quinta-feira, 7 de abril de 2022

A crise na Ucrânia e o declínio do imperialismo estadunidense

 
 


    Edmilson Costa [*]

Cartaz do Congresso da II Internacional, 1889.

Os marxistas costumam avaliar a realidade pelos seus veios mais
profundos porque compreendem que a aparência dos fenômenos nem sempre
corresponde à essência dos acontecimentos. Buscar compreender a
realidade a partir da superfície dos eventos geralmente leva a erros
crassos de avaliação. Por isso, é fundamental sempre observar o que se
esconde por trás dos fatos, mesmo aqueles mais complexos. Esse método de
compreensão da conjuntura é um instrumento fértil para clarear a
percepção do teatro de operações, dos atores em ação, dos rumos da
conjuntura, bem como para identificar os inimigos e as principais
contradições em qualquer situação nacional e internacional, além de
evitar as análises superficiais que possam levar a resultados
desastrosos. Essas considerações são importantes porque se encaixam como
uma luva à atual crise na Ucrânia e suas repercussões na geopolítica
mundial, pois a guerra naquela região pode ser considerada a expressão
concentrada de um conjunto de fenômenos que estão ocorrendo nos
subterrâneos da ordem politica e econômica internacional e cujos
desdobramentos terão repercussão por largo período na conjuntura
internacional.

Quais são os fenômenos que efetivamente estão por trás dessa crise?
Primeiro, a crise é a expressão do desespero do imperialismo
estadunidense diante da crise sistêmica global, cujos fundamentos
demonstraram as fissuras sociais e econômicas dos Estados Unidos e o
declínio de sua hegemonia; segundo, representa o assombro
norte-americano diante da parceria entre a Rússia e a China, cuja
expressão mais recente foi o comunicado conjunto dos dois países
buscando articular uma nova ordem multipolar global; terceiro, significa
também a tentativa dos Estados Unidos de inviabilizar o gasoduto
NordStream2, que ampliaria expressivamente o fornecimento de gás da
Rússia para a Alemanha e vários países da Europa, propiciando aumento
das relações comerciais entre Rússia e Europa e reduzindo a influência
dos EUA na região. Consequentemente, os Estados Unidos visam, com a
crise, conquistar esse grande mercado energético; quarto, essa crise
também expressa uma disputa pela partilha do mundo, em novos termos, das
burguesias dos diversos países imperialistas com a burguesia da Rússia.
Portanto, a operação militar especial desencadeada pelos russos na
Ucrânia é a expressão dessas contradições na geopolítica internacional.

Uma boa pista para entender os meandros da crise na Ucrânia pode também
ser expressa em três movimentos que se articulam e que podem resultar em
desdobramentos até agora não perceptíveis na conjuntura: a) a guerra na
Ucrânia marca o começo do fim da ordem estruturada em Bretton Woods e
aprofundada a partir da queda do Muro de Berlim e da desintegração da
URSS e cujo resultado foi a hegemonia mundial solitária dos Estados
Unidos; b) haverá um descolamento cada vez mais progressivo da hegemonia
mundial do Atlântico para a Ásia-Pacífico, tendo a China e a Rússia como
eixos estratégicos da nova ordem, por unirem o poder militar e
energético russo e o poder econômico chinês; c) o declínio da hegemonia
dos Estados Unidos vai torná-lo mais agressivo, o que pode levar ao
acirramento das tensões internacionais e possivelmente a guerras em
várias partes do mundo, fenômenos próprios dos processos de mudança de
hegemonia na ordem econômica internacional, conforme nos ensina a
história; d) há a possibilidade de que nessa crise possam emergir
janelas de oportunidades para os trabalhadores colocarem em questão o
sistema capitalista e, caso sejam orientados de maneira correta, se
apresentarem como alternativa à velha ordem mundial.

Portanto, a guerra na Ucrânia é resultado desse conjunto de fenômenos e
seu resultado pode determinar os rumos de uma nova ordem internacional
porque, de um lado, a derrota das pretensões dos Estados Unidos de
transformar a Ucrânia numa plataforma para completar o cerco e colocar a
Rússia de joelhos fracassou completamente e demonstrou que a retórica e
a ação guerreira do imperialismo é brutal quando enfrenta nações
militarmente frágeis, mas se torna pouco eficaz quando encontra
adversário à altura em termos de poder militar. A fragilidade da velha
ordem hegemônica se expressa no fato de que a operação militar da Rússia
na Ucrânia encontrou pouca resistência militar interna[1] <#notas_1_9>
e, externamente, apenas lamentos agressivos e sanções econômicas por
parte do Ocidente. Como disse o próprio presidente da Ucrânia, o País
foi abandonado pelos Estados Unidos, pela OTAN e pelas outras potências
imperialistas da Europa. Zelensky fez o papel de bobo da corte:
acreditou inicialmente nas promessas de Biden e da direita europeia e se
transformou num provocador subserviente, ao enfatizar que a Ucrânia iria
se incorporar à OTAN e que o País também viria a construir armas
nucleares, o que para os russos significara uma provocação inaceitável.
Terminou falando sozinho e aceitando as condições impostas pela
realidade da guerra.

*A crise dentro da crise*

Como enfatizamos anteriormente, os elementos mais de fundo da crise
precisam ser observados atentamente para compreendermos melhor essa
conjuntura. Primeiro, o sistema capitalista e, especialmente, a economia
líder, sofreram uma das maiores crises econômicas e sociais em 2008 e
esse problema continua até hoje sem que nenhum País ligado aos Estados
Unidos tenha conseguido se recuperar plenamente e retomar o crescimento,
tanto que até agora nenhuma dessas nações conseguiu sequer voltar ao
patamar anterior a 2008. Mesmo que os Bancos Centrais tenham injetado
trilhões de dólares nas economias para salvar bancos e empresas em
crise, essas medidas apenas evitaram temporariamente o colapso do
sistema, mas não resolveram os problemas colocados pela crise. No
entanto, quando esses países começavam a comemorar algum tipo de
recuperação econômica veio a pandemia, levando a recessão ao mundo
inteiro e agravando os problemas gerados pela crise anterior,
especialmente nos Estados Unidos, cujos efeitos tornaram públicos todas
as mazelas do sistema capitalista, escondidas por décadas pelos meios de
comunicação corporativos. Agora, a economia norte-americana volta a
enfrentar novos problemas como a maior inflação dos últimos 40 anos, a
profunda desigualdade social, a quebra de empresas, a possibilidade da
emergência de um novo crash e o enfraquecimento do dólar como moeda
internacional.

O segundo elemento que explica a movimentação dos Estados Unidos e da
OTAN na Ucrânia, é a crescente aproximação entre a Rússia com a China.
Esse processo já vinha sendo verificado em período anterior à crise, mas
se tornou mais efetivo com a recente reunião de cúpula em fevereiro
deste ano entre Putin e Xi Jiping, que resultou numa declaração conjunta
onde os dois líderes se comprometeram com a construção de uma nova ordem
econômica internacional. Trata-se de um documento histórico que pode ser
considerado uma nova carta de princípios para um mundo multipolar.
Endereçada a todos os países, os dois dirigentes defendem um projeto de
desenvolvimento global, sustentável, baseado na cooperação entre todos
os povos, o direito das nações decidirem sobre seus próprios destinos,
além da firme proposta de que a ordem internacional seja baseada em leis
e não na força. O documento assume também que as nações tenham o direito
à liberdade, a justiça, a igualdade, aos direitos humanos e aos valores
democráticos, enfatizando que não existe nenhum povo escolhido que possa
impor seus modelos de organização política aos outros (numa referência
explícita aos EUA) e que o sistema internacional não é monopólio de
nenhum país, especialmente após as mudanças econômicas que estão
ocorrendo na conjuntura internacional. [2] <#notas_1_9>

A terceira questão que apavora os EUA se refere à construção do gasoduto
NordStream2, que foi realizado numa parceria entre empresas russas e
alemãs. Esse gasoduto viria proporcionar autonomia energética à Alemanha
e aumentaria de maneira expressiva as relações comerciais entre os dois
países e o restante da Europa. Não se pode esquecer que a União Europeia
obtém mais de 30% do gás utilizado na região através da Rússia, um
mercado cobiçado pelas empresas norte-americanas. Para os Estados
Unidos, que concebem o continente europeu como uma espécie de colônia
política dos seus interesses, o NordStream2 reduziria expressivamente a
influência norte-americana na Alemanha e na região e impediria as
empresas de energia dos Estados Unidos de fornecerem gás para esse
grande mercado. Isso é tão verdade que, num de seus pronunciamentos
desesperados, Biden chegou a aventar a possibilidade de destruir o
gasoduto. Outro elemento a ser observado é o fato de que o NordStream2
faria com que a entrega de gás para Europa não passasse mais pelo
território da Ucrânia, como ocorre atualmente, o que também daria à
Rússia mais autonomia no que se refere às exportações para a Europa. Num
momento de crise econômica, observar a Europa estreitar os laços
econômicos com a Rússia é inaceitável para os EUA, o que explica as
tramas norte-americanas para fomentar a guerra na Ucrânia, porque os
jogos de guerra podem coesionar novamente o velho bloco europeu com os
Estados Unidos e colocar as multinacionais do petróleo yanques (Exxon,
Mobil) na disputa do mercado europeu, muito embora com o gás a um preço
cerca de 40% mais caro que o russo.[3] <#notas_1_9>

O quarto elemento desse processo se refere ao declínio da hegemonia dos
Estados Unidos, tanto do ponto de vista econômico quanto político e
monetário, e à tentativa de recuperar o seu domínio tanto pelas sanções
contra concorrentes quanto pela fabricação de guerras. Se observarmos
hoje o poder dos Estados Unidos poderemos ver que, à exceção da questão
militar, há um declínio em todas as áreas. Hoje, a dinâmica industrial
do planeta não é mais da economia líder do Ocidente: a China se
transformou pelo menos nas últimas décadas na oficina do mundo, sendo
líder inconteste do comércio mundial e em breve deve superar, em termos
de PIB, a economia dos Estados Unidos. Já é maior no que se refere à
paridade do poder de compra, uma medida alternativa à taxa de câmbio
para aferir o poder de compra real de uma economia. Do ponto de vista
político, mesmo que a influência dos Estados Unidos ainda seja muito
grande, especialmente junto aos europeus, os EUA já não mandam no mundo
como mandavam no período imediatamente posterior à queda da URSS. Do
ponto de vista monetário, o dólar também já não tem mais o domínio que
tinha no passado, não só pela emergência do euro, mas também pelo poder
de outras moedas, como o yuan chinês. Essa crise atual pode levar a um
declínio ainda maior da moeda dos Estados Unidos, principalmente se as
sanções tiverem o efeito bumerangue, o que é muito provável.

