sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Crise sistémica global 2015



As dinâmicas do futuro afastam a Europa das lógicas de guerra do Ocidente
por GEAB [*]

Desde 2006 o GEAB analisa a evolução e antecipa as etapas vindouras
daquilo a que as nossas equipes chamaram desde o princípio de "crise
sistémica global". O facto de que estejamos mesmo em "crise" desde 2008 já
não desperta dúvidas a ninguém. Que esta "crise" seja "global" é
igualmente admitido por toda a gente. Mas terá o mundo bem compreendido a
a dimensão "sistémica" desta crise?

A parte visível desta mudança de sistema sobre a qual todo o mundo agora
concorda é o surgimento de novos actores internacionais muito importantes
que põem em causa a ordem mundial instaurado pelo Estados Unidos durante o
colapso do bloco soviético.

É assim que no GEAB falamos desde há muito desta tendência pesada de
multipolarização do mundo que impõem reformas as instâncias internacionais
existentes ou/e, em caso de fracasso neste ponto, inventar uma nova
governação mundial (um processo de invenção no qual consideramos que a
Europa tinha um papel histórico a desempenhar tendo em conta a sua
experiência única de integração de entidades estatais de portes e
naturezas diferentes).

Mas há uma outra tendência pesada que cada um admitirá o carácter
profundamente reestruturante, é a Internet que, para além da sua
contribuição para facilitar os intercâmbios comerciais e para a
globalização das economias, conecta de facto num corpo social orgânico a
totalidade da humanidade graças a um "sistema" em rede profundamente
diferente dos sistemas piramidais herdade do século XIX que oficialmente
ainda fundamentam nossos "sistemas" sócio-político-institucionais
nacionais, inter-nacionais e supra-nacionais [1] .

Estas duas grandes tendências combinadas ajudam a fazer uma ideia do que
se parecerá o mundo de amanhã: um corpo social em rede amplamente
auto-organizado e para o qual falta inventar o modelo
institucional-político de governação. Adivinha-se neste enunciado da
problemática com a qual o mundo está confrontado que este modelo
consistirá de pequenas estruturas planas de coordenação política [2]
integradas às redes humanas que actuarão dentro das suas competências
administrativas [3] .

Mas antes de este sistema ser oficializado, toda a dificuldade consiste em
integrar estas dinâmicas do futuro no antigo sistema piramidal... ou em
desembaraçar-se delas. Nossa equipe considera que é a este combate que o
mundo assiste actualmente: lógicas de império vs combinação de entidades
políticas entre elas, democracia representativa vs participação cidadã
directa organizada, pirâmides vs redes, colonização militarizada vs
comércio globalizado e regulado, sistemas nacionais vs sistemas
pós-nacionais, petróleo contra energias renováveis, economia pesada vs
economia digital, bancos vs fluxos financeiros, empregos vs actividade
profissional on line, instituições ONU vs clube BRICS, etc.

Os actores do mundo de antes, devido sobretudo a uma total incompreensão
das molas características da sociedade de amanhã, actualmente recorrem a
todas as ferramentas clássicas de dominação (finança, exército, religião
ou ideologia) para bloquear a evolução "natural" do mundo. Este combate
está destinado ao fracasso, isto é uma certeza, mas conforme a velocidade
com que estes actores se fundirem ao novo modo de organização, os danos
infligidos à humanidade podem ser consideráveis.

Foi neste panorama de transformação sistémica do mundo que a nossa equipe
quis apresentar a sua análise habitual da actualidade recente: a
influência da China e dos BRICS sobre a actualidade económica e
geopolítica, fim do impasse euro-russo em meio ao arsenal ucraniano, crise
cadiaca dos Estados-nação na Europa, esperança de ressurreição ao nível
europeu.

A globalização à chinesa retoma seu curso

No mês passado nossa análise dizia que o mundo estava a tornar-se chinês.
Este mês, um certo número de acontecimentos internacionais mostra-nos o
que isto muda em matéria de governação mundial:
pela primeira vez os Estados Unidos aceitam reduzir suas emissões de
carbono em 28% no horizonte 2025 no quadro de um acordo americano-chinês
sobre o aquecimento climático [4] . Nota-se neste acordo que na
realidade ele é muito mais constrangedor para os americanos do que para
os chineses os quais não se comprometem senão a reverter o aumento das
suas emissões em 2030! Ainda que seja provável que o Congresso se recuse
a votar uma tal orientação estratégica, este acordo constitui o primeiro
do género em que uma negociação bilateral implicando os Estados Unidos é
assinado em benefício do outro. Este acordo integra além disso um
princípio de realidade: os chineses emitem 7 toneladas de CO2 por ano e
por pessoa ao passo que os americanos emitem 16. Desde há muito, todo o
mundo sabe que cabe aos Estados Unidos fazer um verdadeiro esforço; mas
desde há muito os Estados Unidos preferem dar prioridade aos números das
emissões acumuladas pela China inteira com o objectivo real de utilizar
a agenda ambiental [NT] para fazer pressão contra o desenvolvimento da
China e a explosão do seu consumo de petróleo (com o risco de lançar os
preços demasiado altos).


na semana passada, a cimeira da APEC que ocorreu em Pequim nos dias 8-10
de Novembro assinala avanços consideráveis em todos os domínios e o
papel líder da China nestas dinâmicas [5] : o acordo ambiental EUA-China
de que se acaba de falar, mas também a liberalização do comércio em
todas as direcções com acordos em matéria de vistos, câmbio, segurança,
ambiente e comércio entre os Estados Unidos e a China, um tratado de
livre comércio entre a China e a Coreia do Sul (no entanto um aliado
estratégico do famoso "eixo" americano na Ásia), elementos de
apaziguamento nas disputas territoriais entre a China e diferentes
países do Sudeste asiático (Filipinas, Japão, Vietname), dentre os quais
a boa vontade de Abe Shinzo em acalmar o jogo. De facto, a agenda da
globalização retoma seu curso, conduzida desta vez pela China, o que
muda tudo.


