terça-feira, 31 de janeiro de 2017

A evolução da linguagem: perspectiva biolinguística     

 



Entrevista a Noam Chomsky, académico e activista americano

A evolução da linguagem: perspectiva biolinguística

 C.J. Polychroniou (Truthout)   

O tema desta entrevista sai aparentemente fora do âmbito habitual dos artigos
publicados por o diário.info. Mas, para além do seu óbvio interesse científico,
muito do que é dito comporta elementos fundamentais acerca da natureza e
especificidade dos humanos e da fundamental unidade na evolução da espécie.
Compreende-se assim a aversão da direita reaccionária a Darwin e a Chomsky.
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A linguagem humana é crucial para a procura científica de compreensão sobre que
espécie de criaturas somos e portanto crucial para revelar os mistérios da
natureza humana.
Na entrevista seguinte, Noam Chomsky, o académico que revolucionou a linguística
moderna, discute a evolução da linguagem e expõe a perspectiva biolinguística (a
ideia de que a linguagem humana representa um estado de um qualquer componente
da mente). É uma abordagem que desconcerta muitos não especialistas, vários dos
quais tentaram refutar a teoria sobre a linguagem desenvolvida por Chomsky sem
realmente a compreenderem.
O jornalista e escritor “chic radical” e reaccionário Tom Wolfe foi o último a
tê-lo feito no seu novo e ridículo livro The Kingdom of Speech (O Reino da
Fala), no qual tenta atacar as teorias de Charles Darwin e Noam Chomsky com
comentários sarcásticos e ignorantes sobre as suas personalidades e exprimindo
um profundo ódio pela esquerda. De facto, este tão publicitado livro não só
demonstra uma tremenda ignorância sobre a evolução em geral e a área da
linguística em particular, como também pretende dar uma imagem maléfica de Noam
Chomsky devido às suas constantes e implacáveis denúncias sobre os crimes da
política externa dos EUA e a outros desafios ao status quo.
C. J. Polychroniou: Noam, no seu livro recentemente publicado com Robert C.
Berwick [Porquê só nós?: Evolução e Linguagem, (2016)], aborda a questão da
evolução da linguagem numa perspectiva da linguagem como parte do mundo
biológico. Foi esse também o tema do seu discurso na conferência internacional
de Física celebrada este mês em Itália e parece que a comunidade científica
mostra maior reconhecimento e mais subtil compreensão da sua teoria sobre a
aquisição da linguagem do que a maior parte dos cientistas sociais, que parecem
manter graves reservas relativamente à biologia e à ideia da natureza humana em
geral. De facto, não será verdade que a questão da capacidade específica do ser
humano para adquirir um qualquer idioma tem sido um importante tema de interesse
para a moderna comunidade científica desde os tempos de Galileu?
Noam Chomsky: É verdade que sim. Nos finais da moderna revolução científica,
Galileu e os cientistas e filósofos do mosteiro de Port-Royal colocaram um
desafio crucial aos que se interrogam sobre a natureza da linguagem humana, um
desafio que só ocasionalmente foi reconhecido até ser retomado em meados do séc.
XX para se converter na principal preocupação de boa parte dos estudos sobre a
linguagem. Para abreviar, vou referir-me a ele como Desafio de Galileu. Estes
grandes fundadores da ciência moderna admiravam-se que a linguagem permitisse ao
ser humano (cito textualmente) construir “com 25 ou 30 sons, uma variedade
infinita de expressões que, apesar de não se parecerem de nenhuma maneira com o
que se passa no nosso pensamento, conseguem revelar todos os segredos da nossa
mente e tornar tudo aquilo que imaginamos e todos os diversos movimentos da
nossa alma inteligíveis para os outros mesmo sem conseguirem lá penetrar .”
Podemos agora ver que o Desafio de Galileu requer certas reservas, mas é
qualquer coisa de muito real e deveria, na minha opinião, ser reconhecido como
uma das perspectivas mais profundas na rica história da investigação científica
sobre a linguagem e a mente dos últimos 2.500 anos.
 Porém, o Desafio não tinha sido totalmente abandonado. Para Descartes, por
volta da mesma época, a capacidade humana para usar a linguagem de maneira
ilimitada e apropriada constituía o principal fundamento do seu postulado da
mente como novo princípio criativo. Anos mais tarde, dá-se um certo
reconhecimento da linguagem como actividade criativa que implica “um uso
infinito de meios finitos”, segundo formulado por Wilhelm von Humboldt, e que
proporciona “sinais audíveis para o pensamento”, nas palavras do linguista
William Dwight Whitney há um século. Houve também uma certa consciência sobre o
carácter próprio e único desta capacidade que é partilhada pelos humanos
(característica mais surpreendente desta curiosa espécie e base das suas
notáveis façanhas). Contudo, a esse respeito, era pouco o que se dizia.
 Por que motivo só depois de já bem entrado o século XX se retoma a perspectiva
da linguagem como capacidade específica da espécie humana?
 Há uma boa razão para que esta maneira de ver enfraqueça até meados do século
XX: não existiam as ferramentas intelectuais que permitissem sequer formular o
problema de modo suficientemente claro para uma abordagem séria. Esta situação
mudou graças ao trabalho de Alan Turing e de outros grandes matemáticos que
estabeleceram a teoria geral da computabilidade em bases sólidas, mostrando em
particular como um objecto finito como o cérebro pode gerar uma variedade
infinita de expressões. Tornou-se possível depois, pela primeira vez, tratar o
Desafio de Galileu pelo menos em parte de forma directa (apesar de,
infelizmente, toda a história anterior das investigações de Galileu e Descartes
no campo da filosofia da linguagem ou a Gramática de Port-Royal de Antoine
Arnauld e Claude Lancelot serem inteiramente desconhecidas na altura).
 Com estas ferramentas intelectuais disponíveis, torna-se possível formular o
que podemos chamar a Propriedade Básica da linguagem humana: a faculdade da
linguagem proporciona os meios para construir uma variedade infinita de
expressões estruturadas, cada uma das quais com uma interpretação semântica que
exprime um pensamento e cada uma das quais podendo ser exteriorizada através de
um modo sensorial. O conjunto infinito de objectos semanticamente interpretados
constitui aquilo a que por vezes se chamou uma “linguagem do pensamento”: o
sistema cognitivo que recebe determinada expressão linguística e passa à
reflexão, à inferência, ao planeamento e a outros processos mentais e que, ao
exteriorizar-se, pode ser utilizado para a comunicação e para outras interacções
sociais. De longe, a mais importante utilização da linguagem é interna (pensar
com a linguagem).
Pode desenvolver o conceito de linguagem interna?
Sabemos agora que, embora a fala seja a forma mais comum de exteriorização
senso-motora, pode também ser símbolo ou até sensação física, descobertas estas
que implicam reformular ligeiramente o Desafio de Galileu. O requisito mais
fundamental é o que tem a ver com o modo como ele é colocado, que é em termos da
produção de expressões. Formulado assim, o Desafio passa por alto algumas
questões básicas. A produção, tal como a percepção, acede à linguagem interna,
mas não se pode identificar com ela. Temos de distinguir entre o sistema interno
de conhecimento e as acções que a ele acedem. A teoria da computabilidade
permite-nos estabelecer essa distinção, que é importante e comum noutros
domínios.
Pense, por exemplo, na competência aritmética dos humanos. Quando a estudamos,
distinguimos normalmente entre o sistema interno de conhecimento e as acções que
a ela recorrem, como multiplicar números de cabeça, acção esta que envolve
muitos factores para além do conhecimento intrínseco, como por exemplo os
limites da memória. O mesmo acontece com a linguagem. A produção e a percepção
acedem à linguagem interna, mas envolvem também outros factores, incluindo de
novo a memória de curto prazo. Estas ideias começaram a ser estudadas com algum
cuidado nos primeiros dias em que foi considerado o Desafio de Galileu agora
reformulado de modo a ter no centro da questão a linguagem interna, o sistema
cognitivo ao qual a produção e a percepção reais acedem.
Significa isso que resolvemos o mistério da linguagem interna? O próprio
conceito é todavia questionado nalguns meios, apesar de haver aparentemente uma
vasta aprovação por parte da maioria da comunidade científica.
Deram-se importantes avanços na compreensão da natureza da linguagem interna,
mas o seu uso criativo livre continua a ser um mistério. E isso não surpreende.
Numa recente revisão do estado da arte sobre casos muito mais simples de acção
voluntária, dois grandes estudiosos da neurociência, Emilio Bizzi e Robert
Ajemian, escrevem que já começámos a saber alguma coisa sobre a marioneta e os
seus fios, mas que o bonecreiro permanece envolto em mistério. Isto é ainda mais
acentuadamente verdadeiro quando se trata de actos tão criativos como o uso
diário da linguagem, a capacidade humana única que tanto impressionou os
fundadores da ciência moderna.
Para formular a Propriedade Básica, partimos do princípio que a faculdade da
linguagem é partilhada por todos os humanos. Trata-se de uma ideia que parece
encontrar-se solidamente estabelecida. Não são conhecidos grupos com diferenças
de capacidade linguística e as variações a nível individual são marginais. De
maneira geral, a variação genética entre humanos é bastante fraca, o que não é
surpreendente se tivermos em conta a sua recente origem comum.
A tarefa fundamental do estudo sobre a linguagem é determinar a natureza da
Propriedade Básica, o legado genético que está na base da faculdade da
linguagem. Na medida em que se conseguir compreender as suas propriedades,
podemos procurar investigar linguagens internas particulares, cada uma delas uma
concretização da Propriedade Básica, do mesmo modo que cada sistema de visão
individual é uma concretização da faculdade humana da visão. Podemos investigar
como as linguagens internas são adquiridas e utilizadas, como a própria
faculdade da linguagem evoluiu, a sua base na genética humana e as formas como
funciona no cérebro humano. A este programa de investigação geral chamou-se
Programa Biolinguístico. A teoria da faculdade linguística com base genética
chama-se Gramática Universal. A teoria sobre cada linguagem individual chama-se
Gramática Generativa.
Mas, variando as linguagens tanto entre si, qual a ligação entre a Gramática
Generativa e a Gramática Universal?
As linguagens parecem ser extremamente complexas, variando radicalmente entre
si. E de facto, a convicção normal entre os linguistas profissionais de há 60
anos era a de que as linguagens podem variar arbitrariamente e de que cada uma
delas deve ser estudada sem ideias preconcebidas. Ponto de vista semelhante era
mantido nessa altura sobre os organismos em geral. Muitos biólogos teriam
concordado com a conclusão do biólogo molecular Gunther Stent de que a
variabilidade dos organismos é tão livre que constitui “uma quase infinidade de
particulares que têm de ser tratados caso a caso.” Quando compreendemos mal,
tendemos a ver apenas variedade e complexidade.
 Contudo, desde então aprendemos bastante. Reconhece-se agora na biologia que a
variedade das formas de vida é muito limitada, tanto assim que foi seriamente
considerada a hipótese de um “genoma universal”. O meu próprio sentimento é o de
que a linguística teve um desenvolvimento semelhante e defendo essa posição no
estudo contemporâneo da linguagem.
A Propriedade Básica considera a linguagem como um sistema computacional, onde
portanto vamos esperar ver observadas as condições gerais da eficiência
computacional. Um sistema computacional consiste numa série de elementos básicos
e em regras para construir outros mais complexos. Para gerar a linguagem do
pensamento, os elementos básicos são como palavras, embora não sejam palavras.
Para cada língua, o conjunto destes elementos é o seu léxico. As unidades do
léxico são normalmente vistas como produtos culturais, variando largamente com a
experiência e com ligação a entidades extra-mentais (objectos inteiramente fora
da nossa mente, como aquela árvore do lado de fora da janela), hipótese esta
expressa nos títulos de obras de referência, como o influente estudo “Word and
Object” (Palavra e Objecto) de W.V.Quine. Visto mais de perto, o quadro é muito
diferente e revela muitos mistérios. Púnhamos isso de lado, por agora, e
