sexta-feira, 28 de setembro de 2018

PCV: control obrero-popular frente a concepciones burocráticas




Caracas, 5 jul. 2018, Tribuna Popular TP.- El Buró Político del Partido
Comunista de Venezuela (PCV) denunció el fracaso del ejercicio de la dirección
burocrática burguesa de las empresas del Estado y alertó sobre la graves
consecuencias que ello trae para el país y sobre todo para las grandes mayorías
del pueblo trabajador.

Oscar Figuera, secretario general del PCV, señaló que rechazan el desmontaje que
se ha venido haciendo del sistema público de distribución de alimentos que se
construyó durante la presidencia de Hugo Chávez, especialmente de Mercal, Pdval
y Abastos Bicentenario para crear las denominadas Tiendas CLAP que se entregan a
operadores privados.
El dirigente comunista lo denunció como «una política de reprivatización de
espacios conquistados por lo público, de espacios conquistados por el país, y
exigimos que se discuta con el PCV las propuestas que hemos hecho para impulsar
una nueva concepción de gestión múltiple de las empresas públicas, donde se
garantice la participación obrera, comunera y popular, así como la participación
de los productores libres y asociados y del Estado».
Para el PCV, el anuncio del Gobierno nacional sobre el relanzamiento de 700
empresas del Estado, «significa que se estancaron, retrocedieron, pero, además
¿las van a ‘relanzar’ con el mismo esquema, con la misma con concepción? Ha
fracasado la concepción burocrática burguesa de dirección de las empresas, y
ahora se pretende entregarle la presidencia y gerencia de esas empresas a una
organización que no tiene nada que ver con esos centros de trabajo, y donde la
experiencia que tenemos de ese movimiento es que llegan a las instituciones como
que fueran colonizadores y propietarios, irrespetando los propios espacios
legítimos y naturales de las y los trabajadores».
En esas 700 empresas –puntualizó el PCV–, es necesario garantizar la
participación obrero-campesina, comunera y popular, porque con gestión
burocrática no hay garantía de desarrollo productivo del país.
«Esto es un tema que nosotros consideramos debe discutirse en el contexto del
Acuerdo unitario marco PSUV-PCV, firmado por el mismo presidente de la
República, que no es cualquier cosa. Exigimos la discusión de estos temas, por
un lado para poder dar nuestros aportes y opiniones, y por otro lado para
realizar nuestras observaciones a las propuestas que no compartamos; ese espacio
no se ha cumplido», enfatizó Figuera.

In
TRIBUNA POPULAR - PCV
https://prensapcv.wordpress.com/2018/07/05/pcv-control-obrero-popular-frente-a-concepciones-burocraticas/
5/7/2018

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

As escolas da democracia, que nem sempre o são



 Abril Abril  

No sector da Educação um dos traços mais nefastos da política de direita de
sucessivos governos foi a destruição da gestão democrática das escolas dos
ensinos básico e secundário. Foi assim amputada uma das mais importantes
componentes formativas dos jovens. A situação actual não é apenas a do
desincentivo de qualquer forma de participação activa. É a de sucessivos
exemplos de repressão política sobre jovens que, muito justamente, procuram
organizar-se a fazer-se ouvir.


Repressão política nas escolas. Não nos ocorre que aconteça, sobretudo a jovens
que dão os primeiros passos de participação democrática, mas é uma realidade
relatada ao AbrilAbril por vários estudantes durante a pausa lectiva de Verão.
«Os jovens não querem saber» é uma asserção comum que já quase todos devemos ter
ouvido (ou dito) por aqui ou ali, tanto relativamente à política como sobre os
problemas sociais que os rodeiam. Todavia, independentemente de verdadeira ou
não, sendo a escola um dos pilares da educação dos jovens, as denúncias de
coacção e represálias dentro destas, que têm surgido um pouco por todo o País,
são um claro motivo de preocupação.
 Uma realidade que se evidencia com maior gravidade no caso concreto do ensino
básico e secundário, com especificidades que nos levam a deixar de lado neste
trabalho o ensino superior.
 Em Portugal, o 25 de Abril consagrou na Constituição da República um Estado de
Direito, que contempla direitos, liberdades e garantias fundamentais como a
liberdade de expressão (art.º 37), de reunião (art.º 45) e de associação (art.º
46).
 Porém, por todo o País, em escolas básicas (EB) e escolas secundárias (ES),
esses direitos, por nós assumidos como adquiridos, foram postos em causa
sistematicamente ao longo dos últimos anos, num claro abuso de autoridade e de
repressão sobre os mais novos, que tem passado pelos pingos da chuva nos meios
de comunicação.
 O AbrilAbril foi ao encontro desta realidade, confrontando estudantes com
relatos de situações de abuso de autoridade e de repressão sobre os mais novos
que, num clima de medo conjugado com o facto de serem muitas vezes vistos como
inexperientes, os leva a sentirem-se marginalizados e a sua voz abafada.
​​Eleições livres, excepto dentro da escola
Os estudantes, conforme previsto na lei do associativismo juvenil, têm direito a
ser representados pela sua associação de estudantes, estando previstas as formas
de constituição e reconhecimento das mesmas, embora esse processo se revele
caro, burocrático e moroso.
 No entanto, para os estudantes, os principais problemas estão no atropelo ao
funcionamento e ao exercício dos seus direitos de participação, com ingerência e
desrespeito das escolas pelo cumprimento da lei, tal como a obrigatoriedade de
serem consultados pelos órgãos de gestão das escolas em diversas matérias da
vida interna, o direito de consultarem os seus associados em Reuniões Gerais de
Alunos (RGA) ou o de realizarem os seus processos eleitorais de forma autónoma.
 Num levantamento de casos e denúncias apresentado ao Conselho Consultivo da
Juventude (CCJ) - órgão de consulta e de acompanhamento do Governo para a área,
que reúne uma multitude de associações representantivas dos jovens - são muitos
os casos de escolas onde as direcções interferem ilegalmente no processo
eleitoral, apesar de tal só caber à Comissão Eleitoral.
 Referindo alguns exemplos comuns, na ES Artur Gonçalves, em Torres Novas, a
direcção​​​ determinou o processo eleitoral, a composição dos membros das listas
e o conteúdo do programa dos alunos. Na ES Cunha Rivara, em Arraiolos, ocorreu o
mesmo, além de que colocou «sucessivos entraves à actividade da associação de
estudantes», enquanto na ​​ES Padrão da Légua, em Matosinhos, houve estudantes
«impedidos pela direcção de constarem das listas por terem mudado de curso».
Mais grave é, por exemplo, o caso da ES Sebastião da Gama, em Setúbal, com «dois
anos consecutivos de ingerência da direcção no processo eleitoral dos
estudantes, não reconhecendo a lei do associativismo, no que toca à convocatória
de RGA com 10% de assinaturas dos estudantes, não tendo este ano cedido sala
para a sua realização», obrigando a que a mesma fosse realizada na rua.
Recusaram também a comissão eleitoral eleita e procuraram «impedir, por todas as
vias, os prazos definidos para eleições, incluindo através de ameaças a
estudantes».
Directores proíbem estudantes de reunir
 A repressão afecta também o direito de reunião dos estudantes, que, em diversas
ocasiões, tentaram realizar assembleias dentro da escola mas, em reacção,
encontram forte resistência de vários directores, seja proibindo a sua
realização, seja recusando a cedência de uma sala para o efeito.
 Nos depoimentos prestados por vários estudantes, percebe-se que os actos de
proibição e intimidação, em grande parte promovidos pela figura do director,
variam de escola para escola. No actual modelo de gestão escolar, a maioria dos
poderes está ​​​​​​concentrada no director, o que, conjugado com o estatuto do
aluno, abre caminho para abusos de autoridade. Das inúmeras denúncias, alguns
exemplos:
- na ES Alves Redol, em Vila Franca de Xira, foi impedida a realização de uma
RGA dentro da escola. Quando a mesma se deslocou para fora do recinto, o
director, que mais tarde viria a ser destituído, chamou a polícia para impedir a
sua realização;
- na ES Martins Sarmento, em Guimarães, a direcção impediu a realização de uma
RGA e procurou intimidar os estudantes chamando-os à direcção e ameaçando-os;
- na ES Rainha D. Leonor, em Lisboa, a realização da RGA foi proibida, mesmo
reunindo o número de assinaturas necessárias para a realização.
Estudantes castigados por denunciarem falta de condições
Por outro lado, em Novembro de 2017, o caso de uma aluna de Braga, a quem foi
levantado um processo disciplinar por ter divulgado um vídeo a mostrar as más
condições do refeitório da escola, trouxe para fora dos muros aquilo que é a
prática de várias direcções pelo País.
 Uma resposta já familiar para muitos estudantes, que explicam que o recurso aos
regulamentos, entre os quais o Estatuto do Aluno, são frequentemente usados
discricionariamente pelos directores como instrumentos de controlo e punição
sobre os alunos, naquilo a que até chamam «Código Penal para estudantes».
Distribuições e manifestações de alunos reprimidas
Outro caso congénere sucedeu-se na ES Aurélia de Sousa, no Porto, no contexto de
uma concentração de alunos à porta da escola, em protesto contra os exames
nacionais, com cerca de 300 alunos. Em reacção, a direcção da escola coagiu os
estudantes a deixarem o protesto e impediu outros de saírem para se lhes
juntarem, alegando que «as leis […] fora da escola não contam dentro da escola».
Em Leira, na ES Pinhal do Rei, vários elementos da direcção, professores e
funcionários tentaram impedir os estudantes de distribuir documentos à porta da
escola e de falar sobre os seus problemas, chegando mesmo a chamar a polícia.
 Na ES José Gomes Ferreira, em Lisboa, a direcção retirou as faixas que os
estudantes tinham colocado nas grades da escola e arrancou os cartazes que
apelavam à manifestação dos estudantes, em Março.
Polícia cúmplice na repressão
Conforme já mencionado, em diversos ocasiões, a PSP foi chamada às escolas como
instrumento de coacção sobre os estudantes, a pedido dos directores.
 Aconteceu na ES do Restelo, onde uma manifestação de 500 estudantes à porta da
escola teve o seu fim com a chegada de agentes da PSP, que desmobilizaram o
protesto aos empurrões, coagindo alunos com exigência de identificação, apesar
de não haver qualquer crime, e de entrega do contacto dos pais.
 Na ES de Matias Aires, no Cacém, depois de a associação de estudantes ter
pedido à direcção uma sala para uma RGA para discutir acções reivindicativas,
que aquela negou, os alunos marcaram uma concentração à porta da escola no dia
22 de Março. No dia do protesto, os estudantes viram-se confrontados com uma
carrinha de intervenção da PSP, num total de 14 agentes, tendo a direcção
apelado a que os estudantes ou fossem para as aulas ou fossem para casa.
 Já numa manifestação marcada para 21 de Março, no Agrupamento de Escolas de São
João da Talha, em Lisboa, cerca de 50 estudantes assistiram à chegada da polícia
momentos antes da concentração, com o objectivo de os desmobilizar e os obrigar
a entrar na escola, alegando tratar-se de uma manifestação ilegal. Vários
estudantes acabaram encostados às grades da escola.
 Os exemplos aqui relatados por vários estudantes, relativos ao ano lectivo
transacto, mostram uma realidade que urge alterar, com o empenho de professores,
pais e alunos, e à qual o Ministério da Educação não pode ficar alheio. Trata-se
do caminho de jovens no exercício dos seus direitos democráticos e não pode
estar repleto de obstáculos com o intuito de afastá-los. Caso contrário, que
tipo de jovens preparamos para o futuro?
Fonte:
https://www.abrilabril.pt/nacional/escolas-da-democracia-que-nem-sempre-o-sao


In
O DIARIO.INFO
https://www.odiario.info/as-escolas-da-democracia-que-nem/
27/9/2018

terça-feira, 25 de setembro de 2018

Bolsonaro X Haddad no segundo turno? Guerra híbrida continua vencendo




Wilson Roberto Vieira Ferreira

Mais uma vez a sabedoria desconfiada do velho Leonel Brizola. Acostumado com os
truques da geopolítica dos EUA, em 1989 Brizola acusava Lula de ser inflado pela
direita para mais facilmente a própria direita, representada então por Collor,
vencer. Tudo leva a crer que Bolsonaro e Haddad irão ao segundo turno. Otimismo
e ufanismo ganham a esquerda, saudando o gênio político de Lula, mesmo com todo
massacre midiático e “lawfare”. Como sempre, a esquerda apenas compreende a
superfície da atual guerra híbrida brasileira, em ação desde 2013. Para além do
 impeachment e a prisão de Lula, há um objetivo semiótico mais insidioso:
 polarização (petismo X anti-petismo) e despolitização (o jargão do
 empreendedorismo e moralismo travando qualquer debate de macro-conjuntura) -
infantilização o debate político através do ódio e irracionalidade de uma
opinião pública que se acostumou a odiar a Política. E nesse momento, a grande
mídia busca mais uma “bala de prata” para turbinar a polarização. Será que o
velho Brizola tem mais uma vez razão? (ilustração: Felipe Lima, "Gazeta do
Povo")
Dias antes da eleições que levariam Lula ao Segundo turno, contra Fernando
Collor,  em 1989, Brizola foi ao ar alertando as “forças democráticas” de que “a
 direita tinha feito muito esforço junto a Lula e ao seu movimento... encheram o
 balão de Lula para leva-lo ao segundo turno... Por que? Pois nós estamos vendo:
 será muito mais fácil derrota-lo do que qualquer um de nós...”.

