quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Em carta aberta, engenheiros da Petrobrás denunciam entrega do petróleo brasileiro





AEPET 021/19
Rio de Janeiro, 08 de outubro de 2019

Ilmo. Sr.
Presidente do Conselho de Administração da Petrobrás
Eduardo Bacellar Leal Ferreira
Av. Henrique Valadares, 28, Torre A/19º andar
Nesta

Assunto: Plano Estratégico da Petrobrás

Prezado Presidente,

Trazemos para a consideração deste Conselho, os seguintes dados e
informações:

O petróleo do Brasil tem sido exportado em volumes recordes, cerca de
1,2 milhões de barris de petróleo por dia, volume equivalente a 45% da
produção de petróleo cru no país.

Existe relação entre o consumo de energia, o crescimento econômico e o
desenvolvimento humano. O consumo per capita de energia no Brasil é
muito baixo, quase seis vezes menor em relação aos Estados Unidos e
quase cinco em relação a Noruega. No entanto, quase metade do petróleo
produzido no Brasil não tem sido consumido no país, está sendo
exportado, em grande medida por multinacionais estrangeiras.

Enquanto se exporta o petróleo cru do Brasil, o país importa cada vez
mais seus produtos refinados. São importados cerca de 500 mil barris de
derivados de petróleo por dia, a maior parte produzida nos Estados Unidos.

*2) A política de preços da Petrobrás, desde 2016, é de paridade em
relação aos preços dos combustíveis importados. A prática de preços mais
altos que os custos de importação tem viabilizado a lucratividade da
cadeia de importação e a competitividade dos combustíveis importados, em
especial dos Estados Unidos.*

O combustível brasileiro mais caro perde mercado para o importado, o que
resulta na ociosidade das refinarias da Petrobrás, em até um quarto da
sua capacidade.

O consumidor brasileiro paga preços vinculados ao petróleo no mercado
internacional e à cotação do dólar, além dos custos estimados de
importação, apesar do petróleo ser produzido no Brasil e de haver
capacidade de refiná-lo no país, enquanto isso a Petrobrás perde mercado.

De janeiro a julho de 2019, 82% do diesel importado pelo Brasil foi
produzido nos Estados Unidos. Da gasolina 71% e do etanol - que ocupa o
mercado da gasolina - 94%.

Nenhum país se desenvolveu exportando petróleo cru por multinacionais
estrangeiras e importando produtos refinados.

*3) Matriz energética mundial revela a importância dos fósseis*

As fontes primárias de origem fóssil - carvão, petróleo e gás natural -
responderam por 80,2% da demanda total em 2000. Em 2017, a participação
dos fósseis se elevou para 80,8%.

A participação das energias de origem fóssil na demanda de energia
mundial se manteve estável nos últimos 25 anos. É improvável que percam
importância relativa nas próximas décadas, considerando sua qualidade
(flexibilidade, facilidade de uso, densidade energética e
confiabilidade) e quantidade (disponibilidade), em comparação com as
demais fontes primárias de energia.

/Figura 1: Consumo por fonte de energia primária mundial (2017) (IEA, 2019)/

*4) Elevação da produção de petróleo por multinacionais estrangeiras*

A elevação da exportação do petróleo cru brasileiro, com o aumento da
importação dos produtos refinados e da ociosidade das refinarias da
Petrobrás, foi acompanhada da elevação da produção de petróleo do Brasil
por multinacionais privadas e estatais estrangeiras.

Em maio de 2019, a Petrobrás, na condição de empresa concessionária, foi
responsável por 75,15% da produção nacional de petróleo e gás natural,
alcançando 2,61 milhões bep/d. A Shell/BG Brasil, com a produção de 427
mil bep/d, que representa 12,29% do total nacional, classificou-se como
a 2ª em produção. A 3ª empresa concessionária com maior produção foi a
Petrogal Brasil, tendo obtido 3,36% da produção do País, com média de
117 mil bep/d. A Repsol Sinopec foi responsável por 2,62% da produção
nacional, sendo a 4ª concessionária com maior produção, obtendo 91 mil
bep/d. A Equinor Energy, como a 5ª maior concessionária, produziu 1,47%,
com 51 mil bep/d e a Equinor Brasil, como a 6ª produtora, atingiu 1,15%
da produção, com 40 mil bep/d. As demais concessionárias alcançaram a
parcela de 3,96% da produção nacional, com o volume de 137,4 mil bep/d.

