problema [que o
governo vê] na universidade é que eles tem tempo, disposição e
conhecimento. É a única fase na vida que se tem os três ao mesmo tempo.
Já que o mundo que o governo está querendo é um mundo tão esdrúxulo,
visivelmente injusto, é necessário atacar os primeiros a levantar a
bandeira e falar "olha esse absurdo, vamos lutar contra." Essa é a
balbúrdia que eles tem medo.

In
BRASIL 247
https://www.brasil247.com/pt/247/brasil/393623/Eduardo-Moreira-para-Stedile-Brasil-precisa-deixar-de-ser-ref%C3%A9m-do-1-mais-rico.htm
16/5/2019

segunda-feira, 13 de maio de 2019

A águia, o urso e o dragão





    – "Europa: Uma terra de cegos que guia outros cegos"

*por Pepe Escobar [*]

Antigamente, pela noite adentro, à volta de fogueiras em desertos do
sudeste asiático, eu costumava contar uma fábula
<https://www.aljazeera.com/indepth/opinion/2011/12/2011121811848534778.html>
sobre a águia, o urso e o dragão – para grande satisfação dos meus
interlocutores árabes e persas.

A ponte do dragão. Contava como a águia, o urso e o dragão, no início do
século XXI, tinham tirado as suas luvas (de pele) e se envolveram no que
acabou por ser a Guerra Fria 2.0.

Quando nos aproximamos do fim da segunda década deste século já
incandescente, talvez seja proveitoso atualizar aquela fábula. Com o
devido respeito a Jean de la Fontaine
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Jean_de_La_Fontaine> , desculpem-me
enquanto volto a beijar o céu [1] <#nr> (deserto).

Longe vão os dias em que um urso frustrado se ofereceu várias vezes para
cooperar com a águia e os seus lacaios numa questão escaldante: os
mísseis nucleares.

O urso argumentou reiteradas vezes que a colocação de mísseis de
interceção e de radares naquela terra de cegos que guiavam cegos – a
Europa – era uma ameaça. A águia contra-argumentou repetidas vezes que
aquilo era para nos proteger daqueles patifes persas.

Agora, a águia – afirmando que o dragão está a ter uma vida fácil –
rasgou todos os tratados em vigor e está apostada em colocar mísseis
nucleares em zonas orientais selecionadas na terra dos cegos que guiam
os cegos, essencialmente para visar o urso.

*Tudo o que brilha é seda *

Selo da URSS. Menos de 20 anos depois daquilo a que o urso-mor Putin
definiu como "a maior catástrofe geopolítica do século XX", este propôs
uma forma de URSS /light / ; um órgão político-económico chamado a União
Económica Eurasiática (UEE).

A ideia era ter a UEE a interagir com a União Europeia – a instituição
de topo da equipa heterogénea conjunta dos cegos que guiam os cegos.

A águia não se limitou a rejeitar uma possível integração; saiu-se com
um cenário de revolução colorida modificada a fim de desligar a Ucrânia
da UEE.

Ainda antes disso, a águia havia querido estabelecer uma Nova Rota da
Seda sob o seu total controlo. A águia havia-se esquecido
convenientemente de que a original, a Antiga Rota da Seda, ligara o
dragão ao império romano durante séculos – sem intrusos do exterior da
Eurásia.

Assim, podemos imaginar o assombro da águia quando o dragão irrompeu no
palco global com as suas Novas Rotas da Seda super carregadas –
melhorando a ideia original do urso de uma área de comércio livre "de
Lisboa a Vladivostok" e transformando-a num corredor de múltiplas
interligações, terrestres e marítimas, da China oriental à Europa
ocidental, incluindo tudo entre esses dois extremos, abrangendo toda a
Eurásia.

Perante este novo paradigma, os cegos, claro, mantiveram-se cegos
durante tanto tempo quanto nos podemos lembrar; e, pura e simplesmente,
não conseguiram agir em conjunto.

Águia, de James Audubon. Entretanto, a águia ia aumentando a parada.
Lançou o que, para todos os efeitos práticos, era um cerco ao dragão,
progressivamente cheio de armas.