voltemos ao processo computacional.
Como é óbvio, por razões implícitas nos objectivos gerais da investigação
científica, vamos procurar o processo computacional mais simples consistente com
os dados da linguagem. Tem-se reconhecido que a simplicidade de uma teoria se
relaciona directamente com a profundidade da sua explicação. Uma versão mais
concreta desta procura de compreensão foi dada por uma famosa máxima de Galileu
que serviu de guia às ciências desde as suas modernas origens: a natureza é
simples e é missão do cientista demonstrá-lo, desde o movimento dos planetas,
até ao voo de uma águia, ao funcionamento interno de uma célula e à evolução da
linguagem na cabeça de uma criança. A linguística tem uma razão própria
adicional para procurar a mais simples das teorias: tem que considerar o
problema da adaptabilidade evolutiva. Não se sabe muito sobre a evolução dos
humanos modernos, mas os poucos factos que são bem conhecidos e outros que
recentemente vieram a lume são bastante sugestivos e estão bem de acordo com a
conclusão de que a faculdade da linguagem é quase óptima como sistema
computacional, objectivo a que devemos aspirar em bases puramente metodológicas.
Será que existia linguagem antes da emergência do Homo Sapiens?
Um facto que parece estar bem estabelecido, como se referiu, é que a faculdade
da linguagem é uma verdadeira propriedade da espécie, invariante entre os grupos
humanos e, além disso, exclusiva sua no essencial das suas características.
Segue-se que houve pouca ou nenhuma evolução dessa faculdade desde que os grupos
humanos se separaram. Recentes estudos genéticos colocam essa data não muito
distante do aparecimento há cerca de 200.000 anos dos humanos anatomicamente
modernos, talvez 50.000 anos mais tarde, quando o grupo San em África se separou
de outros humanos. Existem algumas provas de que possa até ter sido mais cedo.
Não existe qualquer prova de nada que se assemelhe à linguagem humana ou a
actividades simbólicas antes da emergência dos humanos modernos, Homo Sapiens
Sapiens. Isso leva-nos a esperar que a faculdade da linguagem tenha emergido com
os humanos modernos ou não muito depois, período bastante breve no tempo
evolucionário. Segue-se então que a Propriedade Básica deva de facto ser muito
simples. A
 conclusão está de acordo com o que foi descoberto nos últimos anos sobre a
natureza da linguagem, concordância esta bem acolhida.
As descobertas sobre a separação prematura dos povos San são bastante sugestivas
, já que têm linguagens externalizadas significantemente diferentes. Com
excepções irrelevantes, todas as suas linguagens são a mesma linguagem com
estalidos fonéticos e correspondentes adaptações do trato vocal. A mais provável
interpretação para estes factos, desenvolvida em detalhe no trabalho actual do
linguista holandês Riny Huijbregts, é a de que a posse de linguagem interna
antecedeu a separação, que por sua vez antecedeu a externalização, seguindo esta
diferentes vias em grupos separados. A externalização parece estar associada com
os primeiros sinais de comportamento simbólico no registo arqueológico após a
separação. Juntando estas observações, parece estarmos a chegar a um ponto de
compreensão em que as circunstâncias da evolução da linguagem podem talvez ser
expostas de forma inimaginável até há muito pouco tempo.
Quando é que se tornam evidentes as propriedades universais da linguagem?
As propriedades universais da faculdade da linguagem começam a surgir à luz logo
que se empreenderam esforços sérios na construção de gramáticas generativas,
incluindo as mais simples que nunca tinham sido notadas e são bastante
intrigantes – fenómeno familiar na história das ciências naturais. Uma dessas
propriedades é a dependência estrutural das regras que produzem a linguagem do
pensamento, as quais obedecem apenas a propriedades estruturais, ignorando as
propriedades do sinal externalizado, mesmo propriedades tão simples como a ordem
linear. Para exemplificar, consideremos a frase “as aves que voam
instintivamente nadam.” É ambígua porque o advérbio “instintivamente” pode ser
associado ao verbo precedente (“voam instintivamente”) ou ao seguinte
(“instintivamente nadam”). Suponhamos agora que retiramos o advérbio e formamos
a frase “instintivamente, as aves que voam nadam”. Agora, a ambiguidade
desapareceu. O advérbio fica ligado apenas ao verbo “nadar” mais afastado em
linha, mas estruturalmente mais próximo, e não ao verbo “voar” mais próximo, mas
estruturalmente mais afastado. A única interpretação possível “as aves nadam” é
antinatural, mas não interessa: as regras aplicam-se rigidamente,
independentemente do significado e dos factos. O que é intrigante é que as
regras ignorem a computação simples pela distância linear e guardem a computação
bastante mais complexa pela distância estrutural.
A propriedade de dependência estrutural é válida para qualquer construção em
qualquer linguagem e é de facto intrigante. Além disso, é conhecida sem especial
relevância, como é evidente em casos como o referido e em inúmeros outros. A
experiência mostra que as crianças compreendem que as regras são dependentes da
estrutura logo a partir da altura em que podem ser testadas, por volta dos 3
anos, e não cometem erros, e evidentemente sem que sejam ensinadas. Podemos
estar confiantes portanto que a dependência estrutural decorre dos princípios
que estão nos fundamentos da faculdade humana da linguagem. Existem provas de
outras fontes em apoio da conclusão que a dependência estrutural é um verdadeiro
universal linguístico que está profundamente enraizado no desenho da linguagem.
A investigação conduzida em Milão há uma década e iniciada por Andrea Moro
mostrou que linguagens inventadas obedecendo ao princípio da dependência
estrutural provocam uma activação normal das áreas do cérebro ligadas à
linguagem, mas que sistemas muito mais simples que utilizam o ordenamento linear
em violação desses princípios produzem uma activação difusa, o que implica que
os sujeitos experimentais as tratam como um puzzle e não como uma linguagem.
Resultados semelhantes se encontram na obra de Neil Smith e Ianthi Tsimpli na
sua investigação sobre um deficiente cognitivo, embora linguisticamente dotado.
Fizeram também a interessante observação de que [pessoas com aptidão cognitiva
média] podem resolver um problema quando apresentado como um puzzle, mas não
quando apresentado como um idioma e activando talvez a faculdade da linguagem.
A única conclusão plausível é então que a dependência estrutural é uma
propriedade inata da faculdade da linguagem, um elemento da Propriedade Básica.
E porque tem de ser assim? Há apenas uma resposta conhecida que, felizmente, é a
resposta que procuramos por razões gerais: as operações computacionais da
linguagem são as mais simples possíveis. De novo, é este o resultado que
esperamos alcançar com bases metodológicas e é o que é esperado à luz das já
mencionadas provas sobre a evolução da linguagem.
E sobre a chamada doutrina representacional da linguagem? O que faz dela uma má
ideia a aplicar à linguagem humana?
Conforme mencionei, o ponto de vista convencional é o de que os elementos
atómicos da linguagem são produtos culturais e que os que são básicos, aqueles
que são utilizados para nos referirmos ao mundo, estão associados a entidades
exteriores à mente. Esta teoria representacional foi quase universalmente
adoptada nos tempos modernos. A doutrina parece ser válida para a comunicação
animal: as vocalizações de um macaco, por exemplo, estão associadas a
acontecimentos físicos específicos. Contudo, a doutrina é radicalmente falsa
para a linguagem humana, conforme reconhecido pelo menos desde a Grécia
clássica.
Para o verificar, tomemos o primeiro caso discutido na filosofia pré-socrática,
o problema posto por Heráclito sobre como podemos atravessar o mesmo rio duas
vezes. Dizendo de outra maneira, porque é que duas aparências são entendidas
como duas fases do mesmo rio? Os filósofos contemporâneos sugeriram que o
problema pode ser resolvido considerando o rio como um objecto
quadri-dimensional, mas isso apenas desloca o problema: porquê este objecto e
não outro diferente ou mesmo nenhum?
Quando olhamos para a questão, surge uma quantidade de dúvidas. Suponhamos que a
corrente do rio se inverte. É ainda o mesmo rio. Suponhamos que a corrente fica
com 95% de arsénio devido a descargas de uma fábrica a montante. É ainda o mesmo
rio. O mesmo é verdade com outras alterações bastante radicais no objecto
físico. Por outro lado, com alterações muito ligeiras pode deixar de ser um rio.
Se nas margens forem construídas barreiras fixas e se for utilizado por
petroleiros, é um canal e não um rio. Se a sua superfície sofrer uma mudança de
fase e endurecer, se se pintar uma linha ao meio e for usado no transporte de
carros para a cidade, é uma estrada e já não um rio. Continuando a explorar o
assunto, descobrimos que o que conta como “rio” depende de actos e construções
mentais. O mesmo se verifica geralmente com os mais elementares conceitos:
árvore, água, casa, pessoa, Londres ou de facto com qualquer das palavras
básicas da linguagem humana. Ao contrário dos animais, os elementos da linguagem
e do pensamento humanos violam radical e sistematicamente a doutrina
representacionista.
Além disso, o intricado conhecimento dos meios que são próprios mesmo das
palavras mais simples, para não falar das outras, é adquirido virtualmente sem
experiência. Em períodos de pico da aquisição da linguagem, as crianças adquirem
cerca de uma palavra por hora, quer dizer, frequentemente à sua simples
apresentação. Isso deve significar então que o significado mesmo das palavras
mais elementares é substancialmente inato. A origem evolucionária de tais
conceitos é um completo mistério, um daqueles que podem não ser resolvidos pelos
meios que nos estão disponíveis.
Precisamos então de distinguir entre fala e linguagem?
Voltando ao desafio galilaico, ele tem de ser reformulado para se distinguir
entre linguagem e fala e produção de conhecimento interno, sendo este último um
sistema computacional interno que produz uma linguagem de pensamento, sistema
este que pode ser notavelmente simples, de acordo com o que o registo
evolucionário sugere. As estruturas da linguagem são mapeadas por processos
secundários em determinados sistemas sensório-motores para a externalização.
Estes processos parecem ser o centro da complexidade e variedade do
comportamento linguístico e da sua mutabilidade ao longo do tempo.
 São estas as sugestivas ideias recentes sobre a base neuronal das operações do
sistema computacional e sobre as suas possíveis origens evolucionárias. A origem
dos elementos da computação mantém-se no entanto completo mistério, tal como a
mais importante questão que preocupava os que formularam o desafio galilaico: a
questão cartesiana sobre como pode a linguagem ser usada da sua maneira criativa
normal, apropriada às situações mas não causada por elas, de forma incitada e
tendencial mas não compelida em termos cartesianos. O mistério mantém-se mesmo
para as mais simples formas de movimento voluntário, conforme vimos
anteriormente.
Aprendeu-se muito sobre a linguagem desde o início do Programa Biolinguístico.
Penso que é justo dizer que se aprendeu mais sobre a sua natureza e sobre a
enorme variedade de linguagens tipologicamente diferentes do que em todos os
2.500 anos de história da investigação da linguagem. Porém, como costuma
acontecer nas ciências, quanto mais aprendemos, mais descobrimos o que não
conhecemos. E mais intrigante parece.
Copyright, Truthout. Reprodução proibida sem autorização.
 C.J. Polychroniou
 C.J. Polychroniou é um cientista político/economista que ensinou e trabalhou em
universidades e centros de investigação na Europa e Estados-Unidos. Os seus
principais temas de investigação são a integração económica europeia, a
globalização, a economia política dos Estados-Unidos e a desconstrução do
projecto político-económico do neoliberalismo. É colaborador regular de
Truthout, assim como membro do Projecto Intelectual Público de Truthout.
Publicou vários livros e os seus artigos aparecem numa variedade de revistas,
magazines, jornais e sítios de notíciais populares da internet. Muitas das suas
publicações foram traduzidas em várias línguas estrangeiras, incluindo o croata,
francês, grego, italiano, português, espanhol e turco.
 Tradução do original inglês: Jorge Vasconcelos