Por último, esse conjunto de fenômenos tem impactado fortemente os
líderes dos Estados Unidos e explica o desespero do imperialismo para
retomar a hegemonia que lhe está fugindo entre os dedos, principalmente
porque suas intervenções militares e provocações em vários países têm
sido um rotundo fracasso, como no Afeganistão e na Síria e agora na
Ucrânia. Mesmo levando em conta essas derrotas parciais, não se pode ter
ilusões: os Estados Unidos tendem a se tornar mais agressivos à medida
em que vai perdendo a hegemonia e suas iniciativas não conseguem obter
os resultados esperados. Nenhum império assistiu pacificamente seu
declínio. Portanto, teremos um período de grave tensão internacional,
com a possibilidade de novas guerras e invasões de países que não se
dobram às exigências imperialistas, provocações com a China a partir de
Taiwan e outras regiões. No entanto, ha também a possibilidade de
levantes sociais, especialmente nos países centrais e nos Estados
Unidos, uma vez que a crise mundial do capitalismo agrava a situação dos
trabalhadores e abre janelas de oportunidade para que possam intervir de
maneira independente na conjuntura social e política, tanto em função do
enfraquecimento do império quanto pelas dramáticas condições de vida que
veem enfrentando nas últimas quatro décadas de destruição neoliberal dos
direitos, salários e garantias, do saque ao fundo público e do assalto
às empresas estatais.

*A dupla moral do imperialismo*

Antes de entrarmos na análise factual da guerra na Ucrânia, é importante
abordamos outro aspecto importante dessa crise, que é a dupla moral do
imperialismo. Estados Unidos e União Europeia nesse momento fazem enorme
propaganda em relação à soberania nacional, aos direitos humanos, ao
direito das nações se associarem a quem bem entendam e protestam contra
a invasão do território ucraniano. Falam em paz mas têm as mãos sujas de
sangue. Esquecem esses agora paladinos da liberdade e dos direitos
humanos que na década de 90 a OTAN bombardeou por 78 dias, (sem
permissão do Conselho de Segurança da ONU, a quem hoje eles recorrem
hipocritamente), a Yugoslávia, um país da Europa, destruindo sua
infraestrutura civil, bombardeando prédios civis e matando centenas de
pessoas, inclusive dezenas de crianças, até mesmo a embaixada da China
foi bombardeada, onde morreram três pessoas. Nesses mais de dois meses
de ataque brutal a OTAN lançou 2.300 mísseis e 14 mil bombas sobre o
território yugoslavo, inclusive na capital Belgrado. Além disso, foram
lançadas ainda entre 10 e 15 toneladas de urânio empobrecido que
envenenou a água e provocou um desastre ambiental e a multiplicação de
casos de doenças oncológicas.[4] <#notas_1_9> Depois, desmembraram a
Yugoslávia em vários Estados fantoches, muitos incorporados à OTAN e
ponta de lança dos imperialistas na região. Posteriormente, prenderam o
presidente da Sérvia, Slobodan Milosevich, e o mataram envenenado numa
cela da prisão do Tribunal Penal Internacional.

Essas almas bondosas da civilização ocidental e cristã, que agora
derramam lágrimas de crocodilo em relação à Ucrânia, não hesitaram em
destruir o Iraque porque esse País tinha petróleo e não se dobrava aos
interesses dos Estados Unidos. Organizaram uma invasão ao País sob o
pretexto de que Saddam Hussein estava estocando armas de destruição em
massa, o que depois se comprovou que era uma grande mentira e pura
propaganda da CIA para justificar a invasão. Num brutal ataque que eles
mesmos denominaram de “choque e pavor” destruíram toda a infraestrutura
militar e civil do País, arrasaram a maioria das cidades e deixaram a
população sem água e eletricidade. As forças de ocupação impuseram um
governo dirigido pessoalmente pelos próprios norte-americanos, que
reprimiu violentamente a população. Nessa guerra, mais de um milhão de
iraquianos foram mortos, seu exército foi dissolvido e o próprio
presidente, Saddam Hussein, foi capturado e depois enforcado. Como em
todas as guerras imperialistas, as empresas petroleiras norte-americanas
passaram a controlar a prospecção e venda do petróleo iraquiano, uma vez
que esse País era um dos maiores produtores do mundo.

Os paladinos dos direitos humanos também se esquecem que os Estados
Unidos e a OTAN, sob o pretexto de defender os direitos humanos e
proteger populações perseguidas pelo governo, invadiram a Líbia, um País
que na época tinha o maior Índice de Desenvolvimento Humano da África.
Também destruíram as principais cidades do País, mataram dezenas de
milhares de pessoas e as milícias armadas e treinadas pela CIA
assassinaram com empalação o líder líbio, Muhamar Kadafi. Essa invasão
provocou uma catástrofe humanitária, com o êxodo milhares de refugiados
buscando refúgio nos países da região e da Europa. A destruição e a
desorganização da sociedade foram tamanhas que a Líbia se tornou um
mercado de escravos na região e até hoje o País vive uma guerra civil
violenta. Como o Iraque, a Líbia também era um dos grandes produtores de
petróleo da região, sob o controle do Estado. Agora, com a mesma prática
de rapina anterior, as principais empresas petroleiras dos Estados
Unidos e da Europa detém o controle do petróleo líbio.

Os indignados defensores da soberania nacional não hesitaram em treinar
e armar os fundamentalistas medievais do Isis (Estado Islâmico) e
articular essas gangs para invadir a Síria e barbarizar a população
civil, com cenas de assassinatos que ainda hoje chocam a opinião pública
internacional, como queimar vivo um piloto sírio capturado por essa
milícia islâmica. Com apoio da aviação dos Estados Unidos e armados pela
CIA, esses milicianos ocuparam várias áreas do país e cometeram as
maiores atrocidades contra a população civil, inclusive com a destruição
de monumentos históricos milenares na cidade de Palmira. Essa invasão
também resultou numa catástrofe migratória de milhões de sírios ainda
hoje sem solução. A entrada em cena da aviação russa em apoio às tropas
do exército sírio mudou o curso da guerra e os terroristas do Isis foram
derrotados nas principais cidades, mas ainda têm controle de algumas
áreas, especialmente naquelas ocupadas pelos Estados Unidos onde ainda
têm bases militares. Mais uma vez os EUA se apossaram de poços de
petróleo da Síria e financiam as agressões com o roubo e a venda dessa
matéria-prima do País.

As almas piedosas norte-americanas e europeias fazem vista grossa quando
rotineiramente Israel, que funciona como gendarme do imperialismo
estadunidense na região, lança mísseis contra a Síria, muito deles
matando civis e destruindo áreas residenciais. O pretexto é que o Estado
judeu está atuando preventivamente contra milícias iranianas presentes
em solo sírio em apoio ao governo. Esquecem que diariamente Israel
massacra o povo palestino e recentemente, no último conflito, bombardeou
várias áreas povoadas da região de Gaza matando centenas de civis.
Nenhuma dessas almas piedosas diz algo sobre isso, afinal as vítimas não
são brancos de olhos azuis. Essas pessoas também colocam uma venda nos
olhos para não verem o bombardeio que a Arábia Saudita faz diariamente
contra a população do Yemen, destruindo bairros inteiros e matando a
população civil. Também têm amnesia em relação aos 20 anos de ocupação
do Afeganistão, onde foram assassinados 120 mil pessoas pelos por
bombardeios dos Estados Unidos, e esquecem ainda os constantes
bombardeios da população da Somália. Todas essas ações criminosas são
realizadas como se fossem um problema rotineiro de segunda ordem e não
produzem manchetes nos jornais e na televisão como a atual crise na Ucrânia.

A dupla moral do imperialismo se torna ainda mais clara se recuarmos um
pouco mais no tempo e observarmos uma crise internacional semelhante a
que está agora acontecendo na Ucrânia. A maior parte das gerações atuais
não tem conhecimento, mas na década de 60 do século passado a União
Soviética colocou uma série de mísseis em Cuba como forma de se
contrapor aos mísseis colocados pelos Estados Unidos Turquia, próximo à
sua fronteira. Quando os Estados Unidos descobriram a instalação dos
mísseis em Cuba criaram a maior crise mundial do pós-guerra com ameaça
de conflito nuclear. A crise só terminou quando a URSS decidiu retirar
os mísseis de Cuba em troca da retirada dos mísseis da OTAN da Turquia e
do compromisso de que os Estados Unidos não invadiriam Cuba como fizeram
em Playa Girón. Deve-se relembrar que os Estados Unidos mantêm um
bloqueio criminoso há mais de 60 anos contra Cuba, sem que a ilha tenha
invadido qualquer País. Justificam esse crime porque Cuba é socialista e
não se dobra aos Estados Unidos. Agora, com muita sem cerimônia, os
Estados Unidos e a União Europeia defendem que a Ucrânia, que faz
fronteira de 1.200 quilômetros com a Rússia, possa fazer parte da OTAN e
ainda instalar mísseis e produzir armas atômicas nas portas de Moscou.
Qual a moral que tem os dirigentes ocidentais para se fantasiar de
defensores da soberania nacional e dos direitos humanos dos povos depois
de tudo que descrevemos?