A águia fez uma série de movimentos que equivaliam a incitar os países
fronteiriços do Mar do Sul da China a antagonizar o dragão, enquanto
alterava a disposição duma série de brinquedos – submarinos nucleares,
porta-aviões, caças a jato – cada vez mais próximos do território do
dragão.

Durante este tempo todo, o que o dragão via – e continua a ver – é uma
águia estropiada, tentando abrir caminho à força para sair dum declínio
irreversível, tentando intimidar, isolar e sabotar a ascensão imparável
do dragão para o lugar que sempre ocupara, durante 18 dos últimos 20
séculos:   a sua entronização como rei da selva.

Um vetor fundamental é que os atores de toda a Eurásia sabem que, à luz
das novas leis da selva, o dragão não pode – e não irá – ser reduzido,
pura e simplesmente, à situação de ator secundário. E os atores de toda
a Eurásia são demasiado espertos para embarcar numa Guerra Fria 2.0 que
daria cabo da própria Eurásia.

A reação da águia à estratégia da Nova Rota da Seda do dragão levou
algum tempo a passar da inação à demonização aberta – complementando com
a descrição conjunta do dragão e do urso como ameaças existenciais.

Contudo, apesar de todo este fogo cruzado, os atores de toda a Eurásia
já não se sentem propriamente impressionados com o império da águia
armada até aos dentes. Especialmente depois de a crista da águia ter
sido gravemente ferida por fracassos sobre fracassos, no Afeganistão, no
Iraque, na Líbia e na Síria. Os porta-aviões da águia que patrulham a
parte oriental do Mare Nostrum não estão propriamente a assustar o urso,
os persas e os sírios.

Um acordo entre a águia e o urso sempre foi um mito. Demorou algum tempo
– e muita perturbação financeira – até o urso perceber que não iria
haver nenhum acordo, enquanto o dragão só via acordo para um confronto
aberto.

Depois de se estabelecer, lentamente, mas com segurança, como a potência
militar mais avançada do planeta, com conhecimentos hipersónicos, o urso
chegou a uma conclusão espantosa:   já não nos preocupamos com o que a
águia diz – ou faz.

*Sob o vulcão em erupção *

Águia, de James Audubon. Entretanto, o dragão continua a expandir-se,
inexoravelmente, por todas as latitudes asiáticas, assim como pela
África, pela América Latina e até pelas pastagens infestadas pelo
desemprego dos cegos que guiam os cegos, atingidos pela austeridade.

O dragão está firmemente convencido de que, se for encurralado ao ponto
de ter de recorrer a uma opção nuclear, detém o poder de fazer explodir
o estarrecedor défice da águia [2] <#nr> , reduzir a zero a sua
avaliação de crédito e criar o caos no sistema financeiro mundial.

Não é de admirar que a águia, sob uma nuvem paranoica que tudo envolve,
de dissonância cognitiva, alimentando ininterruptamente a propaganda do
estado aos seus súbditos e lacaios, continue a cuspir lava como um
vulcão em erupção – impondo sanções a uma grande parte do planeta,
entretendo sonhos eróticos /(wet dreams) / de mudança de regime,
lançando um embargo total contra os persas, ressuscitando a "guerra
contra o terrorismo" e tentando punir
<https://consortiumnews.com/2019/04/30/vips-extradition-of-julian-assange-threatens-us-all/>
quaisquer jornalistas, editores ou denunciantes que revelem as suas
maquinações internas.

Dói imenso reconhecer que o centro político-económico de um novo mundo
multipolar vai ser a Ásia – ou seja a Eurásia.

À medida que a águia se torna cada vez mais ameaçadora, o urso e o
dragão aproximam-se cada vez mais na sua parceria estratégica. Agora,
tanto o urso como o dragão têm demasiados laços estratégicos por todo o
planeta para serem intimidados pelo enorme Império de Bases [militares]
da águia ou por aquelas coligações periódicas dos que a isso se dispõem
(um tanto relutantes).

