sábado, 1 de dezembro de 2018
Ao lado dos "coletes amarelos", coletes... vermelhos!
por Rémy Herrera
As cadeias de televisão de todo o mundo tiveram o prazer de retransmitir
os acontecimentos de rua que decorreram em Paris no sábado 24 de
Novembro. Mas nem todas elas tiveram o cuidado de fornecer aos
progressistas os elementos necessários para ir além de uma impressão de
caos e compreender a situação actual. Na 24, como aconteceu uma semana
antes, milhares de "coletes amarelo" ultrapassaram facilmente os cordões
policiais e invadiram os Campos Elíseos para ali gritar sua hostilidade à
política conduzida pelo presidente Emmanuel Macron. Mas desta vez, as
forças da ordem (cerca de 3000 homens mobilizados para a ocasião)
conseguiram impedir toda aproximação ao palácio presidencial.
As sucessivas tentativas de avanço rumo ao Eliseu dos grupos de coletes
amarelos, implacavelmente repelidos por uma chuva de granadas
lacrimogéneas e golpes de bastão, duraram, sem a menor interrupção, das
09h30 às 23h30. Ao longo de toda a jornada, dezenas de barricadas haviam
sido formadas pelos manifestantes, depois desmontadas pelos CRS. E os
múltiplos braseiros ateados na capital, foram extintos uns após os outros
pelos bombeiros. Novos feridos de um lado e do outro, novas e numerosas
interpelações. E, na mesma noite, vídeos – que não pareciam visivelmente
serem fakes – circulavam na web e já provocavam agitações nas quais
polícias encapuçados, esgotados por estes afrontamentos e nauseados pelo
dever de reprimir "um povo que se bate pelas [suas] próprias
reivindicações" (o aumento dos salários e a defesa dos serviços públicos,
dentre outras), queixavam-se de não ter podido fazer pausas e apelavam aos
seus colegas para... aderirem à mobilização dos coletes amarelo! Isto é a
França!
A estratégia de comunicação do governo foi tentar reduzir a rebelião a um
golpe de força da extrema-direita. Hábil. Está bem claro com efeito que a
extrema-direita estava lá, ela também, misturada entre os amotinados. Mas
trata-se igualmente de que Emmanuel Macron espera designar ele próprio seu
futuro adversário (na pessoa de Marine Le Pen) nas próximas eleições – o
que lhe daria uma vitória confortável (mas sem legitimidade), como em
2017. Este presidente que, como ele pretende "não recua", sabe que os
franceses não desejarão racistas para dirigi-los e procura, assim,
encerrá-los numa armadilha: ou ele, ou a extrema-direita. Contudo, ele
rapidamente terá de aceitar a evidência de que os coletes amarelos agrupam
muito mais do que isto. Trata-se da vaga de fundo de todo um povo. Classes
médias pauperizadas inclusive.
O "movimento" dos coletes amarelos não tem líderes e não os quer, mesmo
que em meio à confusão "representantes" (designados não se sabe bem como)
tenham sido recebidos com urgência pelo ministro da Ecologia e Energia
para discutir, num canto da mesa, maneiras de tornar a famosa transição
ecológica "aceitável para os mais pobres"... Uma transição ecológica
absolutamente fundamental e indispensável (quem duvida, excepto Donald
Trump e o príncipe herdeiro da Arábia Saudita?), mas utilizada eficazmente
pelo governo neoliberal de Édouard Philippe como pretexto ao serviço de
uma máquina de guerra social: a busca de uma política de rigor salarial
que mais ninguém quer.
Em termos mais amplos, o problema da liderança certamente também se
coloca para as organizações de esquerda. Sindicatos especialmente. Os
dirigentes dos sindicatos reformistas ?– sobretudo aqueles CFDT –
prosternaram-se imediatamente aos pés do governo, que os recompensou
louvando seu "sentido de negociação" (tradução: de submissão). Muito
mais importante é o que acontece com a CGT. Uma CGT cujos resultados nas
eleições profissionais colocaram, em 26 de novembro, claramente à testa
dos sindicatos da SNCF – e felizmente. Na base, e internamente, vozes cada
vez mais audíveis haviam manifestado amarga decepção por ver as instâncias
confederais da CGT dedicarem-se a abrandar o ritmo de greves e
manifestações de Abril-Maio-Junho, na expectativa de um retorno à calma –
e das férias de Verão. Mas as lutas dos trabalhadores, embora dispersas e
menos mediatizadas, na realidade nunca cessaram desde a Primavera ...
Hoje, a decisão do secretário-geral da CGT, Philippe Martinez (o qual em
Maio 2017 havia apelado a que "Macron obtenha o melhor resultado
possível" para vencer a candidata da Frente Nacional) de "se distanciar"
da mobilização dos coletes amarelos, fez as suas tropas reagirem.
Nesta data de quinta-feira 29 de Novembro, a lista dos camaradas que se
puseram em greve e que bloqueiam suas unidades de trabalho nos sectores da
energia (reservatórios petrolíferos, nuclear...), da saúde (trabalhadores
de ambulâncias) ou da grande distribuição (lojas Carrefour), em
solidariedade com os coletes amarelo já é demasiado longa para que as
pormenorizemos nestas linhas. E eis que "coletes amarelos" da CGT anunciam
que doravante seria preciso igualmente contar com eles: apoiarão os
coletes amarelos e responderão presente ao apelo destes últimos para se
manifestar novamente, em toda a França, e evidentemente na capital, no
próximo sábado 1 de Dezembro.
O presidente Macron e os potentados do dinheiro a que ele serve com zelo
deveriam inquietar-se. Um movimento popular de fundo, maciço,
mulltiforme, obstinado, imparável, parece estar lançado. E a
"convergência das lutas" tão buscada na Primavera poderia talvez começar
a desenhar-se antes da entrada no Inverno.
29/Novembro/2018
In
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/franca/remy_29nov18.html
29/11/2018
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