sábado, 6 de fevereiro de 2021

Crepúsculo: a erosão do controle dos EUA e o futuro multipolar

 



In
TRICONTINENTAL
https://www.thetricontinental.org/pt-pt/dossie-35-crepusculo/
4/1/2021

RESISTIR.INFO 

https://www.resistir.info/eua/crepusculo_04jan21.html
4/1/2021


/A História frequentemente se move em saltos, solavancos e em ziguezague/.

– Friedrich Engels, /Das Volk/, n.16, 20 de agosto de 1859

 

Em 1492, quando Cristóvão Colombo chegou ao Caribe, a história começou a
dividir-se em duas. Antes desse momento, nenhum império havia tido
alcance planetário. A partir daquele ano, as grandes potências europeias
passaram a dominar o mundo e, a partir do final do século XVII, essa
dominação foi organizada e legitimada em nome da ideia de raça, uma
construção com consequências catastróficas para a humanidade.

A autoridade colonial enfrentou constante resistência. Os intelectuais
colonialistas imaginavam a si mesmos como figuras da Grécia Antiga, como
Hércules guerreando contra a monstruosa Hidra de Lerna – rebeliões no
mar, nas /plantations/, nas montanhas e florestas, nas tabernas dos
portos, nas terras comuns que sobreviveram fora do alcance do poder
colonial e nos novos espaços insurgentes criados por aqueles que
fugiam[1] <#_ftn0>. Quando o capitalismo, enraizado na /plantation/
colonial, começou a agarrar o planeta com seus tentáculos, a fábrica e a
cidade tornaram-se locais-chave de luta.

Se houve uma revolução que marcou o início do fim da época colonial e
que inaugurou uma nova civilização liderada pelos trabalhadores, essa
foi a Revolução Haitiana de 1804. Os africanos escravizados derrotaram
as quatro maiores potências europeias da época, conquistaram sua
liberdade e declararam uma República independente. Essa revolução foi
rapidamente interrompida. Em 1825, os franceses enviaram doze navios de
guerra para exigir que a nova República pagasse uma indenização aos
ex-proprietários das /plantations/, cujo valor seria equivalente a mais
de 20 bilhões de dólares hoje[2] <#_ftn1>. A afirmação da liberdade foi
recebida com a imposição de dívidas, uma tática de dominação neocolonial
que seria explorada impiedosamente contra as lutas de libertação do
século seguinte.

A Segunda Guerra Mundial, resultado da tentativa dos fascistas alemães
de retornar às práticas coloniais europeias, levou as potências do velho
continente a uma terrível conflagração que as deixou, ao final,
gravemente enfraquecidas.  Foram então os EUA, a mais poderosa colônia
europeia de povoamento, que assumiram a gestão neocolonial do planeta.
Agora, quase oitenta anos depois, a primazia dos EUA entra em seu
crepúsculo. Alguns intelectuais estadunidenses, remontando à Grécia
Antiga, argumentam que a ascensão da China ameaça os EUA e torna a
guerra inevitável. Essa teoria, conhecida como a armadilha de Tucídides,
é extraída do argumento da /História da Guerra do Peloponeso,/ em que a
ascensão de Atenas levou Esparta a uma guerra necessária em defesa de
seus interesses.² Os EUA impuseram um conflito hostil à China e a outros
países que consideram uma ameaça. A China não pretende suplantar os EUA,
mas apenas inaugurar uma ordem mundial multipolar.

A ideia de uma armadilha de Tucídides faz parte da guerra híbrida que
agora domina o planeta.

Este dossiê n. 36 (jan. 2021) explora o surgimento de uma nova guerra
fria imposta pelos Estados Unidos à China e as formas de guerra híbrida
que têm sido utilizadas como parte desse novo cenário estratégico.

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    *Parte 1: o século estadunidense*

 

A equipe de Planejamento de Políticas do Departamento de Estado dos EUA
distribuiu um memorando, no final da década de 1940, no qual argumentava
que “buscar menos que um poder preponderante é optar pela derrota. O
poder preponderante deve ser o objeto da política dos Estados Unidos”[3]
<#_ftn2>. Estes emergiram da terrível violência da Segunda Guerra
Mundial como a economia mais poderosa, com uma infraestrutura intacta e
uma força militar impressionante que possuía a arma mais perigosa: a
bomba nuclear. O país fez uso dessas vantagens para estabelecer uma
série de instituições cujo objetivo era estender o poder dos EUA
globalmente. Entre elas, instituições políticas multilaterais (como as
Nações Unidas), instituições econômicas multilaterais (como o Fundo
Monetário Internacional e o Banco Mundial), instituições de segurança
regionais (como a Organização do Tratado do Atlântico Norte, a
Organização do Tratado Central e a Organização do Tratado do Sudeste
Asiático) e instituições políticas regionais (como a Organização dos
Estados Americanos).

Os EUA agiram rapidamente para conter os novos Estados que emergiram das
lutas anticoloniais. Patrice Lumumba, recém-eleito presidente do Congo,
foi assassinado em um complô apoiado por Washington em 1961. Movimentos
radicais foram combatidos de forma impiedosa. Na Indonésia, mais de um
milhão de pessoas foram assassinadas enquanto militares, agindo com o
apoio estadunidense, tentavam destruir o Partido Comunista da Indonésia
e sua base de apoio após o golpe de 1965[4] <#_ftn3>.

A União Soviética e outros Estados comunistas, bem como setores radicais
das forças anticoloniais no Terceiro Mundo, funcionaram como um freio
parcial às ambições dos EUA. Quando a URSS começou a se fragmentar em
1990, esse escudo desapareceu e o acelerador da primazia dos Estados
Unidos atingiu a velocidade máxima. O /US Defense Planning Guidance/
[Orientações para o planejamento de defesa], de 1990, presidido por Dick
Cheney, deixou evidente sua agenda:

Nosso primeiro objetivo é evitar o ressurgimento de um novo rival, seja
no território da ex-União Soviética seja em outro lugar […] Esta é uma
consideração dominante subjacente à nova estratégia de defesa regional e
exige que nos esforcemos para impedir qualquer potência hostil de
dominar uma região cujos recursos seriam, sob controle consolidado,
suficientes para gerar poder global. […] Nossa estratégia deve agora
voltar a se concentrar em impedir o surgimento de qualquer potencial
futuro competidor global.[5] <#_ftn4>

Em 2000, o Projeto para um Novo Século Americano publicou /Rebuilding
America’s Defenses/ [Reconstruindo as defesas estadunidenses]. O
relatório informou que a primazia dos EUA “deve ter uma base segura na
inquestionável preeminência militar dos EUA”[6] <#_ftn5>. O
financiamento para as Forças Armadas dos EUA expandiu astronomicamente
antes do ataque da Al Qaeda em 11 de setembro de 2001. Em 2002, a
/Estratégia de Segurança Nacional/ dos /Estados Unidos da América, /do
presidente George W. Bush, afirmava que “Nossas forças serão fortes o
suficiente para dissuadir adversários em potencial de buscar um aumento
militar na esperança de superar ou igualar o poder dos Estados
Unidos”[7] <#_ftn6>. Em 2019, os gastos militares dos EUA – 732 bilhões
de dólares[8] <#_ftn7> (1 trilhão se adicionarmos o orçamento de
inteligência em grande parte sigiloso, mas estimável) – eram maiores que
os dez países seguintes juntos. Todo inventário de armas conhecido
mostra que os EUA têm uma capacidade muito maior de causar estragos do
que qualquer outro país; mas o setor de segurança dos Estados Unidos
agora entende que, embora possa mandar aos ares um país, não pode mais
subordinar todos os países apenas por meio do poderio militar.

Os EUA usaram seu sistema de aliança anterior do tipo /hub and spokes
/[centros e raios] para estender e consolidar seu poder global. Alguns
pilares-chave desse sistema precisam ser claramente compreendidos:

 1. Os Estados Unidos estavam no centro, enquanto seus principais
    aliados (Reino Unido, França, Alemanha, Japão e outros) eram seus
    raios. No limite externo desses raios estavam seus aliados
    subsidiários, como Colômbia, Egito, Israel, Arábia Saudita,
    Tailândia e outros. Esses aliados continuam sendo essenciais para o
    alcance global do poder dos EUA, uma vez que operam contra
    adversários com total apoio de Washington e fornecem aos militares
    estadunidenses bases, inteligência e capacidade logística. Qualquer
    desafio colocado a esses aliados é rapidamente eliminado com toda a
    força, conforme ficou evidente no ataque ao Iraque (1991) e no Plano
    Colômbia (1999).
 2. O surgimento de qualquer “futuro competidor global em potencial”,
    como o /US Defense Planning Guidance/ [Orientações para o
    planejamento de defesa] de 1990 afirmava, deveria ser detido por
    meio do sistema de alianças. A pressão foi construída ao redor da
    China e Rússia por meio da expansão da Otan na Europa Oriental e com
    o aumento das forças dos EUA na região da Orla do Pacífico. A
    eleição de Hugo Chávez na Venezuela (1998), o surgimento de um novo
    conjunto de líderes sul-americanos de esquerda e um novo impulso
    para a integração regional (como a Aliança Bolivariana para as
    Américas – Alba) precisavam ser desestabilizados. Esse desafio
    começou com uma tentativa de golpe militar contra o governo de
    Chávez em 2002. Dois anos depois, Jean-Bertrand Aristide, o
    presidente haitiano progressista eleito por uma maioria esmagadora,
    foi derrocado com sucesso por um golpe apoiado pelos Estados Unidos.
    A isso se seguiram as guerras híbridas.
 3. A cadeia global de /commodities/ desenvolvida para beneficiar as
    corporações multinacionais ocidentais precisava ser protegida a todo
    custo. A revolução eletrônica trouxe uma nova era que viu a
    capacidade de um computador dobrar a cada 18 ou 24 meses. Entre 1955
    e 2015, o poder de um computador aumentou mais de um trilhão de
    vezes. Novas forças produtivas inauguraram o fim do velho sistema
    fabril industrial, centralizado e grande. O Congresso dos Estados
    Unidos estendeu as leis de propriedade intelectual para proteção de
    direitos autorais primeiro para 28 anos em 1976 e depois para cem
    anos em 1998. Esse sistema pernicioso foi aprovado pela Organização
    Mundial do Comércio em 1994.
    A habilidade de desmontar grandes fábricas, distribuí-las
    globalmente e introduzir sistemas de depósito /just-in-time/ minou a
    soberania nacional e o poder sindical. O poder diplomático e militar
    foi implantado para garantir que nenhuma alternativa a esses
    arranjos seria possível. Mecanismos como a Guerra às Drogas e a
    Guerra ao Terror foram usados para atacar quaisquer enfrentamentos à
    cadeia global de /commodities/ que começou nas “zonas de sacrifício”
    onde as matérias-primas são extraídas ou cultivadas.
 4. O complexo Dólar-Wall Street, que dominou os sistemas econômicos e
    financeiros por décadas, não poderia ser desestabilizado por novas
    moedas globais que poderiam representar uma ameaça ao complexo
    Dólar-Wall Street de várias maneiras: poderiam ser usadas como
    reservas e para transações que prejudicariam o dólar; poderiam ser
    usadas por novos bancos de desenvolvimento ou por procedimentos que
    enfraqueceriam o FMI e o Banco Mundial; ou ainda serem usadas por
    novas instituições financeiras para contornar as redes financeiras
    dominadas pelo Ocidente e enraizadas no Departamento do Tesouro dos
    Estados Unidos, nos bancos financeiros do eixo Wall Street-City de
    Londres e Frankfurt e nas redes de transferência de dinheiro (como a
    do sistema SWIFT sediado na Bélgica).

A guerra ilegal dos EUA no Iraque (2003) e a crise de crédito (2007)
mostraram o enfraquecimento do poder dos EUA. A máquina militar dos EUA
poderia facilmente destruir as instituições de um país – como ficou
demonstrado no Iraque em 2003 e na Líbia em 2011 –, mas não poderia
subordinar suas populações. Batalhas podiam ser vencidas, mas não
guerras de longo prazo.