Para corresponder à integração abrangente em curso da Eurásia, de que as
Novas Rotas da Seda são o símbolo gráfico, a fúria da águia, sem freios,
nada tem a oferecer – exceto requentar guerra contra o Islão, em
conjunto com o cerco bélico ao urso e ao dragão.

Depois, há a Pérsia – esses mestres jogadores de xadrez. A águia tem
vindo a perseguir os persas desde que eles se viram livres do procônsul
da águia, o Xá, em 1979 – isso depois de a águia e a pérfida Albion
terem esmagado a democracia em 1953 e colocado o Xá no poder, o qual
fazia com que Saddam se parecesse a um Gandhi.

A águia quer todo o petróleo e o gás natural de volta – para não falar
de um novo Xá no papel de novo polícia do Golfo Pérsico. A diferença é
que, agora, o urso e o dragão estão a dizer Nem Pensem. O que é que a
águia irá fazer? Hastear a bandeira falsa para acabar com todas as
bandeiras falsas?

É onde estamos agora. E mais uma vez, chegámos ao fim – embora não seja
o fim do jogo. Ainda não há nenhuma moral para esta fábula modernizada.
Continuamos a sofrer os ataques e as frechadas de um lamentável destino.
A nossa única e débil esperança é que um grupo de /Homens vazios / [3]
<#nr> obcecados pelo Segundo Advento [do Messias] não transforme a
Guerra Fria 2.0 num Armagedão
<https://pt.wiktionary.org/wiki/Armaged%C3%A3o> .

06/Maio/2019

*[1] Beijar o céu:   Realizar aspirações, frase de canção de Jimi Hendrix.
[2] Here's What Happens if China DUMPS Its $1 Trillion in US Debt Amid
Trade War
<https://sputniknews.com/business/201905121074943114-china-us-tbills-fate/>
[3] Homens vazios:   Refere-se à poesia /The Hollow Men/
<https://allpoetry.com/The-Hollow-Men> , de T. S. Elliot: "[...] Este é
o modo como o mundo acaba. Não com um bang mas com uma lamúria".

[*] Jornalista, brasileiro, correspondente do /Asia Times/
<https://www.asiatimes.com/> . O seu último livro é /2030/
<https://www.bookdepository.com/2030-Pepe-Escobar/9781608880355?ref=grid-view&qid=1557618165216&sr=1-3>
.

O original encontra-se em
consortiumnews.com/2019/05/06/pepe-escobar-the-eagle-the-bear-and-the-dragon/
<https://consortiumnews.com/2019/05/06/pepe-escobar-the-eagle-the-bear-and-the-dragon/>
. Tradução de Margarida Ferreira. *

In
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/eua/escobar_06mai19_p.html#nr
13/5/2019

sábado, 11 de maio de 2019

Gramscismo: uma ideologia da extrema-direita




"Não existe 'gramscismo' em Gramsci. Ele é a auto-descrição dos seus próprios
criadores. A caricatura do pensamento do outro existe porque as teorias
conspiratórias são basicamente fetichistas, não podem jamais conceber a
complexidade do pensamento adversário"


Por Lincoln Secco


Nos estertores da Ditadura Civil-Militar, a extrema-direita brasileira enfrentou
uma crise de direção e teve que mudar. Os ideólogos militares se voltaram para
novas teorias que a esquerda brasileira debatia no final dos anos 1970, entre
elas a de Antonio Gramsci1.

A atenção se justificava porque a luta armada não existia mais, o alvo havia se
embaçado e, apesar da repressão, o Partido Comunista havia sobrevivido
eleitoralmente no MDB e continuava ativo no meio sindical. Os serviços de
inteligência precisavam de novas funções. Muitos delatores civis foram
abandonados e se envolveram na criminalidade comum2. Entre março de 1978 e maio
de 1981 os grupos de repressão militares realizaram 40 atentados (sequestros,
assassinatos e explosões)3. Mas eram atos de desespero diante da iminente
retirada de cena.

A subversão passou a ser identificada pelos oficiais brasileiros numa suposta
estratégia indireta gramsciana operada por partidos, escolas e Igreja Católica.
A Regional Nordeste I da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil era acusada
de ensinar a tomada do poder num de seus cadernos pastorais com base em
Gramsci4.