Em termos absolutos e relativos cresce a desnacionalização da produção
do petróleo brasileiro.

Uma típica colônia extrativa e primário exportadora fornece matérias
primas a países estrangeiros, sem agregar valor, e importa produtos,
tecnologias e serviços valorizados.

Em maio de 2019, foi exportado petróleo cru do Brasil para os seguintes
países: China (51%), EUA (21%), Uruguai (6%), Chile (5%), Espanha (4%) e
outros (13%).

*5) Elevação da importação combustíveis produzidos nos Estados Unidos*

Em 2015, o diesel produzido nos Estados Unidos representou 41% do total
de 16200 toneladas por dia importado pelo Brasil.

Em 2019, de janeiro a julho, a fração do diesel importado dos Estados
Unidos se elevou para 82% do total importado que alcançou 25561
toneladas por dia.

Em 2015, a gasolina produzida nos Estados Unidos representou 23% do
total de 5020 toneladas por dia importadas pelo Brasil.

Em 2019, de janeiro a julho, a fração da gasolina importada dos Estados
Unidos se elevou para 71% do total importado que se elevou para 9874
toneladas por dia.

A política de preços paritários aos de importação (PPI), responsável
pela elevação dos preços dos derivados produzidos no Brasil, a redução
da sua competitividade e a consequente ociosidade das refinarias da
Petrobrás reduziu tanto a produção quanto a competitividade da gasolina
em relação ao etanol produzido no Brasil e importado.

A Petrobrás perde com a redução da sua participação no mercado. O
consumidor paga mais caro, desnecessariamente, com o alinhamento aos
preços internacionais do petróleo e à cotação do câmbio.

Em 2014, foram produzidos quase 50 milhões de metros cúbicos de diesel
no Brasil. A produção nacional de diesel foi reduzida em 16%, para menos
de 42 milhões de metros cúbicos em 2018.

A Petrobrás pode praticar preços inferiores aos paritários de importação
(PPI) e obter melhores resultados empresarias, com a recuperação da sua
participação no mercado brasileiro e a maior utilização da sua
capacidade instalada de refino.

Somente a Petrobrás consegue suprir o mercado doméstico de derivados com
preços abaixo do paritário de importação e, ainda assim, obter
resultados compatíveis com a indústria internacional e sustentar
elevados investimentos que contribuem para o desenvolvimento nacional.

No entanto, a política de preços dos combustíveis e a privatização das
refinarias pode impedir que a Petrobrás exerça seu potencial competitivo
para se fortalecer e impulsionar a economia nacional com seu
abastecimento aos menores custos possíveis.

*6) Aceleração dos leilões de petróleo promove o ciclo extrativo e
primário exportador do tipo colonial*

Com relação a exploração e produção do pré-sal deve ser considerada a
velocidade dos leilões sob o regime de partilha e o volume de 5 bilhões
de barris equivalentes de petróleo (bep) no qual a Petrobrás opera sob o
regime da Cessão Onerosa.

Com o 1º leilão da partilha e a Cessão Onerosa, a Petrobrás detinha 60%
das reservas recuperáveis sob estes dois regimes. As multinacionais
estrangeiras privadas (Shell e Total) alcançavam 26,7% e as empresas
estatais chinesas 13,3% de um total estimado em 15 bilhões de barris
equivalentes de petróleo (bep).

Nos quatro leilões de partilha seguintes, as multinacionais privadas,
International Oil Companies (IOCs), aumentaram significativamente suas
reservas no pré-sal. Neste período, a Petrobrás garantiu acesso à apenas
17,4% do volume leiloado. Sendo o restante do volume distribuído da
seguinte forma: empresas estrangeiras privadas (Shell, BP, Total,
ExxonMobil, Chevron e Petrogal) alcançaram 54,7%, a estatal norueguesa
(Equinor, ex Statoil) ficou com 10,9%, as estatais chinesas com 9,8%, a
estatal colombiana 4,1% e a estatal do Catar 3,0% do volume total
estimado (e riscado) como recuperável de 12,21 bilhões bep.