à margem desta Cimeira APEC, a China e o Canadá desta vez comprometem-se
num acordo de 2,5 mil milhões de dólares de contratos e sobre
intercâmbios em yuan. Se no mês passado a Europa e a Rússia foram
objecto do mesmo tipo de sedução por parte da China, este mês era
portanto a vez da América do Norte... com a diferença de que os chineses
não têm necessidade de ir até eles; foram eles que se deslocaram.


mesmo a Cimeira ASEAN de 9 a 13 de Novembro na Birmânia, terreno minado
para os chineses tendo em conta a importância das disputas territoriais
na relação China-ASEAN, permite registar importantes eixos de resolução,
a começar pelo reconhecimento da legitimidade dos chineses em reclamar
uma resolução bilateral destas disputas [6] , um tratado de Amizade
China-ASEAN, tudo isso consagrado por um empréstimo de 20 mil milhões de
dólares por parte da China...


a Cimeira do G20 de 15 a 16 de Novembro em Brisbane, Austrália, tem como
desafio declarado chegar a iniciar finalmente uma reforma das
organizações internacionais à guisa de prova da sua utilidade. O G20,
enquanto fórum representativo do mundo do século XXI, não sobreviverá a
um fracasso quanto a este ponto. Com este ultimato legítimo, os BRICS
portanto tomam o controle da agenda do G20 que se vê arrastado a uma
busca de solução para o bloqueio pelo Congresso americano da reforma, em
particular do FMI (devendo consagrar o papel acrescido dos países
emergentes e a duplicação do seu capital [7] . O método para resolver o
bloqueio já está previsto: um recorte hábil dos objectivos de reforma em
lugar de um projecto de reforma em bloco permitirá passar pela votação
da maioria e contornar o direito de veto americano. O repto está
lançado, assim como as soluções; esperemos que mesmo o G20 seja
finalmente capaz de produzir resultados sob o governo dos BRICS neste
final de 2014.


do lado da OMC, há esta vitória espantosa da Índia que consegue impor
seus pontos de vista na negociação dos acordos de Bali. Sem que houvesse
sequer necessidade de reescrever o acordo, a Índia viu aceites suas
condições para não por em causa seu programa de segurança alimentar e
pode assinar o acordo. Há que dizer que neste acordo a OMC jogava a sua
sobrevivência [8] .


quanto ao Irão, os russos e os chineses, assim como os alemães, pesam
muito na negociação para obter um acordo a 24 de Novembro que permita
finalmente desbloquear a situação, levantar as sanções e permitir ao
Irão fazer a sua entrada na cena internacional... e poder desempenhar o
papel que lhe cabe na pacificação do Médio Oriente. Antecipamos que,
apesar das dificuldades (9), será alcançado um acordo a 24 de Novembro.
Tudo isso em apenas um mês! O mundo parece reinicializar, conduzido pelas
dinâmicas dos emergentes. Ele é multipolar, pacífico, aberto e o Ocidente
ali também tem o seu lugar.
Notas:
[1] Constata-se nesta terminologia que o Estado-nação sempre constitui o
último ponto de referência institucional-político.
[2] Cuja legitimidade democrática está por inventar
[3] À guisa de exemplo, o secretariado de coordenação das políticas da
Comunidade dos Europeus (CE) poderia consistir numa pequena entidade
descentralizada (composta por um punhado de indivíduos, que não têm sequer
necessidade de estarem reunidos num lugar comum) a trabalharem em rede
para coordenar a execução das acções decididas no quadro de um sistema
legítimo de tomada de decisão (nosso objectivo aqui é mostrar a que ponto
do sistema de 2030 será diferente do actual, não o de dar uma imagem do
que ele será exactamente).
[4] Fonte: EUObserver , 12/11/2014
[5] Vale a pena ser lido este artigo de The Economist , que vai
inteiramente no nosso sentido.
[6] Reparando o intervencionismo americano (nomeadamente) no assunto.
Fonte: Reuters , 13/11/2014
[7] Fonte: China Post , 09/11/2014
[8] Fonte: Deccan Chronicle , 14/11/2014
[9] O número de Setembro do GEAB , em particular, apresentou uma análise
pormenorizada da importância que existe em integrar o Irão na estratégia
de paz no Médio Oriente.

[NT] Os autores confundem ambiente com clima. As negociações do CO2
referem-se ao hipotético aquecimento global e nada têm a ver com ambiente.


15/Novembro/2014
[*] Global Europe Anticipation Bulletin.

O original encontra-se em www.leap2020.eu/...

Este comunicado público encontra-se em http://resistir.info/ .

http://www.resistir.info/crise/geab_89.html#nt

21/Nov/14

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