A crise de crédito revelou o enfraquecimento interno da economia dos
EUA, onde principalmente o consumismo induzido pelo crédito permitiu que
o mito do “sonho americano” permanecesse intacto mesmo com a estagnação
dos salários e com uma crise estrutural de empregos afligindo a vida da
classe trabalhadora e até mesmo da classe média. Entre 1979 e 2018, a
média anual dos salários por hora nos EUA, em dólares constantes,
diminuiu[9] <#_ftn8>. Essas fraquezas levaram a um debate sobre o
declínio dos EUA, embora seus reservatórios da dominação – como o poder
militar, econômico, financeiro e cultural ou “soft power” –
permanecessem intactos. Os presidentes George W. Bush, Barack Obama e
Donald Trump não conseguiram reverter a queda da economia estadunidense,
mais uma vez mantida pela autoridade global do dólar, entre outros
processos.

Em seu discurso de inauguração, em 2017, Trump lamentou a “carnificina”
que atingiu a classe trabalhadora e a classe média nos EUA, que viviam
próximas a “fábricas enferrujadas espalhadas como lápides pela paisagem
de nossa nação”[10] <#_ftn9>. A solução de Trump para essa “carnificina”
foi cinicamente racista, culpando os migrantes sem documentos (e o
México), bem como o roubo de propriedade intelectual e a produção
subsidiada no exterior (e na China). A agenda de Biden não tem nada
substancial a dizer para além do que já disseram Bush, Obama e Trump:
reconstruir a economia dos EUA e usar seu poder para defender seus
interesses. Como observou o /site/ da campanha de Biden, “Biden nunca
hesitará em proteger o povo americano, inclusive, quando necessário,
usando a força. Temos os militares mais fortes do mundo – e como
presidente, Biden garantirá que continue assim”[11] <#_ftn10>.

Os EUA estão se aproximando de uma posição em que não serão mais a maior
economia do mundo, seja qual for a medida, em um futuro próximo. Em
paridade de poder de compra (o fluxo físico real de bens e serviços), a
economia da China já é 16% maior que a dos EUA. Em 2025, o FMI projeta
que será 39% maior. Como acontece com quase todos os países em
desenvolvimento, o tamanho da economia chinesa é subestimado quando
calculado segundo taxas de câmbio atuais, mas já é 73% do tamanho da
economia dos EUA nas taxas de câmbio atuais e, com base nas projeções do
FMI, esse número saltará para 90% em 2025.

No final da década, o PIB da China será maior do que o dos EUA, não
importa como for medido. Já sentimos a mudança. Lojas e /shopping
centers/ trazem ainda as características da cultura dos Estados Unidos,
mas seus produtos são feitos na China. Em outras palavras, os EUA
continuam definindo a /forma/, mas a China já fornece o /conteúdo/.
Gradualmente, a forma ficará alinhada ao conteúdo. Uma década atrás, a
China tinha pouquíssimas marcas globalmente conhecidas, mas agora
Huawei, TikTok, Alibaba e outras são conhecidas em todo o mundo e alvo
de comentários diários nos editoriais de economia.

A reação a esses fatos assumiu muitas formas, das quais as mais comuns
são também as mais extremadas. Há uma literatura de /catastrofismo/, uma
antecipação do colapso dos EUA de sua posição de grande potência. Essa
visão é que a implosão da economia dos EUA – que hoje luta diante da
pandemia, apesar das altas em Wall Street e das injeções de crédito do
Federal Reserve – levará a uma perda de poder estrutural por parte das
instituições dirigidas pelos EUA e ao aumento do uso do poder militar
para manter a autoridade do país. Em contraste está a literatura do
/renascimento/, geralmente com base em esperanças e projeções de um
segundo “século americano” na ausência de dados sérios. Essa visão
sugere que a economia dos EUA é resiliente e o poder do dólar,
sacrossanto, além de uma fé inabalável na engenhosidade das empresas
sediadas nos EUA que seriam capazes de destruir criativamente antigos
setores simplesmente para que voltem a crescer – como uma fênix – com
novas invenções para impulsionar o país. O poderio deste, acredita-se,
não deriva da General Motors de ontem (agora voltada a serviços
financeiros, além de seu papel histórico como uma empresa de
automóveis), mas da Microsoft de amanhã.

Nenhuma dessas visões – colapso ou renascimento – é completa. Ambos
possuem elementos de verdade, mas apenas parcialmente. Há uma grande
debilidade na manutenção da primazia dos EUA, evidenciada pelo fracasso
dos EUA em impedir os avanços científicos e tecnológicos da China –
entre outros países – o que ameaça o monopólio que os EUA têm sobre a
inovação tecnológica. É essa alta tecnologia e o monopólio da renda da
propriedade intelectual que impulsionam a economia estadunidense. O
conflito com a China é decorrente do reconhecimento, por uma grande
parte da elite dos EUA, de que o crescente avanço científico e
tecnológico do país asiático é uma ameaça existencial à sua primazia. O
“giro para a Ásia” de Obama, em 2015, foi baseado no temor desse aumento
e na percepção de que não haveria um Gorbachev chinês para destruir a
China internamente.

A ascensão da China representa uma ameaça existencial à hegemonia
estadunidense. Assim como a dominação europeia inaugurada em 1492, as
tentativas dos EUA de preservar seu domínio global podem ser lidas em
termos raciais.

O declínio histórico dos EUA está ocorrendo enquanto ele ainda possui
grandes reservas históricas; haverá um longo período no qual os EUA
continuarão a realizar contra-ataques diante de seu declínio. Não por
acaso a obra /Sobre a guerra prolongada/ de Mao Zedong voltou a ser uma
das mais citadas na China.

 


    *Parte 2: A Guerra na Eurásia*

The War in Eurasia

Em abril de 2019, o Comando Indo-Pacífico dos Estados Unidos divulgou um
documento intitulado /Regain the Advantage/ [Retomar a vantagem], no
qual apontava para a “nova ameaça de competição que enfrentamos das
Grandes Potências. […] Sem um impedimento convencional válido e
convincente, China e Rússia serão encorajadas a atuar na região para
suplantar os EUA e seus interesses”. O almirante Philip Davidson, líder
do Comando Indo-Pacífico, pediu ao Congresso que financiasse “forças
combinadas rotativas e avançadas” como a “forma mais confiável de
demonstrar aos EUA compromisso e determinação com potenciais
adversários”[12] <#_ftn11>. O relatório tem um espantoso ar de ficção
científica e expressa o desejo de criar “redes de ataque de precisão com
alta capacidade de sobrevivência” ao longo da Orla do Pacífico, com
mísseis – incluindo ogivas nucleares – e instalações de radar de Palau
[arquipélago no oeste do Pacífico] ao espaço sideral. Novos sistemas
bélicos já em desenvolvimento aumentariam a pressão dos EUA sobre a
China e a Rússia ao longo de seus litorais. Essas armas incluem mísseis
de cruzeiro hipersônicos, que reduzem o tempo de ataque contra alvos
chineses e russos para minutos após o lançamento.

Após o colapso da URSS e do sistema estatal comunista, os EUA
descobriram que podiam exercer seu poder sem grandes entraves. Por
exemplo, poderiam bombardear o Iraque e a Iugoslávia, e pressionar por
um sistema de comércio e investimento que favorecesse seus aliados. Toda
a década de 1990 pareceu uma volta da vitória, com os presidentes George
H. W. Bush e Bill Clinton exibindo-se em reuniões internacionais,
sorrindo para as câmeras e garantindo que todos vissem o mundo através
de seus olhos, ao passo que mantinham os “Estados rebeldes” (Irã e
Coreia do Norte, por exemplo) na mira de suas armas. Naquele momento,
China e a Rússia aparentemente estavam comprometidas com a liderança dos
EUA.

Nas décadas seguintes, muita coisa mudou. O crescimento econômico da
China foi espetacular. A renda disponível /per capita/ em termos reais
cresceu 96,6% apenas no período 2011-2019[13] <#_ftn12>. Em 23 de
novembro último, a China anunciou que havia eliminado a pobreza absoluta
em todo o país e usou seu alto nível de investimento para construir
infraestrutura dentro do país. Utilizou também sua enorme quantidade de
câmbio estrangeiro em auxílios para todo o mundo por meio da Iniciativa
de Cinturão e Rota, iniciada em 2013. Enquanto os EUA estavam atolados
em suas guerras no Afeganistão, Iraque e outros lugares, a China
construiu um sistema de comércio  que liga grandes partes do mundo à sua
locomotiva econômica. Durante a pandemia de covid-19, a China foi a
primeira a quebrar a cadeia de transmissão e a retomar a atividade
econômica quase normal. Como consequência, o FMI projeta que quase 60%
do PIB global estimado em 2020-2021 será devido ao crescimento chinês.

A chave para o novo período não é apenas seu dinamismo econômico, mas
seus vínculos estreitos com a Rússia. As novas conexões impulsionadas
pela Iniciativa de Cinturão e Rota estão ocorrendo ao longo do flanco
sul da Ásia para a Europa e África. Já suas ligações com a Rússia
permitem a integração ao longo do flanco norte da Ásia. Os novos laços
entre os dois gigantes asiáticos culminaram em uma série de acordos
econômicos e militares assinados nos últimos cinco anos.

Desde os primeiros anos do século XXI, os países do Sul Global –
incluindo a China – têm procurado criar instituições regionais e
multilaterais baseadas no direito internacional e em uma agenda de
desenvolvimento genuína para os povos do mundo. Essas instituições devem
transcender o período de primazia dos Estados Unidos em grande escala
que se abriu após a queda da URSS. Uma série de iniciativas desse tipo
foi desenvolvida, incluindo plataformas regionais – como a Organização
de Cooperação de Xangai na Ásia (2001) e a Aliança Bolivariana para as
Américas (Alba) na América Latina e Caribe (2004) –, bem como
plataformas mais globais – como o Diálogo Índia, Brasil e África do Sul
(Ibas) (2003) e os Brics, formado por Brasil, Rússia, Índia, China e
África do Sul (2009). A 14^a cúpula do Movimento Não-Alinhado em Havana
(2006) girou em torno da questão do regionalismo e multilateralismo. Na
reunião do Brics, em 2013, os líderes divulgaram a Declaração de
eThekwini, que resumiu o espírito dessa iniciativa, indicando seu
compromisso com a “promoção do direito internacional, do
multilateralismo e do papel central da ONU”, bem como a necessidade de
“mais esforços regionais eficazes” para acabar com o conflito e promover
o desenvolvimento.

O projeto Brics desenvolveu um conjunto de propostas para a criação de
novas instituições multilaterais em substituição às instituições
dominadas pelos Estados Unidos. Um Acordo de Reserva de Contingência,
por exemplo, foi criado para complementar o FMI com liquidez de curto
prazo para países com problemas cambiais, e um Banco Brics foi formado,
desafiando o Banco Mundial e o Banco Asiático de Desenvolvimento. Mas
todo o projeto do Brics tinha limites desde o início: não articulava
nenhuma alternativa ideológica ou política ao neoliberalismo, carecia de
instituições independentes importantes (mesmo o Acordo de Reserva de
Contingência usaria dados e análises do FMI) e não tinha capacidade
política ou militar para conter a dominação militar dos EUA.

Projetos regionais como a Alba desenvolveram formas alternativas de
integração que experimentaram construir relações interestatais e novas
instituições. Essa Aliança levou à criação de novas formações regionais,
como a União de Nações Sul-Americanas (Unasul, 2004) e a Comunidade de
Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac, 2010), e criou um novo
banco regional (BancoSul), uma nova moeda virtual (Sucre), uma nova rede
de comunicações (ancorada na TeleSur) e uma nova atitude de
independência do Sul Global em relação ao poderio estadunidense. Foi
precisamente por isso que os EUA gastaram esforços e recursos para minar
muitos dos movimentos da Alba, como por meio de um golpe à antiga em
Honduras (2009) e um golpe jurídico (/lawfare/) no Brasil (2016)[14]
<#_ftn13>. Esses ataques contra a integração social e política regional
na América do Sul, juntamente com a subordinação do hemisfério ao poder
dos EUA, têm sido as características definidoras de suas políticas
voltadas para a América Latina e o Caribe nos últimos dois séculos.