Outra variável importante desse conflito internacional e da dupla moral
do imperialismo é o papel que a mídia corporativa cumpre em apoio aos
interesses dos Estados Unidos. Quem lê os jornais ou assiste a televisão
e tem um mínimo de informação em relação à crise na Ucrânia pode
constatar que existem duas guerras: uma paralela, na mídia, e outra no
campo de batalha. Da mesma forma que a OTAN é o braço armado do
imperialismo, a mídia corporativa internacional é a central de
propaganda dos interesses dos Estados Unidos e da União Europeia. O
noticiário é todo manipulado e os comentaristas e entrevistados parecem
uma confraria de miquinhos amestrados verbalizando fake news
diariamente, como se as palavras e imagens forjadas na televisão
pudessem mudar o curso da guerra no teatro de operações. Revelam um
padrão de comunicação onde não existe espaço para o contraditório, ou
melhor, só existe espaço para os press releases da CIA e do Departamento
de Estado. No entanto, essa cobertura demonstra uma certa impotência e
desespero diante da realidade da guerra. Essa mídia funciona mais como
torcida organizada do que como órgãos de informação. É necessário a
construção urgente de canais alternativos de caráter mundial para se
contrapor a esses terroristas da informação.

*Uma crise fabricada pelo imperialismo e a OTAN*

A partir dessas considerações é que podemos afirmar que a crise da
Ucrânia foi fabricada conscientemente pelos Estados Unidos para
favorecer seus interesses estratégicos, com o objetivo de transformar,
com sua política guerreira, o espaço ucraniano num instrumento para
completar o cerco à Rússia, que já vinha sendo realizado desde a segunda
metade da década de 90 com a incorporação de 14 Estados do antigo bloco
socialista à OTAN. O objetivo dos Estados Unidos com esses movimentos é
claro: recolocar a Europa na área de influência norte-americana, pois o
início das operações do NordStream2 poderia enfraquecer sua atuação no
continente; enfraquecer as relações comerciais da Rússia com a Europa;
sabotar a parceria estratégica Rússia-China e Eurásia; e alimentar o
complexo industrial militar norte-americano que precisa permanentemente
de guerras para produzir e vender armas para o resto do mundo. Em outras
palavras, os Estados Unidos utilizam a OTAN como braço armado para
garantir pela força os interesses do imperialismo no mundo, como
controlar as rotas de navegação, o comércio de petróleo e gás e os
interesses financeiros de seus monopólios; e subjugar pela força os
países que busquem exercer a soberania nacional. Trata-se de uma
organização anacrônica que não tem mais sentido existir desde a
desintegração da URSS.

Vale lembrar que no período da União Soviética havia uma paridade
militar entre EUA e URSS, cada bloco com seu braço armado – a URSS com o
Pacto de Varsóvia e os EUA com a OTAN. No entanto com a queda da União
Soviética, o imperialismo se aproveitou desse fracasso para agir mais
abertamente no sentido de construir uma ordem internacional com sua
hegemonia absoluta, na qual nenhum País deveria ter espaço para aspirar
uma política que contrariasse seus interesses. Quem ousasse manter
qualquer tipo de independência deveria pagar um alto preço, mesmo
aqueles que tenham restaurado recentemente o capitalismo, como a Rússia
e outros. Isso explica as provocações, revoluções coloridas e várias
tentativas de criar movimentos separatistas na Rússia, como ocorreu na
Chechênia. O objetivo é fazer na Rússia o que conseguiram na Yugoslávia.
Recentemente também patrocinaram levantes no Azerbaijão, Bielorússia e
articulam permanentemente setores independentistas em Taiwan e revoltas
separatistas em várias regiões da China. Em outras palavras querem
transformar esses grandes Estados, que mantém uma política independente
em relação a Washington, num conjunto de republiquetas fantoches,
integradas à OTAN e subordinadas aos interesses imperialistas
estadunidenses. Mesmo que os planos para a Rússia e para a China até
agora tenham fracassado, os imperialistas estão aumentando suas apostas,
com a intensificação das provocações e sabotagens, porque sabem que o
êxito da China e da Rússia é perigoso para seu domínio.

Com relação mais específica à questão da Ucrânia é importante enfatizar
que, por ocasião da desintegração da URSS, os Estados Unidos assumiram o
compromisso de que a OTAN não seria expandida para os antigos países que
formaram o campo socialista, compromisso que também assumido pela
Alemanha, França e outros países. “Nem uma polegada para o Leste”,
prometeram. A Rússia retirou suas tropas da Alemanha e dos países do
Leste europeu, mas os norte-americanos não cumpriram nenhum dos acordos
e, pelo contrário, estenderam a OTAN para o antigo campo socialista. Até
então não existiam condições políticas para a incorporação da Ucrânia à
OTAN, porque o governo de Victor Yanukovitch buscava implementar um
equilíbrio entre o Ocidente e Moscou. Mas em 2013, na esteira das
revoluções coloridas, uma decisão do governo de desistir de se unir à
União Europeia levou à realização de movimentos de protestos pela
derrubada de Yanukovitch. Esses movimentos, estimulados e financiados
pelas ONGs ocidentais e orientados por assessores da inteligência dos
Estados Unidos, rapidamente foram hegemonizados pelos grupos mais
organizados da extrema-direita e por paramilitares nazistas, treinados e
armados pelos Estados Unidos. Após violentos conflitos a partir da praça
Maidan, onde esses esquadrões fascistas tiveram um papel determinante, o
governo Yanukovith, legitimamente eleito, foi derrubado e em seu lugar
assumiu um governo abertamente neofascista.

Parta entendermos o golpe que derrubou Yanukovith, é importante
avaliarmos o papel dos Estados Unidos. Uma conversa entre a
subsecretária de Estado dos EUA, Victoria Nuland, e o embaixador
norte-americano na Ucrânia, Geoffrey Pyatt, que vazou para a imprensa,
reflete bem a trama para derrubar o governo de Yanokovith e as
articulações para colocar os fantoches de Washington no governo após o
golpe. A secretária Nuland diz claramente ao embaixador que Arseniy
Yatsenyuk (um banqueiro de direita) era a pessoa que deveria assumir o
governo “porque é o cara que tem mais experiência econômica”. Adivinhem
quem assumiu como primeiro-ministro após o golpe: o próprio Yatsenyuk. A
ministra das finanças após o golpe era uma diplomata dos Estados Unidos,
que foi obrigada a se naturalizar ucraniana para assumir o cargo. Quando
o embaixador informou a Nuland que os europeus tinham preocupação em
relação ao que está acontecendo na Ucrânia, principalmente a derrubada
de um governo legitimamente eleito, a secretária não se faz de rogada:
“Nós gastamos U$5 mil milhões na Ucrânia nesses 20 anos. Foda-se a
Europa”. Os gastos a que se refere a secretária Nuland foi o treinamento
dos grupos nazistas pelos instrutores dos Estados Unidos e da CIA e que
depois seriam as gangs que na prática assumiram o controle das
manifestações, espancaram e mataram vários manifestantes da oposição, se
tornaram a ponta de lança nos ataques selvagens às repúblicas de Lugansk
e Donesk, nos quais morreram cerca de 14 mil pessoas. Como recompensa,
esses esquadrões fascistas foram incorporados às forças militares
ucranianas e, agora, cercados pelo exército russo, barbarizaram a
população do Leste e a utilizaram como escudo para tentar em vão escapar
ao cerco militar russo.

As primeiras medidas desse novo governo foram colocar na ilegalidade o
Partido Comunista da Ucrânia, um dos mais influentes do País,[5]
<#notas_1_9> e prender centenas de militantes, tanto comunistas como de
todas as outras organizações de esquerda, perseguir sindicalistas e
opositores em geral. A partir daí, os paramilitares nazistas passaram a
se comportar como verdadeiros esquadrões da morte, matando comunistas,
judeus, ciganos e barbarizando a população que tinha origem e falava
russo. Vários vídeos na internet, postado pelos próprios nazistas,
mostram a ação dessas gangs amarrando as pessoas nos postes e surrando;
outros vídeos mostram seus líderes ameaçando parlamentares e juízes que
se contrapunham a suas ações. Que fez o governo ucraniano diante dessas
atrocidades? Incorporou esses nazistas à estrutura militar do País.
Diante dessa conjuntura, povos ligados por laços culturais à Rússia se
rebelaram: na Criméia a população tomou a região e fez um plebiscito
para apoiar sua incorporação à Rússia. Só para esclarecimento, a Criméia
era da União Soviética até 1956, mas na época, Kruschov, que era
ucraniano, resolveu dar de presente a Criméia para a Ucrânia. Como todos
viviam na casa comum da URSS esse não foi um problema, mas isso não
apagou os laços sanguíneos e culturais do povo da Criméia com o povo da
Rússia, o que se revelou após o golpe de 2014. Após o referendo, a
Rússia anexou a Criméia, trazendo-a de volta à antiga região.