A formulação do gramscismo nos anos 1980

Na “Síntese da situação da subversão no Brasil”, documento da delegação militar
brasileira na 17ª Conferência dos Exércitos Americanos, 30% dos constituintes
eram considerados subversivos5. O evento transcorreu em novembro de 1987 em Mar
del Plata, na Argentina.

Naquela conferência havia representantes de 15 Exércitos das Américas (entre
eles o do Brasil), os quais assinaram um acordo que previa “ações nos demais
campos do poder”, além do estritamente militar, para “a segurança e defesa do
continente americano contra o Movimento Comunista Internacional”.

O informe de inteligência apresentado àquela Conferência dos Exércitos
Americanos apontava Antonio Gramsci como o ideólogo da nova estratégia do
Movimento Comunista Internacional. Para a América Latina, essa estratégia
recebeu o nome de “amerocomunismo”, em adaptação do “eurocomunismo” adotado na
Europa. Dizia o relatório:

“Para Gramsci, o método não consistia na conquista ‘revolucionária do poder’,
mas em subverter culturalmente a sociedade como passo imediato para alcançar o
poder político de forma progressiva, pacífica e perene […]. Para este ideólogo,
a ideia principal se baseia na utilização do jogo democrático para a instalação
do socialismo no poder. Uma vez alcançado esse primeiro objetivo, se busca impor
finalmente o comunismo revolucionário. Sua obra está dirigida especialmente aos
intelectuais, profissionais e aos que manejam os meios maciços de comunicação
social”6.

Recuo e retomada nos anos 1990

Ao lado dessa preocupação com as ideias de Gramsci, vários organismos de difusão
do ideário pró mercado foram fundados nos anos 1980. Mas o fracasso do governo
Collor, identificado com aquela visão, levou a um retrocesso e à queda das
atividades dos think tanks liberais7.

Apesar disso, em 1994 o escritor Olavo de Carvalho, que viria a se tornar um
ideólogo da nova direita, lançou um livro contra Gramsci, em que o descrevia
como o “profeta da imbecilidade, o guia de imbecis”8. Carvalho manteve uma
intransigência doutrinária constante mesmo sob a mais severa marginalização.
Inspirou-se no exemplo dos neoliberais da época de Hayek, os quais souberam
esperar os ventos propícios às suas ideias.

O autor associava a esquerda ao crime organizado e investia contra o “comunismo
disfarçado do PT”. Ele usou várias metáforas sexuais para descrever conceitos de
Gramsci: “sedução”, “estupro”, “sacudir as banhas” (sic), “sacanagem”, “suruba
ideológica”, “etapa orgiástica”, “Antônio-só-a-cabecinha-Gramsci” e “penetração
camuflada”. Para ele, Gramsci estaria para a sedução como Lênin para o estupro.
Mais tarde ele escreveu o artigo “Máfia Gramsciana”9, completando com analogias
entre o marxismo e associações criminosas.

A importância do autor é que ele antecipou uma linguagem apelativa e
anti-intelectual antes que esse tipo de abordagem encontrasse um lugar e um
instrumento eficiente de disseminação nas redes sociais, então inexistentes.

Até então esse tipo de escrita era bastante marginal e os escritores liberais
procuravam pontos de contato com a tradição de esquerda, endereçando-lhe
críticas mais sofisticadas, como foi o caso de José Guilherme Merquior, assessor
informal do ex-Presidente Fernando Collor. Outros se abrigavam em seu lócus
ideológico de maior força: a teoria neoclássica, como a maioria dos economistas.
Mas isso mudou.

A virada à histeria coletiva

No seu livro A Revolução Gramscista no Ocidente: a Concepção Revolucionária de
Antônio Gramsci em os Cadernos do Cárcere, de 2002, o General Sérgio Augusto de
Avellar Coutinho escreveu que a versão “gramscista” de tomada do poder seria
“levada a efeito após a conquista legal do governo”, sob “máscara
constitucional”, e só podia ser evitada pela intervenção político-militar em
resposta ao apelo da sociedade nacional.

