quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

O capitalismo na sua fase autofágica





O ocidente está reduzido a canibalizar-se

por Paul Craig Roberts [*]

Eu próprio, Michael Hudson, John Perkins e alguns outros, temos relatado
os múltiplos saqueios de povos pelas instituições econômicas ocidentais,
principalmente os grandes bancos de Nova Iorque com a ajuda do Fundo
Monetário Internacional (FMI).

Os países do terceiro mundo foram e são saqueados ao serem induzidos em
certos planos de desenvolvimento. A governos crédulos e confiantes é-lhes
dito que podem tornar os seus países ricos contraindo empréstimos externos
para implementarem planos de desenvolvimento que as potências ocidentais
apresentam e que teriam em resultado desse desenvolvimento económico
suficientes receitas fiscais para pagamentos dos empréstimos externos.

Raramente, se alguma vez, isso acontece. O que acontece é que o país se
torna endividado até ao limite, muito para além dos seus ganhos em moeda
estrangeira. Quando o país é incapaz de satisfazer o serviço de dívida, os
credores enviam o FMI ao governo endividado para dizer que o FMI poderá
proteger o rating financeiro do governo emprestando-lhe dinheiro para
pagar aos seus credores bancários. No entanto, as condições impostas são
que o governo deverá tomar as necessárias medidas de austeridade a fim de
poder pagar ao FMI.

Estas medidas consistem em restringir serviços públicos, o sector
estatal, pensões de reforma e vender recursos nacionais aos estrangeiros.
O dinheiro economizado pela redução de benefícios sociais e o obtido com a
venda de ativos do país aos estrangeiros serve para pagar ao FMI.

Esta é a maneira pela qual historicamente o Ocidente tem saqueado países
do terceiro mundo. Se o presidente de um país estiver relutante em entrar
em tal negócio, ele simplesmente é subornado, como governos gregos foram,
juntando-se ao saque do país que pretensamente representaria. Quando este
método de saque se esgota, o Ocidente compra terras agrícolas forçando
países do terceiro mundo a abandonarem uma política de auto-suficiência
alimentar, produzindo uma ou duas culturas para exportação.

Esta política tornou populações do terceiro mundo dependentes das
importações de alimentos do ocidente. Normalmente as receitas de
exportação são captadas por governantes corruptos ou pelos compradores
estrangeiros que pagam preços reduzidos pelas exportações enquanto os
estrangeiros vendem alimentos demasiado caro. Desta forma, a
auto-suficiência é transformada em endividamento.

Com o terceiro mundo explorado até aos limites possíveis, as potências
ocidentais resolveram saquear os seus próprios países. A Irlanda tem sido
saqueada, o saque da Grécia e de Portugal é tão severo que forçou um
grande número de mulheres jovens à prostituição. Mas isso não incomoda a
consciência ocidental.

Anteriormente, quando um país soberano se encontrava com endividamento
superior ao que poderia suportar, os credores tinham que anular parte da
dívida até um montante em que o país pudesse suportar. No século XXI,
como relato no meu livro The Failure of Laissez Faire Capitalism, esta
regra tradicional foi abandonada.

A nova regra é que a população de um país, até mesmo de países cujos
dirigentes de topo aceitaram subornos para endividar o país a
estrangeiros, deve ter as pensões de reforma, emprego e serviços sociais
reduzido. Além disto, valiosos recursos nacionais como sistemas municipais
de água, portos, lotaria nacional e espaços naturais protegidos, tais como
as ilhas gregas protegidas, vendidas a estrangeiros, que ficam com a
liberdade de aumentar os preços da água, negar ao governo grego as
receitas da lotaria nacional e vender a imobiliárias o patrimônio nacional
protegido da Grécia.

O que aconteceu à Grécia e a Portugal está em curso em Espanha e Itália.
Os povos são impotentes, porque seus governos não os representam. E não se
trata apenas de governantes que receberam subornos, os membros dos
governos possuem a lavagem cerebral de que os seus países devem pertencer
à União Europeia, caso contrário, serão ultrapassados pela história.

Os povos oprimidos e sofredores sofrem o mesmo tipo de lavagem cerebral.
Por exemplo, na Grécia o governo eleito para evitar o saque da Grécia
estava impotente porque a lavagem cerebral ao povo grego era para que
custasse o que custasse deviam permanecer na UE. A junção de propaganda,
poder financeiro, estupidez e subornos significa que não há esperança
para os povos europeus.

O mesmo é verdade nos Estados Unidos, Canadá, Austrália e Reino Unido.
Nos Estados Unidos dezenas de milhões de cidadãos dos EUA aceitaram
tranquilamente a ausência de qualquer rendimento de juros sobre suas
poupanças durante sete anos. Em vez de levantarem questões e protestarem,
os americanos aceitaram sem pensar a propaganda de que a sua existência
depende do êxito de um punhado de megabancos artificialmente criados,
"grandes demais para falir". Milhões de americanos estão convencidos de
que é melhor para eles deixar degradar as suas economias do que um banco
corrupto falir.