Nas áreas do Leste, os povos de origem russa também se levantavam contra
o governo neofascista numa luta armada a partir da qual, após as
vitórias no campo de batalha, declararam a independência das repúblicas
de Donetsk e Lugansk, na região do Dombas. A guerra civil só terminou
com os Acordos de Minsk, onde a Ucrânia prometia autonomia às duas
regiões. Mas o governo, orientado pelos assessores da CIA, que tinham
inclusive assento no palácio governamental, nunca respeitou os acordos.
Pelo contrário, transformou os batalhões nazistas como vanguarda dos
ataques contra as duas regiões. Nesse processo, os Estados Unidos, para
continuar fomentando a guerra, enviou para a Ucrânia e, especialmente,
para as regiões em conflito, os armamentos mais modernos com os quais
esses batalhões atacavam permanentemente as duas repúblicas. Para se ter
uma ideia, enquanto o Ocidente silenciava diante da violação dos Acordos
de Minsk, as forças militares ucranianas e os batalhões nazistas
mataram, ao longo dos últimos oito anos, 14 mil habitantes das duas
regiões, inclusive dezenas de crianças. A morte de crianças foi tão
brutal que em Donetsk existe um monumento com os nomes de todas as
crianças assassinadas numa rua chamada Alameda dos Anjos. Para essas
milhares de mortes de homens, mulheres e crianças nunca se ouviu uma
palavra de protesto desses líderes que hoje esbravejam hipocritamente em
nome dos direitos humanos.

Mas as medidas do governo neofascista da Ucrânia não visavam apenas a
população rebelada daquelas regiões. Sob a orientação dos Estados Unidos
e tendo como operadores a extrema-direita e os nazistas, desenvolveu-se
uma campanha anticomunista, xenófoba, de perseguição aos russos étnicos
e de proibição do idioma russo. Os currículos escolares passaram a
ensinar que o Exército Vermelho, que perdeu centenas de milhares de
homens para libertar a Ucrânia, era na verdade um exército de ocupação.
As autoridades passaram a glorificar as antigas brigadas de
colaboracionistas das forças invasoras de Hitler durante a Segunda
Guerra Mundial, que tinham Stepan Bandera como principal líder dessas
gangs, responsável por centenas de milhares de assassinatos naquele
período. Abertamente, fazia-se reenterros homenageando membros da SS
local de Bandera e os ex-colaboracionistas do nazismo e seus parentes
passaram a receber pensões e bônus do governo. Além disso, esses
colaboracionistas de Hitler passaram também a ter o status de
“combatentes pela independência da Ucrânia”. A ideologia nazista estava
se tornando tão forte que a escada de um dos shoppings de Kiev era
decorada com a bandeira nazista. Tudo isso acontecia diante do nariz de
Pinóquio dos protetores dos direitos humanos da União Europeia e dos
Estados Unidos. Aliás, passou despercebido que a Rússia apresentou na
ONU uma proposta de repúdio à glorificação nazista. 130 países votaram a
favor e dois contra. Adivinhem quem ... Ucrânia e Estados Unidos!

Em termos concretos, o governo neofascista que emergiu do golpe editou
um conjunto de leis e decretos para construir uma nova história da
Ucrânia, criminalizar a antiga União Soviética e glorificar os que
colaboraram com os nazistas. A legislação aprovada proibia o uso de
símbolos e meios de propaganda comunista, remoção de monumentos e locais
públicos com os nomes relacionados ao período da guerra contra o
nazismo. Por exemplo, a Lei No. 2538-1, que dispunha “sobre a honra e a
memória dos combatentes pela independência da Ucrânia no século XX”,
elevava várias organizações e grupos pró-nazistas que atuaram na segunda
guerra mundial ao status de heróis e assegurava benefícios a seus
membros sobreviventes ou seus parentes. Nessa cruzada para apagar a
libertação da Ucrânia pelo Exército Vermelho, as novas autoridades
neofascistas realizaram as seguintes medidas: “renomearam a denominação
de 987 cidades/aldeias e 51.493 nomes de ruas, bem como removeram 1.320
monumentos dedicados a Lenin e 1.069 monumentos em homenagem a
comunistas proeminentes, muitos dos quais foram vandalizados por grupos
fascistas e pro-nazistas”.[6] <#notas_1_9> O objetivo dessas medidas é
apagar a história do Exército Vermelho e da União Soviética, de forma a
que as novas gerações obtenham um conhecimento distorcido daquele período.

Com relação ao nazismo e o atual presidente da Ucrânia existe ainda uma
questão que precisa ser muito bem esclarecida. Meio cinicamente, os
ocidentais argumentam que a Ucrânia não pode ser considerada sob a
influência da ideologia nazista porque o seu presidente é judeu. Minha
avó dizia que a galinha, mesmo não tendo a autonomia de voo dos outros
pássaros, continua sendo uma ave. Mesmo que isso pareça contraditório,
Zelensky, mesmo sendo judeu, é um apoiador dessas forças nazistas. Em
dezembro passado ele concedeu uma honraria governamental, como herói
nacional da Ucrânia, ao neonazista Dmytro Kotsyubail, líder da
organização Pravy Sektor (setor de direita), responsável pelo massacre
na Casa dos Sindicatos. Para quem não lembra, a Casa dos Sindicatos,
onde também funcionava a sede regional do Partido Comunista da Ucrânia,
na região de Odessa, foi incendiada por membros desse esquadrão da morte
nazista quando esta estava cheia de militantes. Nesse bárbaro massacre,
42 pessoas, entre sindicalistas, comunistas, mulheres e crianças foram
queimados vivos e muitos que tentavam sair do prédio em chamas foram
abatidos à bala por esses terroristas. Zelensky também nomeou um
comandante de um batalhão nazista, Maksim Marchenko, para o cargo de
governador de Odessa. É para esse tipo de gente que os paladinos da
civilização ocidental e cristã agora estão derramando lágrimas de crocodilo.

*O Xeque mate de Putin e a guerra*

Mesmo diante de tudo que estava acontecendo na Ucrânia, o presidente
russo buscou até o último momento um acordo com os Estados Unidos e
União Europeia, tendo como referência a segurança mútua entre Ocidente e
a Rússia, os Acordos de Minsk e a neutralidade ucraniana, mas tanto os
Estados Unidos quanto seu satélite político, a União Europeia, fizeram
ouvidos de mercador, porque a arrogância de Washington, aliada à
mentalidade colonial da União Europeia, os tornaram politicamente cegos.
Na verdade, depois de 30 anos de humilhações, EUA e UE não poderiam
imaginar que a Rússia fosse capaz de tomar nenhuma medida mais firme, a
não ser as costumeiras reclamações que se perdiam com o tempo, como no
passado. Por isso não levaram a sério o discurso de Putin. Fizeram
avaliações equivocadas e cálculos políticos fora da realidade e foram
surpreendidos com a ação militar da Rússia. Sem condições para uma
resposta militar, restou observar os acontecimentos e fazer apenas a
guerra de informação, enquadrando todo o aparato mundial de comunicações
para demonizar a Rússia e aprovar um conjunto de sanções que na prática
poderão se transformar num bumerangue para os Estados Unidos e,
principalmente, para a União Europeia, região que pagará a maior parte
da conta em razão das medidas tomadas por Biden.

Se os dirigentes ocidentais fossem menos arrogantes teriam entendido
perfeitamente as demandas de Putin e evitado a guerra. Que disse o líder
russo ao lançar a ofensiva militar: “É sabido que durante 30 anos
tentamos persistente e pacientemente negociar um acordo igual e
indivisível na Europa. Enfrentamos constantemente enganos e mentiras
cínicas ou tentativas de pressão e chantagem em respostas às nossas
propostas ... Não se trata de nosso regime político ... eles
simplesmente não querem um País independente tão grande como a Rússia.
Esta é a resposta para todas as perguntas ... A Rússia não pode existir
com uma ameaça constante emanando do território ucraniano ... Os
acontecimentos de hoje não estão relacionados ao desejo de minar os
interesses da Ucrânia e do povo ucraniano, mas de proteger a própria
Rússia daqueles que fizeram a Ucrânia de refém e estão tentando usá-la
contra nosso País e seu povo ... Por isso mesmo vamos nos esforçar para
desmilitarizar e desnazificar a Ucrânia. Você não pode olhar o que está
acontecendo em Donbass sem compaixão ... é impossível tolerar esse
pesadelo, esse genocídio contra milhões de pessoas ... Esses foram os
principais motivos para que tomássemos a decisão de reconhecer as
repúblicas populares de Donbass”.[7] <#notas_1_9> E para quem ainda
imaginasse que estava blefando ele alertou: “Quem tentar interferir
conosco e, mais ainda, criar ameaças o nosso País deve saber que a
resposta da Rússia será imediata e levará a consequências que nunca
enfrentou em sua história ... Estamos preparados para qualquer situação.
Espero que eles escutem”.[8] <#notas_1_9> Quando os líderes da OTAN
ampliaram as ameaças buscando verificar até que ponto Putin estava
disposto nesse conflito, a resposta foi ainda mais incisiva: ele colocou
em alerta as forças nucleares, para desespero dos ocidentais, que
estavam sempre acostumados a provocar guerras, destruir países e sabotar
suas economias sem nenhuma resposta à altura.