Em nome da defesa da Ordem é preciso sacrificar a Constituição pois ela permite
a execução da estratégia indireta do “gramscismo”. Embora aparentemente baseada
na consulta da edição brasileira dos “Cadernos do Cárcere”, portanto uma
pesquisa dotada de lógica interna, a cadência da exposição é quebrada por
denúncias da base “nasserista” (sic) do PT, do marxismo de Lula e de José Serra,
entre outros comentários políticos.

Anos depois o Instituto Von Mises denunciaria “o veneno de Bakhtin, Gramsci,
Piaget e Freire”10. Até o geógrafo Milton Santos estaria maculado pelo
gramscismo, conforme o blog O Anti-Gramsci, destinado a combater “a Revolução
Silenciosa que embota a consciência brasileira”. A Escola de Frankfurt,
Althusser e Edward Said também seriam pais da “Nova Ordem Mundial” e da
perestroika (sic), esta entendida como “uma virada estratégica rumo à dominação
mundial através de uma lenta revolução cultural encabeçada pelo ecologismo”
(sic).

A Biblioteca do Exército, através de Nilson Vieira Ferreira de Mello, membro do
seu Conselho Editorial, divulgou o citado livro A Revolução Gramscista no
Ocidente de Sérgio Coutinho. Haveria uma “estratégia gramsciana de implantar o
socialismo sem recorrer às armas convencionais”11.

Da teoria à prática

A campanha da extrema direita à presidência foi baseada no combate à cultura de
esquerda, à “ideologia de gênero” e à visibilidade de comportamentos dissonantes
da tradicional família brasileira. O Vice dele, General Mourão, afirmou que “o
marxismo cultural e suas derivações como o gramscismo, se uniu às oligarquias
corruptas para minar os valores da nação e da família brasileira”12. Na verdade
era uma cópia de um trecho do plano de governo de Bolsonaro. O empresário Flavio
Rocha, dono das lojas Riachuelo, disse que precisamos atacar o gramscismo que
está espalhado pelo país13. Para o General Osvaldo Ferreira, assessor de
Bolsonaro para a educação, o objetivo seria o de reduzir a influência de Gramsci
e Paulo Freire na formação de professores14.

A onda contra o gramscismo atingiu até um tradicional jornal paulista, que conta
entre seus articulistas intelectuais liberais de origem gramsciana, como Marco
Aurelio Nogueira e Luiz Sergio Henriques. Pouco depois de publicar um artigo
contra o marxismo cultural do General Rômulo Pereira15, O Estado de S. Paulo fez
publicar um editorial “contra doutrinação do marxismo gramsciano”16. A
International Gramsci Society, seção brasileira, produziu uma Carta Aberta em
resposta à ameaça do “gramscismo”17.

Técnicas de manipulação

A maioria dos professores sabe que a melhor maneira de se fazer de um aluno um
adversário é doutriná-lo. A cátedra não é o púlpito ou a tribuna. Há o ideal da
neutralidade axiológica, a oferta de múltiplas abordagens e até a honestidade
intelectual de revelar o ponto de partida teórico. Isso é educar para a
liberdade.

Antonio Gramsci é citado no Brasil desde 1923 e, na expressão do estudioso
italiano Guido Liguori, sempre foi um autor “conteso” ou seja, “disputado”. Foi,
portanto, um legítimo objeto de estudos acadêmicos. Assim, não surpreendia a
ninguém que um pensador liberal erudito como J. G. Merquior discutisse suas
ideias nos anos 1980 ou que o professor da USP Oliveiros Ferreira, um profundo e
respeitado intelectual conservador, fizesse uma tese acadêmica sobre Gramsci.
Depois disso, raramente um acadêmico conservador pesquisou o pensamento
gramsciano, exceto em artigos de ocasião com baixo valor intelectual18.

Entretanto, a ninguém passava pela cabeça que qualquer pensador importante
pudesse simplesmente se tornar o centro de uma teoria conspiratória. O problema
não está na estatura intelectual, em geral sofrível, do adepto desse tipo de
teoria. No Brasil nenhum intelectual reconhecido aderiu a posições de
extrema-direita. Teóricos importantes como Heidegger, Hjalmar Schacht e Carl
Schmidt aderiram ao nazismo.