In
O DIARIO.INFO
http://www.odiario.info/a-evolucao-da-linguagem-perspectiva-biolinguistica/
25/1/2017

segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

El lugar de las y los trabajadores del campo y la ciudad


Carlos Hernández López

Hermanos de las ciudades, venid al encuentro de vuestros hermanos de los campos;
hermanos del taller, venid a abrazar a vuestros hermanos del arado; hermanos de
las minas, del ferrocarril, del pueblo, salvad a los ríos, las montañas, los
mares y confundid vuestro anhelo de libertad con nuestro anhelo, vuestra ansia
de justicia con nuestra ansia
Manifiesto a los Obreros de la Republica
Emiliano Zapata,
Tlaltizapan, Morelos, 15 de marzo de 1918
I
Emiliano Zapata se dirigía así a los trabajadores de México en medio de una
embestida contrarrevolucionaria encabezada por Venustiano Carranza. En el
contexto de una guerra contra las fuerzas revolucionarias villistas y
zapatistas, y una traición a la clase trabajadora mexicana aglutinada alrededor
de la Casa del Obrero Mundial, Emiliano Zapata llamaba a una unidad entre los
trabajadores y trabajadoras del campo y la ciudad, insistiendo que su separación
era el arma preferida de Carranza para llevar acabo la reacción. Ahí les decía,
“hermanos de las ciudad…confundid vuestra ansia de justicia con nuestra ansia”.
A casi 100 años de haberse escrito el Manifiesto a los Obreros de la República,
hoy vuelve a surgir el llamado al diálogo entre los trabajadores y trbajadoras
del campo y la ciudad, ahora promovido por el Congreso Nacional Indígena (CNI) y
el Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN). Antecedido por la Sexta
Declaración de la Selva Lacandona, el EZLN y el Congreso Nacional Indígena, con
todas las cientos de miles de bases que ellos representan, se ponen al frente de
una nueva iniciativa que llama a unir a los trabajadores del campo y la ciudad.
En los próximos meses habrán de ocurrir acontecimientos excepcionales para la
historia política de México. En un contexto de ofensiva capitalista
generalizada, el Congreso Nacional Indígena y el EZLN, han tomado la decisión de
formar un Consejo Indígena de Gobierno y lanzar a una mujer indígena a como
candidata a las elecciones presidenciales del 2018. A pesar de que los medios de
comunicación de paga se hagan de la vista gorda, esta iniciativa tiene todo el
potencial para sacudir el país entero. Cuando el CNI y el EZLN dicen que va a
“retemblar en su centro la tierra” no exageran ni un milímetro. Va a retemblar
el país entero porque en esta iniciativa se está presentando la posibilidad de
que la rabia del pueblo mexicano encuentre organización, ósea que la rabia se
convierta en imaginación y creatividad colectiva…y vaya que hay rabia.
En este contexto, la iniciativa del CNI y EZLN formulada con la impenetrable
“moral de lucha” /1 de los pueblos indígenas de México, se presenta también como
una oportunidad real de articulación del campo con la ciudad; se presenta como
una bocanada de aire fresco para el desarticulado mundo del trabajo y golpeado
pueblo trabajador. La posibilidad de abrir un diálogo resguardo por los pueblos
indígenas entre trabajadores del campo y la ciudad es uno de los múltiples
alientos de esperanza que se presentan en esta nueva iniciativa. Es la
posibilidad de unir lo que el capitalismo fragmenta, de hacer dialogo entre
aquellos que el capital presenta como distantes. En la clausura de la Segunda
Etapa del Quinto Congreso Nacional Indígena, el Subcomandante Insurgente Moisés,
a nombre del EZLN, reiteró la necesidad de unir el campo y la ciudad en una
misma lucha:
Es la hora de que todo el pueblo trabajador, junto con los pueblos originarios,
cobijados por la bandera del Congreso Nacional Indígena, que es la bandera de
los originarios, se unan en esta lucha que es para quienes no tienen nada, más
que dolor, rabia y desesperación.
A pesar del tiempo que las separa, la voz del Gral. Emiliano Zapata y la del
Subcomandante Insurgente Moisés suenan parecido porque surgen de la misma
geografía y el mismo calendario: el de la resistencia, la lucha, la esperanza,
la imaginación y la creación de un nuevo mundo.
II
Como resultado de una guerra sin tregua que el capital ha desplegado contra la
clase trabajadora, el mundo del trabajo en México se encuentra limitado en su
capacidad de convocatoria. La explotación enloquecida con la que el capital
nutre sus arcas de la ganancia, la flexibilización del trabajo y la
precarización de la vida laboral generalizada se han logrado mediante una
embestida sobre el potencial organizativo de la clase trabajadora, orillándola a
una condición defensiva que la mantiene al límite de la vida.
Arropados en el pensamiento neoliberal, el gobierno oferta al mundo de los
capitalistas una combinación única de factores: ser el país más cercano al
mercado estadounidense y tener una de las manos de obra más barata del mundo.
Lejos de incentivar la formación de una industria que le de soberanía a la
economía al país, lejos de incentivar la actividad científica y tecnológica
nacional, lejos de proteger la actividad agrícola del comercio internacional,
lejos de estimular salarios dignos para la reproducción digna de la vida, lejos
de promover la formación de una banca nacional y soberana, el gobierno ha hecho
todo lo contrario con el fin de convertir al país en una inmensa maquiladora. Le
ofrece todas las garantías al gran capital para que destruya el territorio
nacional y disponga de una de las fuerzas de trabajo 17 veces más barata que la
fuerza de trabajo del Estados Unidos… Al fin que 80 % de las exportaciones
mexicanas se destinan a Estados Unidos.
En esta economía se registra uno de los salarios mínimos más bajos de América
Latina, con el cual viven 19,5 millones de personas (38 % de la Población
Económicamente Activa), mientras que 11,5 millones de personas viven con uno o
dos salarios mínimos y 17,5 millones viven con más de dos salarios. Según
estudios rigurosos del Centro de Análisis Multidisciplinario (CAM), el poder
adquisitivo del salario en México se ha reducido en un 79,11 % desde 1987, de
forma que actualmente una persona tendría que trabajar 23 horas y media por día
para poder adquirir una Canasta Alimenticia Recomendable. No es casualidad, por
tanto, que México sea el país donde más horas se trabajan al día por personas a
nivel mundial, tampoco es casualidad hayan más de 29 millones de personas en la
informalidad laboral; menos casualidad es el hecho de que México se gradúe como
el mayor expulsor de fuerza de trabajo a nivel mundial, con una comunidad de 12
millones de mexicanos y 30 millones de origen mexicano radicada en EE UU.
Este contexto de profunda precarización y desarticulación ha limitado la
posibilidad de que el mundo del trabajo encuentre fuerza interna para resistir a
la guerra del capital. La flexibilización laboral ha disgregado y atomizado al
trabajo, los contratos temporales y la inseguridad mantienen el potencial
propositivo y organizativo en estado de fragilidad y miedo, haciendo entendible
que ella, la clase trabajadora de México y del mundo, encuentre restringida su
capacidad organizativa. Esto no quiere decir, como pregona el posmodernismo, que
el trabajo haya desaparecido, porque por clase trabajadora no nos referimos a
aquella que está únicamente en las fábricas, tradicionalmente retratada como
figura masculina e industrial, sino que es toda aquella persona que vive
del-trabajo /2.
La clase trabajadora es la/el joven que atiende las cajas en los supermercados y
no recibe salario sino propina, es la familia de jornaleros que migra de forma
temporal para vender su fuerza de trabajo a consorcios agro-industriales y que
después venden el alimento en forma de mercancía elegante detrás de un aparador,
es la trabajadora doméstica que se encuentra empleada las 24 horas del día en
condiciones de semiesclavitud, sin tener más que lo que dicte la voluntad de sus
patrones, es el migrante que se desplaza a las ciudades para trabajar en la
construcción de centros comerciales, bancos, edificios y casas de exclusividad
empresarial, que no existe en las cifras de empleo urbano, es la mujer que
trabaja en las maquilas acosada segundo a segundo por los gerentes para que
aumente los ritmos de producción, es la mujer trabajadora acosada por los
patrones en el trabajo y acosada por el miedo de ser desaparecida o asesinada,
es la mujer trabajadora desaparecida o asesinada, es la trabajadora sexual que
trabajando debe conocer las entrañas más profundas de la violencia patriarcal,
es el trabajador de la educación que educa luchando, es el trabajador petrolero
sometido por la voracidad del sindicalismo corporativo, es la niña y el niño que
viven en la calle, ósea, en su espacio laboral, es el trabajador que barre las
calles del centro histórico después de que pasa una marcha, para que este no
pierda su clasificación mundial de “patrimonio de la humanidad”, es la mujer y
el hombre que deben viajar 4 horas diarias para llegar a su lugar de trabajo. En
otras palabras, es toda persona que al no tener más que su fuerza de trabajo
para sobrevivir, vive del trabajo y así busca la vida y no la muerte.
¿Qué partidos políticos han reivindicado un salario digno para la población
trabajadora? ¿Qué instituciones de la democracia mexicana han pregona la vida
digna laboral? ¿A qué persona de la clase política mexicana le interesa saber
que el salario en el país no alcanza para nada y que es uno de los más bajos del
mundo? ¿A qué político le interesa la calidad de la vida de la clase trabajadora
en México? ¿A qué gobernador le interesa el respeto los derechos laborales? ¿A
qué capitalista le puede interesar aceptar un sindicato independiente? Ninguno,
ninguno, ninguno…A ningún político ni capitalista le puede interesar la vida de
una trabajadora o un trabajador porque su ganancia privada y sus bolsillos se
llenan acosta del trabajo de otros, acosta de la explotación, acosta de la
muerte.
III
En este escenario de profunda oscuridad en el mundo del trabajo, la iniciativa
del CNI-EZLN se convierte en un cobijo para el pueblo explotado. Sin duda, este
dialogo del pueblo mexicano promovido por CNI y el EZLN tendrá todo el potencial
para que los trabajadores del campo y la ciudad vuelvan a tener una confianza en
sí mismos y en su capacidad de transformar la historia, después de sufrir una
embestida prolongada que nos sólo los ha desorganizado y atomizado, sino
fundamentalmente, los ha desmoralizado. Recordando a José revueltas, estaríamos
frente a un escenario de “deshumanización que se supera a sí misma”, es decir,
un mundo de explotación y despojo que se subvierte por la voluntad fundamental
de los despojados y explotados.
29/01/2017
Notas:
1/ Concepto tomado de Pablo Gonzales Casanova.
2/ La noción de clase-que-vive-del-trabajo la retomo del sociólogo brasileño
Ricardo Antunes.
In
VIENTO SUR
http://vientosur.info/spip.php?article12156
29/1/2017

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Más de 15 mil cooperativistas se movilizaron en todo el país


Bajo la consigna “en defensa del trabajo cooperativo”

CNCT

Este miércoles la Confederación Nacional de Cooperativas de Trabajo (CNCT)
convocó a una masiva marcha que se realizó de manera simultánea, de la que
participaron más de 15 mil trabajadores y trabajadoras cooperativistas de todo
el país.
“En un contexto en el cual nuestro sector está totalmente encerrado ante las
medidas anti populares que está tomando el gobierno nacional, nos vimos la
necesidad de salir nuevamente a la calle para defender el trabajo cooperativo”,
enfatizó Christian Miño presidente de a CNCT.
Las diferentes movilizaciones simultáneas tuvieron como punto de encuentro los
Centros de Referencia (CDR) del Ministerio de Desarrollo Social y se llevaron a
cabo en: Mendoza (San Rafael y Capital) Entre Ríos (Concordia y Paraná),
Corrientes, Jujuy, Santiago del Estero, Santa Fe (Capital y Reconquista), Chaco,
Catamarca, Tucumán, San Juan, Salta y provincia de Buenos Aires (Mar del Plata,
Tigre, Quilmes y La Plata).
Allí, los y las representantes de la CNCT presentaron ante los responsables de
los CDR un petitorio en el que se destacaron como principales demandas el
aumento del programa Argentina Trabaja y la apertura de nuevas altas. La
continuidad del programa de Desarrollo de Proveedores Cooperativos (compra de
guardapolvos, remeras, equipos deportivos, blanquería, etc) como así también de
aquellos que ponen su eje en el fortalecimiento de la economía social. La
formulación y realización de un programa que ayude a las cooperativas a
regularizar su situación contable y, además, que la Confederación Nacional de
Cooperativas de Trabajo sea parte de Consejo de la Economía Popular y el Salario
Social Complementario, creado con la reciente Ley de Emergencia Social.
En la mayoría de las dependencias estatales fueron recibidos los petitorios, y
por el momento, se continúa a la espera de respuestas formales e
institucionales.