O notável crescimento de Fernando Haddad nas últimas pesquisas e a consolidação
da ultrapassagem sobre Ciro Gomes é comemorada como praticamente uma definição
do cenário do segundo turno: Bolsonaro (o “coiso”) contra Haddad, visto agora
como uma esperança civilizatória à beira do abismo da barbárie.
Alguns ainda mais ufanistas vislumbram um crescimento escalar do candidato
petista com a transferência integral dos votos que pertenciam a Lula,  podendo o
 candidato do PT até vencer a eleição já no primeiro turno. E muitos saúdam o
 gênio político de Lula capaz de, dos cárceres da PF de Curitiba, reger o script
 e de colocar Haddad na cabeça da chapa no cenário mais oportuno.

Nesse momento vêm à mente aquele longínquo vídeo em tom conspiratório de Leonel
 Brizola. Lá nos anos 80 Brizola via a si mesmo como um legítimo herdeiro da
 luta contra o “entulho autoritário” que ainda persistia após a ditadura
 militar. E para ele, Lula era nada mais  do que um inocente útil usado para
travar as “forças democráticas”, conduzido ao segundo turno para uma derrota
anunciada diante de Collor.

Sobre este vídeo, o jornalista Paulo Henrique Amorim fez uma críptica
observação: “Collor preferia Lula a Brizola. Deu no que deu... Quem ganhou foi a
direita; confiscou a poupança e se entregou aos americanos”.

O perigo da simplificação

Mais do que Lula e o PT (haja vista a facilidade com que foi defenestrado do
Poder pela guerra híbrida), Brizola era muito sensível às manobras da logística
 norte-americana no Brasil – afinal, viveu toda a cena da desestabilização do
 governo João Goulart pelas estratégias do complexo IPES-IBAD (o Instituto
 Millennium da época), apoiado pela inteligência dos EUA, de 1962 a 64,
 preparando a opinião pública para a inevitabilidade e necessidade de um golpe
 militar.
Outra vez a sabedoria do velho Brizola pode revelar que o atual otimismo da
esquerda de retornar ao governo dois anos após o golpe pode ser simplificador e
perigoso. E que, mais uma vez, continua a não compreender os movimentos da
guerra híbrida. Agora, em sua fase decisiva depois de impregnar o psiquismo
nacional com a despolitização e polarização – “Guerra Híbrida”: a continuidade
da guerra convencional por meios semióticos. Articulação entre grande mídia,
Judiciário, ONGs, spin doctors, paid experts e técnicas de ação diretas nas ruas
para acender o rastilho de pólvora.
 A articulação da guerra híbrida com as bombas semióticas diárias da grande
mídia (bombas linguísticas que explodem fragmentos de significação para
impregnar a opinião pública de diversas maneiras – medo, ódio, insegurança,
dúvida etc., sem nunca conseguir concatenar causa e efeito) é de uma
complexidade de longo prazo, com diversas fases que, muitas vezes, se sobrepõem
como camadas. Atuando simultaneamente.

Se não, vejamos. O rastilho foi aceso com as ações diretas nas ruas nas
manifestações iniciadas em 2013 no sentido de se criar uma “Revolução Popular
Híbrida” – sobre a receita para fazer uma RPH, clique aqui.

Jovens liberais e até a extrema-esquerda (PSOL, PSTU etc.) seduzidos para criar
uma espécie de “Primavera Brasileira”, seguindo passo a passo a cartilha de
“Ação Direta” (táticas de promoção de “ação não violenta”) das pesquisas do
cientista político Gene Sharp, financiadas pela Fundação Ford. Essa era a
primeira fase: iniciar a desestabilização do Governo, principalmente às vésperas
de eventos de repercussão mundial: Copa do Mundo e Olimpíadas.
A segunda fase, simultânea e perpassando todas as fases posteriores, a
judicialização da política e do atual processo eleitoral – prisão de Lula, fake
news e STE etc. Subliminarmente reforçada pelo “meganhamento” da Justiça –
diariamente, a grande mídia gritando o mantra “policiais federais nas ruas!”
para dar destaque de portas sendo colocada abaixo pelos policiais, homens de
preto com toucas ninja e armados até os dentes levando políticos e empresários
algemados em prisões preventivas.
O que torna a grande mídia numa narrativa monofásica: corrupção e moralismo,
pautando Lava Jato, Polícia Federal, MPs e STF.
Claro que o objetivo imediato era, através do lawfare, derrubar o governo Dilma,
retirar as lideranças de esquerda, em particular Lula, para abrir espaço à
implementação das medidas econômicas neoliberais. Mas, principalmente,
desarticular à política externa de cooperação Sul-Sul que, ao lado do Pré-sal,
representava uma ameaça à geopolítica aos EUA.
Impregnação semiótica
Mas há algo mais insidioso, uma impregnação semiótica em corações e mente dos
brasileiro a longo prazo nesses últimos cinco anos, cujos panelaços, camisetas
verde-amarelas e “coxinhas” tirando selfies ao lado de policiais militares de
choque nas manifestações anti-Dilma eram apenas a superfície de um movimento
generalizado: polarização e despolitização, os dois lados de uma mesma moeda.
Segundo Antônio Martins, em análise no Jornal GGN sobre os gráficos da pesquisa
Ibope de intenção de voto divulgada em 19/09, a pesquisa mostra que as eleições
2018 estão polarizadas (uma disputa rasa entre petismo X anti-petismo) e
despolitizadas – um nítido descolamento entre as tendências políticas na
sociedade (civilização X barbárie, perda das históricas conquistas sociais etc.)
e as opções pelos candidatos.
Martins sintetiza da seguinte maneira:

A discrepância é clara, mas é preciso enunciar seu significado com todas as
letras: a polaridade petismo x antipetismo não expressa a tensão política real
em curso na sociedade brasileira. Ao contrário: falseia-a; e – muito pior – abre
um espaço inesperado para a direita, agora representada por sua fração extrema.
Em termos concretos, significa que dezenas de milhões de brasileiros contrários
à agenda de retrocessos imposta nos últimos dois anos estão sendo levados a
defendê-la. Fazem-no porque, no momento, veem o PT como inimigo principal a ser
 batido MARTINS, Antônio “Quem pode nos livrar de Bolsonaro”, Jornal GGN,
19/09/2018.

O intenso meganhamento da pauta da grande mídia e a judicialização da política é
uma evidente  manobra metonímica: ao tomar a parte pelo todo, rejeitar em bloco
a Política. Uma situação parecida com as eleições de 1989: a crise econômica e
hiperinflação (hoje, desemprego e disparada do dólar), a repulsa ao presidente
Sarney (hoje, Temer) e a dramaticidade social tanto lá como aqui. Lá havia a
rejeição aos políticos e Collor como a energia da juventude aliada ao appeal
antissistema.

A carga semântica da Política

E, como sempre, os candidatos a “antissistema” procuram um discurso livre da
carga semântica do discurso político – falam em “gestão”, “choque de
eficiência”, “visão empresarial”, “investidores”, “parceria”. Termos que fazem
qualquer jovem dono de alguma startup achar que o empreendedorismo puro e vestal
substituirá a Política suja e corrupta.

O que conduz à polarização. Ou mais precisamente, o anti-petismo, síntese de
tudo aquilo que o silogismo midiático levou a opinião pública: a repulsa à
corrupção e à Política.
A polarização despolitiza e impede qualquer debate político racional: entre os
candidatos não há mais qualquer debate macro (economia política, política
econômica, relações externas) ou micro (políticas sociais). Há apenas a
replicação das pautas da grande mídia: reformas, cortes de gastos, corrupção,
segurança e violência. E o monofásica exigência de Haddad fazer uma mea culpa à
Nação e pedir desculpas pelos esquemas de corrupção dos governos petistas.

Tudo parece apontar para um segundo turno Bolsonaro X Haddad. O que significa
mais um desdobramento bem sucedido da guerra híbrida: o reforço da polarização,
a verdadeira cortina de fumaça que esconde a real tensão política brasileira –
entre a implementação à força das medidas neoliberais (nem que seja pela via dos
fascismo, tendência histórica) e a sujeição de qualquer candidato ao onisciente
“mercado” contra uma política de governo social e trabalhista.
Como de costume, em polarizações emerge o candidato antissistema que quer “mudar
tudo isso que tá aí”: Collor em 1989 e Bolsonaro em 2018. Lá no passado, a
polaridade entre o baderneiro Lula X o verde e amarelo de Collor. E agora, as
polaridades voto masculino X feminino; Nordeste X Sudeste, anti-movimento
identitários X pró-movimentos identitários. Enquanto a tensão real civilização X
barbárie, fascismo X democracia, neoliberalismo X trabalhismo ficam em segundo
plano.
      Qual será a próxima "bala de prata"? Façam suas apostas...


Mídia quer turbinar polarização

   E tudo leva a crer que a grande mídia está nesse momento tentando encontrar
alguma “evidência” ou “indício” que leve mais uma vez ao jornalismo metonímico
que costuma criar “balas de prata” a poucas horas antes das eleições para
turbinar a polarização.

Mais uma vez o programa Fantástico desse último domingo volta à mala de dólares
e relógios cravejados de pedras preciosas apreendidos no aeroporto de Cumbica da
comitiva do vice-presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Mang. Há dias o
episódio ronda os telejornais com o mote de uma dúvida bem marota: “No entanto
há uma questão em aberto: o destino dos US$ 16 milhões em espécie apreendidos. A
Polícia Federal investiga PARA ONDE seriam levadas as malas...”.

Detalhe: nos primeiros dias da cobertura, foto em destaque de Lula sentado em um
trono ao lado do presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Mbasogo, pai do
vice-presidente.

Assim como a Polícia Federal pediu “mais tempo” para concluir a investigação
sobre o agressor de Jair Bolsonaro, Adélio Bispo – abriu “nova frente de
investigação” que tentará descobrir se houve a participação de OUTRAS PESSOAS...
Isso, a 15 dias das eleições, em timing perfeito para um “não-acontecimento”.
Enquanto isso, a Justiça dá permissão de que "Veja" e "SBT" entrevistem Adélio
na prisão às vésperas das eleições...

Claro, não há preço para o prazer da revanche de ver colunistas e os solertes
jornalistas de ponto eletrônico da Globo News tendo que engolir mais uma vez o
PT chegando a um segundo turno, mesmo com todo massacre midiático, lawfare,
 juízes e ministros do STF subitamente elevados a condição de celebridades
 televisivas por manter Lula no cárcere de Curitiba.
Porém, o que vemos é mais do mesmo: a guerra híbrida alcança seu objetivo mais
profundo, para além de tirar Dilma e Lula do poder – infantilizar o debate
político com ódio e irracionalidade para uma opinião pública que se acostumou a
odiar a Política. Cujo resultado é uma eleição decidida não positivamente pelo
voto, mas negativamente pela rejeição
E a decorrência perfeita para os interesses geopolíticos norte-americanos:
ingovernabilidade, seja lá para quem ganhar essas eleições.