A ação militar russa na Ucrânia marca um momento de inflexão na
geopolítica mundial, na qual o imperialismo estadunidense e seu braço
armado, a OTAN, não têm mais o monopólio da força para fazer o que
querem no mundo. Para os ucranianos, ´parece estar claro que foram
usados como carne de canhão nessa crise, pois todas as promessas de que
a OTAN protegeria o atual governo de qualquer ameaça russa eram apenas
palavras vazias: o que se viu na prática foi a Ucrânia abandonada ferida
no meio do caminho. Aliás, para sermos sinceros, os Estados Unidos estão
pouco preocupados com o destino do povo ucraniano nessa guerra. As
mentiras sobre a resistência, as encenações de civis preparando
coquetéis Molotov contra carros de combate blindados, envio de armas e
aviões que nunca chegam para os ucranianos são apenas cortina de fumaça
para esconder sua impotência. Qualquer pessoa minimamente inteligente
que entenda razoavelmente de logística e estratégia militar sabe que
isso é apenas propaganda para evitar a desmoralização completa dos
fomentadores de guerra pelo mundo afora. O que eles querem mesmo – e
para isso estimulam os esquadrões nazistas a fazer milhares de civis de
reféns nas áreas de conflito – é provocar algum tipo de massacre para
colocar na mídia como prova da maldade russa, construir encenação de
morte de civis com falsa bandeira para justificar sua propaganda, que já
está cansando os espectadores dada a parcialidade com que a mídia vem
noticiando a guerra. A CIA é mestra nessas ações: é só lembrarmos dos
“ataques químicos” realizados pelo exército sírio ou das “armas de
destruição em massa” no Iraque, tudo posteriormente comprovado como
propaganda mentirosa.

Um fato muito grave emergiu dos escombros da guerra: no decorrer do
conflito, veio à tona mais uma trama gravíssima da OTAN-EUA na Ucrânia.
Os russos descobriram que as almas piedosas e defensoras dos direitos
humanos construíram clandestinamente dezenas de laboratórios de guerra
biológica na Ucrânia, financiados e controlados pelos serviços de
inteligência dos Estados Unidos. É bom lembrar que o pretexto para
invadir o Iraque foi a acusação de que aquele País estava construindo
armas de destruição em massa. Na verdade, agora todos ficaram sabendo
que quem constrói armas de destruição em massa são os Estados Unidos e a
OTAN, conforme os russos descobriram e os funcionários dos Estados
Unidos foram obrigados a confirmar. A própria Victoria Nuland admitiu
essa ação perante o Congresso dos Estados Unidos, mas disse que esses
laboratórios tinha objetivo de realizar pesquisa científica, mas
espertamente acrescentou que não poderiam cair na mão dos russos...
Quais eram os planos dessa trama criminosa na Ucrânia? Segundo os
documentos apreendidos, os 26 laboratórios ucranianos estavam realizando
pesquisas avançadas com armas químicas e biológicas com patógenos como
cólera, antraz e outras doenças fatais como armas de guerra. Os russos
também descobriram outras experiências macabras como manipulação
ectoparasitas de morcego, além de outros patógenos para contaminar aves
migratórias da Ucrânia para a Rússia.[9] <#notas_1_9> Aliás, isso não é
novidade, pois essas armas biológicas já foram usadas pela CIA contra as
plantações de Cuba, além de patógenos que provocaram epidemia de
diarreia naquele País. Não precisa de nenhuma teoria da conspiração para
se imaginar o seguinte: se EUA-OTAN foram capazes de construir esses
laboratórios clandestinos na Ucrânia, que não fazia parte da OTAN,
imaginem as diabólicas experiências que estão sendo realizadas nas
ex-repúblicas soviéticas. Essa descoberta pode ser apenas a ponta de um
iceberg das atividades criminosas dos EUA-OTAN na região. Merece uma
urgente investigação internacional. Uma ação criminosa dessa ordem
deveria estar recebendo manchetes em toda a mídia internacional, mas
parece que a amnésia tomou conta dos bravos meios de comunicação
ocidentais.

*As sanções e seus efeitos práticos*

Sem condições objetivas para responder militarmente à Rússia, restou aos
Estados Unidos e à União Europeia anunciar um conjunto de sanções que
essas lideranças classificaram como uma verdadeira bomba atômica
financeira, que deveria colocar a economia russa de joelhos. Vejamos
quais foram as principais sanções até agora anunciadas. Desligamento das
instituições financeiras russas do sistema SWIFT, um órgão formalmente
independente mas que na prática é um instrumento do imperialismo
destruir a economia dos países que não se dobram aos interesses dos
Estados Unidos; a Alemanha suspendeu a certificação para o início das
operações do NordStream2, que levaria gás direto da Rússia para os
alemães; proibição de investidores de adquirir títulos do tesouro da
Rússia; bloqueio das reservas e ativos financeiros russos nas
instituições financeiros ocidentais, bem como proibição de empresas e
pessoas físicas russas de efetuar investimentos e pagamentos no exterior
e negociar com produtos oriundos da Rússia.; estímulo a que empresas do
Ocidente se retirem do território russo; fechamento do espaço aéreo dos
Estados Unidos e da Europa para voos de empresas russas; proibição de
compra de petróleo e gás russo pelos Estados Unidos, entre outras.

O grande objetivo dessas sanções é destruir a economia da Rússia e,
possivelmente, criar uma crise econômica-social e política interna no
território russo, que possa inclusive levar à queda do governo.
Realmente, as sanções são muito duras e podem mesmo ocorrer, num
primeiro momento, uma série de transtornos econômicos na economia russa.
Em contrapartida, as sanções podem resultar em consequências
inteiramente diferentes daquilo que está sendo sonhado pelos
imperialistas dos Estados Unidos e da Europa. Da mesma forma como
ocorreu no terreno militar, na área econômico-financeira os Estados
Unidos e seus satélites políticos europeus já não têm também o monopólio
das transações financeiras nem do comércio mundial. E essas sanções
podem resultar numa espécie de efeito bumerangue, com o feitiço se
voltando contra o feiticeiro, afinal num mundo globalizado, com as
economias capitalistas interligadas, medidas com esse nível de
radicalidade não atingem apenas a parte para quem foram direcionadas,
mas toda a economia mundial e, inclusive a própria ordem econômica
internacional tal como conhecemos. É bom lembrar ainda que a Rússia já
vinha se adaptando às sanções do Ocidente e se preparando para novas
sanções desde quando anexou a Criméia. O resultado prático da primeira
onda de sanções foi um fortalecimento interno da indústria do País,
mediante uma espécie de “substituição de importações”, processo que os
brasileiros conhecem muito bem. Também se prepararam reorientando os
fluxos comerciais, aumentando suas relações com a China e a Eurásia, bem
como acumulando reservas cambiais, o que significa que não foram pegos
de surpresa com essas medidas. Vejamos mais detalhadamente essas questões:

O desligamento da economia russa do sistema Swift (Sociedade Mundial de
Telecomunicações e Transações Financeiras Interbancárias, em tradução
livre) é realmente uma medida muito dura, pois praticamente afasta a
Rússia do comércio internacional com os países que adotaram essa medida.
No entanto, as vendas de gás para Europa estão fora dessa sanção, afinal
os europeus sem o gás russo seria o caos. Já prevendo medidas desse
tipo, em função do que foi feito com o Irã e Venezuela, vários países
criaram sistemas alternativos ao Swift: a Rússia criou seu próprio
sistema de transações financeiras, chamado SPFS, para liquidação com a
moeda chinesa e de outros países que não se juntaram às sanções. Da
mesma forma, a China também criou um sistema de pagamentos
interbancários transfronteiriço denominado CIPS e, em 2017, um sistema
específico de pagamentos para o comércio exterior entre o yuan e o
rublo. O Irã, que também foi expulso do Swift, criou o seu próprio
sistema de transações financeiras, conhecido como STFI, e passou a se
integrar a um sistema regional chamado SUCRE, além do fato de que para
suas transações com Alemanha, França em Reino Unido, em razão dos
acordos sobre a questão nuclear, foi criado também um mecanismo para
lidar com o comércio com o Irã, conhecido do INSTEX. Se levarmos em
conta esses sistemas alternativos de pagamentos internacionais, o volume
de comércio entre esses países, e a isso juntarmos os países que não
aderiram a essas medidas, poderemos dizer que as sanções não terão
plenamente os efeitos desejados e ainda podem estimular a criação de um
sistema internacional alternativo ao do Ocidente, levando na prática a
um processo de desdolarização da economia mundial, afinal todos agora
estão cientes de que seus recursos podem ser confiscados se contrariarem
as ordens de Washington. As reservas dos países em dólares e ouro nos
bancos ocidentais já não são mais um porto seguro para os países
superavitários.

A Rússia acumulou nos últimos anos U$640 mil milhões de reservas. Menos
da metade desses recursos podem ser alcançados pelas sanções. É ainda um
volume grande, mas ainda resta à Rússia muita gordura para se proteger
diante do confisco. Ao contrário de países com economias mais frágeis, a
resposta da Rússia tem sido também bastante forte, podendo mesmo
compensar as ações dos EUA-UE. Por exemplo, o governo russo definiu que
seus compromissos externos (dívida externa, remessa de lucro ou
desinvestimento) serão pagos em rublos ao câmbio do dia e depositados em
um banco da Rússia. “O que isso significa na prática é que a maior parte
dos U$478 mil milhões da dívida externa russa pode “desaparecer” dos
balanços dos bancos ocidentais”. [10] <#notas_10_19> Mais recentemente,
a Rússia também definiu que todos os pagamentos de suas exportações com
as chamadas nações hostis deverão ser pagos em rublo. Outras respostas
russas também são significativas: os cartões de crédito Visa e Credicard
decidiram sair do País. O governo de Moscou criou seu próprio cartão o
MIR e o ligou ao UnionPay, da China, que tem uma rede internacional
semelhante ou maior que os cartões dos Estados Unidos. O temor central
dos Estados Unidos, que é o estreitamento de relações entre a China e a
Rússia, está se tornando realidade, estimulado pelas próprias sanções.
“No período 2014-2020, em termos monetários, o volume de negócios da
Rússia com a China aumentou 17,8%, passando de U$88,4 mil milhões para
104,1 mil milhões ... O principal resultado das sanções (realizadas após
a anexação da Criméia) EUA-Europa foi uma mudança na estrutura
geográfica das relações econômicas externas russas em favor da
China”.[11] <#notas_10_19>