In
CNCT CONFEDERACIÓN NACIONAL DE COOPERATIVAS DE TRABAJO
http://www.cnct.org.ar/mas-de-15-mil-cooperativistas-se-movilizaron-en-todo-el-pais
25/1/2017

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

"Chafaricas"

  

      Pânico geral entre os euro-atlantistas

      – As elites mundializadas diante da ascensão de Trump à Casa Branca

       por Pierre Lévy [*] 


       Alarmados, angustiados, traumatizados, confusos, petrificados, lívidos...
      É difícil encontrar um qualificativo que reflicta o estado de espírito dos
      dirigentes euro-atlânticos e da imprensa que lhe é fiel no momento em que 
      Donald Trump acede à Casa Branca .
       E que dizer dos punhados de "idiotas úteis" (conforme a fórmula outrora
      atribuída a Lenine) que, em Berlim, Paris ou Londres, desfilaram com o
      delicioso slogan: "este não é meu presidente"... O que dizer se isto não é
      o apontar de uma linha de fractura fundamental que se esboça
      progressivamente tanto em numerosos países europeus quanto nos Estados
      Unidos, assim como em outros lados do mundo: entre camadas médias mais
      abastadas, urbanas, intelectuais e almejando a mundialização, e uma classe
       operária que sofre desprezo e atomização desde há décadas.
       Entre os primeiros que pensam em "valores" e os segundos em "interesses",
      mesmo na sobrevivência social pura e simples. Entre de um lado aqueles que
      se mobilizam "contra o ódio" (!) e do outro aqueles que se mobilizam pelo
      emprego. Simplificação excessiva? Talvez. Mas esta polarização de classe
      que emerge não está senão no princípio. E tanto melhor se os segundos
      recuperam esta dignidade, esta existência e estes papéis colectivos que
      lhes foram negados pelos cantores da globalização económica e também
      ideológica.
       Ouçamos estes últimos. "É o fim do mundo", lamentou-se Manuel Valls
      (BFMTV 16/01/17), que não se referia aos resultados da primária socialista
      e sim à perspectiva de uma "aliança entre Trump e Putin". "Donald Trump
       [está] decidido a destruir o projecto europeu", espantava-se o editorial
      de  Libération  (18/01/17). E  Le Monde  (19/01/17) tocava o sinal de
      alarme: "o presidente dos Estados Unidos lançou-se numa operação
      deliberada de desestabilização da Alemanha (...) é toda a Europa que é
      atacada".
       A Europa está confrontada com uma dos "maiores desafios destas últimas
      décadas" alerta por sua vez Angela Merkel. O comissário europeu Pierre
      Moscovici choca-se: "tem-se uma administração americana que deseja o
      desmantelamento da União Europeia, isto não é possível!". Quanto ao
      secretário de Estado americano cessante, ele exortou a nata das elites
      mundializadas reunida em Davos a "recordar porque fizemos juntos esta
      viagem de 70 anos". John Kerry parece assim evocar o eixo
       euro-atlântico... no passado.
       Este pânico geral – que não se pode deixar de saborear – é compreensível.
      Pois, numa entrevista publicada alguns dias antes da sua posse, Donald
      Trump confirmou os elementos que já faziam tremer tanto Bruxelas como o
       establishment  de Washington durante a sua campanha eleitoral. Ora, como
      observou o senhor Valls, decididamente inspirado, "esqueceu-se que um
      populista pode querer por em acção o seu programa".
       Será este o caso com o novo hóspede da Casa Branca? Por enquanto, deve-se
      manter a prudência. Mas se o senhor Trump passa, ainda que apenas
       parcialmente,  das palavras aos actos , então sim, isto será mesmo o fim
       de um  mundo, o início de uma mudança de era histórica.
       Pois o que disse o miliardário na entrevista publicada pelos diário
      alemão  Bild  e pelo inglês  TheTimes  ? Que o Reino Unido foi
      "inteligente" ao abandonar a UE; que este não era senão o "veículo da
      potência alemã"; que esperava que muitos outros Estados imitassem o
      Brexit; que se rejubilava em preparar um acordo comercial separado com
      Londres; que o livre comércio mundial (portanto o TTIP, nomeadamente) era
      doravante caduco; que à indústria automobilística alemão poderia muito bem
      serem impostos importantes direitos alfandegários se isso encorajasse o
      emprego nos Estados Unidos; e que a chanceler havia cometido um "erro
      catastrófico" com a sua política de portas abertas aos refugiados.
       Pior – ou melhor: o novo presidente americano confirmou que considerava a
       NATO "obsoleta", que um grande acordo com Moscovo tendo em vista o
       desarmamento nuclear "seria no interesse de muita gente"; e que,
       consequentemente, as sanções contra a Rússia poderiam ser postas em
      causa. Mobilizando todo o seu sentido da retórica, o secretário-geral da
      Aliança Atlântica diz-se "preocupado".  Le Monde  enraivecia-se já no fim
      de Dezembro (22/12/16): o senhor Trump "quer ser o homem da renovação
      industrial americana, não o xerife de uma ordem democrática ocidental para
      manter e propagar". Imperdoável! Em Davos, Joseph Biden, ainda
       vice-presidente americano durante dois dias, lançou um apelo desesperado
       para "salvar a ordem liberal internacional"...
       Dezasseis antigos chefes de Estado ou de governo e ministros –
      essencialmente dos países da Europa do Nordeste – haviam, pouco antes,
      alertado contra o perigo maior de um reaquecimento das relações com a
      Rússia: "a confiança e a amizade seriam um grave erro", escreviam sem
      piscar.
       Será preciso então estranhar a histeria crescente contra a Rússia?
      Moscovo é confusamente acusada de promover (com êxito crescente) seus
      media públicos destinados ao ocidente, de invadir as redes sociais com
      falsas notícias e piratear os computadores das instituições ocidentais.
      Segundo a CIA, a NSA e o FBI – e Deus sabe que estas nobres chafaricas não
      podem dizer senão a verdade – Vladimir Putin teria assim influenciado a
      eleição americana em favor do seu favorito e certamente aberto o
      champanhe. Retransmitido por Arte (06/01/13), o grande chefe (de partida)
      da informação, James Clapper, fez uma declaração assim: "os russos têm uma
      longa experiência de ingerência eleitoral, quer se trate dos seus próprios
       escrutínios ou os dos outros". Humor involuntário?
       E assim, o hóspede do Kremlin preparar-se-ia para levar pela mão os
      eleitores holandeses, franceses, depois os alemães, que comparecerão às
      urnas em 2017 para que tantos uns como outros escolhessem formações
      anti-UE (ou consideradas como tal).
       Pois, evidentemente, sem estas sombrias manobras, os cidadãos estariam
       entusiastas para plebiscitar uma União Europeia cada vez mais popular e
       legítima.
       Mas um golpe, Vladimir Vladimirovitch?

      23/Janeiro/2017
       Do mesmo autor:
        Le complot de Moscou
      [*] Especialista em questões europeias, dirige a redacção da publicação
      mensal Ruptures . Anteriormente foi jornalista do diário  L'Humanité, 
      engenheiro e sindicalista. É autor de dois ensaios e um romance.
       O original encontra-se em 
      https://francais.rt.com/opinions/32868-panique-generale-chez-euro-atlantistes
       
In
RESISTIR.INFO
http://resistir.info/europa/panico_euroatlantista_23jan17.html
26/1/2017

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

REVELAR O QUE PATRÕES E O GOVERNO TENTAM ESCONDER. AMPLIAR A LUTA EM CADA LOCAL DE TRABALHO, MORADIA E ESTUDO CONTRA O MASSACRE AOS DIREITOS



Intersindical
 
  
A cada saída de suas próprias crises, os capitalistas aproveitam para
intensificar o ataque aos trabalhadores. E dessa vez no Brasil, os patrões
conseguiram um governo biônico para tentar acelerar e impor uma das principais
reivindicações patronais: detonar com a legislação trabalhista, permitindo a
redução salarial, a eliminação de direitos e o aumento da jornada de trabalho.
Esse é o pacote de Temer/PMDB que vai chegar em regime de urgência no início de
fevereiro ao Congresso Nacional, ou seja, o governo tenta mostrar serviço ao
Capital o quanto antes, pois como também está enlameado nos atos de corrupção,
quer passar o trator nos direitos trabalhistas ante qualquer possiblidade de ser
o próximo a ser retirado da cadeira da Presidência.
A CONIVÊNCIA QUE TANTO BEM FAZ AO PATRÃO: logo depois do anúncio do pacote que
massacra os direitos dos trabalhadores, a maioria das centrais sindicais além de
não revelar o objetivo desse pacote, silenciaram sobre a necessidade da greve
geral para enfrentar mais esse ataque contra os trabalhadores.
Ao contrário da defesa dos trabalhadores, o que viu foram elogios à proposta do
governo. A Força Sindical já de início elogiou a proposta do governo, dizendo
que ela traz um avanço na relação capital e trabalho. Para a Força Sindical, uma
central sindical criada com o apoio direto da FIESP (Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo), impor o negociado acima do legislado é estender para o
conjunto dos trabalhadores o que eles já praticam: a aceitação de acordos em que
salários e direitos possam ser reduzidos. A UGT que regularmente tem sido
chamada para encontros com o governo, fez festa em sua própria defesa dizendo
que Temer atendeu seu pedido de não enviar uma Medida Provisória, mas sim um
Projeto de Lei para o Congresso Nacional. Escondem que o tempo maior que querem
para debater o pacote, não é para enfrentá-lo e sim para tentar impor a
aceitação desse massacre contra os direitos.
Já a CUT disse que o pacote é “autoritário e inapropriado para o momento” e que
foi um absurdo apresentá-lo às vésperas do Natal. Ou seja, depois podia?
Inapropriado por que? Porque não foi o seu governo que o apresentou?
O fato é que todas essas centrais já se submeteram aos interesses patronais
aceitando nas negociações a redução de direitos. Em todos esses acordos em que o
negociado prevaleceu sobre o legislado o que impera não é o avanço de diretos,
mas sim o retrocesso.
A LUTA TEM QUE SER PRA VALER: a proposta de desmonte da Previdência já está em
andamento no Congresso Nacional, o pacote contra os direitos trabalhistas chega
nos próximos dias e não há alternativa de remediar ou remendar projetos que tem
em seu centro o objetivo de acabar os direitos.
A pressão no Congresso e no governo não adianta se for para reformar a reforma,
a luta tem que ser para impedir esse massacre contra a classe trabalhadora que
chamam de reforma e isso não se faz nas salas confortáveis do Palácio do
Planalto ou do Congresso, isso se faz nas fábricas e nas ruas, parando a
produção e a circulação de mercadorias.
Há cem anos acontecia uma grande greve geral no País na qual a cidade de São
Paulo parou. A greve geral de 1917 mobilizou a classe trabalhadora que amargava
jornadas de mais de 16 horas, arrocho salarial e péssimas condições de trabalho.
Nesse período os direitos que hoje querem nos arrancar eram ainda
reivindicações, e foi em sua prática solidária que os trabalhadores construíram
também as Associações de Mutua Ajuda, ou seja, os direitos trabalhistas. A
Previdência Social não foi concessão dos patrões ou do Estado, são fruto da luta
e da ação própria da classe trabalhadora.
A greve geral continua a ser um dos instrumentos mais poderosos da classe
trabalhadora para defender seus direitos.
Portanto é mais do que hora de construir de fato as condições para a necessária
greve geral, revelando ao conjunto dos trabalhadores aquilo que o governo, os
patrões, seus meios de comunicação e também os pelegos presentes no movimento
sindical tentam ocultar: não se trata de uma reforma para manter e ampliar
empregos, se trata de acabar com os mínimos direitos que milhares de
trabalhadores que vieram antes de nós tanto lutaram para que fossem garantidos.
O Capital e seu Estado mentem ao dizer que é preciso reformar a Previdência e a
legislação trabalhista, pois estão preocupados em proteger as futuras gerações,
a verdade de sua preocupação é: garantir que essa e as futuras gerações de
trabalhadores tenham cada vez menos direitos, para que os capitalistas
concentrem cada vez mais riqueza.