In
CINEGNOSE
https://cinegnose.blogspot.com/2018/09/bolsonaro-x-haddad-no-segundo-turno.html#more
24/9/2018

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Ponha na primeira página: Já não há repórteres



     
       por John Pilger


       A morte de Robert Parry, este ano, foi como uma despedida da era do
       repórter. Parry era "um pioneiro do jornalismo independente", escreveu
      Seymour Hersh, que tinha muito em comum com ele.
       Hersh revelou o massacre de My Lai no Vietname e o bombardeamento secreto
      do Camboja; Parry denunciou o Irão-Contra, uma conspiração de drogas e de
      armas que o levou à Casa Branca. Em 2016, eles produziram, em separado,
      provas convincentes de que o governo de Assad na Síria não tinha usado
      armas químicas. Não foram esquecidos.
       Afastado dos media dominantes, Hersh teve de publicar a sua obra fora dos
      Estados Unidos. Parry instituiu uma página de notícias independente, 
      Consortium News , onde, num artigo final, na sequência de um ACV, se
      referiu à veneração do jornalismo pelas "opiniões aprovadas" enquanto as
      "provas não aprovadas são postas de lado ou desacreditadas,
      independentemente da sua qualidade.
       Embora o jornalismo sempre tenha sido uma extensão do poder instituído,
      alguma coisa mudou nos últimos anos. Os dissidentes não protestaram quando
      entrei um jornal nacional na Grã-Bretanha, nos anos 60, e regressei a um
      metafórico mundo subterrâneo, quando o capitalismo liberal avançou para
      uma forma de ditadura corporativa. Isto é uma viragem sísmica, com
      jornalistas a policiar a nova tendência para o conformismo
       ("groupthink"),  como Parry lhe chamava, distribuindo os seus mitos e
      diversões, perseguindo os seus inimigos.
       Observem a caça às bruxas contra os refugiados e imigrantes, o abandono
      premeditado dos fanáticos do "Me Too" das nossas antigas liberdadea, a
      presunção de inocência, o racismo anti-Rússia e a histeria anti-Brexit, a
      crescente campanha anti-China e a ocultação de alertas quanto a uma guerra
      mundial.
       Com muitos jornalistas independentes, ou a sua maioria, banidos ou
      expulsos dos media dominantes, um cantinho da Internet tornou-se uma fonte
      vital de divulgação e análise baseadas em provas: o verdadeiro jornalismo.
      Páginas como wikileaks,org, consortiumnews.com, ZNet zcomm.org, wsws.org,
      counterpunch.org, informationclearinghouse.info, globalresearch.org, e
      truthdig.com, são leitura obrigatória para quem queira perceber um mundo
      em que a ciência e a tecnologia avançam prodigiosamente, enquanto a vida
      política e económica nestas medonhas "democracias" regridem por detrás da
      fachada de espetáculo narcisista dos "media".
       Na Grã-Bretanha, só uma página da web proporciona crítica independente
      dos "media", de forma consistente. É a notável Media Lens – em parte
      porque os seus fundadores e editores, assim como seus únicos redactores,
      David Edwards e David Cromwell desde 2001, concentram o seu olhar não nos
       habituais suspeitos, a imprensa Tory, mas nos modelos do conceituado
      jornalismo liberal: a BBC, o  Guardian,  o Channel 4 News.
       O método é simples. Meticulosos na sua investigação, são respeitosos e
      delicados quando perguntam porque é que um ou uma jornalista, produziu uma
      notícia parcial ou não revelou factos essenciais ou promoveu mitos
      desacreditados.
       As respostas que recebem são sobretudo defensivas, por vezes ofensivas;
       algumas são histéricas, como se eles tivessem atacado uma espécie
      protegida.
       Eu diria que Media Lens estilhaçou o silêncio sobre o jornalismo
       corporativo. Tal como Noam Chomsky e Edward Herman, em  Manufacturing
      Consent,  eles representam um Quinto Estado que desconstrói e desmistifica
      o poder dos media.
       O mais interessante é que nenhum deles é jornalista. David Edwards é um
      antigo professor, David Cromwell é oceanógrafo. Mas a sua compreensão da
      moral do jornalismo – um termo que raramente se usa, chamemos-lhe
      verdadeira objetividade – é uma qualidade básica das notícias de Media
      Lens.
       Acho que o trabalho deles é heroico e eu distribuiria um exemplar do
       livro que acabam de publicar, Propaganda Blitz , em todas as escolas de
      jornalismo que prestam serviços ao sistema corporativo, como fazem todas.
       Vejam o capítulo, Desmantelamento do Serviço Nacional de Saúde, em que
      Edwards e Cromwell descrevem a parte fundamental desempenhada pelos
      jornalistas na crise do pioneiro serviço de saúde britânico.
       A crise do SNS é o produto de um conceito político e dos media, conhecido
      por "austeridade", com a sua linguagem desonesta e traiçoeira de
      "poupanças de eficiência" (o termo da BBC para os cortes das despesas
      públicas) e "escolhas difíceis" (a destruição deliberada dos pilares da
       vida civilizada na Grã-Bretanha moderna).
       A "austeridade" é uma invenção. A Grã-Bretanha é um país rico com uma
      dívida por conta dos seus bancos desonestos, não da população. Os recursos
      que financiariam confortavelmente o Serviço Nacional de Saúde foram
      roubados em plena luz do dia pelos poucos a quem foi permitido a fuga a
      milhares de milhões em impostos.
       Usando um vocabulário de eufemismos corporativos, o Serviço Nacional de
      Saúde, de financiamento público, está a ser deliberadamente dirigido por
      fanáticos do mercado livre, para justificar a sua liquidação. Pode parecer
      que o Labour Party de Jeremy Corbyn se opõe a isso, mas será mesmo? A
      resposta, muito provavelmente, é não. Pouco disto se fala nos media, e
      muito menos é explicado.
       Edwards e Cromwell dissecaram a Lei da Saúde e da Assistência Social de
      2012, cujo título inócuo oculta as suas consequências desastrosas.
      Desconhecida da maior parte da população, a Lei acaba com a obrigação
      legal de os governos britânicos fornecerem assistência à saúde, universal
      e gratuita: os alicerces sobre os quais foi instituído o SNS, na sequência
      da II Guerra Mundial. As empresas privadas podem agora insinuar-se no SNS,
      pedaço a pedaço.
       Edwards e Cromwell perguntam: Onde estava a BBC quando esta lei histórica
      estava a caminho do Parlamento? Com o compromisso estatutário de
      "proporcionar uma visão abrangente" e informar devidamente o público sobre
      "questões de política pública", a BBC nunca esclareceu a ameaça sobre uma
      das instituições mais acarinhadas pela nação. Um cabeçalho a BBC disse:
      "Aprovada a lei que dá poder ao médicos de clínica geral". Era pura
       propaganda de estado.
       Há uma semelhança flagrante com a cobertura da BBC à invasão ilegal do
      Iraque do primeiro-ministro, Tony Blair, em 2003, que causou um milhão de
      mortos e muitos mais na miséria. Um estudo da Universidade de Gales, em
      Cardiff, concluiu que a BBC refletiu "esmagadoramente" a linha do governo,
      subestimando as notícias sobre o sofrimento de civis. Um estudo Media
      Tenor colocou a BBC no fundo de um conjunto de emissoras ocidentais, no
      que se refere ao tempo concedido aos opositores da invasão. O tão gabado
      "princípio" de imparcialidade nunca foi considerado.
       Um dos capítulos mais impressionantes em Propaganda Blitz descreve as
       campanhas de difamação montadas por jornalistas contra dissidentes,
      adversários políticos e denunciantes. A campanha do  Guardian  contra
      Julian Assange, o fundador da WikiLeaks, é a mais perturbante.
       Assange, cujas épicas revelações da WikiLeaks deram fama, prémios de
      jornalismo e grandeza ao  Guardian,  foi abandonado quando já não lhe era
      útil. Depois, foi sujeito a um massacre injurioso e covarde, como raras
      vezes vi.
       Sem que nem um cêntimo tenha sido entregue à WikiLeaks, um badalado livro
      do  Guardian  levou a um lucrativo filme de Hollywood. Os autores do
      livro, Luke Harding e David Leigh, descreveram gratuitamente Assange como
      uma "personalidade degradada" e "insensível". Também revelaram a  password
       secreta que ele havia confiado ao jornal, e que se destinava a proteger
      um ficheiro digital que continha os endereços telegráficos da embaixada
      dos EUA.
       Com Assange agora encurralado na embaixada do Equador, Harding, no meio
      da polícia cá fora, regozijou-se no seu blogue de que "a Scotland Yard
      pode ser a última a rir".
       A colunista do  Guardian,  Suzanne Moore escreveu: "Aposto que Assange
      entupiu-se de cobaias esmagadas. Ele é realmente o maior monte de merda".
       A sra. Moore, que se intitula feminista, queixou-se mais tarde que,
      depois de ter atacado Assange, havia sofrido "insultos infames". Edwards e
       Cromwell escreveram-lhe: "Realmente, é uma vergonha, lamentamos ouvir
      isso. Mas como descreverias chamar a alguém 'um monte de merda? Um insulto
      infame?".
       A sra. Moore respondeu que não o faria, e acrescentou: "Aconselho-vos a
      não serem tão arrogantes".
       O seu antigo colega do  Guardian,  James Ball, escreveu: "É difícil
      imaginar o cheiro da embaixada do Equador, em Londres, mais de cinco anos
      e meio depois de Julian Assange lá ter entrado".
       Esta perversidade de atrasado mental apareceu num jornal descrito pela
      sua editora, Katharine Viner, como "ponderado e progressivo". Qual é a
      raiz deste revanchismo? É inveja, o reconhecimento perverso de que Assange
      conseguiu mais furos jornalísticos do que os seus franco-atiradores
      poderão arranjar durante toda a vida? É por ele se recusar a ser "um de
      nós" e envergonhe aqueles que há muito venderam a independência do
      jornalismo?
       Os estudantes de jornalismo deviam estudar isto para perceber que a
      origem das "notícias falsas" não é só enganação  (trollism),  ou os cromos
      dos noticiários Fox, ou Donald Trump, mas um jornalismo untado de falsa
      respeitabilidade: um jornalismo liberal que afirma questionar o poder do
      estado corrupto mas, na realidade, corteja-o e protege-o e pactua com ele.
      A amoralidade dos anos de Tony Blair, do qual o  Guardian  não conseguiu
      reabilitar-se, é o seu eco.
       "É uma época em que as pessoas anseiam por novas ideias e alternativas
      frescas", escreveu Katharine Viner. O seu colaborador político, Jonathan
      Freedlan, desvalorizou o anseio dos jovens que apoiaram a modesta política
      do líder Labour, Jeremy Corbyn, como "uma forma de narcisismo".
       "Como é que este homem…", zurrou Zoe Williams, do  Guardian,  "conseguiu
      chegar às urnas?" Juntou-se-lhe um coro de fala-baratos precoces, que
      fizeram fila para empunhar espadas afiadas, quando Corbyn esteve perto de
      ganhar as eleições gerais de 2017, apesar dos media.
       Noticiam-se histórias complexas, numa fórmula enviesada, de ouvir dizer e
      de omissão, como um culto: o Brexit, a Venezuela, a Rússia, a Síria. Na
      Síria, só as investigações de um grupo de jornalistas independentes
      contaram isto, revelando a rede de apoio anglo-americano aos jihadistas na
      Síria, incluindo os que estão ligados ao ISIS.
       Apoiado por uma campanha de "operações psicológicas", financiada pelo
      Foreign Office britânico e pela USAID, o objetivo é iludir o público
      ocidental e acelerar o derrube do governo de Damasco, apesar da
      alternativa medieval e do risco de guerra com a Rússia.
       A Campanha da Síria, montada por uma organização de relações públicas de
      Nova Iorque, a Purpose, financia um grupo conhecido como os Capacetes
      Brancos, que afirma, falsamente, ser a "Defesa Civil da Síria" e é
      apresentado, sem qualquer crítica, nos noticiários da TV e nas redes
      sociais, aparentemente a salvar vítimas de bombardeamentos que filmam e
      editam, embora os espetadores não sejam informados disso. George Clooney é
      um dos seus fãs.
       Os Capacetes Brancos são apêndices dos jihadistas com quem trocam
       endereços. Os seus uniformes e equipamentos inteligentes são fornecidos
      pelos tesoureiros ocidentais. O facto de as suas proezas não serem
      questionadas pelas maiores agências noticiosas é indicador da grande
      influência daquela empresa de relações públicas, apoiada pelo estado, que
      governa hoje os media. Como fez notar Robert Fisk, recentemente, nenhum
      repórter dos media dominantes transmite notícias da Síria diretamente da
       Síria.
       Num ataque insidioso, Olivia Solon, uma repórter do  Guardian,  com base
      em San Francisco, que nunca esteve na Síria, pôde difamar o trabalho
      investigativo é fundamentado das jornalistas Vanessa Beeley e Eva
      Bartlett, sobre os Capacetes Brancos, como "propagado  online  por uma
      rede de ativistas anti-imperialistas, teóricos da conspiração e  trolls 
      com o apoio do governo russo".
       Este abuso foi publicado sem permitir qualquer correção, nem sequer o
      direito de resposta. A página de comentários do  Guardian  foi bloqueada,
      como documentam Edwards e Cromwell. Eu vi a lista de perguntas que Solon
      enviou a Beeley, que parece uma folha de acusação de McCarthy – "Já foi
      convidada a ir à Coreia do Norte?"
       Quão baixo já desceram os media predominantes. O subjetivismo é tudo;
      slogans e insultos são provas suficientes. O que conta é a "perceção".
       Quando era comandante dos EUA, no Afeganistão, o general David Petraeus
       declarou que chamava "uma guerra de perceção… travada continuamente,
      usando os media ". O que interessava não eram os factos, mas a forma como
      a notícia funcionava nos Estados Unidos. O inimigo não declarado era, como
      sempre, o público bem informado e crítico da nação.
       Nada mudou. Nos anos 70, conheci Leni Riefenstahl, cineasta de Hitler,
      cuja propaganda hipnotizava o público alemão.
       Disse-me que as "mensagens" dos seus filmes não dependiam de "ordens
      superiores", mas do "vazio submisso" de um público mal informado.
       "Isso inclui a burguesia liberal, instruída?" perguntei.
       "Toda a gente", disse ela. "A propaganda ganha sempre, se a permitirmos".