A interrupção do NordStream2 por parte da Alemanha causará problemas
apenas para os alemães, que deixarão de ter o gás mais barato da Rússia.
Em contrapartida, a Rússia vai aumentar as exportações de gás para o
Oriente. A Gazprom fechou contrato com a China para a construção de um
gasoduto que passará pela Mongólia e se conectará com a China e
consequentemente com toda a Ásia, substituindo as remessas que iriam
para a Alemanha. Além de petróleo e gás, a Rússia também é um dos
maiores exportadores mundiais de outras matérias-primas como trigo e
grãos em geral, além de metais como cobalto, alumínio e paládio, este
último imprescindível para a indústria de tecnologia da informação.
Portanto, como já podemos verificar, somente nos primeiros dias após as
sanções os preços dessas matérias-primas aumentaram de maneira
acentuada. Se a inflação já era uma realidade nas economias ocidentais,
imaginem o que acontecerá com a escalada de preços que resultará das
sanções. Poderemos ter um processo hiperinflacionário tanto nos Estados
Unidos quanto na Europa. Aliás, a Europa vinha ensaiando construir
alternativas autônomas em relação aos Estados Unidos. Primeiro, com a
criação da zona do euro e também uma força militar europeia. Com essa
capitulação, serão os principais prejudicados com as sanções. “O preço
de sua obediência é impor inflação aos custos de sua indústria, enquanto
subordinam sua política eleitoral democrática aos procônsules
estadunidenses da OTAN”.[12] <#notas_10_19>

Avaliando em termos de curto e médio prazo, podemos dizer que o
imperialismo já não tem condições de se impor como no passado. A guerra
na Ucrânia pode ser considerada apenas o gatilho que acelerou o processo
de transição de hegemonia e colocou em marcha um conjunto de fenômenos
que não estava nos cálculos dos autores das sanções e que podem se
voltar contra suas próprias economias, tais como: a) uma recessão
mundial em consequência da redução do fluxo de matérias primas e de
suprimentos industriais, agravada pelos efeitos da recente crise
sanitária; b) uma aceleração da inflação, estimulada pelos aumentos dos
preços das matérias-primas, especialmente petróleo e gás, que é a matriz
energética das principais economias do mundo; c) uma aproximação cada
vez mais estratégica entre China e Rússia, para desespero dos velhos
imperialistas em declínio; d) como consequência, a Europa pagará o maior
preço em termos econômicos e sociais por sua vassalagem em relação aos
Estados Unidos, o que se refletirá na queda do crescimento econômico e
queda na produtividade da região; e) a crise mundial resultante desse
processo agravará ainda mais todos os problemas colocados pela crise
sistêmica global e intensificados pela pandemia, o que poderá abrir
janelas de oportunidades para os trabalhadores emergiram da conjuntura
contestando a velha ordem e disputando uma nova ordem internacional de
acordo com seus interesses.

Alguns desdobramentos em curso na economia mundial podem acelerar
mudanças qualitativas tanto na esfera monetária quanto na geopolítica
internacional. “A China passou a investir pesadamente na
internacionalização de sua moeda, graças ao aumento do comércio exterior
– importações e exportações – investimentos na Rota da Seda, uma rede
global permitindo swap do renminbi (o yuan é a unidade de conta enquanto
o renminbi é o nome da moeda) com bancos oficiais de compensação e,
finalmente, adição do renminbi à cesta de Direitos Especiais de Saque,
as moeda do FMI. O próximo passo será a emissão de e-CNY, a moeda
digital chinesa”.[13] <#notas_10_19> Essa transição poderá ser acelerada
se grandes exportadores de petróleo, como a Arábia Saudita (que está
negociando com a China essa questão) começarem a realizar suas
transações em yuan. A Índia já fez acordo com a Rússia nesse sentido. Na
verdade, se observarmos o conjunto da economia mundial poderemos dizer
que “cerca de 70% da humanidade se encontra fora da centralidade
anglo-saxã, sionista ou eurocêntrica”.[14] <#notas_10_19> Em outras
palavras, existem condições objetivas para a construção de uma nova
ordem econômica mundial, com o declínio do dólar e a emergência de novas
estruturas que venham a substituir a velha ordem mundial construída em
Bretton Woods.

Esse conjunto de problemas econômicos que emergirão em função das
sanções se desdobrarão em problemas sociais e políticos, afinal o
aprofundamento da crise sistêmica mundial que se avizinha encontrará as
economias dos países centrais ainda curando as feridas da crise de 2008
(da qual até hoje ainda não se recuperaram) e da crise sanitária. Um
sistema hegemônico em declínio, com estagnação econômica, desemprego e
escalada inflacionária dificilmente terá o controle pleno do curso dos
acontecimentos, especialmente porque estamos num processo de transição
de hegemonia. Isso nos leva a crer que iremos viver uma conjuntura
internacional muito difícil porque o animal ferido é muito mais perigoso
e agressivo. Não se pode descartar a intensificação das guerras,
sabotagens, golpes de Estado entre outras manobras do imperialismo em
processo de senilidade. Por outro lado, como o inimigo está cheio de
problemas e como suas próprias decisões desencadearam forças que eles
podem não ter condições de controlar, não está descartada a
possibilidade de abertura de uma janela de oportunidades para o
proletariado mundial entrar em cena e contestar a ordem estabelecida e
se colocar como alternativa à crise mundial do capitalismo.

*Além das aparências: as disputas interburguesas*

Até aqui procuramos entender a dinâmica da conjuntura de maneira
objetiva, sem aprofundarmos a análise do ponto de vista de classe,
levando em conta que esse conflito, além dos elementos geopolíticos que
levaram a Rússia a realizar essa operação militar na Ucrânia, das
pretensões imperialistas dos Estados Unidos e União Europeia, existe
também uma questão de fundo que explica a guerra: os interesses
econômicos da burguesia russa e das burguesias do velho imperialismo. Os
marxistas não devem ter nenhuma ilusão sobre essa questão: sabemos muito
bem que a Rússia atual não é a União Soviética e que Putin não é
revolucionário. Pelo contrário, é o representante da burguesia russa e
do sistema capitalista no País, e temos claro que essa burguesia só se
constituiu enquanto classe porque roubou o patrimônio construído pelos
trabalhadores ao longo dos 74 anos do período soviético. Os marxistas
compreendem também muito bem o desespero do imperialismo para resolver
pela guerra a crise sistêmica que o castiga desde 2008 e sabem ainda que
essas guerras, os golpes de Estado, sabotagens, sanções, revoluções
coloridas são resultado do desespero das classes dominantes globais
diante de um mundo em constante mutação, às quais não conseguem mais
hegemonizar como faziam há algumas décadas. Por isso, é importante
avaliarmos todos os interesses econômicos em jogo.

Primeiro, o NordSstream 2 consolidaria a hegemonia russa no mercado de
gás da Europa e deixaria para trás as ambições das petroleiras dos
Estados Unidos de ocupar esse mercado. “Atualmente, o gás natural russo
responde por mais de 30% de todas as importações para a União Europeia.
As principais potências da UE, Alemanha e França, obtém 40% de seu gás
da Rússia, enquanto outros países como a República Checa e a Romênia,
usam apenas (o gás) da nação euroasiática ... Os produtores dos Estados
Unidos querem participar e controlar essa bonança, especialmente na
Europa, onde os preços do gás aumentaram cinco vezes em 2021 e agora,
com as ações militares na Ucrânia, vão explodir ... Cheias de gás, as
corporações americanas olham cada vez mais para a Europa como cliente
... Graças a um acordo entre o governo Trump e a UE as vendas de gás dos
EUA para a Europa aumentaram de forma constante, de 16% em 2019 para 28%
no final de 2021. No entanto, há um problema que pode limitar o
crescimento: o gás natural dos EUA é caro, consideravelmente mais que o
da Rússia. O (gás extraído através do) fracking hidráulico aumenta
substancialmente os custos de produção. Além disso, para ser exportado
para clientes internacionais, o gás dos EUA deve ser liquefeito e
carregado/descarregado em navios-tanques e terminais especializados
caros. A conversão do gás de xisto fraturado em gás natural liquefeito
(GNL) pode mais que dobrar os custos para empresas americanas,
colocando-as em desvantagem em relação ao gás barato que viaja por dutos
(da Rússia)”.[15] <#notas_10_19>

A Rússia é uma superpotência em energia e detém as maiores reservas de
gás natural do mundo. Porém passou despercebida a notícia de que a
Ucrânia descobriu grandes reservas de gás natural capazes de torná-la
também uma potência exportadora desse produto. Os governos que assumiram
após o golpe de 2014 na Ucrânia buscaram cada vez mais afastar a Rússia
dos negócios na Ucrânia e estreitar os laços com os Estados Unidos e a
União Europeia. Após a descoberta, o governo ucraniano firmou um acordo
com ExxonMobil e a Shell para exploração do gás, o que ameaçou os
interesses da gigante estatal russa, a Gazpron, que viu nesses acordos
uma manobra para afastar os russos do mercado europeu. Ou seja, uma
Ucrânia em pleno processo de russofobia e com empresas ocidentais
procurando retirar a Rússia desse mercado era também inaceitável. Não se
pode esquecer ainda que o filho do presidente Biden, Hunter Biden, se
tornou CEO da Burisma Holdings, em 2014, a maior exportadora de gás da
Ucrânia, com um salário de US$50 mil por mês, com a tarefa de fazer
lobby ucraniano junto ao governo norte-americano. Em seu livro de
memórias, ele confirma as alegações de que estava na Ucrânia para
facilitar as relações com o governo oriundo do golpe. “Eles queriam
criar um baluarte contra a agressão russa ... O nome de Biden é sinônimo
de democracia e transparência, por isso disse que era ouro para
eles”.[16] <#notas_10_19>