As limitações internas do projeto do Brics corroeram seu potencial
quando os acontecimentos políticos na Índia (2013) e no Brasil (2016)
trouxeram a extrema-direita ao poder. Ambos os países subordinaram
imediatamente sua política externa a Washington, sem sequer querer ser
parte de qualquer regionalismo ou multilateralismo. Não há mais a
possibilidade nem mesmo de um subimperialismo, como argumentou Ruy Mauro
Marini em 1965, já que agora essas frações da elite em lugares como
Brasil e Índia se contentavam em ocupar os postos designados pelo
Departamento de Estado dos EUA em vez de dirigir sua própria política em
suas regiões.

A saída do Brasil e da Índia de qualquer liderança efetiva do bloco
Brics veio ao lado de tensões políticas na África do Sul, onde o
ex-presidente Jacob Zuma transformou o Congresso Nacional Africano
(CNA), antes um movimento de libertação nacional, em uma cleptocracia
repressiva. Nos últimos cinco anos, o projeto do Brics não conseguiu
avançar em nenhuma agenda significativa, embora sua existência
continuada como um grupo que inclui as maiores economias em
desenvolvimento do mundo tenha algum significado. Apesar das diferenças,
China, Índia e Rússia também continuaram a cooperar na Organização de
Cooperação de Xangai.

É nesse contexto que assistimos ao crescimento da aliança chinesa e
russa, impulsionada pelos ataques dos Estados Unidos e de outras
potências ocidentais e pelo desgaste do Brics. Um grande abismo entre a
China e a Rússia havia surgido durante a disputa sino-soviética de 1956,
e as tensões entre os dois países continuaram a persistir nos anos
imediatamente posteriores à queda da URSS, com uma Moscou inicialmente
flexível olhando para o Ocidente em busca de alianças. Foi apenas em
2008 que ambas as nações finalmente resolveram uma disputa de fronteira
de longa data, abrindo caminho para os laços do período atual.

Nesse período, os legisladores dos EUA procuraram encurralar uma Rússia
enfraquecida em um projeto para cercar a China. O Ocidente exagerou e
tentou colocar a Rússia de joelhos por meio da expansão da Otan em
direção à Europa Oriental, quebrando uma promessa feita durante a
dissolução da República Democrática Alemã (RDA). O poder russo parecia
destinado a ser totalmente drenado quando o Ocidente ameaçou os dois
únicos portos de água quente da Rússia em Sebastopol (Crimeia) e em
Tartus (Síria). Um conjunto de outras ações agressivas do Ocidente
contra a Rússia – incluindo a expulsão do país do G8 em 2014 e um severo
regime de sanções instituído pelos EUA – atingiu vitais interesses
russos, ofendeu enormemente a opinião nacional russa, que estava
profundamente envolvida com os eventos na Ucrânia, e empurrou a Rússia
para um maior alinhamento com a China.

Em 2019, os presidentes dos dois países, Xi Jinping e Vladimir Putin,
falaram no Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo, uma reunião
anual de negócios iniciada em 1997, cujo escopo inclui cada vez mais a
avaliação das relações da Rússia com a Ásia, bem como com o Ocidente. Xi
e Putin falaram dos laços próximos entre seus países, enfatizando que os
dois haviam se encontrado pessoalmente pelo menos trinta vezes desde
2013. Entre os muitos acordos para incrementar o comércio, os dois
líderes concordaram em aumentar o comércio bilateral usando o rublo e o
/yuan/ – em vez do dólar – para reconciliar os pagamentos
transnacionais. Essa esnobada não foi a única coisa que alarmou
Washington. O mesmo aconteceu com o aumento nas vendas de armas entre os
dois países, que veio junto com exercícios militares conjuntos mais
frequentes: em setembro de 2018, um terço dos soldados russos participou
dos exercícios militares Vostok 2018 entre as duas potências[15]
<#_ftn14>. Em outubro de 2020, quando Putin foi questionado se formaria
com a China uma “aliança militar”, ele respondeu: “Não precisamos disso,
mas, em teoria, é perfeitamente possível imaginar”[16] <#_ftn15>.

O enfraquecimento da Rússia em termos políticos e militares certamente
fez parte da expansão da Otan para o leste, mas a China tem sido o
principal alvo econômico dos EUA e seus aliados. Em particular, há
grande ansiedade em relação ao desenvolvimento das empresas chinesas de
alta tecnologia que produzem equipamentos e softwares para
telecomunicações, robótica e inteligência artificial, entre outras. Uma
coisa era a China ser a oficina do mundo, seus trabalhadores serem
empregados por corporações multinacionais, enquanto suas próprias
empresas permaneciam no setor de tecnologia média; outra é se tornar um
importante produtor tecnológico mundial. Essa é a razão pela qual o
governo dos EUA, empurrado por empresas do Vale do Silício, foi atrás da
Huawei e da ZTE. Em abril de 2019, o Conselho de Inovação em Defesa dos
EUA observou:

O líder do 5G deve ganhar centenas de bilhões de dólares em receita na
próxima década, com ampla criação de empregos em todo o setor de
tecnologia sem fio. O 5G também tem o potencial de revolucionar outras
indústrias, já que tecnologias como veículos autônomos obterão enormes
benefícios com a transferência de dados mais rápida e maior. O 5G também
aprimorará a Internet das Coisas (IoT, sigla em inglês), aumentando a
quantidade e a velocidade do fluxo de dados entre vários dispositivos, e
pode até mesmo substituir o /backbone/ de fibra ótica usado em tantos
lares. O país que possuir 5G possuirá muitas dessas inovações e definirá
os padrões para o resto do mundo[17] <#_ftn16>.

Esse país provavelmente não será os EUA. Mesmo o Defense Innovation
Board [Conselho de Inovações em Defesa] admite que nem a AT&T nem a
Verizon serão capazes de fabricar o tipo de transmissor necessário para
os novos sistemas. Tampouco é provável que a Suécia (Ericsson) ou a
Finlândia (Nokia) consigam, já que as empresas chinesas estão muito à
frente. Essa é uma grave ameaça às perspectivas futuras da economia dos
EUA, razão pela qual o governo tem usado todos os instrumentos para
restringir o crescimento da China.

Nenhuma das acusações amplamente falsas contra as empresas chinesas (de
roubo de propriedade intelectual ou de erosão da privacidade) dissuadiu
clientes em todo o mundo. O que impediu as perspectivas comerciais
dessas empresas foi a pressão política direta dos EUA sobre os governos
para conter ou proibir a entrada da Huawei e da ZTE. Os EUA reconhecem
que o rápido crescimento tecnológico chinês é uma ameaça geracional à
principal vantagem que tiveram nas últimas décadas, ou seja, sua
superioridade tecnológica. É para evitar a ascensão tecnológica do país
asiático que os EUA têm usado todos os recursos, desde a pressão
diplomática até a militar, mas nenhuma delas parece estar funcionando.

A China, por enquanto, está decidida. Não está disposta a recuar e
desmantelar seus ganhos tecnológicos. Nenhuma resolução é possível a
menos que haja um reconhecimento da realidade: a China é igual ou mais
avançada do que o Ocidente em termos de produção tecnológica em alguns
setores, e a tendência é isso aumentar gradualmente, e não é nada que
precise ser ou possa ser revertido por meio da guerra.

Em 2001, o então vice-presidente da China, Hu Jintao, disse que “a
multipolaridade constitui uma base importante na política externa
chinesa”[18] <#_ftn17>. A China continua comprometida com a
multipolaridade, evitando qualquer perspectiva de um “século chinês”
após o “século americano”. A posição chinesa é espelhada em alguns dos
documentos estratégicos dos EUA, como o relatório do Conselho Nacional
de Inteligência dos EUA, de 2012, que afirma que “até 2030, nenhum país
– os EUA, a China ou qualquer outro grande país – será um poder
hegemônico”[19] <#_ftn18>. O que existirá, em vez disso, é um “poder
difuso”. Mas outros membros da comunidade de análise estratégica dos
Estados Unidos, como Richard N. Haass, presidente do Conselho de
Relações Exteriores, argumentam que, se os Estados Unidos não
continuarem sua “liderança” da ordem global, a alternativa “não é uma
era dominada pela China ou qualquer outro país, mas sim um tempo caótico
em que os problemas regionais e globais oprimirão a vontade coletiva
mundial e a capacidade de enfrentá-los”[20] <#_ftn19>.

A multipolaridade, ou um declínio na primazia dos EUA, afirma Haass,
trará o caos: “Os americanos não estariam seguros ou seriam prósperos em
tal mundo”, escreveu Haass em /Foreign Policy Begins at Home/ [Política
externa começa em casa] (2013). “Nossa Idade das Trevas já foi
suficiente; a última coisa que precisamos é outra”[21] <#_ftn20>. Para
liberais como Haass e neofascistas como Trump, não há substituto para a
primazia dos EUA. É esse fracasso das elites dos EUA em compreender a
inevitabilidade de um futuro multipolar que as leva a novas guerras
frias, perigosas intervenções militares e guerras híbridas de todos os
tipos.


    *Parte 3: Guerra híbrida*

 

Em 2015, Andrew Korybko publicou um livro fascinante chamado /Hybrid
Wars: The Indirect Adaptive Approach to Regime Change/ [Guerras
híbridas: a abordagem adaptativa indireta para a mudança de regime]. Por
meio da leitura de documentos militares públicos e vazados dos EUA,
Korybko expôs as várias estratégias usadas para derrubar governos tidos
como entraves ao poder dos EUA. Korybko explica o objetivo de uma guerra
híbrida citando o documento do Exército estadunidense classificado como
/Special Forces Unconventional Warfare /[Forças Especiais para Guerras
não Convencionais]: “degradar o aparato de segurança do governo (os
elementos militares e policiais do poder nacional) ao ponto em que o
governo fique suscetível à derrota”. A questão nem sempre é substituir
um governo hostil aos interesses dos EUA por outro favorável a ele. “Em
sua essência, a guerra híbrida é o caos administrado”[22] <#_ftn21>,
escreve Korybko. Um conflito de baixa intensidade que gradualmente
esvazia o país de sua resiliência e cria confusão na região é talvez o
objetivo dos tipos de conflitos que são processados por guerras de
informação e sanções, dois elementos-chave no conjunto de ferramentas da
guerra híbrida.

A guerra híbrida liderada pelos Estados Unidos se desdobra de forma mais
feroz contra o Irã e a Venezuela, países que vêm sendo enfraquecidos
pela guerra de informação e pelo caos no mercado de petróleo. O que
impede esses países de entrar em colapso diante de tal pressão são as
reservas de legitimidade produzidas por seus próprios processos sociais
e políticos. Na Venezuela, por exemplo, a mobilização regular do povo
tanto para manifestações como para o trabalho prático de reprodução
social em escala comunitária afirma a legitimidade popular de seu
processo revolucionário. As guerras híbridas nem sempre têm êxito, mas –
mesmo quando não o fazem – ameaçam os laços sociais básicos entre as
pessoas.