      20/Setembro/2018
       O original encontra-se em  www.informationclearinghouse.info/50300.htm .
       Tradução de Margarida Ferreira.

In
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/pilger/pilger_20set18.html
24/9/2018

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Cómo EEUU desmanteló Brasil



Vicky Peláez

Los estrategas norteamericanos y sus 1.777 'think tanks' están concentrados
permanentemente en buscar métodos para mantener su hegemonía mundial y en
especial preservar para su uso exclusivo las inmensas riquezas naturales de
América Latina y el Caribe, a los que consideraba su 'patio trasero'.

"Solamente los muertos están contentos en Brasil".
(dicho popular)

Sin embargo, en el caso de Brasil, que siempre ocupó un lugar privilegiado como
aliado incondicional de Washington, se le terminó toda ventaja cuando llegaron
al poder los gobiernos populistas de Luiz Inacio Lula da Silva y Dilma Rousseff.

Excanciller: Lula está indignado con sumisión brasileña ante EEUU
Desde el día que Lula da Silva asumió la presidencia, los 'grandes
manipuladores' de la democracia: la CIA, la Agencia de Seguridad Nacional (NSA),
Soros Quantum Hedge Fund y el Grupo Stonebridge (ASG) de la ex secretaria de
Estado norteamericano, Madeleine Albright, promovieron una guerra mediática
contra el populismo brasileño a nivel mundial y nacional.
En Brasil, 551 medios de comunicación pertenecientes a seis familias que
controlan el 98% de la información divulgada en el país escribieron miles de
artículos y presentaron un sinnúmero de informes de TV en los que acusaban al
gobierno populista de ser corrupto, ineficiente, incapaz de terminar con la
violencia, vendido a los chinos, etc.
No te lo pierdas: El Pentágono, otra vez en América Latina
De acuerdo con el periodista norteamericano y exempleado de la NSA, Wayne
Madsen, la lucha contra el populismo se intensificó después de asumir Dilma
Rousseff su segundo mandato en 2014. La Fundación Soros, la Agencia de Estados
Unidos para el Desarrollo Internacional (USAID, por sus siglas en inglés), la
Fundación Nacional para la Democracia (NED) y cientos de ONG usaron
organizaciones como Vem Pra Rua, el Movimiento Brasil Libre para desatar
protestas callejeras y tratar de convertirlas en un tipo de Revolución de
Colores. No lograron 'crear' una 'revolución', pero sí desestabilizaron al país.

Por qué EEUU quiere a toda costa controlar la base militar de Alcántara en
Brasil
La CIA y la NSA infiltraron, de acuerdo con The Real Agenda News, no solamente
instituciones judiciales, legislativas y al propio Gobierno sino que reclutaron
a varios líderes de movimientos sociales, inclusive penetraron el Partido de los
Trabajadores (PT) en el Gobierno, se contactaron con servicios de inteligencia
militar, con los directivos del Banco Central y con ejecutivos de Petrobras.
Lo interesante fue que después de comprobarse por varios estudios geofísicos que
frente a Río de Janeiro, en el mar a una profundidad de 2.000 metros, hay más de
100.000 millones de barriles de petróleo, en mayo de 2013 el vicepresidente de
EEUU en aquel entonces, Joe Biden, fue a Brasil para convencer a Dilma Rousseff
de dar permiso a las corporaciones energéticas norteamericanas y participar en
la explotación de aquel yacimiento de oro negro.
Te puede interesar: El Pentágono resucita al subimperialismo brasileño
El representante norteamericano recibió una respuesta negativa y desde que Biden
regresó a su país con las 'manos vacías', las protestas contra el Gobierno de
Rousseff se intensificaron y la aceptación de la presidenta bajó
estrepitosamente del 70 al 30%, según los medios de comunicación. Inmediatamente
a Dilma Rousseff la implicaron en el escándalo de Petrobras por recibir
aparentemente de esta corporación estatal dinero usado para 'comprar' votos en
el Congreso. Nada de esto fue probado pero el proceso de 'impeachment' contra la
presidenta arrancó.

Líder social: expresidente Lula ve una creciente injerencia de EEUU en Brasil
Los impulsores de la destitución de Dilma Rousseff, el presidente de la Cámara
de Diputados, Eduardo Cunha, y el presidente del Senado, Renan Calheiros,
después de hacer varias consultas con el Departamento de Estado norteamericano
promovieron la acusación contra la presidenta de violar normas fiscales para
maquillar las finanzas del país. En Brasil, estas decisiones fiscales se conocen
como 'pedaladas fiscales' y consisten en usar fondos de bancos públicos para
cubrir gastos de programas que están bajo la responsabilidad del Gobierno. No
había ningún gobierno brasileño que no recurriera a esta práctica. En realidad,
este método lo han estado utilizando prácticamente todos los gobiernos del mundo
en el transcurso de la historia para cubrir gastos urgentes.
No te lo pierdas: Presidente de Bolivia acusa a EEUU de usar un "golpe judicial"
contra Lula
Sin embargo, el 'impeachment' de Dilma Rousseff fue sancionado en Washington y
el 31 de agosto de 2016 después del voto en el Senado, la primera mujer
presidenta en la historia del país fue destituida. Dos horas después, Michel
Temer, que hasta aquel momento era el presidente interino, se transformó en
seguida de vicepresidente y aliado de Dilma en su enemigo y el nuevo presidente
de Brasil después de jurar apresuradamente el cargo.

¿Por qué EEUU tiene el ojo puesto en Brasil?
Poco tiempo después, uno de los principales autores de la destitución de Dilma
Rousseff, Eduardo Cunha, fue condenado a 15 años de prisión por tener en Suiza
cinco millones de dólares provenientes de sobornos por un contrato de Petrobras.
El presidente del Senado, Roman Calheiros, tuvo que pasar por 11 investigaciones
en la corte suprema por corrupción, lavado de activos, desvío de dinero y fraude
público, pero el Tribunal Supremo de Justicia lo absolvió milagrosamente de
todas las acusaciones. A la vez, 34 legisladores que votaron por el
'impeachment' de la presidenta terminaron en la cárcel junto con 51 políticos
acusados de corrupción y lavado de dinero.
Así, después de una larga 'labor' encubierta, Washington logró terminar con el
populismo en Brasil e instalar a un presidente a su gusto, Michel Temer, que en
seguida promovió un proyecto elaborado por el Fondo Monetario Internacional, que
él mismo bautizó como el 'Plan Puente al Futuro'.
No te lo pierdas: Presidente venezolano: "las garras" de EEUU están detrás de
medidas contra Lula
Este plan incluye el recorte de gasto público para los programas sociales de
vivienda, educación y combate de la pobreza; reforma del sistema jubilatorio y
flexibilización de las leyes laborales y aprobación de un 'contrato
intermitente', que se caracteriza por ausencia de jornadas fijas regulares sino
esporádicas, de acuerdo a la necesidad del empleador; cierre del programa 'Mi
Casa — Mi Vida', que permitía a los trabajadores adquirir su casa propia;
revisión del Sistema universal de Salud Pública; privatización de aeropuertos,
carreteras, ferrocarriles y empresas energéticas estatales al estilo de Alberto
Fujimori en Perú o Mauricio Macri en Argentina. Hace poco el Gobierno anunció 34
licitaciones y subastas de bienes públicos.

Excanciller de Lula: América del Sur lucha de nuevo por ver quién es el mejor
amigo de EEUU
Desde la llegada de Temer al poder en 2016, Brasil va camino a su peor ciclo de
crecimientos de los últimos 100 años. La expansión del Producto Interno Bruto
(PIB) en 2017 era solo de 1% y para 2018 los economistas pronostican un
crecimiento del 1,47%, según el Instituto de Investigación Económica Aplicada.
Tal es la situación en el país que el 70% de los brasileños considera a Michel
Temer como el peor presidente desde el retorno del país a la democracia en 1985.
Los únicos contentos con su llegada al poder son los oligarcas nacionales y los
dueños de las transnacionales energéticas y militar-industriales, pues Temer les
está ofreciendo las riquezas nacionales a cambio de una simple promesa de
inversiones e interés en una cooperación militar. También está feliz el
Pentágono que por fin se acerca a su meta de instalarse en la Amazonía
brasileña, algo que no logró ni con el Gobierno militar.
No te lo pierdas: El peligroso retorno del intervencionismo en América Latina
Para alcanzar todo esto, los norteamericanos no escatimaron dinero para sus
operaciones abiertas y en especial, encubiertas. Según documentos de Edward
Snowden, desde 2002 la CIA y la NSA instalaron en conjunto dos estaciones de
espionaje y de interceptación de la comunicación electrónica SCS (Special
Collection Service) llamado en privado 'College Park'. Precisamente sus datos
fueron usados tanto en la Operación Lava Jato, como en la destitución de Dilma
Rousseff y el encarcelamiento de Lula da Silva.
Brasil: los intereses de Estados Unidos detrás de la decisión contra Lula
Las mismas estaciones conectadas al sistema Primary Fornsat Collection
Information (La Red de Interceptación Global de la NSA) fueron instaladas en la
Ciudad de Panamá, Ciudad de México, Bogotá y Caracas, de acuerdo a la
información revelada por Snowden (estas estaciones están operando actualmente en
88 países, según Electroslaces.net). Precisamente, estos sistemas SCS
permitieron a Estados Unidos interferir en las elecciones de 41 países de 1946 a
2000, de acuerdo al estudio de Carnegie Mellon University. Tras analizar los
últimos acontecimientos en el mundo, podríamos decir sin equivocarnos que estas
interferencias ya pasaron para 2018 el número 50 de lejos.
A pesar de que los fallidos regímenes populistas representados por Cristina
Fernández en Argentina, Dilma Rousseff en Brasil, Rafael Correa traicionado en
Ecuador por su aliado, Lenín Moreno, todos estos líderes populistas proclamaron
una política de 'Equilibrio y Reconciliación' entre pobres y ricos. No obstante,
las élites nacionales toleraron esta política mientras no interfería seriamente
con sus ganancias y la rechazaron inmediatamente cuando las condiciones
económicas ya no les convenían. Al mismo tiempo, EEUU ha percibido desde el
principio que el populismo sería aprovechado en términos geoeconómicos por China
y Rusia. En el caso de Brasil, a Washington le irritó inmediatamente la
membresía del país en BRICS y el apoyo de Dilma Rousseff a la creación de una
nueva moneda de reserva.