In
INTERSINDICAL
http://www.intersindical.org.br/mobilizacao/noticias2/item/1311-revelar-o-que-patroes-e-o-governo-tentam-ocultar-para-ampliar-a-luta-em-cada-local-de-trabalho-moradia-e-estudo-contra-o-massacre-aos-direitos
23/1/2017

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Recuperar a Lenin


La concepción que tiene del partido Lenin rompe con la forma de partido
parlamentário

Recuperar a Lenin

Todo es forma partido en la política española... lo que falta es una teoría de
la organización al servicio de la acción del nuevo tipo de asalariado resultante
de una década de crisis, que permita recuperar la secuencia revolucionaria del
cambio en España


Eddy Sánchez Iglesias

Como cada año, el 21 de enero se conmemora la fecha del fallecimiento de Lenin,
momento en el que lanzo una pregunta intencionada ¿y si el abandono del
leninismo fue un error?
 Mi intención es contribuir a abrir un debate en el marco del que será el XX
Congreso del PCE, al plantear la necesidad de recuperar a Lenin en las
condiciones actuales, en concreto, su teoría sobre el partido.
 Elegir este tema -el otro sería la teoría leninista sobre el imperialismo, al
que dedicaré un próximo artículo-, viene motivada por la contradicción que surge
al apreciar cómo las bases del PCE se siguen considerando leninistas (en su
mayor medida) mientras que el Partido (como institución) no.
 Todo en un contexto donde le PCE realiza una revisión crítica de sus aciertos y
errores durante la Transición, revisión incompleta, porque precisamente uno de
los mayores gestos políticos de aquel PCE, como fue el abandono del leninismo en
su IX Congreso en 1978, aparece como incuestionable en la actualidad.
 En mi opinión, el motivo político principal para ese “abandono de Lenin” no es
tanto el hecho –de gran envergadura- de las consecuencias políticas que tiene
hoy la desaparición de la URSS, sino la asunción por parte del PCE –al menos
hasta ahora- de una premisa: que la teoría del partido de nuevo tipo de Lenin ya
no tiene vigencia en la sociedad actual. Si se considera la teoría del partido
como la aportación más importante de Lenin al marxismo, al entenderse sin
vigencia, el abandono del leninismo queda justificado.
 Mi hipótesis es diferente y contraria. Para ello me baso en el trabajo del
sociólogo y antropólogo francés Sylvain Lazarus y su artículo “Lenin y el
partido” editado en el libro de Akal Lenin Reactivado. Cito textualmente a
Lazarus: “durante el siglo XIX la idea de la política era la insurreccional,
mientras que en el siglo XX esa idea descansaba sobre el partido. […] Lenin iba
a convertir la nueva concepción del partido en la condición para una estrategia
revolucionaria en la era del imperialismo”.
Según esta hipótesis, que comparto, es dentro de la forma partido donde se han
reorientado, y se orientan, las condiciones de clase y de acceso al poder. Y es
aquí donde Lenin hace una aportación central, aportación que hace –siguiendo a
Lazarus- rompiendo con la tesis de Marx y Engels del Manifiesto Comunista, en lo
que respecta al carácter espontáneo de la aparición de comunistas dentro del
proletariado moderno. Si para Marx “donde hay proletarios hay comunistas”, Lenin
oponía “donde hay partido hay proletarios comunistas”. Para Lenin los mecanismos
de realización de las condiciones de la revolución requieren la forma partido.
Entonces la pregunta sería ¿qué forma partido?
 Ante tal pregunta, cabe afirmar que la forma partido que asume la izquierda
actual, sea moderna o posmoderna, es la forma de partido parlamentario. El
partido parlamentario se presenta como una organización que reduce la política
al poder del Estado y que, por tanto, busca recabar apoyo de todos los estratos
y clases sociales para acceder al ejercicio –que no toma- de dicho poder. El
partido parlamentario niega por tanto toda referencia de clase, haciendo del
programa su elemento central, base de un “contrato” con el que aglutinar a toda
una base interclasista.
 La concepción que tiene del partido Lenin rompe con la forma de partido
parlamentario, heredero de la Francia que vence a la Comuna de París en 1871, y
sitúa como centro de la acción política la categoría política de partido
revolucionario, aquel que tiene en la referencia de clase su centralidad.
 Frente al partido parlamentario, Lenin descubre aquella dimensión del marxismo
que había sido negada por la práctica de la Segunda Internacional: la dimensión
emancipadora de la subjetividad. Esta compresión de la acción política desde la
vuelta a la clase es clave para afrontar el momento político actual,
caracterizado por una clase trabajadora en plena transformación.
 Es necesario separar al PCE de la visión de la izquierda actual, que reduce a
la clase obrera al puro momento objetivo (como una mera realidad económica), a
la vez que entiende el momento subjetivo como algo separado de la producción, lo
que reduce la política del partido a una tarea de gestión económico-política del
capitalismo, que bien podríamos llamar “gobernismo”.
El momento subjetivo de una clase obrera en formación, que como la actual, nos
remite a lo que E.P. Thompson presentaba como una clase trabajadora que se
atrevía, en momentos de sobre-explotación, “a distinguir entre trabajo y vida”,
tal y como hacen hoy los trabajadores de los Contac Center, Coca Cola, Movistar
o Nissan, que plantean una acción colectiva exitosa allí donde nadie esperaba:
la empresa global y el barrio.
 Bien entendido, lo que se plantea no es elaborar una teoría frente a la
supuesta cancelación histórica de la forma partido, sino recuperar de la forma
parlamentaria la forma partido, para así –volviendo a Sylvain Lazarus- “extraer
la revolución de este mecanismo de captura” que supone el parlamentarismo.
 En la actualidad organizaciones no faltan, todo es forma partido en la política
española de hoy, lo que falta es una teoría de la organización al servicio de la
acción del nuevo tipo de asalariado resultante de una década de crisis, que
permita recuperar la secuencia revolucionaria del cambio en España, y que
posibilite examinar y concretar en términos de hoy, la concepción de partido y
de clase. Elementos por los que el PCE debería plantearse recuperar a Lenin en
su próximo congreso.
   
In
MUNDO OBRERO
http://www.mundoobrero.es/pl.php?id=6613
19/1/2017

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

 Aprovechemos la experiencia victoriosa del Gran Octubre


Guennadi Ziugánov

Intervención en la Duma de Guennadi Ziugánov, presidente del CC del PCFR
Este año se cumple el centenario del Gran Octubre y de la revolución de Febrero.
No fue casual que tanto el discurso a la nación del presidente de Rusia, como la
intervención del presidente de la Duma, comenzasen recordando esas fechas. Es
muy importante para nosotros extraer las consecuencias de aquellos grandiosos
acontecimientos.
Les quiero recordar que si consultan la hemeroteca de los periódicos de enero de
1917 se sorprenderán, pues no encontrarán en ninguno de ellos ni una sola
palabra sobre una posible revolución.
Estalló tras la revuelta de las mujeres hambrientas que no consiguieron ni una
barra de pan en la Av. Nevski. Todos le dieron la espalda al zar: su familia, la
iglesia, la cúpula militar, la nobleza, todas las capas. Luego al poder llegó el
gobierno provisional, donde únicamente el ministro de ferrocarriles no era
masón. Se sucedieron 5 gabinetes de gobierno distintos. Despedazaron el país,
paralizaron la economía y los conflictos armados comenzaron a regarse como la
pólvora por lo que un día había sido un gran país. Y solo el Gran Octubre salvó
al país, aunque contra la Rusia soviética se organizase el levantamiento de los
checos, la guerra civil ─que fue una contienda entre el Octubre proletario y el
Febrero liberal─, y la intervención de 14 países. Por cierto que sobre esto no
se dice nada en los actuales libros de texto.
Solo la Unión Soviética supo agrupar en torno a los ideales de justicia social,
paz y amistad de los pueblos, a todo un imperio en descomposición, llevando a
cabo una modernización única en todos los campos de la vida. Solo en lo
económico, los tiempos de crecimiento durante 20 años fueron de más del 16%. La
URSS derrotó al fascismo, salió al espacio, creó la paridad nuclear que
garantizó y garantiza la paz a la actual generación de rusos. Si sabemos recoger
lo mejor de aquella época, alcanzaremos grandes metas. Nuestra tarea pasa por
aunar esas tres épocas: la imperial, la soviética y la actual. En el pasado en
la Duma ha habido tres intervenciones significativas. El discurso del presidente
conminando no solo a la solidaridad y la unidad, sino exigiendo al mismo tiempo
garantizar el ritmo mundial de desarrollo. La intervención del Patriarca Kiril,
quien pidió conjugar los ideales de la Rusia Sagrada, la Rusia imperial y la
justicia soviética; y la conferencia del premio nobel  Zhorés Alfiórov (diputado
por el PCFR. N de la T), dedicada a la ciencia y al gobierno, partiendo del
trabajo de Einstein “¿Por qué el socialismo?, aparecido en 1949. Ya entonces
este genio científico anunció a la humanidad: “sin socialismo las guerras y la
violencia continuarán en el planeta”. Les quisiera recordar un hecho bastante
curioso. Se cumplen ahora justo 50 años, cuando representantes de toda la
humanidad, después del salto al espacio, se reunieron en Washington para debatir
cómo sería el mundo en el nuevo milenio. Lo más curioso de lo que entonces
declararon fue que iban a derrotar a la pobreza, a las enfermedades y que harían
todo para que todos tuvieran una casa y la gente viviese dignamente. Nada de eso
como sabemos se produjo.
Por cierto que en ese encuentro prometieron que para 1999 iban a celebrar unos
fuegos artificiales conmemorando la destrucción total de los arsenales
nucleares. En este caso las esperanzas tampoco se cumplieron. Recordemos que
cuando se reunió la asamblea General de la ONU en el 2000, llegó a la conclusión
de que los diez principales peligros que amenazaban a la humanidad, que hacen
cada día más difícil la vida en el planeta, siguen siendo los mismos: pobreza,
enfermedades, degradación del medio ambiente. En el noveno lugar se encontraba
el terrorismo. El año pasado pasó  ya a ser uno de los tres principales desafíos
para el mundo. Como vemos, el capital y el mercado no ha sido capaz de resolver
en estos 50 años ninguno de esos problemas señalados. La situación continúa
agravándose. Nadie sabe qué hacer. Nosotros estamos convencidos. Sin la gran
experiencia del país de los soviets no podremos avanzar.
Ayer al encender el televisor veo a dos jóvenes bien vestidos, del Ministerio de
Justicia, proponiendo celebrar el año nuevo desahuciando de su única casa a
ciudadanos culpables de vaya a usted a saber qué. Por lo visto todavía no se han
muerto todos con los fríos que estamos viviendo. Considero que se trata de una
completa provocación que nada tiene que ver con la política social de un Estado
que se define como tal. Es una locura. Salir con esa propuesta en un país donde
72 de cada 100 personas viven con 15 mil rublos al mes o menos (1€= 63 Rublos).
Por eso es que no pueden pagar por los gastos de vivienda, la hipoteca y todo lo
demás, porque apenas les llega para comida y medicinas después de intentar
afrontar su deuda.
Mientras tanto, una de las noticias del pasado año ha sido el brusco incremento
del número de multimillonarios (en dólares) en el país. Rusia ocupa el primer
lugar del mundo entre los países más importantes, en niveles de desigualdad
social. El 62% de la riqueza en nuestro país recae sobre los millonarios en
dólares, el 26% sobre los multimillonarios en dólares. Mientras a la mayoría
absoluta de la población apenas le corresponde un 10% de toda esa riqueza.
¿Acaso no es hora de gravar con impuestos a los más ricos?
En este sentido es fundamental extraer conclusiones de las intervenciones de
figuras relevantes y de dirigentes de nuestro país: Necesitamos una nueva
estrategia. Pero cuando veo que es el señor Kudrin (exministro de finanzas. N de
la T.) el que se encarga de diseñar esa estrategia, un escalofrío me recorre el
cuerpo. Lo que les va a presentar va a ser una estrategia de tres puntos.
Primero: Vendamos lo que queda. Segundo punto: El Estado será el vigilante de la
propiedad ajena. Y tercer punto: volvamos a guardar el dinero en los bancos
extranjeros al 2%, mientras pedimos créditos en el exterior al 5-8%. No les va a
proponer nada nuevo.
En este sentido, en este año de celebraciones y año de la ecología, volvamos a
ver lo que aprobó la Duma en su anterior composición. Aprobamos casi 40 leyes en
defensa de la ecología. V. Kashin (diputado del PCFR. N de la T) y su equipo, el
Comité para la ecología, trabajaron de forma brillante, todos los grupos le
respaldaron. ¿En qué consistían nuestras propuestas? En introducir nuevas
normativas ecológicas y obligar así a que se recurra al uso de las tecnologías
más punteras. Lograr, que funcione la ley de política industrial y planificación
estratégica, que acordaron todos los grupos. Aquí se abre ante nosotros un
enorme campo de posibilidades. Aún más si tenemos en cuenta que nuestros
esfuerzos se vieron respaldados por el Consejo de Estado, que estuvo analizando
en su última sesión de diciembre toda esta problemática.
Hemos preparado el programa “Diez pasos hacia una vida digna”. Les invito a que
vuelvan a repasarlo y analizar el paquete de leyes que proponemos.
Pongamos por caso la producción. Sin ella no es posible ningún tipo de
consolidación ni desarrollo. El país en los últimos 4 años ha perdido el 8% de
su PIB. Significa eso que hemos dejado de ingresar 100 billones de rublos. Eso
implica que se han perdido para los presupuestos 40 billones de rublos.
Básicamente hemos tirado el presupuesto para tres años. Y por ahora sigue sin
haber ningún tipo de crecimiento.
¿Cómo vamos a lograr alcanzar ese 3% de crecimiento que nos prometió el
presidente en su discurso? Solo de un modo: reduciendo el apartado de gasto
presupuestario en 22 billones como mínimo. Solo desde ese umbral es posible un
desarrollo acelerado. Mientras no resolvamos ese problema, se podrá prometer lo
que se quiera, pero no se logrará nada.
Por eso los proyectos  de ley que en su día presentamos, sobre la
nacionalización del sector de las materias primas, la introducción del monopolio
estatal sobre la producción de bebidas alcohólicas y la introducción de una
escala recaudatoria progresiva, deben volver a ser debatidos en profundidad.
Solo así podremos cumplir las directrices del presidente y comenzar a salir de
esta profunda crisis.
En lo que respecta a la base de consolidación, dicen que la amistad surge en la
obra. Aquellos que alguna vez trabajaron en los destacamentos de construcción
conocen ese dicho. Tenemos a día de hoy nueve mil construcciones abandonadas,
congeladas, en las que en su día se invirtieron 2’5 billones de rublos, y a las
que no se les ha sacado ningún rendimiento. Propongo que cada diputado asuma el
patronazgo de este tipo de construcciones en sus regiones. Que recurra a la
juventud y ayude así a resolver los problemas concretos de cada uno de esos
proyectos. La base de la consolidación pasa por ayuda a sobrevivir a aquellos
que lo están pasando mal, principalmente mujeres, niños y ancianos.
Sirva como ejemplo la operación para devolver a la vida las instalaciones de
“Artek”. Aprobamos la resolución y en dos años se han invertido 10,5 mil
millones de rublos. Falta todavía invertir 1500 millones para convertir de nuevo
a “Artek” en el mejor sanatorio y campo vacacional del mundo. El año pasado ya
pasaron sus vacaciones allí 30 mil niños.
Hemos ayudado a los niños del hermoso Donbás. El PCFR acaba de fletar el convoy
nº 58 con diez mil regalos para año nuevo. Tomemos la decisión de respaldar al
Donbás. Reconozcamos a esas repúblicas. Basta ya de que el gobierno de Kiev se
siga burlando de ellas.
Para nosotros es de vital importancia ayudar a los niños con enfermedades
oncológicas. El año pasado estuvimos a vueltas con eso y no terminamos de
adoptar ninguna decisión. Se trata de miles y miles de niños que están
sufriendo. Tenemos 5 bloques de edificios del Centro oncológico en Moscú que
llevan vacíos dos años ya. Ahora tenemos ya la posibilidad de añadir recursos
para equiparlos y ayudarles.
Para nosotros es muy importantes ayudar a las familias jóvenes. He podido
constatar que aquellos que tienen dos hijos son todos pobres. Para algo se
preparó un programa para dar respuesta a ese problema.
Ahora, en lo que respecta a las empresas populares. Ya me canso de repetirlo:
vayan aquí al lado al sovjoz Lenin, a visitar a su director Grudinin, vayan a
verlo aunque solo sea por una vez. Vayan a Marii-El, al combinado “Zvenigovski”.
Su director Kazankov se ha convertido en campeón de Europa en cuanto a calidad
de sus productos cárnicos. Y asolo esa empresa aporta 600 millones de rublos en
impuestos. Por cierto que en el sovjoz Lenin han construido una escuela
fantástica, en la que han invertido 1200 millones, sin pedirle ni un céntimo al
Estado. Allí el sueldo medio es de 77 mil rublos, con todo un programa social
completo.
Juntos aprobamos durante el gobierno de Primakov-Masliukov (1998 N de la T.) la
ley sobre las empresas populares. ¿Por qué no volver a ella y resolver así el
problema?
Tenemos toda una serie competa de programas: “Nuestro bosque”, “nuestra casa”,
“nuestro jardín”, “nuestra dacha”, “nuestra aviación”, “nuestras carreteras”.
Pongámoslo en acción, llevémoslo a la práctica. De ponerlo en marcha en un
futuro cercano se creará otro ambiente en la sociedad, todos entenderán lo que
es el trabajo productivo y no la palabrería hueca”.
Reciban una vez más mi felicitación por el año nuevo.
Traducido del ruso por Iñigo Aguirre
In
LA REPÚBLICA
http://larepublica.es/2017/01/14/aprovechemos-la-experiencia-victoriosa-del-gran-octubre/
14/1/2017