Com base em Korybko e em uma série de documentos do governo dos EUA,
aqui estão quatro dos aspectos mais importantes da estratégia de guerra
híbrida:

 1. *Guerra informacional*. Em 1989, William Lind, um autor que ajudou a
    desenvolver a teoria da guerra de quarta geração (um sinônimo para
    guerras híbridas), escreveu que “as notícias de televisão podem se
    tornar uma arma operacional mais poderosa que as divisões
    blindadas”[23] <#_ftn22>. Controlar informações e definir pessoas e
    eventos molda a maneira como os conflitos são entendidos. O controle
    sobre o enredo é essencial, mas esse controle não pode ser visto
    como propaganda nua e crua. A narrativa é tão cuidadosamente
    definida que tudo o que vem de um “Estado pária” é interpretado como
    falso, e o que os EUA e seus aliados dizem é visto como verdadeiro.
    Mesmo que sejam feitas declarações falsas – como a de que o Iraque
    tinha armas de destruição em massa –, elas são consideradas erros e
    não mentiras.
    Ideias racistas profundamente arraigadas são mobilizadas para
    construir certos líderes como ditadores – ou mesmo como genocidas –
    enquanto os líderes ocidentais que enviam bombardeiros para
    aniquilar cidades são vendidos como humanitários. Esse exercício
    básico de /branding/ de líderes políticos é característico do poder
    da guerra de informação. Os Estados Unidos podem ser responsáveis
    por mais de um milhão de mortos no Iraque, mas sempre será Saddam
    Hussein – e não George W. Bush – quem será visto como um criminoso
    de guerra e, portanto, merecedor de seu terrível destino. Os
    muçulmanos são sempre terroristas, os russos sempre mafiosos ou
    espiões, e o Estado considerado um adversário não é mais liderado
    por um governo, mas por um “regime”. Reivindicações
    descontroladamente desequilibradas sobre violações dos direitos
    humanos se tornam uma ferramenta central para deslegitimar
    dissidentes, seja por Estados seja por movimentos populares. Há uma
    “porta giratória” entre a Human Rights Watch, uma organização criada
    por atores dos EUA durante a Guerra Fria, e funcionários de política
    externa do governo dos EUA.
 2. *Guerra diplomática.* Remover o representante legítimo de um país de
    um órgão multilateral é uma maneira astuta de deslegitimar o governo
    do país. Os EUA retiraram Cuba da Organização dos Estados Americanos
    (OEA) em 1962 como punição exemplar a qualquer país que desafiasse
    os EUA. Mas Cuba não invadiu os Estados Unidos; foi o contrário, no
    episódio conhecido como Invasão da Baía dos Porcos, em 1961, e, se a
    Carta da OEA fosse cumprida, os Estados Unidos deveriam perder seu
    assento no organismo. Mas como este é um instrumento do poder dos
    EUA, foi Cuba quem teve que se retirar. Expulsar o embaixador,
    pressionar aliados a fazerem o mesmo, isolar o país nas Nações
    Unidas – tudo isso faz parte dos mecanismos eficazes de uma guerra
    diplomática.
 3. *Guerra econômica*. As sanções estadunidenses e secundárias são
    impostas ao adversário, que deve lutar para romper o embargo
    estabelecido. Essas sanções impedem o país visado de utilizar os
    canais normais de financiamento, incluindo o sistema SWIFT e as
    redes bancárias internacionais. Evitam, assim, que o país importe
    bens essenciais ou que inclusive possa pagar empresas de transporte
    pelo trânsito de bens que outros estariam plenamente satisfeitos em
    vender; impedem o acesso às contas bancárias do país em outros
    Estados e a fundos-chave de desenvolvimento oferecidos pelo Banco
    Mundial e fundos de emergência oferecidos pelo FMI. Em janeiro de
    2019, quando houve uma tentativa de golpe na Venezuela, o embaixador
    Idriss Jazairy, Relator Especial da ONU sobre o impacto negativo das
    medidas coercivas unilaterais, disse: “Estou especialmente
    preocupado em ouvir relatos de que essas sanções visam mudar o
    governo Venezuela. A coerção, seja militar seja econômica, nunca
    deve ser usada para buscar uma mudança de governo em um Estado
    soberano. O uso de sanções por poderes externos para derrubar um
    governo eleito viola todas as normas do direito internacional”[24]
    <#_ftn23>.

 4. *Guerra política.* Todo o espectro de informação e guerra
    diplomática é usado para minar a legitimidade política de um governo
    e para lançar dúvidas sobre todo o sistema político do país sob
    ataque. Os processos eleitorais são descritos como fraudulentos, os
    líderes políticos são difamados, o próprio sistema legal é usado
    contra os líderes políticos populares através de um processo
    conhecido como /lawfare/, e a fé em todo o sistema político é
    corroída. Financiamentos são fornecidos a “grupos de oposição”,
    incluindo organizações não governamentais, que muitas vezes se
    tornam instrumentos das velhas elites. A difícil situação econômica
    criada pela guerra econômica cria sérias tensões internas, que são
    atribuídas ao governo por essa “oposição” e não à guerra econômica.
    Fundos e apoio político são então concedidos à população
    insatisfeita que, sentindo o peso dessa guerra política, começa a
    apoiar a mudança de governo. As mídias sociais são utilizadas como
    uma arma contra o governo, conforme descrito em/Special Forces
    Unconventional Warfare /[Forças Especiais para Guerras não
    Convencionais], o já citado documento de 2010. Esta é uma “revolução
    colorida”, uma revolução dos de cima e não dos de baixo. Se há
    repressão policial contra os protestos, mesmo que para deter
    mobilizações que aterrorizam bairros populares e agridem fisicamente
    a população, essa repressão é mostrada como autoritária ou mesmo
    genocida. Em seguida, o clamor por “intervenção humanitária” começa
    a levar a uma intervenção militar aberta dos Estados Unidos. O
    Estado Maior Conjunto dos EUA, o /Joint Vision 2020,/ sugere que um
    dos objetivos é promover o caos na sociedade-alvo por meio das
    chamadas “operações de informação” (incluindo “operações
    psicológicas” e “ataques a redes de computadores”).

 

Em uma guerra híbrida, o agressor tem como alvo as vulnerabilidades de
uma sociedade por meio desses aspectos da guerra não militar
(informacional, diplomática, econômica e política) e aprofunda o caos
por meio de atos de sabotagem e ameaças de invasão. A pressão aumenta
sobre a sociedade-alvo, na qual a solidariedade e a resistência são
chamadas para evitar o colapso social e político total.

Entre as técnicas de guerra híbridas que os EUA empregam contra a China
estão a retórica hostil contra o governo e o povo chinês, distorções
sobre eventos em Hong Kong, Taiwan e Xinjiang e a descrição da pandemia
de coronavírus como um “vírus chinês”. A evidência não é tão importante
aqui quanto o uso de ideias racistas e anticomunistas mais antigas para
demonizar o país asiático. Mas essas técnicas não tiveram sucesso na
China, onde a classe média – o alvo de uma “revolução colorida” – não
tem nenhum apetite por derrubar o governo e demonstra estar satisfeita
com os rumos do país, cujo governo tem se esforçado para melhorar os
padrões de vida e foi capaz – ao contrário dos governos ocidentais – de
enfrentar a pandemia do coronavírus. Um estudo da Universidade de
Harvard publicado em julho de 2020 mostra que o governo liderado pelo
Partido Comunista da China aumentou sua aprovação de 2003 a 2016, em
grande parte por causa dos programas de bem-estar social e da luta
contra a corrupção impulsionada tanto pelo Partido Comunista da China
quanto pelo governo. A aprovação geral é de 95,5%[25] <#_ftn24>.

A época de dominação europeia do planeta, inaugurada em 1492, chegará ao
fim. Na verdade, já podemos vislumbrar seu fim. Mas surgem questões
importantes. Não sabemos quanto tempo levará o processo, quão efetiva e
devastadora será a resistência liderada pelos EUA, ou o que irá
substituí-la. Nossa tarefa é continuar, no presente, a resistência que
em 1804 derrotou as potências escravistas no Haiti, até que haja outra
data para colocar ao lado de 1492, uma data que marque o fim da
dominação do planeta pela Europa e suas colônias.

------------------------------------------------------------------------


      *Notas*

[1] <#_ftnref0> Peter Linebaugh; Marcus Rediker, /The Many-Headed
Hydra/: /The Hidden History of the Revolutionary Atlantic, /Boston:
Beacon Press, 2000.

[2] <#_ftnref1> Dan Sperling, ‘In 1825, Haiti Paid France $21 Billion To
Preserve Its Independence – Time For France To Pay It Back’, /Forbes/, 6
dez. 2017.  Disponível em:
https://www.forbes.com/sites/realspin/2017/12/06/in-1825-haiti-gained-independence-from-france-for-21-billion-its-time-for-france-to-pay-it-back.
Acesso em: 7 dez. 2020.

[3] <#_ftnref2> Citação retirada de Melvyn Leffler. A Preponderance of
Power: National Security, the Truman Administration, and the Cold War
(Palo Alto, CA: Stanford University Press, 1992), p.18-19.

[4] <#_ftnref3> Leia mais sobre a repressão ao Partido Comunista da
Indonésia após o golpe de 1965 em nosso dossiê: O legado do Lekra:
organizando a cultura revolucionária na Indonésia, 1 dez. 2020.

[5] <#_ftnref4> “Excerpts From Pentagon’s Plan: Prevent the Re-Emergence
of a New Rival”, New York Times, 8 mar. 1992. Disponível em:
https://www.nytimes.com/1992/03/08/world/excerpts-from-pentagon-s-plan-prevent-the-re-emergence-of-a-new-rival.html.
Acesso em: 7 dez. 2020.

[6] <#_ftnref5> Vijay Prashad, Balas de Washington: uma história da CIA,
golpes e assassinatos (São Paulo: Expressão Popular, 2020).

[7] <#_ftnref6> U.S. National Security Strategy: Transform America’s
National Security Institutions to Meet the Challenges and Opportunities
of the 21^st Century’, U.S. Department of State Archive, 20 set. 2001.
Disponível em: https://2001-2009.state.gov/r/pa/ei/wh/15430.htm
<https://2001-2009.state.gov/r/pa/ei/wh/15430.htm>. Acesso em: 7 dez. 2020.

[8] <#_ftnref7> Nan Tian; Alexandra Kuimova; Diego Lopes da Silva;
Pieter D. Wezeman; Siemon T. Wezeman, ‘Trends in World Military
Expenditure, 2019’, Stockholm International Peace Research Institute,
abr. 2020. Disponível em:
https://www.sipri.org/sites/default/files/2020-04/fs_2020_04_milex_0_0.pdf
<https://www.sipri.org/sites/default/files/2020-04/fs_2020_04_milex_0_0.pdf>.
Acesso em: 7 dez. 2020.

[9] <#_ftnref8> John Schmitt; Elise Gould; Josh Bivens, ‘America’s
slow-motion wage crisis’, Economic Policy Institute, 13 set. 2018.
Disponível em:
https://www.epi.org/publication/americas-slow-motion-wage-crisis-four-decades-of-slow-and-unequal-growth-2/
<https://www.epi.org/publication/americas-slow-motion-wage-crisis-four-decades-of-slow-and-unequal-growth-2/>.
Acesso em: 7 dez. 2020.

[10] <#_ftnref9> Donald J. Trump, ‘Inaugural Address: Remarks of
President Donald J. Trump – as prepared for delivery’, The White House,
20 jan. 2017. Disponível em:
https://www.whitehouse.gov/briefings-statements/the-inaugural-address/
<https://www.whitehouse.gov/briefings-statements/the-inaugural-address/>. Acesso
em: 7 dez. 2020.

[11] <#_ftnref10> ‘The Power of America’s Example: The Biden Plan for
Leading the Democratic World to Meet the Challenges of the 21^st
Century’, Joebiden.com, jul. 2019. Disponível em:
https://joebiden.com/americanleadership
<https://joebiden.com/americanleadership>. Acesso em: 7 dez. 2020.

[12] <#_ftnref11> ‘National Defense Authorization Act (NDAA) 2020
Section 1253 Assessment Executive Summary: Regain the Advantage’, U.S.
Indo-Pacific Command, 5 abr. 2020. Disponível em:
https://int.nyt.com/data/documenthelper/6864-national-defense-strategy-summ/8851517f5e10106bc3b1/optimized/full.pdf
<https://int.nyt.com/data/documenthelper/6864-national-defense-strategy-summ/8851517f5e10106bc3b1/optimized/full.pdf>.
Acesso em: 7 dez. 2020.