Mesmo levando em conta todos os problemas resultantes da geopolítica,
não existem santos nessa crise. Nenhum País assiste sem reação à perda
de um grande mercado de um dos seus principais produtos de exportação.
Para a burguesia russa a perda de influência no maior País das
ex-repúblicas soviéticas a deixaria muito frágil economicamente e os
próximos passos dos Estados Unidos e da OTAN seria também dominar o
mercado de petróleo e, politicamente, a transformar o Estado russo em
dezenas de republiquetas a serviço de Washington, como já acontece
naqueles países do Leste incorporados à OTAN. Portanto, até por instinto
de sobrevivência, Putin e a burguesia russa, após tentarem, por várias
décadas, resolver sem sucesso essas disputas interburguesas pela via
diplomática, decidiram recorrer ao velho método das armas como forma de
atingir os objetivos políticos e econômicos. Os líderes do velho
imperialismo, com sua arrogância e ambição, não imaginavam uma resposta
tão dura de Moscou, acostumavam que estavam com os recuos constantes dos
dirigentes russos. Calcularam mal a resposta russa e agora estão diante
de uma derrota militar, da perspectiva de uma crise econômica mundial,
cujos resultados são ainda imponderáveis. Não se pode descartar,
inclusive, convulsões sociais nos Estados Unidos e na Europa como
consequência dos problemas oriundos da guerra e dos efeitos das sanções.
As guerras todos sabem como começam, mas poucos podem prever como
terminam, bem como suas consequências.

Em outras palavras, além dos problemas geopolíticos e das ambições dos
EUA-OTAN-UE a burguesia russa, apesar de jovem em termos históricos,
tinha claro que se cedesse na Ucrânia seria esmagada diante das ambições
do velho imperialismo. Perderia não apenas uma das principais fontes de
recursos (petróleo e gás) mas também veria seu Estado esquartejado como
ocorreu com a antiga Yugoslávia e, em seguida, suas próprias
propriedades seriam absorvidas pelas corporações transnacionais dos
Estados Unidos e da Europa como no Iraque e na Líbia. Portanto, reagir
militarmente era caso de vida ou morte, afinal esta não é a primeira vez
que se iniciam guerras em função de disputas entre as várias frações da
burguesia. Além disso, para quem tem ilusões sobre o presidente russo e
sua opção pelo capitalismo, é importante ler com cuidado recente
entrevista de Putin sobre como a Rússia vai enfrentar a crise. “Sem
dúvida, na nova realidade, nossa economia precisará de profundas
mudanças estruturais ... Não serão fáceis e causarão aumento temporário
da inflação e do desemprego ... É Preciso responder às pressões externas
com a máxima liberdade empresarial ... Sem dúvida, a economia russa vai
se adaptar à nova realidade ... O papel fundamental na superação dos
problemas atuais deve ser desempenhado por empresas privadas que podem
reconstruir a logística em pouco tempo, encontrar novos fornecedores e
aumentar a produção de mercadorias demandadas”.[17] <#notas_10_19>

No mesmo pronunciamento Putin promete eliminar barreiras administrativas
e regulatórias injustificadas, a fim de facilitar a resolução de
problemas por parte dos empresários e dos governos regionais. Nada mais
cristalino para um representante da burguesia de seu País. Vai ocorrer
aumento da inflação e do desemprego, mas a solução é facilitar a vida
das empresas e consolidar o poder da burguesia nas novas condições
impostas pelo Ocidente. Em outras palavras, a crise resultante da guerra
recairá sobre o proletariado, mas poderá também ter consequências
internas para Putin e a burguesia da qual é representante. Terminada a
guerra, é hoje de fazer o balanço. Ainda existe no imaginário popular
russo os bons tempos do período soviético, onde não havia burguesia nem
exploração. A guerra pode mudar o curso da luta de classes na Rússia. Em
algum momento os trabalhadores vão perceber que todo o patrimônio dessa
burguesia não foi por ela criado: foi roubado dos trabalhadores pelos
traidores da União Soviética, Gorbachov, Yeltsin e vários membros da
cúpula corrompida do ex-PCUS, e apropriado pelos oligarcas que esbanjam
luxo e riqueza enquanto regride cada vez mais o nível de vida do povo.
Portanto, a crise e os horrores da guerra poderão influir na psicologia
das massas e levar a um ajuste de contas entre o proletariado russo e
essa burguesia, afinal esses oligarcas não têm nenhuma justificativa
para o patrimônio que possuem – não receberam de herança, não
empreenderam para construir suas empresas, apenas roubaram dos
trabalhadores na mão grande. Também com o fim da guerra e a
desnazificação da Ucrânia os trabalhadores também poderão realizar o
ajuste contas com o que sobrar do nazismo e da burguesia corrupta
ucraniana. O pós-guerra abrirá também uma luta política intensa no
interior da tanto da Rússia quanto da Ucrânia e, quiçá, em todo o
sistema capitalista.

*Algumas conclusões provisórias*

1) Estamos diante de uma transição de hegemonia em que o velho
imperialismo está em declínio em função de um conjunto de mudanças
qualitativas que ocorreram na divisão internacional da produção e do
trabalho. Como a história tem provado, todo período de transição de
hegemonia é marcado por perturbações de toda ordem na conjuntura
internacional, porque o velho está morrendo e o novo ainda não se
consolidou completamente. A guerra na Ucrânia foi apenas o gatilho que
veio acelerar o processo de transição que já vinha sendo construído nos
subterrâneos da geopolítica internacional. A vitória militar da Rússia
quebrou o monopólio da força do velho imperialismo e, se as sanções não
produzirem o efeito que a velha ordem imagina, também está quebrado o
seu monopólio econômico-financeiro, o que terá profundas consequências
no curto, médio e longo prazos naquilo que poderíamos nomear
provisoriamente de uma nova ordem econômica e política internacional.

2) O declínio imperialista nessas duas áreas chaves do domínio econômico
e político torna mais clara a transição da hegemonia do Ocidente para a
Ásia–Pacífico, processo que será estimulado pelo estreitamento das
relações entre a China e Rússia, que continua “firme como uma rocha”
como dizem os chineses apesar das pressões do Ocidente. A integração
geopolítica e econômica dessas duas potências representa uma espécie de
xeque-mate para o velho imperialismo, uma vez que a Rússia possui as
matérias-primas de que a China necessita para sua pujante indústria e
tem ainda uma máquina militar, herdada da União Soviética, que garante a
dissuasão contra qualquer aventura imperial dos EUA. Por seu turno, a
China se transformou na oficina do mundo, tanto em termos de produção
quanto nas áreas de tecnologia e no comércio mundial o que, numa
linguagem militar, representa uma ofensiva em forma de pinça na
conjuntura internacional.

3) A guerra na Ucrânia representa também o momento de virada na
conjuntura internacional, cujo resultado será a emergência de uma série
de fenômenos novos que estavam amadurecendo no interior da conjuntura e
que agora explodiram com a guerra como sempre ocorre em todos os grandes
momentos de declínio de hegemonia. Dito de outra forma: a guerra na
Ucrânia é a expressão concentrada tanto das contradições não resolvidas
da crise sistêmica global que emergiu em 2008 quanto da velha ordem
econômica e política internacional construída em Bretton Woods e
aprofundada com a desagregação da União Soviética. O mundo do pós-guerra
da Ucrânia, passada a euforia da propaganda imperialista, será bastante
diferente do que conhecemos atualmente e as estruturas dominantes
sofrerão abalos consideráveis no próximo período.

4) Um dos principais fenômenos que podem emergir dessa crise é um
processo de desdolarização da economia mundial e a constituição de novos
blocos monetários em contraposição ao dólar. Vale lembrar que ao longo
das últimas sete décadas os Estados Unidos tiveram o privilégio da
senhoriagem da moeda mundial, baseada inicialmente em seu poder
econômico e militar. Aos poucos foram aparecendo novos atores, entre os
quais o surgimento da zona do euro e a emergência da China como potência
econômica mundial. Pelo menos nas três últimas décadas os Estados Unidos
driblaram as dificuldades de sua economia cobrindo seu déficit comercial
com “apropriação” do valor produzido pela economia mundial, através do
comércio mundial, em troca de papel pintado, ou seja, de um dólar sem
lastro na produção do valor. Agora, com a crise e as sanções à Rússia,
está se conformando de maneira acelerada um processo de desdolarização
do comércio internacional, a partir dos acordos China-Rússia-Eurásia, e
a introdução do yuan como moeda internacional.

5) Ao longo da história o poder militar tem sido o elemento determinante
para a hegemonia dos impérios. Desde 1945 os Estados Unidos se
transformaram na nação com o maior orçamento e o maior poder militar do
planeta. Mesmo que tenha sido derrotado no Vietnã, na Síria e no
Afeganistão, essas foram derrotas parciais que não alteraram a
correlação de forças no cenário internacional, mas a guerra da Ucrânia
marca uma mudança de qualidade, pois os EUA-OTAN perderam o monopólio da
força e, mesmo sem lutar, sofreram uma derrota histórica, pois foram na
prática impedidos de intervir na guerra que provocaram diante do poderio
militar russo e da possibilidade de uma terceira guerra mundial.
Acostumados que estavam a disciplinar pelas armas os países que não se
dobravam aos seus interesses, como ocorreu na Yugoslavia e na Líbia,
bombardeados sem que ocorresse a choradeira que se verifica agora, a
crise na Ucrânia representou um basta à arrogância militar do EUA-OTAN,
marcando assim uma nova correlação de forças na geopolítica
internacional, onde os caprichos expansionistas de Washington já não têm
mais a efetividade que tinha no passado.