Mas o problema está na própria extrema-direita. Ela se resume no fim das contas
a uma manipulação racional da irracionalidade de seus seguidores. Isso impede
qualquer sofisticação teórica. Seus ideólogos não podem ser profundos, apenas
técnicos ou criadores de palavras de ordem simplórias, boatos e conspirações.
Daí a glorificação do “especialista” e o desprezo pela Filosofia, enquanto a
História se torna palco de disputas entre a “verdade sufocada” e a “manipulação”
promovida pela quase totalidade dos historiadores profissionais.

“Memes”, manipulação de imagens e notícias, palavras de ordem mentirosas
repetidas ad nauseam e redução de todo pensamento e comportamento diverso a uma
caricatura já existiam. Goebbels foi um mestre nessa técnica. Mas um aspecto
formal indispensável foi a combinação de três vertentes opostas: referências
supostamente eruditas; linguagem apelativa e vulgar; convite à ação. Vamos a
elas.

Em primeiro lugar, o “erudito” da nova direita cita autores que ele supõe serem
marxistas, ampliando bastante o conceito para nele incluir qualquer um que dele
discorde. De São Tomás de Aquino a Leonardo Boff, de Fernando Henrique Cardoso a
Marilena Chaui, são todos revolucionários. A linguagem tem um ritmo: recurso à
história, suposta demonstração de conhecimento do “pensamento de esquerda” e
citações (normalmente cópias de índices onomásticos ou “copia e cola” de textos
da internet para “provar” a leitura dedicada das obras de Gramsci, por exemplo).

Em segundo lugar, há um recurso preponderante, uma técnica e um método. O
recurso é a linguagem envilecida, com abundância de adjetivos, combinada com a
“erudição”, constituindo uma miscelânea propositalmente confusa. A técnica é a
redução de conceitos a simplificações e agressões verbais. O método é a
argumentação ad hominem e, seu corolário, a explicação do pensamento oposto
pelas qualidades que seriam intrínsecas ao adversário.

O adversário é um pseudo-intelectual, um homem ou mulher medíocre. A esquerda é
incapaz, fracassada, de classe-média e lideranças de trabalhadores são
qualificadas de apedeutas, analfabetos funcionais, delirantes etc. Note-se que
parece se tratar do medo que o próprio formulador tem de estar fazendo uma
auto-descrição.

Por fim, há um apelo à ação. Começa pela auto-glorificação do próprio fracasso,
do isolamento, do não reconhecimento intelectual. A culpa seria da penetração
“gramscista” nos meios de comunicação e do monopólio dos adeptos de Paulo Freire
nas escolas, universidades, jornais, revistas e até na Rede Globo. Vincula-se a
isso a citação de autores ultra liberais sem repercussão acadêmica. Eles são
apresentados como gênios incompreendidos, resgatados do limbo.

O escopo é evidente: os que os retiram do esquecimento estão retirando a si
mesmos de uma condição análoga e ainda demonstrando que a “esquerda” é ignara a
ponto de desconhecer aqueles autores fundamentais para a história da filosofia.
Paralelamente, propõem o fim da própria Filosofia, mediante sua proibição nas
escolas e retirada de verbas nas universidades públicas e convidam todos à ação
moralizadora.

Uma “conclusão gramsciana”

Não existe “gramscismo” em Gramsci, é óbvio. Ele é a auto-descrição dos seus
próprios criadores. A caricatura do pensamento do outro existe porque as teorias
conspiratórias são basicamente fetichistas. Agarram-se a “fatos” e descrições
sumárias de comportamentos e indivíduos que personificariam a “estratégia” do
inimigo. Assim, uma mulher lésbica não é uma pessoa e sim a personficação de uma
ideologia.

Eles não podem jamais conceber a complexidade do pensamento adversário. Seu
modus operandi consiste no uso de técnicas ideológicas de penetração cultural
nos meios de comunicação para difundir a ideia de que há um núcleo conspiratório
“marxista cultural”, de forma semelhante à conspiração “judaico-bolchevique” do
passado. Os “gramscistas” são eles mesmos.