[13] <#_ftnref12> ‘Factbox: How close is China to complete building a
moderately prosperous society in all respects’, Xinhua, 2 ago. 2020.
Disponível em:
http://www.xinhuanet.com/english/2020-08/02/c_139259082.htm
<http://www.xinhuanet.com/english/2020-08/02/c_139259082.htm>. Acesso
em: 7 dez. 2020.

[14] <#_ftnref13> Para saber mais, leia nosso dossiê n.5 de 1 jun. 2018:
Lula e a Batalha pela Democracia. Disponível em:
https://www.thetricontinental.org/pt-pt/dossie-5-lula-a-a-batalha-da-democracia/
<https://www.thetricontinental.org/pt-pt/dossie-5-lula-a-a-batalha-da-democracia/>.
Acesso em: 7 dez. 2020.

[15] <#_ftnref14> ‘Russia and China hold the biggest military exercises
for decades’, /The Economist/, 6 set. 2018, Disponível em:
https://www.economist.com/europe/2018/09/06/russia-and-china-hold-the-biggest-military-exercises-for-decades
<https://www.economist.com/europe/2018/09/06/russia-and-china-hold-the-biggest-military-exercises-for-decades>.
Acesso em: 7 dez. 2020.

[16] <#_ftnref15> Vladimir Isachenko, ‘Putin: Russia-China military
alliance can’t be ruled out’. /AP News/, 22 out. 2020. Disponível em:
https://apnews.com/article/beijing-moscow-foreign-policy-russia-vladimir-putin-1d4b112d2fe8cb66192c5225f4d614c4
<https://apnews.com/article/beijing-moscow-foreign-policy-russia-vladimir-putin-1d4b112d2fe8cb66192c5225f4d614c4>.
Acesso em: 7 dez. 2020.

[17] <#_ftnref16> Milo Medin; Gilman Louie. ‘The 5G Ecosystem: Risks &
Opportunities for DoD Defense Innovation Board’. Colaboradores: Kurt
DelBene; Michael McQuade; Richard Murray; Mark Sirangelo. /Defense
Innovation Board/, 3 abr. 2019. Disponível em:
https://media.defense.gov/2019/Apr/04/2002109654/-1/-1/0/DIB_5G_STUDY_04.04.19.PDF
<https://media.defense.gov/2019/Apr/04/2002109654/-1/-1/0/DIB_5G_STUDY_04.04.19.PDF>.
Acesso em: 7 dez. 2020.

[18] <#_ftnref17> ‘Multipolarity Plays Key Role in World Peace: Chinese
Vice President’, People’s Daily, 6 nov. 2001. Disponível em:
http://en.people.cn/english/200111/05/eng20011105_83945.html
<http://en.people.cn/english/200111/05/eng20011105_83945.html>. Acesso
em: 7 dez. 2020.

[19] <#_ftnref18> National Intelligence Council, Global Trends 2030:
Alternative Worlds (Washington, DC: Office of the Director of National
Intelligence, 2012), iii.

[20] <#_ftnref19> Richard Haass, ‘How to Build a Second American
Century’, /Washington Post/, 26 abr. 2013; Stephen Brooks; William C.
Wohlforth, World Out of Balance: International Relations and the
Challenge of American Primacy. Princeton: Princeton University Press, 2008.

[21] <#_ftnref20> Richard Haass, Foreign Policy Begins at Home. New
York: Basic Books, 2013.

[22] <#_ftnref21> Andrew Korybko, Hybrid Wars: The Indirect Adaptive
Approach to Regime Change (Moscow: Peoples’ Friendship University of
Russia, 2015). Disponível em:
https://orientalreview.org/wp-content/uploads/2015/08/AK-Hybrid-Wars-updated.pdf
<https://orientalreview.org/wp-content/uploads/2015/08/AK-Hybrid-Wars-updated.pdf>.
Acesso em: 7 dez. 2020

[23] <#_ftnref22> William S. Lind and Gregory A. Thiele, 4^th Generation
Warfare Handbook (Kouvola: Castalia House, 2015).

[24] <#_ftnref23> ‘Venezuela sanctions harm human rights of innocent
people, UN expert warns’, United Nations Human Rights, Office of the
High Commissioner, 31 jan. 2019. Disponível em:

https://www.ohchr.org/en/NewsEvents/Pages/DisplayNews.aspx?NewsID=24131&LangID=E
<https://

 

 

.ohchr.org/en/NewsEvents/Pages/DisplayNews.aspx?NewsID=24131&LangID=E>.
Acesso em: 7 dez. 2020).

[25] <#_ftnref24> Dan Harsha, ‘Taking China’s pulse’, The Harvard
Gazette, 9 jul. 2020. Disponível em:

https://news.harvard.edu/gazette/story/2020/07/long-term-survey-reveals-chinese-government-satisfaction/
<https://news.harvard.edu/gazette/story/2020/07/long-term-survey-reveals-chinese-government-satisfaction/>.
Acesso em: 7 dez. 2020.




quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

O ressurgimento rentista e a tomada de controle: Capitalismo financeiro vs. capitalismo industrial (2)




In
RESISTIR.INFO

https://www.resistir.info/m_hudson/ressurgencia_rentista_27jan21_2.html
3/2/2021


    (A primeira parte encontra-se aqui
    <https://resistir.info/m_hudson/ressurgencia_rentista_27jan21_1.html> )

*por Michael Hudson [*]

Saída em K. *A luta do capital financeiro para privatizar e monopolizar
infraestrutura pública *

Outra razão para a desindustrialização é o aumento do custo de vida
resultante da conversão de infra-estruturas públicas em monopólios
privatizados. Quando os Estados Unidos e a Alemanha ultrapassaram o
capitalismo industrial britânico, foi reconhecido que uma das principais
chaves para a vantagem industrial era o investimento público em
estradas, caminhos-de-ferro e outros transportes, educação, saúde
pública, comunicações e outras infra-estruturas básicas. Simon Patten, o
primeiro professor de teoria económica na primeira /business school /
dos EUA, a Wharton School da Universidade da Pensilvânia, definiu a
infra-estrutura pública como um "quarto factor de produção", para além
do trabalho, do capital e da terra. Mas ao contrário do capital,
explicava Patten, o seu objectivo não era o de obter lucro. O seu
objectivo era minimizar o custo de vida e de fazer negócios,
proporcionando serviços básicos a baixo preço para tornar o sector
privado mais competitivo.

Ao contrário das taxas militares que sobrecarregavam os contribuintes
nas economias pré-modernas, "numa sociedade industrial, o objectivo da
tributação é aumentar a prosperidade industrial" através da criação de
infra-estruturas sob a forma de canais e caminhos-de-ferro, um serviço
postal e educação pública. Esta infra-estrutura era um "quarto" factor
de produção. Os impostos seriam "não encargos", explicava Patten, na
medida em que fossem investidos em melhoramentos internos públicos,
encabeçados por transportes tais como o Canal Erie [2] <#notas> .

A vantagem deste investimento público é reduzir custos ao invés de
deixar privatizadores imporem rendas de monopólio na forma de encargos
de acesso à infraestrutura básica. Governos podem estabelecer os preços
dos serviços destes monopólios naturais (incluindo criação de crédito,
como estamos a ver hoje) ao preço de custo ou oferecê-los gratuitamente,
ajudando o trabalho e seus empregadores industriais a venderem por menos
a países aos quais faltam tais empreendimentos públicos.

Nas cidades, explicava Patten, o transporte público elevava os preços
das propriedades (e portanto da renda económica) na periferia afastada,
assim como o Canal Erie havia beneficiado agricultores do Oeste que
competiam com agricultores do norte do estado de Nova York. Esse
princípio é evidente nos bairros suburbanos de hoje em relação aos
centros de cidades. A extensão do metro de Londres ao longo da Jubilee
Line, e do metro da Segunda Avenida da Cidade de Nova York, mostraram
que o transporte subterrâneo e o autocarro podem ser financiados
publicamente pela tributação do valor rentístico mais alto criado para
determinados sítios ao longo destas rotas. Pagar o investimento de
capital a partir de tais taxas pode providenciar transportes a preços
subsidiados, minimizando consequentemente o custo de estrutura da
economia. O que Joseph Stiglitz popularizou como a "Lei de Henry George"
deveria assim, mais correctamente, ser conhecida como "Lei de Patten" da
tributação não sobrecarregada por dívidas /(burdenless). / [3] <#notas>

Sob um regime de "tributação não sobrecarregada" o retorno sobre o
investimento público não toma a forma de lucro mas destina-se a reduzir
o preço geral de estrutura da economia para "promover prosperidade
geral". Isto significa que governos deveriam operar directamente os
monopólios naturais ou, pelo menos, regulá-los. "Parques, esgotos e
escolas melhoram a saúde e a inteligência de todas as classes de
produtores, o que lhes permite produzir de modo mais barato e competir
com mais êxito em outros mercados". Patten concluía: "Se os tribunais,
correios, parques, obras gasistas, hidráulicas, de arruamentos, fluviais
e melhorias de portos e outras obras públicas não aumentarem a
prosperidade da sociedade elas não deveriam ser efectuadas pelo Estado".
Mas esta prosperidade para a economia geral não pode ser obtida ao
tratar empresas públicas como centros de lucro, como se diz hoje em dia.
[4] <#notas>

Em certo sentido, isto pode ser chamado "privatizar os lucros e
socializar os prejuízos". Advogar uma economia mista de acordo com estas
linhas é parte da lógica do capitalismo industrial que procura minimizar
a produção do sector privado e dos custos de emprego a fim de maximizar
lucros. A infraestrutura social básica é um subsídio a ser fornecido
pelo estado.

O primeiro-ministro conservador britânico Benjamin Disraeli (1874-80)
reflectiu este princípio: "A saúde do povo é realmente o fundamento
sobre o qual depende toda a sua felicidade e todos os seus poderes
enquanto Estado". [5] <#notas> Ele patrocinou a Lei da Saúde Pública de
1875, seguida da Lei da Venda de Alimentos e Drogas e, no ano seguinte,
a Lei da Educação. O governo prestaria estes serviços, e não
empregadores privados em busca de monopólio.

Durante um século, o investimento público ajudou os Estados Unidos a
seguir uma política de Economia de Altos Salários, providenciando
padrões de educação, alimentação e saúde para tornar o trabalho mais
produtivo e assim ser capaz de livrar-se do trabalho "miserável" de
baixo salário. O objectivo era criar uma retro-alimentação positiva
entre salários em ascensão e aumento da produtividade do trabalho.

Isto está em contraste absoluto com o /business plan / do capitalismo
financeiro de hoje – cortar salários e, também, reduzir o investimento
de capital a longo prazo, a investigação e o desenvolvimento enquanto
privatiza infraestrutura pública. A carnificina neoliberal de Ronald
Reagan nos Estados Unidos e de Margaret Thatcher na Grã-Bretanha na
década de 1980 foi apoiada pelas exigências do FMI de que economias
devedoras equilibrassem seus orçamentos pela liquidação de empresas
públicas e recortes nos gastos sociais. Serviços de infraestrutura foram
privatizados como monopólios naturais, aumentando drasticamente os
custos de estrutura de tais economias, mas criando enormes comissões de
subscrição financeira e ganhos no mercado bolsista da Wall Street e de
Londres.

Até agora privatizar monopólios públicos tornou-se um dos modos mais
lucrativos de ganhar riqueza financeiramente. Mas cuidados de saúde
privatizados e seguros médicos são pagos pelo trabalho e seus
empregadores, não pelo governo como no capitalismo industrial. E face à
ascensão de custos do sistema educacional privatizado, o acesso da
classe média ao emprego tem sido financiado pela dívida estudantil.
Estas privatizações não ajudaram as economias a tornarem-se mais ricas
ou competitivas. Ao nível vasto da economia, este plano de negócios é
uma corrida para o fundo, mas uma corrida que beneficia a riqueza
financeira no topo.