sábado, 21 de janeiro de 2017

Uma tarde com Julian Assange, o hacker que tirou o sono ao governo americano




 Fernando Morais 

Esta entrevista realizada pelo blogue brasileiro Nocaute é importante a vários
títulos. É importante pelo conhecimento e informação que Assange manifesta dos
processos de espionagem económica e política por parte dos EUA, e – numa altura
em prossegue uma alucinada campanha de acusações de interferência externa nas
eleições nos EUA - é importante pelo que revela do papel dos poderosíssimos
meios de comunicação electrónica de que esse país dispõe enquanto instrumentos
de manipulação política e mediática.


Foi quase um ano de espera. Desde o começo de 2016 amigos europeus e
latino-americanos tentavam me ajudar a conseguir uma entrevista jornalística com
o cyber ativista australiano Julian Assange, exilado desde 2012 na elegante e
modesta embaixada do Equador, em Londres.
 Cheguei a ter um contato enviesado e impessoal com Assange, ao tentar armar um
encontro dele com o ex-presidente Lula, que viajaria a Londres em abril de 2013.
Lula topou, Assange topou, o pessoal diplomático equatoriano na Inglaterra
também apoiou a iniciativa, mas circunstâncias que não vêm ao caso acabaram por
frustrar a visita de Lula.
 Quando comecei a montar o Nocaute, no ano passado, adotei uma ideia fixa: a
principal matéria do número de estreia do blog seria uma entrevista com Julian
Assange. Bati em portas de intermediários em vários países até que, em meados do
ano, chegou a luz verde: ele ia me receber. E a notícia boa coincidia com os
últimos “zeros” (ou “demos” ou “betas”), as versões experimentais do blog, só
acessíveis ao público interno.
 Aí começaram a adiar a entrevista. E nós tendo que procrastinar o lançamento do
Nocaute. Pelo menos na minha cabeça já estava decidido: sem Assange não tinha
estreia.
 A notícia ruim chegou em setembro: o mega-hacker mantinha a palavra, ia me
conceder a entrevista, mas não antes do dia 8 de novembro, data das eleições
presidenciais norte-americanas. Demos um cavalo-de-pau na ideia original,
convidamos o ex-presidente Lula e fizemos com ele a capa do número 1 de Nocaute,
lançado na noite de 29 de setembro.
 Abertas as urnas e eleito Donald Trump, voltei a cobrar a entrevista, que
acabou sendo marcada para a tarde de 27 de dezembro. Uma gelada e úmida tarde
londrina. De calça azul marinho e agasalho de lã abotoado até o pescoço, o
varapau de um metro e noventa apareceu sorridente, com a barba e os cabelos
longos, mais pálido do que sugerem suas fotos.
 Julian Assange é um homem de fala suave e gestos contidos, que em nada lembra o
carbonário pintado por alguns veículos. Falou durante três horas sobre Trump,
Hillary, Michel Temer, manifestações contra Dilma, Petrobras e, claro,
espionagem. A gravação foi interrompida algumas vezes para que ele pudesse tomar
um pouco de água e ciscar pedaços de um croissant trazido num saquinho de papel
por sua assistente.
 Ao final, fez uma única exigência: que a entrevista não fosse divulgada antes
de determinada data de janeiro.
Fernando Morais: Há dez anos nascia o WikiLeaks, a mais poderosa e inexpugnável
máquina de divulgação de segredos de estado de que se tem notícias em todos os
tempos. Há quatro anos está aqui nesse pequeno prédio no centro de Londres onde
funciona a embaixada do Equador, o criador dessa máquina, o australiano Julian
Assange. Assange está exilado na embaixada do Equador, a poucos metros da
Harrods, paraíso mundial para os turistas que vêm aqui para fazer compras. Vamos
entrar aqui na embaixada para fazer uma entrevista exclusiva com Julian Assange
para o Nocaute. Venha conosco!
Fernando Morais: Em primeiro lugar muito obrigado pela deferência de ter me
recebido aqui. É uma honra estar aqui com você, apesar das circunstâncias.
 Você deve saber que os netos dos netos dos seus netos e os netos dos netos dos
meus netos, os seus na Austrália e os meus no Brasil, vão ler nos livros de
História, daqui a cem anos, o responsável pela eleição do Trump para a
Presidência dos EUA foi o senhor. Não importa que isso não seja verdade: como o
senhor se sente em relação a isso?
Assange: Penso que é muita ingenuidade acreditar que muda tudo tendo este ou
aquele presidente no comando. Sim, o Trump foi eleito e nomeou Rex Tillerson
secretário de Estado, e Rex é o CEO da Exxon. Mas, quem foram os segundos
maiores frequentadores da Casa Branca nos oito anos do governo Obama? Os
lobistas da Exxon.
 O que a Hillary Clinton fazia quando era secretária de Estado? Uma das coisas
principais era pressionar a favor dos interesses das empresas de petróleo. Acho
que não podemos ser muito ingênuos a respeito.
 Os Estados Unidos vão continuar cometendo todos tipos de crimes contra seu
próprio povo e também no exterior. Vão cometer erros e crimes graves
intencionalmente. Sempre foi assim. Porque os governos representam as facções
dominantes da sociedade americana, que são as grandes empresas multinacionais.
 A questão é: que tipo de símbolo é isso? O que representa esse fenômeno? Com
Rex Tillerson como chefe do Departamento de Estado fica muito fácil saber o que
eles querem fazer. Era mais difícil quando Hillary Clinton era secretária de
Estado.
 Eu critico o governo Trump, engajado em causas capitalistas, fazendo acordos
escusos para amigos. Mas como se trata de uma classe de bilionários, é uma
crítica fácil de se fazer.
 Mas se olharmos o gabinete do Obama, veremos dezenas de bilionários. Há
bilionários no gabinete do Trump como havia no do Obama.
 Então não estou certo de que as coisas sejam tão diferentes, e retoricamente a
situação é muito mais fácil de se entender.
 Além disso, o Trump desestabilizou o que era uma consolidação crescente de
poder de Obama desde os tempos de Clinton. Essa consolidação foi incomodada. Um
novo grupo está emergindo no gabinete do Trump. Mas ele tem muitos inimigos, tem
a maioria da imprensa americana como sua inimiga, tem a estrutura montada pelo
Obama e terá que encontrar seu próprio caminho. Trump desestabilizou o estado de
poder que funcionava. Trump trouxe muita gente que é bilionária, com um caráter
muito forte, para seu gabinete.
 Por que as pessoas se tornam bilionárias? Parte da explicação é que elas não
querem mais trabalhar pra ninguém. Mas essas pessoas disseram que trabalhariam
para o Trump. Essa é uma questão muito interessante.
 A partir do momento que se tiver uma situação de independência dessas pessoas
que formam o gabinete, com o tempo alguns serão ejetados e outros começarão uma
carreira para solidificar aquela estrutura. Mas por um bom tempo, talvez um ano
ou dois, haverá muitas oportunidades de mudar a percepção do que o governo
americano faz, e conseguir algumas mudanças de verdade a partir disso.
 Algumas áreas como a política externa, por exemplo, com certeza terão mudanças.
Algumas pra melhor, outras para pior.
 Sim, o governo Trump cometerá todo tipo de crimes, mas definitivamente os
mesmos crimes cometidos pelo governo da Hillary Clinton. Só que agora o processo
será mais visível e as críticas internas serão muito mais intensas.
 Vamos imaginar que haja outra guerra por petróleo. Quem irá se opor a ela
internacionalmente? Se você olhar para a estrutura da sociedade europeia, a
maioria irá criticar mais facilmente o governo americano do que se a Hillary
Clinton estivesse conduzindo a guerra. Se você vive num país vítima da guerra,
você terá ajuda internacional mais facilmente se a administração Trump ameaçar
invadir seu país.
 Da mesma forma no âmbito doméstico. Trump pode ter mais oposição interna para
essa guerra. O New York Times faz oposição a Trump, assim como a CNN e como
quatro dos cinco grandes conglomerados de mídia dos EUA. Então, é mais fácil
conseguir uma resistência doméstica contra essa política. Se fosse nos moldes
antigos, essa oposição estaria fora do jogo, incluindo a CNN. Vamos ver se os
cinco grupos de mídia dos EUA fazem um acordo para sair de cena, mas no momento
eles estão fazendo campanha contra o Trump. Então ficará mais fácil conseguir
uma resistência doméstica contra essa política.
 Há um isolamento de forças nesse gabinete. Provavelmente essa força isolada vai
mudar com o tempo. Provavelmente a CIA e os complexos militares vão se
aproximar. A Exxon, Chevron e outras companhias com interesses no exterior vão
impor suas demandas. A indústria de armas dirá: “Temos de aumentar nossas vendas
de armamentos. As pessoas precisam ver nosso jatos bombardeando alguma coisa ou
não os comprarão.”
Com o tempo dá pra se preocupar. Mas neste momento é muito fácil criticar dentro
e fora dos EUA qualquer coisa efetivamente perigosa que a administração Trump
faça. Então não é tão ruim.
Fernando Morais: Que evidências o WikiLeaks tem do envolvimento internacional na
derrubada da presidente Dilma Rousseff no Brasil?
Assange: Não publicamos nada diretamente a respeito, mas muita coisa sobre as
partes envolvidas, como eles agiram historicamente – incluindo o presidente
Temer e outras pessoas do seu gabinete. A maioria trata de contatos com a
embaixada americana. Vindo à embaixada americana, trazendo briefings e tentando
fazer lobby para que ela apoie um partido ou outro.
Fernando Morais: Na sua opinião o que aconteceu no Brasil foi um processo de
impeachment ou um golpe de estado no estilo Século 21?
Assange: Algo entre as duas coisas, um golpe constitucional. Um golpe político,
como pode ser chamado.
Fernando: Há alguma evidência concreta do que a CIA…
Assange: Na Austrália, meu país natal, houve um golpe que foi esquecido, que
aconteceu de forma muito semelhante ao que ocorreu com Dilma e Temer no Brasil.
Foi em 1975, um processo muito parecido, lá também um partido de esquerda estava
no poder.
 Fazia dois anos que estavam no poder e nunca tinham estado tanto tempo antes.
Aí os setores de negócios e de inteligência, aliados aos governos americano e
britânico, se uniram e usaram um truque constitucional para derrubar o governo e
instalar a oposição.
Fernando: À luz do que o WikiLeaks tornou público, é possível identificar
exatamente o que a NSA (National Security Agency) buscava ao fazer espionagem e
escutas telefônicas no Brasil?
Assange: Sim, as publicações das escutas sobre o Brasil. Nós publicamos que não
apenas a NSA estava espionando determinada companhia ou pessoa, mas vazamos a
cadeia completa de alvos. Portanto, temos a base da atividade de coleta de
dados. Se você pensa na NSA, ela não decide políticas mas faz espionagem sim.
Hackeia satélites, coloca grampos em fibras óticas, etc.
 Isso se dá no nível operacional, não no político. No nível político, o (DNI)
Director Nacional Intelligency diz quais são prioridades gerais do que os
Estados Unidos querem coletar [de informação] e aí acionam a NSA e a CIA, o
National Reconnaissance Office [agência de inteligência norte-americana que
projeta, constrói e opera os satélites espiões para o governo dos EUA] e coletam
de volta a informação.
 Nas nossas publicações você pode ver que o gabinete de um determinado ministro,