Después, cuando el Gobierno brasileño inició la colocación de cables de fibra
óptica a través del Atlántico hacia Europa para lograr su propio sistema de
telecomunicación independiente de EEUU, inclusive su internet para evitar la
interceptación por la NSA, la Casa Blanca se puso en alerta.

Presidenta del PT: hay que perdonar a quienes apoyaron "golpe" en Brasil
Finalmente, todos estos hechos colmaron la paciencia norteamericana y aceleraron
el golpe judicial legislativo contra Dilma Rousseff y de paso contra Lula da
Silva que se proyectaba como un favorito para las elecciones presidenciales
programadas para el próximo 7 de octubre. El candidato de la CIA, NSA y Soros
para las elecciones de 2014, Aecio Neves, no está participando en esta contienda
electoral, pero la otra favorita del trío, mencionado para las elecciones
anteriores, Marina Silva, se está presentando como candidata aunque está
bastante 'quemada'.
Para la agencia Bloomberg News, los más visibles candidatos a la Presidencia
actualmente son Jair Bolsonaro, un excapitán de las Fuerzas Armadas que
representa a la extrema derecha del Partido Social Liberal (PSL), cuyo índice de
aceptación aumentó después de sufrir un atentado; lo sigue Marina Silva de
Unidas para Transformar Brasil (REDE); y el heredero político de Lula da Silva,
Fernando Haddad, del Partido de los Trabajadores (PT) quien es doctor en
filosofía. Ultimamente está creciendo la aceptación de Geraldo Alckmin del
Partido de la Socialdemocracia Brasileña (PSDB) debido al apoyo de los
empresarios. En fin, nada está claro y todo indica que habrá una segunda vuelta
el próximo 28 de octubre. Se espera también que un 20% de los votantes se
abstenga de dar su voto.

En todo caso, será el pueblo quien decida, como dijo alguna vez Lula da Silva,
si seguirán a "los críticos del PT que piensan que debemos empezar el día
pidiendo a EEUU permiso a estornudar o a Europa, permiso dee toser" o ser un
país orgulloso, independiente y soberano.

LA OPINIÓN DEL AUTOR NO COINCIDE NECESARIAMENTE CON LA DE SPUTNIK


In
SPUTNIK
https://mundo.sputniknews.com/firmas/201809201082115911-como-eeuu-desmantelo-brasil/
20/9/2018

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Stalingrado - la ciudad que derrotó al Tercer Reich

Jochen Hellbeck
Stalingrado - la ciudad que derrotó al Tercer Reich
Barcelona: Galaxia Gutenberg, 2018


Stalingrado fue la batalla más feroz y letal en la historia de la humanidad, con una cifra de muertos estimada en más de un millón en apenas seis meses. Su trascendencia fue inmediaamente percebida por las autoridades soviéticas, que decidieron enviar una delegación de historiadores  moscovitas con el fin de registgrar para la posteridad las voces de los defensores de Stalingrado.

Mientras se libraba la batalla ningún corresponsal extranjero obtuvo permiso para viajar a Stalingrado. Este hecho, junto a la imposibilidad de acceder hasta fechas muy recientes a los archivos rusos, provocó que los numerosos estudios sobre la batalla de Stalingrado la presenaran a través de los ojos de los alemanes que quedaron atrapados en la ciudad.

Con la publicación por primera vez de las entrevistas recogidas en Stalingrado, que habian estado sepultadas hasta ahora en los archivos, este libro supone una gran aportación a la literatura sobre la Segunda Guerra Mundial. Y permite a los lectores  imaginar a los soldados del Ejércio Rojo y otros defensores de la ciudad como personas que piensan y sienten. Sus testimonios acercan al lector a la batalla y ofrecen una vivida descripción de las acciones, pensamientos y sentimientos de los participantes soviéticos que nos es comparable a la de ninguna otra fuente conocida.También ayudan a entender algunas de las grandes preguntas sobre Stalingrado: ? Cómo fue capaz el Ejército Rojo de imponerse a un enemigo considerado superior en planificación operativa, disciplina militar y técnicas de combate? ?De qué recursos se valieron los defensores de Stalingrado para parar los pies a los invencibles alemanes que hasta ese momento habían tenido a Europa de rodillas?

El libro se complementa con fragmentos de cartas y declaraciones de los soldados alemanes hechos prisioneros por los soviéticos, todas inéditas hasta ahora.

Jochen Hellbeck nos ofrece la mejor y más completa narración de lo que fué la batalla de Stalingrado, ahora que se cunplen los 75 años de su finalización.


Galaxia Gutenberg

domingo, 16 de setembro de 2018

Sair da guerra contra a Síria


Thierry Meyssan

A Casa Branca não consegue retirar-se da guerra na Síria. O Presidente Trump
enfrenta-se, ao mesmo tempo, com o auto-proclamado «Estado Estável» (segundo o
editorial anónimo do New York Times), que prossegue a estratégia
Rumsfeld-Cebrowski, e com as reactivadas ambições dos seus aliados israelitas,
franceses, britânicos e turcos. A lógica destes interesses poderá deslocar a
guerra em vez de a resolver.
Enquanto a Casa Branca e a Rússia se puseram de acordo para por fim à guerra,
por interpostos jiadistas, na Síria, a paz tarda em chegar. Ora, porquê ?
Porquê a guerra contra a Síria ?
Contrariamente a uma ideia generalizada por sete anos de propaganda, a guerra
contra a Síria não é uma «revolução que deu para o torto». Ela foi decidida pelo
Pentágono em Setembro de 2001, depois longamente preparada, com algumas
dificuldades é certo.
Uma guerra preparada durante uma década
  A preparação da guerra é largamente escalpelizada no último livro de Thierry
  Meyssan. Ele está disponível em francês, em espanhol, em russo e em turco. Em
  Setembro, será publicado em inglês, em árabe e em italiano.
Relembremos as principais etapas desta planificação :
 Em Setembro de 2001, o Secretário da Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld adopta a
estratégia do Almirante Arthur Cebrowski. As estruturas estatais de metade do
mundo deveriam ser destruídas. Os Estados Unidos controlarão o acesso pelos
Estados cuja economia está globalizada aos recursos naturais das regiões
não-conectadas à economia global. O Pentágono começará a sua obra «remodelando»
o «Médio-Oriente Alargado» [1].
 A 12 de Dezembro de 2003, George Bush Jr. assina a Lei sobre a restauração da
soberania libanesa exigindo contas à Síria (Syria Accountability and Lebanese
Sovereignty Restoration Act). A partir daqui, o Presidente dos Estados Unidos
tem o direito de entrar em guerra contra a Síria sem ter que passar pelo
Congresso [2].
 Em 2004, aquando da cimeira da Liga Árabe em Túnis, o Presidenta Ben Ali tenta
fazer passar uma moção autorizando a Liga a legitimar o uso da força contra os
Estados- membros que não respeitem a novíssima Carta de Direitos do Homem da
Liga.
 Em 2005, a CIA organiza a revolução colorida “do Cedro” no Líbano. Assassinam o
líder sunita Rafic Hariri e tornam responsáveis por isso os Presidentes cristão
libanês e alauíta sírio, trata-se de provocar um levantamento sunita contra a
Força Síria de manutenção de paz [3]. No momento em que os Marines estão prontos
a desembarcar em Beirute, a Síria retira por sua iniciativa e o balão esvazia-se
[4].
 Em 2006, Dick Cheney confia à sua filha, Liz, o cuidado de criar o «Grupo para
a Política e as Operações no Irão e na Síria» (Iran Syria Policy and Operations
Group). Ela organiza o ataque israelita contra o Hezbolla, pensando que ele não
resistirá muito tempo. Os Marines dos EUA desembarcarão em Beirute e continuarão
a sua marcha «libertadora» até Damasco. A operação falha e Israel tem que bater
em retirada após 33 dias de combates [5].
 Em 2008, Washington tenta de novo recriar o conflito a partir do Líbano. O
Primeiro-ministro Fouad Siniora decide cortar as comunicações internas da
Resistência e interromper os transportes aéreos com Teerão. Em poucas horas, o
Hezbolla destrói o dispositivo militar ocidental e repõe em acção o conjunto das
suas infraestruturas.
 Em 2010, Washington adopta a «liderança pela retaguarda» (leading from behind).
A Administração Obama confia ao Reino Unido e à França o ataque contra a Líbia e
a Síria (acordos de Lancaster House).
 Em 2011, inicio das operações militares na Síria.
É, portanto, absurdo evocar a guerra contra a Síria como um acontecimento
espontâneo sui generis [6].
Uma guerra indirecta
A originalidade da guerra contra a Síria é, claro, de ter sido declarada por
Estados (os «Amigos da Síria»), mas, na prática, ter sido conduzida quase
exclusivamente por exércitos não-estatais, os jiadistas.
Durante os sete anos desta guerra, mais de 250. 000 combatentes chegaram do
estrangeiro para se baterem contra a República Árabe Síria. Tratava-se, é certo,
de carne para canhão, gente muitas vezes insuficientemente treinada, mas,
durante os quatro primeiros anos, estes soldados estavam mais bem armados do que
o Exército Árabe Sírio. O maior tráfico de armas da história foi organizado para
os aprovisionar com material de guerra [7].
Desde a Renascença europeia que os Ocidentais jamais haviam recorrido a
mercenários numa tal escala [8].
É, portanto, absurdo falar em «revolução que deu para o torto».
  O desmantelamento do Próximo-Oriente planificado pelo Pentágono no quadro da
  estratégia do Almirante Cebrowski. Este mapa foi publicado pelo Coronel Peters
  em 2006, mais ele já tinha sido comentado, precisamente antes dos atentados do
  11 de Setembro de 2001.
Uma guerra supervisionada por aliados com os seus próprios objectivos
Ao recorrer a Israel para atacar o Líbano, depois confiando as guerras da Líbia
e da Síria ao Reino Unido e à França, e, por fim, utilizando as instalações da
OTAN na Turquia, o Pentágono deixou que o seu plano fosse perturbado pelos seus
aliados.
Como em todas as guerras, o país líder deve prometer aos seus aliados, para
estes o seguirem, que encontrarão um retorno após o seu investimento. Ora, com a
entrada da Rússia na guerra, a vitória ocidental tornou-se impossível. Cada um
dos aliados dos Estados Unidos virou-se, pois, progressivamente, para a sua
própria estratégia nesta região. Com o tempo, os objectivos de guerra dos
aliados sobrepuseram-se aos dos Estados Unidos, os quais, por si, se recusaram a
investir militarmente tanto quanto o deveriam ter feito.
Israel
Prosseguindo a ideologia colonial de alguns dos seus pais fundadores, Israel põe
em marcha uma política de divisão dos seus grandes vizinhos em pequenos países
étnica ou religiosamente homogéneos. Assim, apoiou inutilmente a divisão do
Líbano num Estado muçulmano e num outro cristão, ou ainda a criação de um
Curdistão no Iraque, depois na Síria. Não dispomos de documentos da estratégia
israelita, mas, retrospectivamente, a linha seguida por Telavive corresponde ao
«Plano Yinon» de 1982 [9] ou à do Institute for Advanced Strategic and Political
Studies de 1996 [10].
A estratégia israelita cola-se à das grandes linhas da «remodelação do
Médio-Oriente» de Rumsfeld e Cebrowski. No entanto, ela não tem, de modo nenhum,
o mesmo objectivo: o Pentágono quer controlar o acesso dos países desenvolvidos
às riquezas da região, enquanto Israel quer assegurar-se que nenhum dos seus
vizinhos será suficientemente forte para se levantar contra si.
O Reino Unido e a França
O Reino Unido e a França renovam a sua política colonial, tal como ela era
expressa na altura da queda do Império Otomano e da divisão do Médio-Oriente (os
Acordos Sykes-Picot).
Os Britânicos retomam a «Grande Revolta Árabe de 1915» que Lawrence da Arábia
lançara contra os Otomanos. À época, prometeram a liberdade a todos os Árabes se
eles derrubassem o jugo otomano e colocassem os wahhabitas no Poder. Desta vez,
prometem-lhes a liberdade se derrubarem todos os seus governos nacionais e os
substituírem pelos Irmãos Muçulmanos. Mas, nem em 1915, quando o Império
Britânico substituiu o Império Otomano, nem em 2011, os Árabes chegarão à sua
liberdade. É este o plano da «Primavera Árabe de 2011» [11].
Os Franceses buscam restabelecer o mandato que a Sociedade das Nações lhes
tinham confiado sobre a Síria. Isto é o que explica o sobrinho-neto de Picot (o
dos Acordos Sykes-Picot), o antigo Presidente Giscard d’Estaing [12]. E, é o que
reclama o Presidente Hollande durante a sua viagem às Nações Unidas, em Setembro
de 2015. Tal como em 1921, a França apoia-se na separação étnica de Curdos dos
Árabes. Ela defende, portanto, a criação de um Curdistão, não sobre o seu
território histórico na Turquia, mas seja onde for, sobre terras árabes na
Síria.
A Turquia
A Turquia, quanto a si, sonha concretizar a promessa do seu fundador, Mustafa
Kemal Atatürk, o «Juramento Nacional» (Misak-ı Millî) [13], adoptado pelo
Parlamento otomano a 12 de Fevereiro de 1920. Ela pretende, ao mesmo tempo,
anexar o Norte da Síria, incluindo Alepo, e eliminar os Cristãos, aqui incluídos
os Católicos em Maaloula e os Arménios em Kessab.
Ela entra em conflito com os outros aliados : com os Israelitas porque quer
anexar o Norte da Síria e não autonomizá-lo; com os Britânicos porque quer
restaurar o Califado otomano; e com os Franceses porque se opõe à criação de um
Curdistão independente na Síria. Acima de tudo, entra em conflito com os
próprios Estados Unidos porque eles não escondem querer destruí-la depois de ter
desmantelado a Síria [14].
Como sair desta guerra ?
Após sete anos de combates, o Estado sírio continua de pé. A República Árabe da
Síria e os seus aliados, a Rússia, o Irão e o Hezbolla estão por cima. Os
exércitos estrangeiros (os jiadistas) sofreram uma derrota esmagadora, mas não
os seus comanditários : os Estados Unidos, Israel, o Reino Unido e a França, a
Turquia.
A guerra não só despertou as ambições do início do século XX, como nenhum dos
protagonistas que não experimentaram a derrota no seu próprio corpo está pronto
a abandonar o combate.
Parece estúpido querer começar do zero uma guerra já perdida pelos jiadistas. A
presença do exército russo torna agora impossível qualquer confrontação directa.
Longe de ter sido destruída, a população síria está agora temperada, pronta para
suportar mais e muito melhor armada. Acima de tudo, ela reflectiu muito e é
menos manipulável do que em 2011. No entanto, tal como na época, a retórica
política ocidental retomou a sua ladainha de «Bashar deve partir».
A lógica apontaria, portanto, para que o conflito prossiga num outro terreno. Se
no passado, o Almirante Cebrowski havia previsto levar num segundo tempo a
guerra à Ásia Central e do Sudeste, os seus sucessores devem primeiro acabar com
o Médio-Oriente Alargado. Actualmente, eles consideram a possibilidade de
reacender o solo iraquiano, como se pode ver com a espectacular reviravolta da
Administração Rohani e os tumultos em Bassorá.
Thierry Meyssan
Tradução
Alva