*O capitalismo financeiro empobrece economias enquanto aumenta seu custo
de estrutura *

A renda económica clássica é definida como o excesso de preço sobre o
valor de custo intrínseco. Capitalizar esta renda – quer seja a renda da
terra ou a renda monopólica da privatização acima descrita – em
obrigações, acções e empréstimos bancários cria "riqueza virtual". A
criação exponencial de crédito do capitalismo financeiro aumenta a
riqueza "virtual" – títulos financeiros e direitos de propriedade – ao
administrar estes títulos e créditos de uma forma que os fez valer mais
do que a riqueza real tangível.

A principal forma de ganhar fortunas é obter ganhos nos preços de
activos ("ganhos de capital") em acções, obrigações e bens imobiliários.
Contudo, esta sobrecarga financeira exponencialmente crescente, com
alavancagem da dívida, polariza a economia de forma a concentrar a
propriedade da riqueza nas mãos dos credores, e dos proprietários de
imóveis de aluguer, acções e títulos – drenando a economia "real" a fim
de pagar o sector FIRE.

A teoria económica pós-classica descreve a infraestrutura privatizada, o
desenvolvimento de recursos naturais e a banca como fazendo parte da
economia industrial, não sobreposta a ela por uma classe em busca de
rendas. Mas a dinâmica de economias capitalistas-financeiras não
consiste em ganhar riqueza principalmente pelo investimento em meios de
produção industrial e poupando lucros ou salários, mas sim em ganhos de
capital obtidos principalmente através da procura da busca de rendas.
Estes ganhos não são "capital" como se entendia classicamente. São
"ganhos financeiros-capitalistas", porque resultam de uma inflação de
preços de activos alimentada pela alavancagem da dívida.

Ao inflacionar os seus preços de habitação e uma bolha no mercado de
acções a crédito, a alavancagem da dívida dos EUA, bem como a sua
financeirização e privatização de infra-estruturas básicas, colocou os
seus preços afastados dos mercados mundiais. A China e outros países não
financiarizados evitaram custos elevados de seguros de saúde, custos de
educação e outros serviços, estabelecendo-os em baixo custo ou
gratuitos, encarando-os como um serviço público. A saúde pública e os
cuidados médicos custam muito menos no estrangeiro, mas são atacados nos
Estados Unidos pelos neoliberais como "medicina socializada", como se
financiarizar a prestação de cuidados de saúde tornasse a economia dos
EUA mais eficiente e competitiva. Os transportes também foram
financiarizados e gerido com fins lucrativos, não para baixar o custo de
vida e de fazer negócio.

Deve-se concluir que a América optou por não mais industrializar, mas
financiar a sua economia através da renda económica – renda monopolista,
desde as tecnologias de informação, à banca e à especulação, deixando a
indústria, investigação e desenvolvimento para outros países. Mesmo que
a China e outros países asiáticos não existissem, não há maneira de a
América recuperar os seus mercados de exportação ou mesmo o seu mercado
interno com as suas actuais despesas gerais sobrecarregadas pelo
endividamento e a sua educação privatizada e financiarizada, assim como
os cuidados de saúde, transportes e outros sectores de infra-estrutura
básica.

O problema subjacente não é a competição da China, mas a financiarização
neoliberal. Capitalismo-financeiro não é capitalismo industrial. É uma
decadência de volta à servidão da dívida e ao neo-feudalismo rentista.
Os banqueiros desempenham hoje o papel que os senhores da terra
desempenharam ao longo do século XIX, fazendo fortunas sem o valor
correspondente, através de ganhos de capital com o imobiliário, acções e
títulos a crédito, pelo alavancamento de dívida cujos encargos aumentam
o custo de viver e de fazer negócio da economia.

*A nova guerra fria de hoje é um combate do capitalismo financeiro
contra o capitalismo industrial *

O mundo de hoje está a ser fracturado por uma guerra económica sobre que
espécie de sistema económica terá. O capitalismo industrial está a
perder o combate para o capitalismo financeiro, o qual está a revelar-se
como a sua antítese – assim como o capitalismo industrial era a antítese
dos senhores da terra pós-feudais e das casas bancárias predadoras.

A este respeito, a Nova Guerra Fria de hoje é um conflito de sistemas
económicos. Como tal, ela está a ser combatida contra a dinâmica do
capitalismo industrial dos EUA, bem como aquele da China e de outras
economias. Portanto, a luta é também interna nos Estados Unidos e na
Europa, bem como confrontacional contra a China e a Rússia, o Irão,
Cuba, Venezuela e os seus movimentos para desdolarizar as suas economias
e rejeitar o Consenso de Washington e a sua Diplomacia do Dólar. É uma
luta do capital financeiro centrado nos EUA para promover a doutrina
neoliberal que concede privilégios fiscais especiais ao rendimento dos
rentistas, desonerando tributariamente a renda de terra, a renda de
recursos naturais, a renda de monopólio e a do sector financeiro. Este
objectivo inclui a privatização e a financeirização de infra-estruturas
básicas, maximizando a sua extracção de renda económica ao invés de
minimizar o custo de vida e de fazer negócio.

O resultado é uma guerra para mudar o carácter do capitalismo bem como o
da social-democracia. O Partido Trabalhista britânico,
sociais-democratas europeus e o Partido Democrata dos EUA saltaram todos
para dentro do vagão neoliberal. Todos eles são cúmplices na austeridade
que se tem propagado desde o Mediterrâneo até o cinturão da ferrugem no
Meio-Oeste dos EUA.

O capitalismo financeiro explora o trabalho, mas via um sector rentista,
o qual acaba por canibalizar o capital industrial. Este impulso tem-se
internacionalizado num combate contra nações que restringem a dinâmica
predatória do capital financeiro que procura privatizar e desmantelar o
poder regulatório do governo. A Nova Guerra Fria não é meramente uma
guerra que está a ser travada pelo capitalismo financeiro contra o
socialismo e a propriedade pública dos meios de produção. Tendo em vista
a dinâmica inerente do capitalismo industrial que exige forte
regulamentação estatal e poder tributário para controlar a intrusão do
capital financeiro, este conflito global pós-industrial é entre o
socialismo que evolui a partir do capitalismo industrial e o fascismo,
definido como uma reacção rentista para mobilizar o governo a fim de
fazer recuar a social-democracia e restaurar o controlo das classes
financeiras e monopolistas rentistas.

A velha Guerra Fria era um combate contra o "Comunismo". Além de
libertar-se da renda da terra, dos encargos com juros e de lucros
industriais apropriados privadamente, o socialismo favorece o combate do
trabalho por melhores salários e condições de trabalho, melhor
investimento público em escolas, cuidados de saúde e outros apoios ao
bem estar social, melhor segurança de emprego e seguro de desemprego.
Todas estas reformas minariam os lucros dos empregadores. Lucros mais
baixos significam preços de acções mais baixos e portanto menos ganhos
para o capital financeiro.

O objectivo do capitalismo financeiro não é tornar uma economia mais
produtiva pela produção de bens e a sua venda a um custo mais baixo do
que os competidores. O que à primeira vista pode parecer ser rivalidade
económica internacional e inveja entre os Estados Unidos e a China é
portanto melhor visto como um combate entre sistemas económicos: o do
capitalismo financeiro e o da civilização a tentar libertar-se de
privilégios rentistas e da submissão a credores, com uma filosofia de
governo mais social com poder de decisão para controlar interesses
privados quando eles actuam egoistamente e prejudicam a sociedade como
um todo.

O inimigo nesta Nova Guerra Fria não é meramente governo socialista mas
governo em si mesmo, excepto na medida em que ele possa ser trazido para
ficar sob o controle da alta finança a fim de promover a agenda
neoliberal rentista. Isto reverte a revolução política democrática do
século XIX que substituiu a Casa dos Lordes e outras câmaras altas
controladas pela aristocracia hereditária por legisladores mais
representativos. O objectivo é criar um estado corporativo, substituindo
organismos governamentais eleitos por bancos centrais – o Federal
Reserve dos EUA e o Banco Central Europeu, juntamente com pressão
externa do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial.

O resultado é um "estado profundo" a apoiar uma oligarquia financeira
cosmopolita. Isto é a definição de fascismo, revertendo governos
democráticos para devolver o controle às classes financeiras e
monopolistas rentistas. O beneficiário é o sector corporativo, não o
trabalho, cujo ressentimento é desviado contra estrangeiros e contra
inimigos internos designados.

Na falta de afluência estrangeira, o Estado corporativo norte-americano
promove o emprego através de uma acumulação militar e de despesas
públicas em infra-estruturas, a maior parte das quais é entregue a
iniciados internos a fim de privatizar em monopólios em busca de renda e
em sinecuras. Nos Estados Unidos, as forças armadas estão a ser
privatizadas para combater no estrangeiro (exemplo: Blackwater
USA/Academi) e as prisões estão a ser transformadas em centros de lucro
utilizando condenados como mão-de-obra barata.

O que é irónico é que embora a China esteja a procurar desligar-se do
capitalismo financeiro ocidental, na realidade tem feito o que os
Estados Unidos fizeram na sua descolagem industrial no final do século
XIX e início do século XX. Como uma economia socialista, a China tem
visado aquilo que se esperava do capitalismo industrial: libertar a sua
economia do rendimento rentista (senhores da terra e bancos usurários),
em grande parte através de uma política progressiva de impostos sobre o
rendimento que incide principalmente sobre o rendimento de rentistas.

Acima de tudo, a China tem mantido a banca no domínio público. Manter a
moeda e a criação de crédito públicas ao invés de privatiza-las é o
passo mais importante para manter baixo o custo de vida e de fazer
negócio. A China foi capaz de evitar uma crise de dívida pelo
esquecimento das mesmas ao invés de encerar empresas endividadas
consideradas serem de interesse público. Neste aspecto, é a China
socialista que está a alcançar o destino que se esperava inicialmente do
capitalismo industrial no Ocidente.

*Resumo: O capital financeiro em busca de renda *

A transformação da teoria económica académica sob o capitalismo
financeiro de hoje inverteu o impulso progressivo e mesmo radical da
economia política clássica que evoluiu para o marxismo. A teoria
pós-clássica descreve os sectores financeiro e outros rentistas como uma
parte intrínseca da economia industrial. Os actuais formatos
contabilísticos do rendimento nacional e do PIB são compilados de acordo
com esta reacção anti-clássica, representando o sector FIRE e os seus
sectores aliados em busca de renda como um acréscimo ao rendimento
nacional e não como um subtraendo. Juros, rendas e preços monopolistas
são todos contabilizados como "ganhos" – como se todos os rendimentos
fossem obtidos como partes intrínsecas do capitalismo industrial e não
como extracção predatória como despesas gerais da propriedade
imobiliária e dos créditos financeiros.

Isto é o oposto da teoria económica clássica. O capitalismo financeiro é
um mecanismo para evitar o que Marx e na verdade a maioria dos seus
contemporâneos esperavam: que o capitalismo industrial evoluísse para o
socialismo, de forma pacífica ou não.

*Algumas observações finais: As finanças tomam controle da indústria, do
governo e da ideologia *

Quase todas as economias são uma economia mista ?– pública e privada,
financeira, industrial e de buscadores de renda. Dentro destas economias
mistas, a dinâmica financeira – crescimento da dívida por juros
compostos, atendo-se primariamente a privilégios de extracção de renda
e, portanto, protegendo-os ideológica, política e academicamente. Estas
dinâmicas são diferentes daquelas do capitalismo industrial e, na
verdade, prejudicam a economia industrial ao desviar o seu rendimento a
fim de pagar ao sector financeiro e os seus clientes rentistas.

Uma expressão deste antagonismo inato é o horizonte temporal. O
capitalismo industrial requer planeamento a longo prazo para desenvolver
um produto, fazer um plano de marketing e empreender investigação e
desenvolvimento para seus preços abaixo dos dos concorrentes. A dinâmica
básica é M-C-M': o capital (dinheiro, M) é investido na construção de
fábricas e outros meios de produção e no emprego de mão-de-obra para
vender os seus produtos (mercadorias, C) com um lucro (M').