a Petrobras e o presidente da República são alvo de espionagem por razões
políticas ou econômicas porque essas são as razões listadas de acordo com as
designações dadas.
Assange: Então a busca no Brasil é uma mistura envolvendo assuntos políticos,
tentando entender a política no Brasil, que rumo gostaria que tomasse, o que
gosta, o que não gosta. E compreender a economia brasileira.
 Ada: Existem evidências de informantes que imprimimos a respeito de conversas
do vice-presidente Temer.
Assange: É essa publicação dos grampos no Brasil, com números de telefone
detalhados, as informações pedidas. Isto é a política de diretrizes dos EUA: por
que eles querem essas informações e qual a necessidade delas? Isto explica,
resumidamente, o porquê deles quererem essas informações. Espionando Dilma por
razões políticas. O gabinete da presidente, dos ministros etc. Isto é para
entender como funcionam as finanças do país. Então é uma mistura.
 Por razões militares, ocasionalmente espionam o Exército brasileiro. Todos
sabem que isso é o que os serviços de inteligência fazem. O que há de novo nisso
é o grau de interesse político, econômico e financeiro, não apenas uma parte
pequena da atividade. Na verdade, se analisarmos o orçamento da NSA, cerca de
50% de toda sua atividade é pra entender qual o rumo que um país ou gabinete
presidencial está tomando politicamente e economicamente – para que os EUA
possam reagir e conduzi-los a um caminho específico. Na lista das espionáveis
estão as importantes companhias energéticas.
Fernando: O WikiLeaks divulga um milhão de documentos por ano. Você certamente
não se lembra de tudo, mas dos documentos do WikiLeaks o que é sabido a respeito
da relação do então vice-presidente Temer com os serviços de inteligência
estrangeiros, particularmente norte americanos?
Assange: Nós publicamos várias mensagens sobre isso. Uma em particular é de
janeiro de 2006, em que ele vai à embaixada americana. A mensagem é somente a
respeito das informações fornecidas por Michel Temer, suas visões políticas e as
estratégias do seu partido.
 Isso mostra um grau um pouco preocupante de conforto dele com a embaixada
americana. O que ele terá como retorno? Ele está claramente dando informações
internas à embaixada dos EUA por alguma razão. Provavelmente para pedir algum
favor aos Estados Unidos, talvez para receber informações deles em retorno.
 Ele foi à embaixada americana várias vezes pra falar. A mensagem que publicamos
em janeiro é só sobre essas comunicações. Frequentemente a embaixada retorna
contato a respeito de alguma questão e consultam diversos informantes de
partidos diferentes e juntam essa informação.
 Temer enviou informações várias vezes para a embaixada americana, mas outros
também o fizeram. Gente do seu gabinete e também gente de dentro do PT. Então,
pessoalmente, eu acho que dada a natureza da relação do Brasil com os Estados
Unidos e considerando a intenção do departamento de Estado americano em
maximizar os interesses da Chevron e ExxonMobil, estão provendo aos EUA
inteligência política interna sobre o que se passa politicamente no Brasil.
 Com essas informações o Departamento de Estado pode fazer manobras em defesa
dos interesses das grandes companhias americanas de petróleo. O que não
necessariamente está alinhado com os interesses do Brasil.
 Dependendo de como funciona uma sociedade, pode-se permitir que qualquer pessoa
vá a uma embaixada e passe informações internas. Mas a maioria das sociedades
que sobrevivem tem regras contra isso. Regras que proíbem que informações
políticas delicadas sejam dadas a outro estado.
Ada: E há também há a sensação de que ele está insatisfeito com a política
anti-neoliberal do PT e deseja se alinhar com o PSDB.
Assange: É o que tem acontecido agora. Se você ler o que publicamos em 2006,
verá que a situação política atual está sendo construída há muito tempo. É
interessante ver como o posicionamento das partes, suas visões de mundo e quem
são seus aliados, não mudou tanto, como pode se ver.
Fernando: Você deve saber que o Brasil descobriu enormes jazidas de petróleo do
pré-sal no oceano e isso daria muito dinheiro ao Brasil mesmo o barril a 8
dólares Que interesse internacional existe nisso? Especialmente o envolvimento
do Michel Temer?
Assange: Não tenho certeza. Precisamente a respeito de Michel Temer temos um
material importante. Nós publicamos um número de documentos a respeito das
jazidas do pré-sal na costa brasileira. Os depósitos são considerados cerca de
quatro vezes maiores que as jazidas brasileiras existentes, algo extremamente
significativo. É muito caro chegar lá no fundo do oceano e furar a camada de
sal. Mas quando se chega, o petróleo não precisa de muito refinamento e se torna
bastante lucrativo.
 A respeito das condições existentes, a Petrobrás teria 30% de receita do
petróleo do pré-sal.
 Empresas interessadas nesse petróleo têm ido à embaixada americana para
reclamar dessas condições. E alguns partidos políticos no Brasil estavam dizendo
que prefeririam que a Chevron e a ExxonMobil tivessem acesso mesmo sem a
exclusividade dos trinta por cento da Petrobras.
 Esse é na verdade um tema muito interessante: qual é a melhor maneira para o
Brasil de licenciar a exploração dos depósitos de petróleo? O que mais
beneficiaria os brasileiros?
 E o argumento básico é nesta linha: se um estado vai agir de maneira coerente,
em competição com outros países e grandes companhias de petróleo, eles devem
garantir uma receita, e o petróleo garante um fluxo forte de receita, que pode
fortalecer o estado.
 O outro lado da equação usa o argumento que, se uma empresa, mesmo se é
propriedade do estado, tem acesso preferencial, ela ficaria ineficiente e não se
sairia bem na extração petróleo, porque não haveria competição. Estes são os
argumentos básicos.
 Também se diz que se existe muita competição na extração de petróleo, o preço
cai muito e o estado não arrecadará muito em termos de cobranças de licenças de
extração.
 Então se você olha as mensagens publicadas em dezembro de 2009, verá que já
havia relatos disso, mas não era a parte mais interessante. Pra mim a parte mais
importante é quando admitiram que o mais lucrativo para o governo seria que a
Petrobras tivesse o direito aos 30%.
 Então isso é uma admissão. Por que a embaixada alega que o negócio mais
lucrativo pra o estado brasileiro ocorreria se a Petrobras tivesse esses 30%?
 Porque a Chevron e outras grandes companhias americanas de petróleo diriam: se
a Petrobras tem esses 30%, não compensa pra nós. Não vale a pena pra nós fazer a
extração, nós poderíamos talvez nos envolver no financiamento.
 Mas a russa Gazprom e outras companhias chinesas de petróleo, como a China Oil,
poderiam ser capazes de cobrir lances nas licitações, obrigando a Chevron e a
Exxon a investir mais dinheiro, porque chineses e russos conseguem operar com
menos lucro.
 Por que? Porque os chineses só querem o petróleo, eles não estão tão
interessados no lucro. Eles podem chegar mais depressa e ficariam com as contas
equilibradas. Além de aportar um volume maior de recursos ao Brasil.
 Assim como outras empresas petrolíferas estatais e outros estados que têm
petróleo, os chineses operam de forma a que sempre possam ganhar licitações em
cima da Exxon, por exemplo, uma empresa muito grande, que tem uma receita anual
de US$ 269 bilhões.
 Então, no caso da Petrobras a questão que está posta é a seguinte: que tipo de
estado o Brasil quer ser? Um estado forte. Ou um estado muito fraco, que tem
grandes petrolíferas estrangeiras e multinacionais tomando conta dos seus
recursos naturais?
 Talvez você possa ver o que acontece no Brasil por outro ângulo: quais são as
grandes instituições públicas brasileiras, quais as mais fortes? Acho que são o
Exército e a Petrobras. E acho que em comparação, todas as outras instituições
são fracas. Então creio que fragilizar a Petrobras é uma forma de fortalecer os
militares como centro de gravidade da organização do estado. E isso pode ser um
problema.
 Duas razões justificam a elevação do pré-sal a assunto prioritário nas
políticas internas: a Petrobras é considerada uma aliada do PT, porque Dilma
esteve lá, colocou gente dela lá e as políticas dela beneficiaram a Petrobras.
Por tudo isso, institucionalmente, a Petrobras sente que seus interesses estão
melhor servidos pelo PT.
 Isso faz com que outros partidos queiram reduzir o poder da Petrobras, tirando
os ganhos dela. Uma maneira de trocar favores com os Estados Unidos é facilitar
à Chevron e à ExxonMobil o acesso a partes desse petróleo. Nas mensagens vazadas
por WikiLeaks aparece um desejo constante das petroleiras americanas de ter o
mesmo acesso que a Petrobras tem.
 É diferente de um estado tradicional, algo como um capitalismo de estado.
Porque o que a Petrobras pratica é capitalismo de estado. Tem a estrutura de uma
empresa, mas cuja organização é controlada pelo estado.
 Qual a diferença entre esse tipo de controle e o controle que vem de leis e
acordos? Você tem que nos dar certa porcentagem pra fazer o serviço, você não
pode agir de determinado modo ou sua companhia será multada e pessoas podem ser
processadas.
 É isso que tem acontecido nos países em desenvolvimento desde o começo dos anos
80, talvez desde 70 em países desenvolvidos. Tem sido uma mudança de como se
regulam instituições.
 Mas isso só funciona quando o sistema de regulação e o de legislação são
incorruptíveis. Ai não importa quem controla a instituição, já que você controla
as leis. Mas só funciona se você conseguir forçar o cumprimento das leis e
detectar se as leis estão sendo corrompidas. E o setor de petróleo tem tanto
dinheiro que isso acaba se tornando impossível.
Fernando Morais: Voltando ao Brasil, ao Michel Temer, na página dele do
Wikileaks ele se dirige a alguém não identificado, isso foi uma conversa privada
com um informante americano? Quantas vezes isso aconteceu e o que isso sugere?
Assange: Sim, Michel Temer teve reuniões privadas na embaixada americana para
passar a eles questões de inteligência política, a que não muitos tiveram
acesso, e discussões das dinâmicas políticas no Brasil.
 Isso não é pra dizer que ele é um espião pago pelo governo americano. Eu não
sei, mas não existem evidencias que ele seja um espião pago em dinheiro. Estamos
falando de algo mais, falando de construir uma boa relação de forma a ter trocas
de informação de parte a parte. E apoio político.
Fernando Morais : Tem uma outra passagem de um discurso da Hillary Clinton para
o Itaú que ela diz que gostaria de ter fronteiras livres. Isso seria algum
anúncio de que ela estava a favor do impeachment ou o golpe no Brasil?
Assange: Sim, em outubro publicamos palestras secretas de Hillary Clinton pelas
quais ela foi paga. As transcrições de alguns trechos revelam que o staff de
campanha dela temia que se tornassem públicos. Bernie Sanders e outros achavam
que esse tema deveria ser público, mas ela o manteve em segredo. E isso era o