In
VOLTAIRENET.ORG
http://www.voltairenet.org/article202876.html
11/9/2018


sábado, 15 de setembro de 2018

Um país fracturado


 Mauro Luis Iasi

A situação no Brasil depois do golpe que colocou Temer na presidência não pode
ser vista como «uma “onda conservadora”, ou um acidente inexplicável no curso
normal de uma democratização interrompida, ou ainda uma momentânea espécie de
“psicose de massas”. Estamos diante de uma manifestação compreensível e até
certo ponto esperada de uma sociedade fortemente cindida em interesses
inconciliáveis de classe que tem sido mantida e reproduzida por artifícios
políticos e ideológicos que encontraram seu ponto de esgarçamento.»


“Uma coisa é um país, outra uma cicatriz.”
Affonso Romano de Sant’Anna

Somos um país fraturado. Um país fraturado é mais que um país dividido, é um
país no qual a divisão tornou-se algo explosivo. Não é um mero trauma, é uma
fratura exposta. Os bálsamos e unguentos tradicionais não vão curar o osso
partido, a pele rompida, os tendões e músculos destroçados.
Sempre fomos um país divido. Dividido pela desigualdade estruturante das
formações sociais, incluídas a força na ordem mercantil mundial e depois no modo
de produção capitalista. Dividido entre colonizadores e povos indígenas, entre
escravocratas e escravos, entre oligarcas e povo, entre latifundiários e
agricultores, entre burgueses e proletários. No entanto, essa desigualdade nem
sempre se manifesta como fratura. Em tempos ditos normais, a desigualdade
encontra formas de subordinação à ordem, seja ela colonial, escravocrata,
republicana ou democrática, de maneira que as tensões inevitáveis entre aqueles
que exploram e dominam e aqueles que sofrem a dominação podem se apresentar como
formas “civilizadas” de uma ordem instituída, até mesmo logrando a submissão
passiva ou ativa de amplos segmentos das camadas oprimidas.
Por vezes, no entanto, essa ordem é abalada pela explosão das contradições que
vão se acumulando no tecido de uma sociabilidade fundada na desigualdade e na
exploração. Isso acontece com muito mais frequência do que gostariam os
artífices do discurso sobre nossa “vocação pacífica e ordeira”. São muitos os
exemplos, desde a resistência indígena na Confederação dos Tamoios (1554-1567),
passando pelo Quilombo dos Palmares (1580-1710), a Confederação do Equador
(1824), a Revolta dos Malês (1835), as Rebeliões Regenciais (1831-1840), a
guerra de Canudos (1896-1897) as lutas operárias desde o final do século XIX, a
Greve Geral de 1917 e a insurreição de 1919, o Movimento Tenentista de 1922, a
Revolução Paulista de 1924, a Coluna Prestes (1925-1927), o movimento de 1930
que levou Getúlio Vargas ao poder, a insurreição da ANL e do PCB de 1935, a
revolta de Trombas e Formoso em Goiás (1950-1957), a resistência armada contra o
Golpe de 1964, apenas para citar alguns exemplos numa longa lista histórica de
revoltas e resistências às quais devemos somar a cotidiana e, muitas vezes,
invisível resistência contra a violência, a fome, a exploração e a opressão
diária que empreendem os oprimidos.
A natureza estrutural da desigualdade, que encontra suas raízes no passado
colonial e escravista, mas que que se consolida com o desenvolvimento do
capitalismo dependente e a submissão ao imperialismo, acaba por determinar
limites evidentes ao desenvolvimento da ordem democrática que se vê condenada à
uma democracia restrita para poucos, resultando no aspecto autocrático do Estado
brasileiro, nos termos em que define Florestan Fernandes. Uma democracia para
poucos setores privilegiados, resultantes da fusão oligárquica-burguesa, que tem
por principal problema equacionar a exclusão das amplas maiorias da ordem que as
explora e domina.
O mito segundo o qual o desenvolvimento da economia capitalista resultaria na
gradual diminuição das desigualdades se demonstrou uma falácia, seja pela prova
prática do chamado “milagre brasileiro” durante a ditadura, seja pela recente e
traumática experiência de conciliação de classes do ciclo petista. O que ficou
comprovado é que a alternância de ciclos de crescimento e recessão acabam por
revelar, ao final, aumento significativos das desigualdades econômicas e sociais
entre as classes.
Nos momentos de euforia se produz fantasias ideológicas, tais como a
“brasilianidade” da época getulista, o mito do “Brasil potência” na Ditadura, ou
o discurso de que o Brasil poderia ser um “país de todos” no engodo da
conciliação de classes. No entanto, na crise do capital, inevitável no processo
de valorização do valor para quem o conhece, a ideologia se desmascara e a
contradição latente emerge na forma de conflito e, em certas condições, de
fratura. É nestes momentos que a outra face de nosso “caráter” se revela.
Vivemos hoje um desses momentos e é necessário compreendê-lo. Estamos
convencidos de que não se trata de uma “onda conservadora”, ou um acidente
inexplicável no curso normal de uma democratização interrompida, ou ainda uma
momentânea espécie de “psicose de massas”. Estamos diante de uma manifestação
compreensível e até certo ponto esperada de uma sociedade fortemente cindida em
interesses inconciliáveis de classe que tem sido mantida e reproduzida por
artifícios políticos e ideológicos que encontraram seu ponto de esgarçamento.
Resumidamente, podemos afirmar que vivemos em uma sociedade na qual os setores
dominantes (primeiro oligárquicos e aristocráticos; depois burgueses dependentes
e aliados à ordem imperialista, suspeitamos que sem que se percam aspectos
oligárquicos e aristocráticos) que constituem não mais que algo em torno de 3%
da população economicamente ativa, concentram a maior parte da riqueza
socialmente produzida. Os dados de 2014 indicavam que os 10% mais ricos
concentravam cerca de 72,4% da riqueza nacional (em 1990 concentravam 53%), em
2015, 1% dos mais ricos concentravam 28% da riqueza. Como um exemplo, as seis
pessoas mais ricas do Brasil em 2017 (segundo dados da Oxfam), Jorge Paulo
Lemann (AB Inbev), Joseph Safra (Banco Safra), Marcel Hermmann Telles (AB
Inbev), Carlos Alberto Sicupira (AB Inbev), Eduardo Saverin (Facebook) e Ermirio
Pereira de Moraes (Grupo Votorantim), juntas têm mais dinheiro que metade da
população brasileira.
Alguns estudiosos estão preferindo utilizar termos como “plutocracia” para
designar uma ordem na qual uma pequena maioria impõe seus interesses, e me
parece cada vez mais adequado. Em um quadro como este, as formas políticas têm
que ser limitadas à deformações autocráticas, ainda que, por momentos, se
expressem em aparências democráticas, resultando naquilo que o mesmo Florestan
denominou de “democracia de cooptação”. Nesta situação, a ideologia
evidentemente ganha centralidade, uma vez que a ordem precisa do consentimento
de parte daqueles que de fato nada têm a ganhar com ela, tal consentimento só
pode ser logrado com poderosas doses de encobrimento, naturalização,
justificativas, inversões que possam apresentar os estreitos interesses de uma
insignificante minoria como se fossem interesses gerais.
O momento da crise é também o momento em que os mecanismos ideológicos mostram
sua insuficiência para acobertar o real. As ideias que correspondiam a uma certa
ordem social, perdem essa correspondência, tornando-se, nas palavras de Marx e
Engels, “inautênticas” (A ideologia alemã, p. 283). No entanto, seguem os mesmos
autores, paradoxalmente essas ideias “quanto mais desmentidas pela vida […] tão
mais resolutamente são afirmadas, tanto mais hipócritas, moralistas e santa se
torna”.
A falência dos mecanismos políticos, jurídicos, policiais e ideológicos, abre
espaço para a violência. Mas analisemos mais detidamente essa violência. Na
ordem burguesa (seja ela abertamente autocrática ou formalmente democrática), a
violência sempre se faz presente – ela é uma condição inevitável, inclusive para
a formação do chamado “consenso”. A violência de que aqui se trata é a reação de
um segmento minoritário e privilegiado numa ordem intrinsicamente injusta e
violenta que vê o risco da massa de oprimidos levantar-se contra eles.
Este é outro dos aspectos constitutivos de nossa formação social: as camadas e
classes dominantes se antecipam para evitar que os fechamentos de ciclos possam
levar a explosões que coloquem em risco a continuidade de seu domínio. Foi assim
na abolição da escravidão, cercadas de garantias legais e policiais, para que os
ex-escravizados não resolvessem reagir a séculos de arbítrio, agressões e
exploração a que foram submetidos. Foi assim na chamada transição lenta, gradual
e segura transição da ditadura à democratização. Um dos mecanismos desse
fenômeno, que já foi chamado de “mudança conservadora”, é o fato que as classes
dominantes manipulam estereótipos para produzir em torno delas a universalidade
vazia que possa ocupar o lugar daquela que ela um dia por ventura tenha tido
alguma substancialidade. Aí se inscrevem os mitos da “nação”, do
“desenvolvimento”, do “risco do comunismo”, da “guerra contra as drogas e o
crime”, a “defesa da família e da moral”, o combate à “corrupção” entre outros.
É por isso que as classes dominantes são tão violentas e irracionais: medo. E
elas têm motivos para temer. O aspecto aparentemente irracional é adesão de
segmentos dos explorados na defesa desses mitos e reforçando estereótipos que em
última instância se voltam contra eles próprios. Em outra oportunidade
refletimos sobre isso ao remeter aos estudos de Reich e a psicologia de massas
do fascismo. Agora nos interessa um outro aspecto.
Algumas pessoas têm buscado entender a radicalização da fratura em nosso país
pela emergência de um suposto “discurso de ódio”. Para provocar, nossa reflexão
começaria dizendo que não há “discurso de ódio”… o que existe é ódio que se
expressa, entre outras coisas, no discurso. Essa distinção aparentemente sutil
nos parece importante porque, sem ela, podemos cair no equívoco de acreditar que
é o “discurso” que gera o ódio, o que nos levaria à ingênua posição de alertar
as pessoas para ter cuidado com que falam porque o que for dito pode nos
conduzir à violência e à barbárie. Caso estejamos certos em nossas premissas, o
discurso de ódio expresso por representantes das camadas privilegiadas é a
expressão do receio desses segmentos de que as condições que permitem a
continuidade de seus privilégios possam ser abaladas pelo despertar das massas
cuja exploração é condição para tanto. Trata-se de um “ódio de classe”, o que
não impede que se expresse também como racismo, homofobia, machismo e misoginia,
fundamentalismo religioso ou outra forma qualquer de irracionalismo, mas seu
fundamento é o ódio de classe. Há uma clara diferença no tratamento da
desigualdade e da violência contra negros, mulheres, gays e lésbicas, quando se