O capitalismo financeiro abrevia este processo para um M-M', fazendo
dinheiro de modo puramente financeiro, pela cobrança de juros e obtenção
de ganhos de capital. O modo financeiro de "criação de riqueza" é medido
pela avaliação do imobiliário, acções e títulos. Esta avaliação Esta
avaliação durante muito tempo foi baseada na capitalização do seu fluxo
de receitas (rendas ou lucros) à taxa de juro corrente, mas agora
baseia-se quase inteiramente nos ganhos de capital como a fonte
principal de "retornos totais".

Ao assumir o controlo de empresas industriais, os gestores financeiros
concentram-se no curto prazo, pois o seu salário e bónus baseiam-se no
desempenho do ano em curso. O "desempenho" em causa é o desempenho na
bolsa de valores. Os preços das acções tornaram-se em grande medida
independentes do volume de vendas e dos lucros, agora que são aumentados
pelas empresas que normalmente pagam cerca de 92 por cento das suas
receitas em dividendos e recompra de acções [6] <#notas> .

Ainda mais destrutivamente, o capital privado criou um novo processo:
M-dívida-M'. Um documento recente calcula isso: "Mais de 40% das
empresas que efectuam pagamentos também angariam capital durante o mesmo
ano, resultando em 31% das recompras e dividendos agregados de acções
financiadas externamente, primariamente com dívida". [7] <#notas> Isto
tornou o sector corporativo financeiramente frágil, particularmente a
indústria aérea na sequência da crise da COVID-19.

A essência das participações privadas ( /private equity
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Private_equity> / ), explica Matt
Stoller, é que "engenheiros financeiros [angariem] grandes quantias de
dinheiro e contraiam ainda mais empréstimos para comprar empresas e
saqueá-las. Estes tipos de barões do /private equity / não são
especialistas que ajudam a financiar produtos e serviços úteis, eles
fazem negócios de cortadores de biscoitos atacando empresas que
acreditam ter poder de mercado para elevar preços, que podem despedir
trabalhadores ou vender activos, e/ou que têm alguma espécie de alçapão
legal vantajoso. Muitas vezes destroem o negócio subjacente. Os gigantes
da indústria, desde a Blackstone até a Apollo, são os filhos do rei dos
títulos lixo /(junk bond) / da década de 1980 e do defraudador Michael
Milken. Eles são essencialmente mafiosos super dimensionados" [8]
<#notas> .

O capital privado tem desempenhado um grande papel no aumento da
alavancagem corporativa, tanto através das suas próprias acções como
através da desinibição de grandes companhias públicas na utilização da
dívida. Como explicaram Eileen Appelbaum e Rosemary Batt, as grandes
firmas de compras /(buyout), / na sequência do manual desenvolvido na
década de 1980, produzem os seus retornos a partir da engenharia
financeira e do corte de custos (acordos de redução de dimensão visam
empresas "mais crescentes", mas enquanto aquelas empresas de /private
equity / asseveram que acrescentam valor, isto pode ser apenas pelo
facto de serem habilidosas em identificar empresas promissoras e em
cavalgar uma onda de desempenho).

Ao contrário do que diz o seu marketing, as taxas de estrutura das
private equity significam que elas ganham dinheiro mesmo quando levam
firmas à bancarrota. E elas tornaram-se tão poderosas que é difícil
obter apoio político para travá-las quando prejudicam grande número de
cidadãos através de práticas exploradoras como a facturação de
equilíbrio ("surpresa") [9] <#notas> .

A descrição clássica deste processo de saqueio com fins lucrativos é o
documento de George Akerloff e Paul Romer de 1993, que descreve como "as
empresas têm um incentivo para irem à falência por lucro a expensas da
sociedade (para saquear) ao invés de irem em frente (para apostar no
êxito)". A bancarrota com fins lucrativos ocorrerá se uma má
contabilidade, uma regulamentação laxista, ou penalidades baixas por
abuso derem aos proprietários um incentivo para se pagarem a si próprios
mais do que as suas empresas valem e a seguir incumprirem as suas
obrigações de dívida". [10] <#notas>

O facto de os "ganhos de papel" dos preços das acções poderem ser
eliminados quando ocorrem tempestades financeiras, torna o capitalismo
financeiro menos resiliente do que a base industrial de investimento em
capital tangível que permanece no lugar. Os Estados Unidos encurralaram
a sua economia num canto ao desindustrializarem, substituindo a formação
de capital tangível por "riqueza virtual", ou seja, créditos financeiros
sobre rendimentos e activos tangíveis. Desde 2009, e especialmente desde
a crise Covid de 2020, a sua economia tem estado a sofrer através
daquilo a que se chama uma "recuperação" em forma de K [NR] <#nr> . Os
mercados de acções e títulos atingiram máximos históricos para
beneficiar as famílias mais ricas, mas a economia "real" da produção e
consumo, do PIB e emprego, declinou para o sector não-rentista, ou seja,
a economia em geral.

Como explicarmos esta disparidade se não pelo reconhecimento de que
diferentes dinâmicas e leis do movimento estão a funcionar? Ganhos em
riqueza cada vez mais tomam a forma de uma valorização ascendente de
direitos financeiros e de propriedade rentistas sobre os activos reais e
rendimentos reais da economia, encabeçados por direitos de extracção de
rendas, não por meios de produção.

Um capitalismo financeiro desta espécie só pode sobreviver se retirar
ganhos exponencialmente crescentes de fora do sistema, quer pela criação
de moeda pelo banco central /(Quantitative Easing) / quer pela
financiarização de economias estrangeiras, privatizando-as para
substituir serviços de infraestruturas públicas de baixos preços por
monopólios em busca de renda que emitem títulos e acções, amplamente
financiados por crédito baseado no dólar à procura de ganhos de capital.
O problema com este imperialismo financeiro é que ele faz os hospedeiros
clientes tornarem-se economias de alto custo como as dos EUA e de outros
patrocinadores nos centros financeiros do mundo.

Todos os sistemas económicos procuram internacionalizar-se e estender o
seu domínio através do mundo. A Guerra Fria reavivada de hoje deveria
ser entendida como um combate sobre que espécie de sistema económico
terá o mundo. O capitalismo financeiro está a lutar contra nações que
restringem a sua dinâmica intrusiva e o patrocínio da privatização e do
desmantelamento do poder regulador público. Ao contrário do capitalismo
industrial, o objectivo rentista não é tornar uma economia mais
produtiva pela produção de bens e a sua venda a um custo inferior ao dos
competidores. As dinâmicas do capitalismo financeiro são globalistas,
procurando utilizar organizações internacionais (o FMI, a NATO, o Banco
Mundial e as sanções comerciais e de investimento concebidas pelos EUA)
para anular governos nacionais que não são controlados pelas classes
rentistas. O objectivo é transformar todas as economias em
capitalistas-financeiras com camadas de privilégio hereditário, impondo
políticas de austeridade anti-laboral para espremer um excedente
dolarizado.

A resistência do capitalismo industrial a esta pressão internacional é
necessariamente nacionalista, porque necessita de subsídios e leis do
estado para tributar e regular o sector FIRE. Mas está a perder o
combate para o capitalismo financeiro, o qual está a transformar-se na
sua némesis, tal como o capitalismo industrial foi a némesis do senhor
da terra pós-feudal e da banca predatória. O capitalismo industrial
exige subsídios estatais e investimento em infraestruturas, juntamente
com poder regulador e fiscal para controlar a investida do capital
financeiro. O conflito global resultante é entre o socialismo (a
evolução natural do capitalismo industrial) e um fascismo pró-rentista,
uma reacção estatal-financeira-capitalista contra a mobilização do poder
estatal do socialismo para repelir os interesses dos rentistas pós-feudais.

Portanto, subjacente à rivalidade hoje sentida pelos Estados Unidos
contra a China está um choque de sistemas económicos. O conflito real
não é tanto "América vs. China", mas sim capitalismo financeiro vs.
capitalismo/socialismo de "estado" industrial. O que está em jogo é se
"o estado" irá apoiar a financeirização em benefício da classe rentista
ou fortalecer a economia industrial e a prosperidade global.

Para além do seu horizonte temporal, o outro grande contraste entre
capitalismo financeiro e capitalismo industrial é o papel do governo. O
capitalismo industrial quer que o governo ajude a "socializar os
custos", subsidiando serviços de infraestruturas. Ao baixar o custo de
vida (e consequentemente o salário mínimo), isto deixa mais lucros a
serem privatizados. O capitalismo financeiro quer arrancar estes
serviços públicos do domínio público e transformá-los em activos
privatizados submissos à renda. Isso eleva a estrutura de custos da
economia – e, em consequência, é autodestrutivo do ponto de vista da
competição internacional entre industriais.

Esta é a razão porque economias de custo mais baixo e menos
financiarizadas ultrapassaram os Estados Unidos, a começar pela China. O
modo como a Ásia, a Europa e os Estados Unidos reagiram à crise do
Covid-19 enfatiza este contraste. A pandemia forçou cerca de 70 por
cento dos restaurantes de bairro locais a encerrarem diante de grandes
rendas e dívidas atrasadas. Arrendatários, desempregados proprietários
de habitações e investidores imobiliários, bem como numerosos sectores
de consumo enfrentam também despejos e desalojamentos, insolvência e
execução de hipotecas ou vendas desesperadas quando a actividade
económica afunda.

Menos amplamente observado é como a pandemia levou a Reserva Federal a
subsidiar a polarização e monopolização da economia dos EUA,
disponibilizando crédito a apenas uma fracção de 1 por cento para
bancos, fundos de /private equity / e às maiores corporações do país,
ajudando-as a devorar pequenas e médias empresas em dificuldades.

Durante uma década após o salvamento bancário fraudulento de Obama em
2009, o Fed descreveu o seu objectivo como sendo manter a liquidez do
sistema bancário e evitar danos aos detentores dos seus títulos,
accionistas e grandes depositantes. O Fed infundiu o sistema bancário
comercial com poder de empréstimo suficiente para apoiar os preços das
acções e obrigações. A liquidez foi injectada no sistema bancário
através da compra de títulos do governo, como era normal. Mas depois de
o vírus do Covid atacar em Março de 2020, o Fed começou a comprar dívida
corporativa pela primeira vez, incluindo títulos lixo. A ex-chefe do
FDIC [Federal Deposit Insurance Corporation], Sheila Bair, e o
economista do Tesouro Lawrence Goodman, nota, a Reserva Federal comprou
os títulos "de 'anjos caídos' que afundaram para o status de lixo
durante a pandemia", por se terem permitido empréstimos
super-alavancados para pagar dividendos e comprar as suas próprias
acções [11] <#notas> .

O Congresso considerou a possibilidade de limitar a utilização das
receitas dos títulos comprados "para compensações executivas ou
distribuições a accionistas" no momento em que aprovou as medidas, mas
não fez qualquer tentativa para impedir as empresas de o fazerem.
Registando que "a Sysco utilizou o dinheiro para pagar dividendos aos
seus accionistas enquanto despedia um terço da sua força de trabalho ...
um relatório da comissão parlamentar constatou que as empresas que
beneficiaram das medidas despediram mais de um milhão de trabalhadores
entre Março e Setembro". Bair e Goodman concluem que "há pouca evidência
de que a compra da dívida empresarial do Fed tenha beneficiado a
sociedade". Pelo contrário: As acções do Fed "criaram mais uma
oportunidade injusta para as grandes empresas ficarem ainda maiores pela
compra dos competidores com o crédito subsidiado pelo governo".

O resultado, eles acusam, está a transformar a conformação política da
economia. "Os salvamentos /(bailouts) / em série do mercado pelas
autoridades monetárias – primeiro o sistema bancário em 2008 e agora
todo o mundo empresarial em meio a pandemia" – tem sido "uma ameaça
maior [para destruir o capitalismo] do que Bernie Sanders". As "taxas de
juro super baixas do Fed favoreceram o capital próprio das grandes
empresas em detrimento das suas congéneres mais pequenas", concentrando
o controle da economia nas mãos das empresas com maior acesso a tais
créditos.