***

Pra quem realmente quiser entender o pensamento gramsciano para além das
distorções do “gramscismo” formulado pela extrema-direita brasileira,
recomendamos consultar o Dicionário gramsciano, organizado por Guido Liguori e
Pasquale Voza. A obra destrincha os principais conceitos de Antonio Gramsci em
uma enciclopédia com mais de 600 verbetes, elaborados por alguns dos mais
importantes estudiosos de sua obra no mundo.



Na TV Boitempo, o cientista político Marcos Del Roio, presidente da
International Gramsci Society – Brasil, e colaborador do Dicionário gramsciano,
faz uma introdução à trajetória intelectual e política de Antonio Gramsci. Vale
a pena conferir. A aula integra uma série de vídeos sobre o marxista sardo
produzido pelo canal da Boitempo no YouTube:



Notas

1 Versão modificada de um artigo publicado originalmente em espanhol. Lincoln
Secco, “Gramscismo: Una Ideología De La Nueva Derecha Brasileña”, em: Revista
Política Latinoamericana, (7), 2018, Buenos Aires.
2 C. Guerra, Memórias de uma Guerra Suja. Depoimento a Rogério Medeiros e
Marcelo Netto (São Paulo: Editora Topbooks, 2012).
3 H. Silva, O Poder Militar (Porto Alegre: LPM, 1987), p. 543
4 O Estado de S. Paulo, 23 fev. 1988.
5 O Estado de S. Paulo, 27 set. 1988.
6 Folha de S.Paulo, 25 set. 1988.
7 Camila Rocha, “O papel dos think tanks pró-mercado na difusão do
neoliberalismo no Brasil”, MILLCAYAC – Revista Digital de Ciencias Sociales /
Vol. IV / N° 7 / 2017. ISSN: 2362-616x. (pp. 95-120), Centro de Publicaciones.
FCPyS. UNCuyo. Mendoza.
8 Olavo de Carvalho, A Nova Era e a Revolução Cultural: Fritjof Capra & Antonio
Gramsci (Rio de Janeiro: Instituto de Artes Liberais, 1994), p. 82. As metáforas
sexuais citadas adiante estão nas páginas 68, 71, 72, 76 e 77.
9 Jornal da Tarde, 25 nov. 1999.
10 Ubiratan Jorge Iorio, “Gramsci, Paulo Freire e a batalha da linguagem: nosso
declínio começou com a deturpação das palavras”, Mises Brasil, 24 nov. 2016.
11 Idem.
12 Gabriel Hirabahasi, “Mourão não sai do zero”, Em: Época (Blog: Expresso, por
Murilo Ramos). Acesso em 8 de maio de 2019.
13 Bruno Góes, “As companhias de Flavio Rocha”, O Globo – Lauro Jardim. 2 mar.
2018.
14 Folha de São Paulo, 18 ago. 2018.
15 O Estado de S. Paulo, 19 de abr. 2017, p. 2.
16 O Estado de S. Paulo, 29 abr. 2018.
17 Marcos Del Roio, “CARTA ABERTA em resposta à ameaça do gramscismo”,
International Gramsci Society.
18 Um exemplo: Denis Lerrer Rosenfield, “Gramsci e o MST”, O Estado de S. Paulo,
13 dez. 2004.

***

Lincoln Secco é professor de História Contemporânea na USP. Publicou pela
Boitempo a biografia de Caio Prado Júnior (2008), pela Coleção Pauliceia. É
organizador, com Luiz Bernardo Pericás, da coletânea de ensaios inéditos
Intérpretes do Brasil: clássicos, rebeldes e renegados, e um dos autores do
livro de intervenção da Boitempo inspirado em Junho Cidades rebeldes: passe
livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. Colaborou para o Blog da
Boitempo mensalmente durante o ano de 2011. A partir de 2012, tornou-se
colaborador esporádico do Blog.

*Publicado originalmente no blog da Boitempo

In
CARTA MAIOR
https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Leituras/Gramscismo-uma-ideologia-da-extrema-direita/58/44060
10/5/2019