Para manter os povos ocidentais confusos sobre a real ameaça que
enfrentam, é dito às pessoas que há terroristas atrás de cada árvore, de
cada passaporte, ou mesmo sob cada cama, e que todos serão mortos a menos
que o excessivo poder do governo seja inquestionável. Até agora isso tem
funcionado perfeitamente, com falsas palavras de ordem, reforçando falsos
ataques terroristas, que servem para evitar a tomada de consciência de que
isto não passa de um embuste para acumular todos os rendimentos e riqueza
em poucas mãos.

Não contente com sua supremacia sobre os "povos democráticos", o “um por
cento” dos mais ricos avançou com as parcerias Transatlântica (TTIP) e
Transpacífica. Alegadamente, são "acordos de livre comércio" que
beneficiarão a todos. Na verdade, são negociações cuidadosamente
escondidas, secretas, que permitem o controlo de empresas privadas sobre
as leis de governos soberanos.

Por exemplo, veio a público que no âmbito do TTIP o Serviço Nacional de
Saúde no Reino Unido poderia ser regido por tribunais privados,
instituídos no âmbito daquele tratado e, constituindo um obstáculo para
seguros médicos privados, ser processado por danos a empresas privadas e
até mesmo forçado à sua extinção.

O corrupto governo do Reino Unido sob o vassalo de Washington David
Cameron bloqueou o acesso aos documentos legais que mostram o impacto da
parceria transatlântica no Serviço Nacional de Saúde da Grã-Bretanha.
www.globalresearch.ca/...

Para qualquer cidadão de um país ocidental, que seja tão estúpido ou
tenha o seu cérebro tão lavado para não ter percebido isso, a verdadeira
intenção da política do "seu" governo é entregar todos os aspectos das
suas vidas ao apoderamento de interesses privados.

No Reino Unido, o serviço postal foi vendido a um preço irrealista a
interesses privados com ligações políticas. Nos EUA os republicanos e
talvez os democratas, pretendem privatizar o Medicare e a Previdência
Social, assim como privatizaram muitos aspectos das forças armadas e do
sistema prisional. As funções do Estado tornaram-se alvos para o lucro
privado.

Uma das razões para a escalada do custo do orçamento militar dos EUA é a
sua privatização. A privatização do sistema prisional dos EUA resultou em
que grande número de pessoas inocentes é enviada para a prisão e forçada a
trabalhar para a Apple Computer, para empresas de vestuário que produzem
para as forças armadas e para um grande número de outras empresas
privadas. Os trabalhadores da prisão são pagos tão baixo quanto 69
centavos por hora, inferior ao salário chinês.

Isto é a América hoje. Policiais corruptos. Promotores de Justiça
corruptos. Juízes corruptos. Mas máximo lucro para os capitalistas dos EUA
a partir de trabalho nas prisões. Os economistas do livre mercado
glorificaram prisões privadas, alegando que seriam mais eficientes. E na
verdade são eficientes em fornecer os lucros do trabalho escravo para os
capitalistas.

Mostramos uma reportagem sobre o primeiro-ministro Cameron negando
informações sobre o efeito da parceria transatlântica TTIP no Serviço
Nacional de Saúde britânico.
www.theguardian.com/...

O jornal britânico Guardian, que várias vezes teve de prostituir-se
para manter um pouco de independência, descreve a raiva que sente o povo
britânico pelo sigilo do governo sobre uma questão tão fundamental para o
seu bem-estar. Contudo, continuam a votar em partidos políticos que têm
traído o povo britânico.

Por toda a Europa, governos corruptos controlados por Washington têm
distraído as pessoas sobre a forma como são vendidos pelos "seus"
governos, concentrando a sua atenção nos imigrantes, cuja presença decorre
de governos europeus representarem os interesses de Washington e não os
interesses de seus próprios povos.

Algo terrível aconteceu à inteligência e a consciência dos povos
ocidentais, que parecem já não ser capazes de compreender as maquinações
dos "seus" governos.

Governo responsável nos países ocidentais é história. Apenas fracasso e o
colapso aguarda a civilização ocidental.
[*] Foi secretário de Estado Adjunto do Tesouro para a política económica
e editor associado do Wall Street Journal. Colunista na Business Week,
Scripps Howard News Service e Creators Syndicate. Tem tido muitas
intervenções em universidades. Os seus textos na internet são seguidos no
mundo inteiro. Os livros mais recentes de Paul Craig Roberts são The
Failure of Laissez Faire Capitalism and Economic Dissolution of the West ,
How America Was Lost e The Neoconservative Threat to World Order .

O original encontra-se em www.paulcraigroberts.org/ . Tradução de DVC.


In
RESSITIR.INFO
http://resistir.info/crise/roberts_20jan16.html
24/2/2016

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