As empresas mais pequenas são "a principal fonte de criação de emprego e
de inovação", mas não têm acesso ao crédito quase gratuito de que
desfrutam os bancos e os seus maiores clientes. Como resultado, o sector
financeiro continua a ser a mãe dos trusts, concentrando a riqueza
financeira e corporativa ao financiar uma devastação das empresas mais
pequenas pelas companhias gigantes para monopolizar o mercado de dívida
e de salvamento.

O resultado desta concentração financiarizada do "peixe grande come o
peixe pequeno" é uma versão nos dias modernos do Estado Corporativo do
fascismo. Radhika Desai chama a isto "creditocracia", regido pelas
instituições no controle do crédito. [12] <#notas> É um sistema
económico no qual os bancos centrais tomam dos órgãos políticos eleitos
e do Tesouro o controle da política económica, completando assim o
processo de privatização do controle da economia no seu todo.

27/Janeiro/2021

[2] "The Theory of Dynamic Economics," Essays in Economic Theory ed.
Rexford Guy Tugwell (New York: 1924), pp. 96 e 98, originalmente em The
Publications of the University of Pennsylvania, Political Economy and
Public Law Series 3:2 (whole No. 11), 1892, p. 96. Governos
aristocráticos da Europa desenvolveram sua política fiscal "numa época
em que o estado era uma mera organização militar para a defesa da
sociedades de inimigos estrangeiros, ou para satisfazer sentimentos
nacionais por guerras agressivas". Tais estados tinham uma política de
desenvolvimento económico "passiva" e sua filosofia fiscal não se
baseava na eficiência económica. Apresento pormenores em "Simon Patten
on Public Infrastructure and Economic Rent Capture," American Journal of
Economics and Sociology 70 (October 2011), pp. 873-903.
[3] George defendeu um imposto sobre a terra, mas a sua oposição ao
socialismo levou-o a rejeitar os conceitos de valor e preço, necessários
para definir a renda económica quantitativamente. A sua defesa dos
banqueiros e dos juros tornou as suas recomendações políticas ineficazes
na medida em que passou para a ala da direita libertária do espectro
político, opondo-se a investimento governamental, mas limitando-se a
tributar as rendas dos privatizadores – o contrário do que Patten e a
sua escola pró-industrial de economistas defendiam, com base na teoria
clássica do valor e dos preços.
[4] "The Theory of Dynamic Economics," p. 98.
[5] Discurso de 24 de Junho de 1877. Ele utilizou o latim e disse
"Sanitas, Sanitatum" e traduziu isto como "Saneamento, tudo é
saneamento". Era um jogo de palavras com o famoso aforismo, "Vanitas,
vanitatum," "Vaidade, tudo é vaidade".
[6] William Lazonick, "Profits Without Prosperity: Stock Buybacks
Manipulate the Market and Leave Most Americans Worse Off," Harvard
Business Review, September 2014. E mais recentemente, Lazonick e
Jang-Sup Shin, Predatory Value Extraction: How the Looting of the
Business Corporation Became the U.S. Norm and How Sustainable Prosperity
Can Be Restored (Oxford: 2020).
[7] Joan Farre-Mensa, Roni Michaely, Martin Schmalz, "Financing
Payouts," Ross School of Business Paper No. 1263 (December 1, 2020),
citado por Matt Stoller," How to Get Rich Sabotaging Nuclear Weapons
Facilities," BIG, January 3, 2021.
[8] Matt Stoller, ibid. Ver também o seu artigo "Crime Shouldn't Pay:
Why Big Tech Executives Should Face Jail," BIG, December 20, 2020.
[9] George Akerloff and Paul Romer, "Looting: The Economic Underworld of
Bankruptcy for Profit,"
[10] Sheila Bair e Lawrence Goodman, "Corporate Debt 'Relief' Is an
Economic Dud", /Wall Street Journal, / January 7, 2021.
[11] Desai, Radhika. 2020.'The Fate of Capitalism Hangs in the Balance
of International Power'. Canadian Dimension, 12 October. Ver também
Geoffrey Gardiner, Towards True Monetarism (Dulwich: 1993) e The
Evolution of Creditary Structure and Controls (London: Palgrave, 2006) e
o grupo póskeynesiano Gang of 8 popularizou a expressão "creditary
economics" na década de 1990.

[NR] Ver O que significa uma recuperação económica em forma de K
<https://resistir.info/jf/saidas_suite_24out20.html>

*A primeira parte encontra-se em
resistir.info/m_hudson/ressurgencia_rentista_27jan21_1.html
<https://resistir.info/m_hudson/ressurgencia_rentista_27jan21_1.html> *

*[*] Este artigo é baseado no Capítulo 1 de /Cold War 2.0. The
Geopolitical Economics of Finance Capitalism vs. Industrial Capitalism /
(Dresden, ISLET: em impressão; tradução chinesa em 2021). Obras do autor
em Book Depository
<https://www.bookdepository.com/search?searchTerm=Michael+Hudson&search=Find+book>.


O original encontra-se em michael-hudson.com/...
<https://michael-hudson.com/2021/01/the-rentier-resurgence-and-takeover-finance-capitalism-vs-industrial-capitalism/>

In
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/m_hudson/ressurgencia_rentista_27jan21_2.html
3/2/2021

terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

El Fondo Buitre “BlackRock” llega al poder con Joe Biden

 




ALFREDO JALIFE-RAHME, PROFESOR DE LA UNIVERSIDAD AUTÓNOMA DE MÉXICO

BlackRock, transnacional para el «manejo de inversiones» con un capital
que se ha elevado en forma estratosférica a 8,7 billones de dólares,
logró colocar en forma espectacular en el gobierno de Biden y Kamala a
tres de sus funcionarios más importantes.

El súper-banco BlackRock -que comparte los primeros sitiales con
Vanguard, Fidelity y State Street – se benefició enormemente por el
manejo de los Bonos del Tesoro que le asignó de forma discrecional el
israelí-estadounidense y exsecretario del Tesoro, Steve Mnuchin, quien
al parecer fue estimulado por el talmúdico Jared Kushner, yerno de
Donald Trump.

No es gratuito que el súper-banco BlackRock haya sido uno de los
principales beneficiados durante la pandemia del COVID-19. De hecho,
BlackRock fue denunciado por haber manejado ilícitamente la compra de
deuda corporativa de la Reserva Federal en los primeros días del flagelo
muncial.

Cabe señalar que el mega-banco de inversiones Goldman Sachs – que es 5
veces menor que BlackRock en «Activos Bajo Manejo» gozó también del maná
de Trump, de los Clinton y de Obama.

No por casualidad, Steve Mnuchin (ex Secretario del Tesoro), Gary David
Cohn ( asesor económico de Trump) y Steve Bannon (consejero principal de
Trump) provienen de Goldman Sachs.

Pues bien, ahora todo indica que el súper-banco BlackRock ha desplazado
del poder al mega-banco Goldman Sachs.

Por tanto, no es ocioso recordar que Larry Fink, mandamás de BlackRock,
fue el candidato para la Secretaría del Tesoro, en caso de un triunfo de
Hillary Clinton. Su supuesto papel era arreglar el marasmo económico que
había legado Obama con la severa crisis del 2008 que arrojó una
destrucción de capital por nada menos que 60 *billones* de dólares.

*El Fondo buitre BlackRock colocó en el gobierno a sus empleados
estrella: Mike Pyle, Brian Deese y Wally Adeyemo.*

El funcionario de mayor jerarquía de BlackRock, Mike Pyle – estratega en
jefe de las Inversiones Globales – ha sido nombrado «economista en jefe»
de la vicepresidenta Kamala Harris.

Brian Deese es el nuevo director del Consejo Económico Nacional, y el
nigeriano-estadounidense Wally Adeyemo es el Vicesecretario del Tesoro.

Muchos en Washington se están preguntando ¿Con estos nombramientos
BlackRock están pensando que Kamala Harris (de 56 años) puede llegar a
sustituir al presidente Joe Biden (de 78 años) a quien se le podrían
aplicar la Enmienda 25 por disfunción cognoscitiva?

Cabe señalar que Kamala Harris está casada con Douglas Emhoff, miembro
del bufete de abogados trasnacional DLA Piper, la tercera firma legal en
EEUU, del que forma parte el expresidente español y fanático monetarista
neoliberal José María Aznar.

Tal como están las cosas en Washington una cosa es segura: Kamala
Harris, es la primera vicepresidenta que goza de tanto poder.

En este escenario lo que asombra es la capacidad de anticipación
política de Larry Fink (el mandamás de BlackRock) quien, en 2016 formó
un «gobierno en la sombra” con operadores del Partido Demócrata y
algunos «genios» de política económica. Según la revista Sludge, la
gracia de Mike Pyle, uno de los “genios” de Fink, es que es “el máximo
experto estadounidense en políticas neoliberales».

¿Cómo pueden las mismas políticas neoliberales tener diferentes
resultados ayer con Obama y hoy con Biden y Kamala Harris? Al menos,
sostienen en Wall Street que se trate de una política económica que se
proponga destruir las finanzas de China, Europa y Rusia.

Para Sludge, Mike Pyle es un personaje que hace de bisagra entre Obama y
la dupla Clinton/Kamala:“/que/ /curiosamente a pesar de ser el principal
asesor económico del gobierno no despachará con Biden sino con Kamala
Harris, la potencial sucesora de Biden»,/

Hace ya un tiempo The American Prospect reportó que Mike Pyle fue
miembro del «gobierno en la sombra» de Larry Fink .Su elección demuestra
simplemente la «influencia de los Clinton en Kamala Harris » cuya
hermana fue una connotada consejera política del gobierno de Bill Clinton».

Una cosa está clara los grandes intereses económicos están instalados en
el seno de la cúpula Demócrata. Su élite dominante no ha dejado el poder
político desde hace décadas: hoy detrás Biden, se encuentra Obama, que
está operando “de facto” su tercer mandato, detrás de Kamala están los
Clinton – que ostentan, a lo menos, una fortuna de 8 millones de dólares
en bienes raíces.

En este tablero de ajedrez del poder, Kamala es el siguiente relevo,
pues todos la vislumbran como la sucesora de Biden: ya sea mediante la
enmienda 25, ya sea después que Biden concluya su mandato.

*El Fondo Buitre en el poder.*

Estos nombramientos han enfurecido a los «progresistas demócratas”.
Brian Deese, ahora director del Consejo Económico Nacional » es parte de
los “genios” de BlackRock, el súper-banco que juega doble con sus
inversiones:  aposta al petróleo y también a las energías verde . Deese
ayudó a Obama a rescatar la industria automotriz durante la grave crisis
de 2008..Claro que este personaje no es un exhibicionista, su estilo es
operar en las sombras, según The New Republic, «Deese, es una de las
personas más poderosas, pero menos famosas» de la elite norteamericana.

Por su parte el nigeriano-estadounidense Wally Adeyemo asumió como
Vicesecretario del Tesoro junto a la poderosa Janet Yellen. Adeyemo fue
presidente de la fundación de Obama, Viceconsejero de Seguridad
Nacional, y Vicedirector del Consejo Nacional Económico. Salvo en la
«Fundación Obama», Wally Adeyemo, ha sido usado por el expresidente como
un operador relevante desde un discreto segundo plano.

Otro dato interesante para entender los lazos que conforman la elite
neoliberal estadounidense, es que los tres mosqueteros de BlackRock –
Pyle, Deese y Adeyem – se graduaron en Leyes en Yale al igual que Joe
Biden y Kamala Harris.

El papel de Black Rock va mucho más allá de un Fondo de Inversión.
BlackRock participó en la privatización de Pemex, la otrora gigante
empresa estatal mexicana y, la revista británica The Economist demostró
las prácticas depredadoras de BlackRock, de hecho un Fondo Buitre que
controla las principales transnacionales del Imperio.

Con todos estos antecedentes la situación es un poco más clara.
BlackRock es más que una empresa, es un conglomerado económico que se
propone controlar financiera y políticamente a medio mundo.

In
OBSERVATORIO DE LA CRISIS
https://observatoriocrisis.com/2021/02/02/el-fondo-buitre-blackrock-llega-al-poder-con-joe-biden/
2/1/2021