6) O tsunami de sanções acionadas contra a Rússia tem dois objetivos:
desestruturar a economia do País e sabotar a nova rota da seda, de forma
a enfraquecer o emergente poderio econômico chinês. No entanto, as
sanções podem não alcançar os resultados pretendidos. É só observarmos
que, mesmo sendo economias mais frágeis, Venezuela e Irã continuam
sobrevivendo apesar de sancionados. Além disso, a economia russa é muito
maior tanto pelo fato de que a Rússia é uma das maiores potências
energéticas do mundo (a Europa depende em mais de 30% do gás russo) e
uma das maiores exportadoras de metais estratégicos para a economia
mundial, quanto por ter um extraordinário poder militar. Vale lembrar
que a Rússia já tinha experiência com sanções dos Estados Unidos desde
que anexou a Criméia e que vinha preparando sua economia para a
eventualidade de novas sanções em virtude do contencioso em relação à
Ucrânia desde o golpe de 2014. Evidentemente que as sanções vão produzir
inicialmente certo grau de inflação, de desemprego e possivelmente queda
no crescimento econômico, mas a Rússia se adaptará em pouco tempo à nova
conjuntura, especialmente em função do estreitamento das relações com a
China e com a Eurásia.

7) Ao contrário dos desejos e da euforia inicial nos Estados Unidos e
União Europeia, essas medidas podem ter um efeito bumerangue e resultar
em problemas não imaginados pelo Ocidente, como a emergência de uma nova
crise econômica e monetária mundial. Para os Estados Unidos, a crise da
Ucrânia visava afastar a Europa da Rússia, enfraquecer as relações
China-Rússia e ocupar o mercado de energia da Europa. No curto prazo
esse objetivos estão sendo alcançados na Europa, especialmente com o
aumento da presença das petroleiras dos EUA nesse mercado e a venda de
equipamentos militares para a região, mas no médio e longo prazos esse
pode ser o dobre de finados do velho imperialismo. Primeiro, porque as
sanções levarão a um aumento dos preços das matérias-primas e dos
suprimentos para as indústrias dos países centrais, sendo que a Europa
pagará o maior preço por sua vassalagem. Esse processo resultará no
aumento da inflação, do desemprego e numa crise econômica no coração do
sistema imperialista, após uma conjuntura que já vinha debilitada em
razão dos problemas causados pela pandemia.

8) Um dado pouco observado nas análises sobre a conjuntura internacional
é o fato de que a produção mundial do valor não está mais centrada na
economia líder. Pelo menos nas últimas quatro décadas, a economia dos
Estados Unidos tem se especializado na construção de uma economia de
serviços, na financeirização especulativa, na exportação de capitais e,
principalmente, na cobertura de seus deficits comerciais mediante a
“expropriação do valor” das nações superavitárias em troca de uma moeda
que não tem mais lastro na produção do valor. Enquanto isso, as nações
que lideram efetivamente a produção do valor estão localizadas fora do
eixo Atlântico, mais precisamente na Eurásia, com destaque para China,
Rússia e Índia. Com os solavancos da crise atual, não levará muito tempo
para que a Lei do Valor realize um ajuste de contas com o império
estadunidense e a velha ordem por ele construída.

9) O declínio econômico do velho imperialismo, como sempre ocorreu
historicamente em vários momentos de transição de hegemonia, vai
produzir uma conjuntura internacional bastante tensa, pois nenhum
império entregou seu poder de maneira pacífica. Mesmo debilitado
econômica e militarmente, ainda tem condições de realizar guerras,
provocações e toda sorte de sabotagens contra as nações que não se
dobrarem aos seus interesses. Como parte dessas provocações, não está
descartado os estímulos à independência de Taiwan como forma de
desestabilizar a China e levá-la a uma guerra na região e a
interferência na América Latina contra qualquer possibilidade de
alinhamento com a China. Também não está descartado os laços cada vez
mais estreitos entre o imperialismo em declínio e as forças fascistas em
todas as regiões do planeta, a luta aberta contra as liberdades
democráticas em todos os países, revelando assim o caráter cada vez mais
reacionário do grande capital nesse momento de crise. O imperialismo
senil poderá morrer abraçado ao nazismo como último testemunho de sua
decadência.

10) Essa conjuntura de transição de hegemonia poderá abrir janelas de
oportunidades para os trabalhadores dos países centrais e periféricos
emergirem na nova conjuntura como protagonistas em busca de uma nova
ordem econômica que atenda aos seus interesses. Acossados pela crise
econômica, pelo desemprego, os trabalhadores poderão retomar a
iniciativa após um longo período em que foram enganados pelas promessas
de paz e bem estar social dos partidos sociais-democratas e esmagados
pela brutalidade das classes dominantes periféricas. Esse processo
poderá ser mais intenso nos Estados Unidos, tanto pelas contradições
econômicas e sociais internas, quanto pela redução da “expropriação do
valor” através do comércio mundial, além da crise do dólar como moeda
mundial. Um império com a economia em crise, com as gritantes
desigualdades sociais internas não poderá sustentar por muito tempo o
dólar como moeda mundial, fato que terá consequências imponderáveis para
a ordem imperial montada após a Segunda Guerra Mundial.


        05 /Abril/2022


      [1] O conto de fadas da resistência ucraniana só existe nos fake
      news que diariamente são veiculados na televisão, pois no primeiro
      dia da guerra a Rússia colocou fora de combate a aviação da
      Ucrânia, seus aeroportos, os centros de comando e bases de
      lançamento de mísseis. Restou à Ucrânia apenas a infantaria e o
      estímulo suicida à população para a construção de prosaicos
      coquetéis Molotov para enfrentar os blindados russos, ou ao
      Ocidente o elogio dos batalhões nazistas, que utilizam a população
      como escudo humano para retardar sua destruição, além da busca de
      imagens de prédios destruídos para a propaganda contra a Rússia.
      [2] Fiori, J. L. Mudança à vista na geopolítica global. São Paulo:
      outraspalavras.net/geopoliticaeguerra/fiori-mudanca-a-vistana-geopolitica-global/ <https://outraspalavras.net/geopoliticaeguerra/fiori-mudanca-a-vistana-geopolitica-global/>. Acesso em 15/03/2022.
      [3] Esteller, R. O grande negócio dos EUA: vende gás 40% mais caro
      que a Rússia. tudoparaminhacuba.wordpress.com/
      <https://tudoparaminhacuba.wordpress.com/> . Acesso em 18/03/2022
      [4] Acervo do conhecimento histórico. achistorico.blogspot.com/
      <https://achistorico.blogspot.com/>. Acesso em 18 de março de 2022.
      [5] Nas eleições de 2012 o Partido comunista da Ucrânia (PCU)
      obteve 1,2% dos votos e 32 cadeiras no Parlamento. Nas eleições de
      2014, no bojo dos movimentos do Euromaidan, a votação do PCU
      regrediu para 3,88%, o que deixou a legenda fora do Parlamento. Em
      2015 o Partido foi colocado na ilegalidade.
      [6] Mottas, N. A descomunização da Ucrânia e a ascensão do
      fascismo, In Defense of Communism. www.idcommunism.com/
      <https://www.idcommunism.com/>. Acesso em 20/03/2022.
      [7] Discurso de Putin a anunciar a operação militar especial na
      Ucrânia. Acesso em 18/03/2022.
      [8] Idem, discurso de Putin.
      [9] Rússia exige explicações dos EUA sobre laboratórios biológicos
      na Ucrânia e Após acusações da Rússia, EUA se manifestam sobre
      laboratórios na Ucrânia.
      [10] Escobar. P. As sanções de Washington destruirão a Europa, não
      a Rússia. resistir.info/p_escobar/sancoes_08mar22.html
      <https://resistir.info/p_escobar/sancoes_08mar22.html>. Acesso em
      21/03/2022.
      [11] Glazyev, S. Sanções e soberania.
      resistir.info/russia/glazyev_02mar22.html
      <https://resistir.info/russia/glazyev_02mar22.html>. Acesso em
      21/03/2022
      [12] Hudson, M. Sanções à Russia, a brincadeira com fogo dos
      Estados Unidos. www.outraspalavras.net
      <https://www.outraspalavras.net/>. Acesso em 23/03/2022
      [13] Nassif. L. A lenta erosão do dólar como moeda global, a
      partir de informações de trabalho de Serkan Arslanalp, Barry
      Eichengreen e China Simpson-Beel, patrocinado pelo FMI.
      www.jornalggn.com.br <https://jornalggn.com.br/>. Acesso em
      29/03/2022.
      [14] Beaklini, B. Crise e “desdolarização” da economia mundial
      superando a hegemonia dos petrodólares. www.jornalggn.com.br
      <https://jornalggn.com.br/>. Acesso em 29/03/2022.
      [15] Oro, J. R. Quem se beneficia da crise na Ucrânia.
      www.patrialatina.com.br <http://patrialatina.com.br/>. Acesso em
      20/03/2022.
      [16] BBC. Hunter Biden admite que empresa ucraniana que o
      contratou via seu nome como ouro. www.sapobrasil.com.br
      <https://www.sapobrasil.com.br/>. Acesso em 25/03/2022.
      [17] Klimentyev, M. Putin: Ocidente falhou em organizar a guerra
      econômica blitzkrieg contra a Rússia. www.atualidad.rt.com
      <https://actualidad.rt.com/>. Acesso em 28/03/2022.

Em
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/ucrania/e_costa_05abr22.html
5/4/2022

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