soma ao estigma do preconceito a condição de classe, ainda que seja sempre
racismo, machismo, homofobia etc. É inegável que para os pobres e a classe
trabalhadora o preconceito assume a forma de risco de morte.
Identificamos o fato de que o trauma da desigualdade e seu fundamento na
exploração, alcançou o status de fratura, na medida que mesmo as manifestações
mais elementares que poderiam indicar um caminho saudável de fusão em torno de
uma universalidade um pouco mais substantiva, são o meio pelo qual o ódio de
classe se manifesta. Vale elencar alguns poucos, mas representativos, exemplos.
Uma jovem negra e lésbica é assinada com tiros na cabeça, uma liderança indígena
é abatida a tiros, um ônibus em campanha é atingido por tiros, um museu pega
fogo e destrói um patrimônio inestimável. Imediatamente, o tecido fraturado da
sociedade dá espaço para o brutal ataque e desqualificação das vítimas, de forma
violenta, mentirosa, mesquinha. Vejam, não é um expediente desconhecido. Quando
um jovem é assassinado na favela é preciso transformá-lo em traficante, quando
um pedreiro é torturado até a morte e seu corpo desaparece é preciso levantar
dúvidas sobre seu comportamento, quando uma mãe de família é baleada e seu corpo
arrastado por uma viatura, é necessário contextualizar essa cena num tiroteio
contra o crime organizado.
Agora, a vereadora assassinada ainda tem que ser alvejada por calunias contra
sua pessoa, a universidade pública incinerada novamente, agora por notícias
falsas que a responsabilizam pela agressão da PEC 241 que congela gastos por 20
anos, o ex-presidente tem que ser preso pela suposta e não provada propriedade
de um apartamento na praia, a presidente deposta tem que ser agredida e
desqualificada, um professor de uma universidade pública, com hábito de ler
poemas, tem que ser processado como um perigoso terrorista que pode eliminar
todos os conservadores a golpe de sonetos, pedagogos têm que ser torturados até
confessar que leram Paulo Freire e que O pequeno príncipe é parte do “kit gay”
distribuído nas escolas. Parece irracional, porque é. Mas é uma irracionalidade
compreensível.
A única maneira de uma ordem desumana, depredadora, profundamente desigual e
cruel conseguir forjar um consenso em torno dos segmentos privilegiados é criar
algo que aparentemente atinja todos e responsabilizar os segmentos que você quer
isolar. Um exemplo clássico é o da corrupção. Uma vez que tal prática delapida o
patrimônio público e acaba desviando os recursos da educação, da saúde e de
outros setores, basta colar o estigma no segmento que se deseja combater e
pronto.
A operação costuma funcionar como um evento traumático que signifique muito para
muita gente. Manipula-se um sentimento de insegurança; uma morte, um
assassinato, que possa gerar identificação imediata. Vários são os exemplos de
episódios que antecederam aventuras violentas e desastrosas: o famoso incêndio
de 1933 no Reichstag, cuja culpa foi atribuída a um pedreiro desempregado que
havia sido membro do Partido Comunista, contribuindo de forma decisiva para a
consolidação do domínio nazista na Alemanha; o atentado contra Carlos Lacerda,
na Rua Tonelero, em 1954, que acabou por isolar o presidente Getúlio Vargas e o
levar ao suicídio; o assassinato do Arquiduque de Sarajevo, em 1914, estopim da
Primeira Guerra Mundial; o conhecido “plano Cohen”, forjado por Getúlio Vargas e
atribuído aos comunistas para justificar o golpe de 1937, entre muitos outros
exemplos.
 É evidente que nem toda tentativa é assim tão sofisticada (tenho muita pena dos
historiadores do futuro), como a delirante denúncia de que os perigosos
marxistas do Foro de São Paulo (poucas iniciativas foram tão reformistas e pouco
marxistas como o Foro de São Paulo) têm um plano secreto para implantar na
América Latina uma federação de repúblicas socialistas. No entanto, a lógica é a
mesma: encontrar o inimigo, estigmatizá-lo, depositar a culpa da crise sobre
seus ombros e arrastar o irracionalismo até o ponto em que parte das massas
sirvam à manipulação e a prestem-se ao papel de defesa de uma ordem que as
oprime e despreza contra aqueles que tentam defender seus reais interesses.
Assim se destrói a saúde pública e se culpa os que defendem o SUS. Assim se
sucateia a universidade pública culpando aqueles que trabalham em sua defesa.
Assim se mata nas favelas, culpando as que próprias pessoas que são obrigadas a
viverem lá. Assim se destrói todo um país culpabilizando aqueles que tentam
salvá-lo. As margens do rio continuam seu trabalho de opressão e já se prepara o
discurso que culpabilizará a força das águas que estão prestes a transbordar.
O problema é o que fazer com fraturas expostas. As classes dominantes estão
jogando um jogo muito perigoso, mas que jogam bem e têm recursos para tanto.
Acreditam, como em outros momentos da história, que podem utilizar de seus
extratos mais radicalizados da extrema direita, eliminar seus adversários e
voltar com reconciliadores da vida nacional. Nem sempre dá certo, como provam os
casos do nazi-fascismo na Europa, a ditadura no Brasil e o Trump nos EUA. No
enterro da democracia, coitada tão frágil, todos os presentes chorarão
copiosamente, inclusive, como vemos sempre nos filmes e series policiais, o
assassino. Uma coisa sabemos: o bálsamo das eleições não ungirá o vencedor com a
legitimidade esperada e o Brasil sairá do pleito ainda mais fraturado do que
entrou.
Nuvens pesadas se assomam no horizonte e diálogos francos e chá de camomila
ajudam tanto como a criança que tenta juntar os cacos do vaso que despedaçou.
***
 Mauro Iasi é professor adjunto da Escola de Serviço Social da UFRJ, pesquisador
do NEPEM (Núcleo de Estudos e Pesquisas Marxistas), do NEP 13 de Maio e membro
do Comitê Central do PCB. É autor do livro O dilema de Hamlet: o ser e o não ser
da consciência (Boitempo, 2002) e colabora com os livros Cidades rebeldes: Passe
Livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil e György Lukács e a
emancipação humana (Boitempo, 2013), organizado por Marcos Del Roio. Colabora
para o Blog da Boitempo mensalmente, às quartas.
Fonte: https://blogdaboitempo.com.br/2018/09/10/um-pais-fraturado/

In
RESISTIR.INFO
https://www.odiario.info/um-pais-fracturado/
15/9/2018

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

A universidade brasileira sem reforma e o seu atraso renovado


       por Henrique Júdice Magalhães [*] 

       1 
      A América Latina, em geral, e a Argentina, em particular, comemoram, em
       2018, o centenário da rebelião estudantil que, com epicentro na
       Universidade de Córdoba, levou à  reforma universitária naquele país e
      abalou o cenário acadêmico do continente.
       Os estudantes cordobeses padeciam, em 1918, o domínio de sua universidade
      pela Corda Frates, que manipulava a designação de dirigentes e professores
      no interesse pessoal de seus membros e na conveniência ideológica do
      obscurantismo clerical. A esse problema particular, deram soluções
      universais: admissão de professores por concurso com participação
      discente; liberdade para qualquer pessoa dar cursos em sua área de
      conhecimento; representação paritária de professores, estudantes e
       egressos nas deliberações internas; ensino baseado na crítica; interação
      com o extramuros. Conquistas que mudaram as universidades argentinas e de
      outras nações onde o movimento teve eco (México, Peru, Cuba) e se fazem,
      ainda hoje, ausentes no Brasil.
       Porém, o mais importante efeito da rebelião dividia seus participantes e
      só veio a se concretizar plena e oficialmente em 1953: o fim do
      vestibular.

       2 
      De início, o acesso à educação superior dependia – lá e aqui – de um exame
      de suficiência: entravam todos os que atingissem uma nota previamente
      definida. Mas a falta de transparência sobre conteúdos e critérios tolhia
      o acesso das classes não privilegiadas.
       Nos anos 20, quando as universidades argentinas, sob o impulso
      democratizante de 18, se abrem aos setores sociais remediados, o Estado
      oligárquico brasileiro autoriza suas escolas superiores (universidade, só
      havia a atual UFRJ) a limitar vagas. Nos 50, quando isso se torna um
      problema social no Brasil, a Argentina extingue o vestibular e fixa como
      único requisito de acesso ao ensino superior o diploma secundário.

       3 
      "Fomos aprovados, queremos estudar" era a palavra de ordem de um dos
       pontos altos do movimento estudantil brasileiro: a tomada da Faculdade de
       Filosofia, Ciências e Letras da USP (1968). Pouco antes (1961-64), uma
       das reformas de base reivindicadas com a simpatia do governo  João
      Goulart era a universitária.
       O contínuo crescimento do número de jovens que obtinham a nota de
       aprovação no vestibular, mas não as poucas vagas (os ditos "excedentes"),
      tornara a democratização do acesso ao curso superior uma bandeira
      estudantil com forte respaldo social.
       Duas contrarreformas a frustraram, consolidando e aprofundando o
      afastamento entre a universidade pública e o povo e sujeitando o ensino
      superior brasileiro a uma mistura única no mundo entre clientelismo e
       acumulação de capital. Uma foi promovida pela ditadura de 1964; a outra,
      pelo PT. Graças a elas, só temos a "comemorar", hoje, a renovação dos
      vícios de um sistema universitário que reflete e realimenta os desta
      sociedade.

       4 
      Uma contrarreforma dá ao problema gerador da reivindicação de reforma uma
      resposta capaz de preservar os interesses que esta atingiria. Modifica
      estruturas para que sigam atendendo, com mais eficácia, aos mesmos fins.
      Tal se deu aqui nos anos 60/70 com o acesso das classes médias ao ensino
      superior e nos 2000/2010 com o das classes populares.

       5 
      A ditadura de 64 e as agências de inteligência dos EUA sabiam do potencial
      explosivo da questão dos excedentes e que não a contornariam só com
      repressão nem podiam depender de uma estrutura universitária incapaz de
      formar a quantidade de profissionais necessária a uma economia urbana em
      expansão e ao próprio Estado.
       Mas temiam abrir a universidade pública às massas quando os estudantes
      organizados dentro dela ou pela reivindicação de nela entrar compunham,
      junto aos operários que reerguiam a fronte em Contagem, Osasco e Cabo de
      Santo Agostinho, a vanguarda política do povo brasileiro (em 1969, na
      Argentina, a aliança operário-estudantil enterrou, com o Cordobazo, outra
      ditadura).

