terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Anatomia Ideológica da Disney


 Fernando Buen Abad    

É muito oportuna nesta época “festiva” a análise do esmagador domínio ideológico
do conglomerado das indústrias do entretenimento, dos grandes meios de
comunicação globais e das redes digitais. Um exemplo recente é bem elucidativo:
a promoção da “franchise” Star Wars – hoje parte do universo Disney – por parte
de destacadas figuras da extrema-direita norte-americana, destacando o conteúdo
ideológico que sempre assumiu como essencialmente belicista, anticomunista e de
propaganda imperialista. Através do eficaz e quase inatacável universo da
cultura mediática de massas.
...

Como sucede com muitas outras mercadorias hiperventiladas publicitariamente, um
“público” massivo e mundial decidiu sepultar toda a razão crítica perante o
discurso Disney e cedeu-lhe territórios nodais tornando-o carne dos seus sonhos
e dos seus afectos. Os filhos como primeiras vítimas. Até os mais recalcitrantes
social-democratas vestem as suas meninas de princesitas. E há que ouvir as -
nada pouco irresponsáveis - justificações.
Hoje o império Disney deu passos enormes na sua aventura monopolizadora do reino
mediático global. Anuncia também a imprensa monopolista (como se se tratasse de
uma conquista moral) a compra feita pela Disney de uma percentagem de acções da
empresa Fox: “A compra por parte da Disney da divisão de entretenimento da Fox
por US$52.400 milhões faz prever um abalo no mundo do consumo digital e
audiovisual.” Mas nem tudo é dinheiro para estes “homens de negócios”. Já o
diziam Ariel Dorfman e Armand Mattelart, (1972) históricos analistas da Disney.
No epicentro do problema que isto implica para a humanidade está não só o
protagonismo descontrolado do império económico anglo-saxónico-israelita sobre
os meios de comunicação e cultura planetários; está não só o perigo da
uniformização dos gostos e dos consumos; está não só o cancelamento da
diversidade e da liberdade de expressão dos povos… está o colonialismo da
mentalidade belicista empenhada em convencer-nos a aceitar a indústria das
guerras como um facto natural e darwiniano ante o qual apenas nos resta
resignar-nos, consumir e aplaudi-los.
E para que o aceitemos mansamente, quer dizer consumidoramente, eles contam com
os seus noticiários, os seus filmes, as suas séries televisivas, os seus heróis,
os seus desenhos animados e os seus valores adornados mercantis. E contam também
com as festas, os disfarces, a música, as canções e o Natal. Infiltraram a
propaganda dos seus bastiões ideológicos com personagens emblemáticos até nos
berços dos bebés. Dominação amplíssima dos territórios simbólicos. “Esta
aquisição que antes teria sido impensável promete transformar Hollywood e
Silicon Valley. É o maior contra-ataque de uma empresa de meios de comunicação
tradicional contra os gigantes tecnológicos que se introduziram de forma
agressiva no negócio do entretenimento”, sublinhou uma análise do diário The New
York Times…”A Disney tem agora suficiente músculo para se converter num
verdadeiro competidor de Netflix, Apple, Amazon, Google e Facebook no mundo em
acelerado crescimento do vídeo em linha”. [1]
O papel da Disney na história do belicismo mundial não é novo nem é ingénuo.
Desempenhou o papel de uma agência de propaganda que foi capaz de seduzir
“pequenos e grandes” com os néctares de uma trivialidade atrevida, um raciocínio
mercantilista “linearizado” ao máximo e uma moral maniqueia que tomou conta do
reino do “bem” enquanto se apropriava dos avanços tecnológicos e comunicacionais
do seu tempo. “No que diz respeito à Disney, a participação deste projecto
durante a guerra traduziu-se em lucros económicos e obviamente numa consolidação
empresarial, mas sobretudo em algo absolutamente impagável: na associação da
marca Disney (e de Mickey Mouse por extensão) ao espírito americano de liberdade
dentro do imaginário colectivo da população da época mas que, de facto, chega
até aos nossos dias”. [2]
A Disney contém na sua base ideológica todos os ingredientes nazi-fascistas que
se “modernizaram” no decurso dos últimos anos. Tornam-se evidentes não apenas
nos seus discursos explícitos mas também na própria alma dos seus modelos
organizacionais como empresas monopolistas transnacionais. A grande emboscada
radica em fazer deslizar como inocentes as manias burguesas mais insuportáveis.
Desde o Tio Patinhas até à mais infernal enxurrada formas de agir mercantis e de
estereótipos de conduta, que sob o manto sagrado da Disney intervêm contra
crianças, adolescentes e adultos. E então “perdoa-se-lhes” tudo, inclusivamente
que seja um dos maiores e mais perigosos dispositivos de concentração mediática
do planeta. ¿Como pode ser tão maligno um consórcio que fabrica e vende
personagens tão “angelicais” e “meigos”? Perguntar-se-ão alguns.
Uma das armas actualmente mais poderosas de guerra ideológica é a indústria
mediática. 96% dos meios de comunicação do mundo estão sob o controlo de seis
empresas. Sob a direcção de Robert A. Iger, empresário estado-unidense de origem
judaica director da Disney desde o ano 2000, esta assentou a sua habilidade
comercial e estratégica num mundo em que as guerras são um grande negócio, em
ler os contextos para inserir os seus produtos, valores, ideologias e sensações
de “segurança e bem-estar” tão necessárias para que a burguesa invista
tranquilamente as suas poupanças em destruir ou reprimir a concorrência
comercial ou os seus inimigos de classe. Serve para isso o imenso potencial
propagandístico capaz de operar massivas lavagens ao cérebro utilizando todo o
tipo de invenções de guerra psicológica. A lista dos donos de semelhante
armamento ideológico é: Sumner Redstone (Murray Rothstein, Viacom, MTV), Robert
Iger (Disney), Roger Ailes (Fox), Stanley Gold (Shamrock ABC/Disney), Barry
Meyer (Warner Bros), Michael Eisner (Disney), Edward Adler (Time Warner), Danny
Goldberg – David Geffen (Dreamworks, Elektra/Asylum Records), Jeffrey Katzenberg
(Dreamworks, Disney), Jean-Bernard Levy (Vivendi, França), Joe Roth, Steven
Spielberg, Ron Meyer, Mark Zuckerberg (Facebook), Mortimer Zuckerman, Leslie
Moonves (CBS).
Mas retratar o poder colonizador é apenas uma parte muito básica. Faz falta
delinear o que fazer. Tomar cautelas e dispor-se a criar as fontes culturais e
comunicacionais transformadoras sem imitar os formatos hegemónicos, sem se
subordinar aos seus modos alienantes, sem repetir os seus vícios. Faz falta
claridade política e decisão organizada, faz falta que todas as lutas coloquem
nas suas agendas a batalha das ideias e a batalha comunicacional num cenário de
disputa simbólica em que se nos vai a identidade, se nos vai a palavra, se nos
vai a vida. Nada menos.
—-
Notas:
 [1]http://www.bbc.com/mundo/noticias-42359905
 [2] Raquel Crisóstomo Gálvez:
https://www.academia.edu/1778128/Walt_Disney_en_el_frente_propaganda_b%C3%A9lica_y_animaci%C3%B3n
 Cubadebate
 Texto completo em: https://www.lahaine.org/anatomia-ideologica-de-disney


In
O DIÁRIO.INFO
https://www.odiario.info/anatomia-ideologica-da-disney/
2/1/2018

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