Santo Graal do jornalismo americano, ter acesso a essas coisas. Para o
jornalismo americano foi como ter acesso a um tesouro. E nós publicamos.
 É um material muito interessante ver a posição dela quando fala com Goldman
Sachs, quando ela fala com bancos brasileiros de investimento.
 O que se vê é uma liberal imperialista em relação à expansão do império
americano, com fome de cimentar acordos de aproximação e implantar mudanças
ardilosas como o TTP [Tratado Transpacífico] e o TTIP [Acordo de Parceria
Transatlântica de Comércio e Investimento]. Ela propõe realinhamentos
estratégicos com o objetivo de fazer duas coisas: dar às multinacionais
americanas o que elas querem e parar a China, fazer com que seja mais difícil os
chineses crescerem.
 Então eu não sei o que as declarações dela estão refletindo. Ela falava sobre
energia com bancos de investimentos do Brasil, estava defendendo livre-trânsito
de produtos de energia.
Fernando Morais: Logo depois da chamada primavera árabe, dois movimentos de rua
cresceram, um no Brasil e outro na Turquia. No Brasil, antes dos protestos de
2013, a popularidade da presidente Dilma era 80 por cento, após os protestos foi
a 30 por cento. E na Turquia acabou com a tentativa de golpe militar contra o
presidente Erdogan e recentemente o golpe no Brasil. Você vê relação entre os
dois?
Assange: Não. Entre a Turquia e o Brasil, não. Acho que são coisas diferentes.
Talvez o golpe no Brasil fosse populista na sua natureza. Se houvesse uma
questão mais ampla seria relacionada ao uso de mídias sociais, que por um lado
está permitindo surgir uma cultura não industrializada de forma orgânica,
imprevisível e incontrolável, permitindo aos líderes políticos pular
intermediários, falam direto com as massas, tal como está fazendo o Trump.
 Isto é, evitam a censura e a influência da mídia organizada, controlada pelas
grandes famílias. Esse efeito tem sido direcionado por organizações
especializadas em espalhar centenas de milhares de “verbots” mensagens na
internet, forçando uma mensagem em particular, fazendo parecer que é um fenômeno
orgânico, mas é um fenômeno programado.
 Vou te dar um exemplo. Em 2011 WikiLeaks publicou muitas informações do
Bahrein. Era a época da primavera árabe, árabes bareinitas avançaram sobre o
poder e o Twitter era muito popular. No espaço de um ano o regime do Bahrein
contratou algo como dez empresas de assessoria de imprensa, a maioria ocidental.
Repentinamente começaram a surgir muitas contas no Twitter e no Facebook, até
paginas da Internet, publicando propaganda pró regime .
Ada: No Brasil foi um pouco diferente porque como a esquerda estava no poder,
essas mensagens populistas foram de alguma maneira defendidas pela grande mídia,
que é controlada por cinco famílias. O que vimos em 2013 foi muito diferente do
que aconteceu historicamente no Brasil, uma emergência da direita que não
favorece a própria direita e que é esquerdofóbica, que é um novo fenômeno no
Brasil, é um caso diferente dos EUA de certo modo.
Assange: Populismo genuíno pode sempre se mover contra a autoridade enquanto se
tenha uma mídia que o expresse. Porque a autoridade é percebida pela sua
habilidade de prender pessoas, cobrar impostos e liderar, sob esse aspecto. E
quando uma crítica livre se desenvolve, do tipo mais duro, subjuga a percepção
de autoridade. Aborda de maneira áspera, enfatiza a percepção de autoridade.
Isso aconteceu no caso da Dilma.
 Não era puramente orgânico, mas tinha um componente orgânico e esse componente
orgânico foi enfatizado pelos cinco grandes grupos de mídia. E provavelmente por
robôs. Na verdade achei evidencias de robôs, não tenho certeza a respeito de
quem os controlava, foi descoberto no final, mas houve uma pressão de robôs de
mídias sociais.
 Estamos só no comecinho deste fenômeno onde muita gente tem agora a capacidade
de publicar. Isso muda a dinâmica de poder, porque nas nossas sociedades, muito
da dinâmica de poder é baseada na censura, prevenindo assim que a maioria da
população se expresse. Ou ao menos que publique algo que atinja muita gente.
Isso está começando a mudar.
 Você sabe quando está lidando com um robô? Você sabe quando está lidando com
uma pessoa real? É um sistema que tem alguns humanos e esses humanos controlam
milhares de robôs que são com quem você interage, na verdade. É a invenção dos
“falsos demos”.
Por que as revoluções acontecem em praças, muito frequentemente? Por que sempre
acontecem em praças? É porque na praça você pode ver como o povo reage. Você
olha em volta e pode ver as pessoas. Por que se precisa de uma praça para isso?
Certamente se as pessoas não estivessem na praça e a mídia estivesse cobrindo e
divulgando fielmente a vontade do povo, se teria a revolução de qualquer
maneira. Mas os canais de comunicação não divulgam o que a população quer, então
não se tem a mesma percepção .
 É a percepção do que é a vontade da maioria que define se algo é politicamente
possível. Portanto quando se tem uma revolução é normalmente numa praça, como a
tomada do Palácio de Inverno, porque as pessoas podem ver que elas são muitas.
Porque elas não veem que são tantas quando não estão na praça? Porque o sistema
de mídia está suprimindo a realidade do que as pessoas pensam, eles não
conseguem perceber os “falsos demos”.
Com a possibilidade de todos falarem na internet de uma maneira ou de outra, um
antídoto pra isso é criar os tais “fake demos”. É muito simples: censurar
pessoas está se tornando muito difícil. O senso de coletividade fica difícil de
perceber. O poder político não se preocupa mais em censurar pessoas, o que se
preocupa é a sensação de ser maioria, de que se tem a vontade popular por trás
de você. Para obter esse efeito criam-se “falsos demos”. É isso que, desde mais
ou menos 2011, vêm fazendo estados e partidos políticos. É um novo jeito de
fabricar consensos. Estamos familiarizados com a situação antiga, com os
oligarcas da mídia, mas quando se tem mídias sociais se tem uma nova maneira de
criar consensos, que é a criação de uma aparência de vontade democrática.
Fernando Morais: Você identificou alguma evidência da influência americana nos
protestos do Brasil?
Assange: O que eu vi é que havia um grande numero de robôs online operando pra
estimular esses protestos. E pensando em como são os programas americanos, vemos
que essas coisas não acontecem na América Latina sem apoio americano.
Financeiramente, com logística e inteligência, tanto no exato momento que
acontece ou meramente juntando as partes envolvidas. Se ler nossas publicações
você verá que acontece repetidamente isso e o Brasil é um país que atrai muito
interesse.
 Na verdade ao olhar a espionagem militar em diferentes países da América
Latina, o Brasil é o país latino-americano mais espionado. Isso é muito
interessante porque alguém imaginará ingenuamente que deve ser Venezuela ou Cuba
que tenham mais espiões, porque historicamente foram os adversários com os quais
os EUA mais se envolveram em hostilidades, e não o Brasil. Então por que o
Brasil? É que o Brasil tem uma economia maior, o Brasil é simplesmente mais
importante economicamente.
Fernando Morais: Muitos disseram que o sistema de votos do Brasil e da Venezuela
foram certificados e não tem fraude, mas meu genro disse a pessoas desse meio
que sim é possível fraudar, especialmente no caminho entre a urna e o sistema.
Sabe algo sobre isso? E o que isso significa para a democracia na era
cibernética?
Assange: Eu era um hacker adolescente e virei consultor de segurança e
engenheiro cartográfico e usei essa formação pra manter WikiLeaks e nossas
fontes a salvo. WikiLeaks existe dentro de uma comunidade de pessoas
semelhantes. E há muito tempo eu e outras pessoas dessa comunidade afirmamos,
faz mais de vinte anos que dizemos isso: urnas eletrônicas são perigosas.
 Os fabricantes de urnas eletrônicas dizem que elas aumentam a precisão da
contagem dos votos porque é mais difícil mexer numa máquina complexa do que numa
urna normal. É verdade que é mais difícil fraudar uma urna eletrônica que uma
urna normal, mas se fraudar uma urna normal, você afeta quantos votos?
 Talvez algumas centenas. Agora, quando se tem acesso ao código responsável pela
eleição, ou ao computador que faz os relatórios, pode-se mudar centenas de
milhares ou até milhões de votos. E pode-se fazer isso de maneira quase
indetectável! Esse é o ponto principal!
 Alguém dirá: ok, mas podemos auditar, checar as máquinas pra ver se estão ok,
pode-se se ter uma conexão reserva. Mas a realidade é que governos gostam de
cortar custos ou ficam ineficientes e com o passar do tempo não se audita tanto.
 Esse é um problema filosófico interessante: nunca se sabe de verdade o que faz
uma máquina que seja complexa.
 Quase ninguém pode determinar se uma máquina complexa está de fato fazendo o
que deveria fazer. E quando se trata de votos, da intensa busca pelo poder, com
motivações muito fortes. Uma pessoa comum deveria ser capaz de entender que a
máquina faz o que deveria fazer, mas uma pessoa comum nada pode entender dessa
complexidade. Por isso as urnas eletrônicas são perigosas.
Fernando Morais: Durante a guerra fria o cardeal húngaro Jozsef Mindszenty viveu
15 anos na embaixada americana em Budapeste, porque ele estava sendo perseguido
pelo regime pró soviético. Por quanto tempo está preparado para viver na
embaixada do Equador?
Assange : Quanto tempo aguentarei ficar aqui é irrelevante. O que importa é
saber quando os EUA começarão a obedecer suas próprias leis e quando derrubarão
o processo contra mim e, potencialmente, contra outros membros do WikiLeaks.
Relevante é saber quando o Departamento de Justiça americano vai começar a
obedecer suas leis, suas próprias leis, a Constituição americana, a Primeira
Emenda, suas regras internas que dizem que não se pode processar um meio de
comunicação. O que importa é saber quando o Reino Unido e a Suécia obedecerão às
leis – há quase um ano a ONU determinou que ambos estavam agindo ilegalmente ao
me manter em prisão domiciliar nesta embaixada, me detendo por seis anos neste
país sem acusação. Recentemente a ONU reafirmou essa decisão e a situação
continua a mesma. Quando eles obedecerão às leis?
Assange: Eu acho irônico que acusem um veículo como WikiLeaks de ser radical e
revolucionário. O que prega o WikiLeaks? Que as pessoas devem obedecer às leis,
não devem ser corruptas, devem ser honestas, abertas, transparentes. De certa
maneira é algo tão simples que chega a parecer cristã, até conservadora essa
visão.
 Nós dizemos que os Estados Unidos apenas deveriam obedecer suas próprias leis.
Não é uma demanda tão grande, mas as pessoas que se opõem dizem: mesmo que a lei
diga que vocês podem publicar, vocês não deveriam.
Fernando Morais: Muito obrigado e espero recebê-lo como um homem livre em um
Brasil democrático.
Este texto encontra-se em:
http://www.nocaute.blog.br/mundo/uma-tarde-com-julian-assange-o-hacker-que-tirou-o-sono-do-governo-americano.html

In
O DIARIO.INFO
http://www.odiario.info/uma-tarde-com-julian-assange-o/
20/1/2016