       6 
      Ao mesmo tempo, criaram-se novas universidades estatais, sobretudo no
      interior; ampliaram-se vagas nas já existentes, com novos cursos; e
      abriram-se cursos superiores nas escolas técnicas federais, também em
       expansão. O desvirtuamento dessas ações (positivas em princípio) pela
      concepção ideológica congênita às novas instituições, sobre as quais o
       dispositivo burocrático do poder central e as oligarquias locais exerciam
      um controle bem maior que sobre as preexistentes, era o problema menor,
      embora grave.
       Muito pior foi o gordo subsídio ao ensino superior privado, que absorveu
       muito mais matrículas que o estatal. Com isso, escoaram-se milhões de
      jovens para escolas sem organização discente, reduzindo-se a base social
      do movimento estudantil e a pressão sobre o Estado. E azeitaram-se as
      relações da facção que o geria com os donos delas (igrejas, sobretudo a
      católica; esquemas políticos regionais; e meia dúzia de capitalistas
      típicos).
       À questão social da escassez de vagas, ofereceram-se penosas soluções
      individuais: obter bolsas também pré-limitadas, encarando colegas,
      sobretudo os da mesma origem social, como concorrentes; endividar-se; usar
      o salário para pagar mensalidades, etc.
       Não é acidental que se tenha dado a essas escolas, para ministrar uma
      formação em geral restrita, dinheiro capaz de custear número maior de
      vagas nas públicas. A formação dos quadros dirigentes e funcionários mais
      graduados do Estado e das empresas manteve-se em poucas instituições,
      cabendo às demais formar mão-de-obra em ambiente despolitizado e devolver
      aos artífices dessa política parcela do dinheiro que eles fazem jorrar
      para elas.

       7 
      O tópico 6 descreve também a ação do PT em seu ciclo de gerenciamento do
      Estado (2003-16), que se completa com financeirização e formação de
      monopólios no sistema privado e reserva de cotas para estratos sociais não
       privilegiados.

       8 
      Em 12/04/2004, na  Folha de São Paulo,  Marta Salomon e Luciana
      Constantino mostraram ser possível duplicar as vagas das universidades
      federais com os impostos e contribuições que as particulares
      "filantrópicas" não pagam.
       Em 16/05, no mesmo jornal, o então ministro da Educação, Tarso Genro, e
      seu então adjunto e logo sucessor,  Fernando Haddad (FH-2), responderam
      que a ideia de que o ensino privado seja mantido por quem o usa, e não por
      toda a população via Estado, é neoliberal e elevaria mensalidades. Em
      defesa do subsídio às "instituições educacionais de assistência social",
      base do  ProUni , alegaram que "a desoneração tributária do pão não
      favorece o padeiro, mas quem tem fome". (Em 2013, quando caía a carga
      fiscal das empresas de ônibus e subiam as passagens, Tarso, então
      governador do RS, e FH-2, prefeito de São Paulo e associado para tal fim
      ao então governador Geraldo Alckmin, responderam via PM [Polícia Militar]
      com balas de borracha, cassetetes e gás lacrimogêneo aos jovens
      trabalhadores e estudantes que questionavam a aparente incoerência).

       9 
      Nos anos 50, o embate sobre entrega de recursos públicos a escolas
       privadas opusera Darcy Ribeiro e Anísio Teixeira a Carlos Lacerda. O PT
       optou por Lacerda. E fez pior.
       O dispositivo da lei de educação de 1961 que permitiu isso obrigava os
      destinatários dessas verbas a ter gratuitamente alunos pobres "no valor
      correspondente ao recebido". A de 1971 dispôs que a subvenção se daria
      quando custasse menos que abrir escolas públicas. E, no auge ideológico do
      privatismo (1998), condicionou-se a imunidade fiscal das  pilantrópicas 
      [1] à reversão de no mínimo 20% de seu faturamento total à gratuidade e
      limitou-se a isenção previdenciária ao valor das mensalidades de que
      abrissem mão.
       Já o ProUni só requer delas a reserva de 10% das vagas a bolsistas
      integrais e ainda estende as isenções de imposto de renda [2] , PIS e
      contribuições sociais sobre o faturamento e o lucro líquido às
      assumidamente mercantis, caso ofereçam em bolsas (mesmo parciais) 8,5% do
      que faturam com mensalidades. Se Lacerda, Médici e Fernando Henrique
      Cardoso (FH-1) foram verdadeiras mães para o ensino privado, FH-2 foi uma
      avó.
       De 2004 a 2015, o Estado injetou no ensino superior privado mais de R$ 80
      mil milhões – uns 10% via renúncia fiscal do ProUni e 90%, por meio do 
      Fies . O Brasil passou de 3,9 milhões de matrículas universitárias (2003)
      a 8 milhões (2015); a participação das instituições públicas caiu de 29
      para 25%, o inverso da Argentina, onde tinham 77% em 2014.

       10 
      O ProUni e o Fies levaram a coisas como "a compra da Somos Educação
      (editoras Ática, Scipione, Atual, Bemvirá e Saraiva, PH, Anglo, Maxi,
      Colégio Motivo, Plurall, Sigma, Ético, Geo, Red Ballon, SER, Chave do
      Saber, Alfacon, Integrado) pela  Kroton (Anhanguera, Unime, Unopar,
      Uniderp, Unic, Pitágoras, LFG e Fama). O maior grupo de ensino superior do
      Brasil (Kroton) acaba de comprar o maior de educação básica. O grupo
      resultante também tem negócios em editoras e cursinhos para concursos. O
      valor da operação foi de R$ 4,6 mil milhões. Os maiores acionistas da
      Kroton são os fundos  BlackRock [3] , JP Morgan Asset Management, Capital
       World, Invesco e Coronation" – escreveu Gustavo Gindre. Em 2017, a Kroton
      tentara comprar a Estácio de Sá, numa das oito operações que o Conselho
      Administrativo de Defesa Econômica (Cade) vetou entre 4,5 mil analisadas
      desde 2011. Interlocutores privilegiados da socialdemocracia alemã que
      tantos revolucionários matou (Rosa Luxemburgo, por exemplo) em 1918-19 e
      1974-77, Tarso e FH-2 promoveram a demonstração empírica da tese do melhor
      economista que ela teve: Rudolf Hilferding, que, antes de renegar o
      marxismo, concluiu que a dependência do crédito leva à fusão entre o
      capital bancário e o industrial (ou, no caso, de serviços) sob controle
       dos operadores financeiros e à monopolização total de cada ramo de
      atividade.
       Com um crescimento de 22.130% no lucro da Kroton de 2010 a 2015, dois de
      seus sócios, Walfrido Mares Guia e Antonio Carbonari Netto foram os maior
       doadores do caixa 1 das campanhas, respectivamente, de FH-2 à prefeitura
       de São Paulo, em 2016, e de Maria do Rosário – casada com um capanga que
      Tarso levou ao MEC e serviria também a FH-2, Eliezer Pacheco – à Câmara
      federal, em 2010 (em 2014, o doador foi a própria Kroton). Já a
      Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) contratou o chefe de gabinete de
      Tarso e adjunto de FH-2 na secretaria executiva do MEC, Jairo Jorge, assim
      que ele deixou o cargo, pagando-lhe, em valores de hoje, R$ 20 mil mensais
      e R$ 800 mil por "consultoria", como revelou Naira Hofmeister no  Extra
      Classe  de 12/2009.
       Aos estudantes, o Fies proporciona um diploma e uma dívida – ou só a
      dívida, caso não concluam o curso.

       11 
      Na cidadela do capitalismo (os EUA), é considerado um problema grave que
       os jovens se formem devendo dezenas ou centenas de milhares de dólares e
       precisem aceitar empregos que, de outro modo, recusariam. Aqui, farsantes
      como FH-2 dizem que isso é uma conquista.
       Quem faz isso possível? Uma direita tão ou mais canalha, para quem o mal
      que o PT fez foi dar vida mansa às vítimas desse arranjo e que defende
      agora, pela boca de Geraldo Alckmin e Gustavo Franco, a cobrança de
      mensalidades no ensino público; e uma "esquerda" incapaz de exigir uma
      reforma que a Argentina fez entre 100 e 65 anos atrás.
       O livre ingresso (e, em sua falta, o exame de suficiência) não são pautas
      maximalistas. Não garantem sequer possibilidade plena de concluir o curso
      ante as barreiras que o capitalismo impõe até em seus países centrais (a
      alta evasão subsiste na França). Nem tocam no problema central da
      universidade brasileira, que não é de onde seus alunos vêm, mas para onde
      vão, a quem servem após formados. Muito menos na iniquidade de ser aqui o
       ensino superior caminho quase único da ascensão social e esta a única via
      para melhorar de vida, como se os filhos de operários e camponeses não
      tivessem direito a viver melhor em sua classe de origem, mas só saindo
      dela – algo que deveria ser escolha guiada pela vocação, não imperativo
      material ou de status.
       São apenas o mínimo a esperar de um reformismo digno desse nome, até
      porque a Constituição preconiza o exame de suficiência ao assegurar o
      acesso ao ensino superior (graduação e pós) "segundo a capacidade de cada
       um" (art. 208, V), e não segundo o número de alunos que a burocracia
      universitária estatal queira ter.

       12 
      Nenhuma outra instituição do Estado brasileiro decide quantas pessoas
      atenderá. É indefensável que a universidade se interponha entre a demanda
      social por profissionais e o anseio das pessoas por formação. Na
      Argentina, apenas a ditadura genocida de 1976-83 fez isso: nem Onganía e
      Menem foram além de permitir os exames de suficiência que o reformismo de
      Cristina Fernández de Kirchner tornaria a abolir em 2015.
       A história da restrição do acesso ao ensino superior público brasileiro é
      também a da recusa da burocracia docente a sair da guilda e viver na
      república. Ela se mantém coesa pela escassez de seus membros e pelo férreo
      controle sobre a seleção deles.
       O que areja a universidade argentina e sustenta as conquistas da reforma
      de 18 é a amplitude do acesso. Ela torna necessário um número muito maior
      de professores, tirando de pessoas e grupos o monopólio de disciplinas,
      reduzindo seu poder sobre os estudantes e inviabilizando o grau de tirania
      que professores mais antigos e titulados exercem aqui sobre colegas mais
      jovens e alunos de pós-graduação – nível no qual tampouco vigora, lá, o
      sistema de número fechado, embora haja seleção por suficiência.
       As próprias perspectivas profissionais dos pós-graduandos – que, em
      geral, aspiram a um cargo docente – são afetadas pela perversa pirâmide em
      que se reestruturou, nos governos petistas, o ensino superior brasileiro.
      Hoje, o doutorado é um requisito inelidível para as pouquíssimas vagas
      docentes das universidades federais e um obstáculo intransponível a um
      emprego nas particulares incubadas pelo Fies/ProUni: só em 2011, a Kroton
      demitiu 1.500 doutores e mestres para reduzir custos e aumentar o lucro de
      seus acionistas.

       13 
      Só à luz da iniquidade do regime de número fechado se pode avaliar a
      política de cotas e a conduta das frações liberais e petistas do movimento
      negro, que defendem um sistema em que entram  alguns  negros (por certo,
      mais que antes) na universidade pública, e não outro em que entrariam
       todos  os negros – e brancos, orientais, indígenas e mestiços – que o
      desejassem ou, ao menos, que atingissem a nota mínima.
       O mesmo se aplica às cotas para alunos de escolas públicas e com renda
      [2] familiar até 1,5 salário mínimo  per capita.  Elas mudaram o perfil do
      alunado de alguns cursos (outros já tinham esse setor social como seu
      público), mas a distribuição mais justa de vagas escassas teve por
      premissa a renúncia a reverter a injustiça maior, que é a própria
      escassez.
       NR
       [1] Pilantrópica: amálgama de pilantra+filantrópica
       [2] No Brasil chamam de renda a qualquer tipo de rendimento.
       [3] BlackRoch: Trata-se do mesmo fundo abutre que em Portugal comprou o
      Novo Banco (ex-BES) por preço negativo. 
      [*] Jornalista.
       O original encontra-se em  anovademocracia.com.br/... 
In
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/brasil/universidade_07set18.html#asterisco
8/9/2018