Considerando os cinco leilões e a Cessão Onerosa, a Petrobrás tem 41%,
enquanto as empresas estrangeiras, privadas e estatais, têm acesso a 59%
do total volume recuperável estimado de 27,21 bilhões de bep.

O volume recuperável estimado, cedido onerosamente para a Petrobrás
somado aos concedidos nos cinco primeiros leilões de partilha, alcança
cerca de 27 bilhões de barris de petróleo equivalente. Este volume,
comparado com as reservas nacionais provadas, representa a 15ª maior
reserva internacional. Mais do que duas vezes maior do que a atual
reserva provada do Brasil (13,0 bilhões bep) e da Argélia (12,2), mais
do que três vezes maior que as reservas de Angola (8,3), Equador (8,3),
México (7,3) e Azerbaijão (7,0) e mais do que quatro vezes a reserva
provada da Noruega (6,6).

*7) Novos leilões de partilha: Excedente da Cessão Onerosa e 6ª rodada*

Apesar do expressivo volume do pré-sal já concedido por meio da Cessão
Onerosa e das cinco primeiras rodadas de partilha, estimado em mais de
27 bilhões de barris (bep), e da corrente exportação de mais de um
milhão de barris por dia, o governo federal planeja realizar ainda em
2019 o leilão do Excedente da Cessão Onerosa e a 6ª rodada de partilha
do pré-sal.

Estima-se que o volume recuperável no Excedente da Cessão Onerosa possa
alcançar até 15 bilhões de barris de petróleo equivalente. Estamos
diante da aceleração do ciclo primário exportador do petróleo brasileiro.

Para justificar o ciclo extrativo e primário exportador do petróleo
brasileiro foi criado o mito da Petrobrás quebrada, a falácia da
necessidade da privatização de ativos para redução da dívida e a lenda
do petróleo que brevemente se tornaria um mico (sem valor)

*8) Maiores petrolíferas são estatais*

As estatais já são 19, entre as 25 maiores empresas de petróleo e gás
natural, controlando 90% das reservas e 75% das produções mundiais.

As vendas de ativos da Petrobrás não se justificam pela redução do
endividamento e estão em contradição com o aumento da integração
vertical e da internacionalização das companhias de petróleo, inclusive
as estatais.

O governo federal não dispõe de uma política para o controle da produção
e da exportação de petróleo. Não conhece todo o potencial de reservas do
pré-sal, mas apressa leilões de áreas que podem conter dezenas de
bilhões de barris de petróleo, apenas para cobrir déficits fiscais. Esta
política poderá levar ao esgotamento prematuro das reservas nacionais.

É necessário investir na delimitação de jazidas e na definição das
reservas do pré-sal, como condição para definir a extensão das
concessões. O petróleo produzido deve ser direcionado, prioritariamente,
para o uso interno e para a produção de derivados pelo parque de refino
nacional. A exportação deve ser residual.

O objetivo do planejamento da produção deve ser a segurança energética
nacional e o abastecimento aos menores custos possíveis.

A natureza e o trabalho de gerações de brasileiros nos deram a grande
oportunidade que é o petróleo do pré-sal. Precisamos ser capazes de
empreender um projeto soberano para, desta vez, usar as riquezas
naturais brasileiras em benefício da maioria da população.

É do nosso entendimento que os dados e informações apresentados devem
ser levados em consideração para que a Petrobrás volte a ter como
objetivo estratégico o abastecimento do País, aos menores custos
possíveis para a população, garantindo os recursos para os investimentos
necessários do setor.

Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)


In
BRASIL 247
https://www.brasil247.com/economia/em-carta-aberta-engenheiros-da-petrobras-denunciam-entrega-do-petroleo-brasileiro
16/10/2019

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