sábado, 27 de agosto de 2022

A Primavera de Praga de 1968 – A contrarrevolução como o “Cavalo de Tróia” do imperialismo

 

  
   

Nikos Mottas

    /O plano para a restauração de um sistema “capitalista puro” na
    Checoslováquia em 1968 foi significativamente auxiliado por uma
    série de atividades contrarrevolucionárias do imperialismo
    internacional. Vários documentos desclassificados da CIA e do
    Departamento de Estado revelam a existência de “planos
    operacionais”, organizados pelo governo dos EUA, para a
    desestabilização da Checoslováquia./



Era agosto de 1968, na capital da República Socialista da
Checoslováquia, Praga, onde a solidariedade internacionalista dos países
do Pacto de Varsóvia esmagou um dos esforços contrarrevolucionários mais
significativos da época da Guerra Fria. Os acontecimentos em Praga
constituem um marco na luta do mundo socialista contra o
imperialismo. Ao mesmo tempo, os acontecimentos da época continuam a
servir como fonte de propaganda anticomunista de várias forças burguesas
e oportunistas.

 

Há muitas décadas, que a historiografia burguesa – apoiada por
oportunistas e contrarrevolucionários (trotskistas, eurocomunistas,
social-democratas etc.) se refere aos “tanques soviéticos” que, como
argumentam, “afogaram Praga em sangue” encerrando prematuramente o
esforço para um “socialismo de rosto humano”.

 

Os acontecimentos contrarrevolucionários de Praga em 1968 foram usados
pela burguesia internacional na sua campanha caluniadora contra a União
Soviética e a construção socialista do século XX. Esta propaganda
anticomunista-antisoviética é baseada num argumento falso: que o
processo de reformas que estavam a ser promovidos pela liderança de
Dubček [1] visava trazer um supostamente “socialismo humano” como uma
alternativa ao “modelo estalinista” imposto pela URSS.

 

Hoje, cinco décadas depois, existem inúmeros documentos, arquivos,
depoimentos e outros tipos de informações disponíveis, de onde podemos
tirar conclusões valiosas sobre o caráter real da contrarrevolução e a
contínua atividade subversiva do imperialismo. Já é hora de demolir as
mentiras anticomunistas e denunciar a terrível distorção da história.

 

O exame dos acontecimentos de 1968 na Checoslováquiaa não pode ocorrer
fora do quadro histórico do período em que esses eventos ocorreram. Este
quadro é o da Guerra Fria, do confronto, a nível global, de dois
sistemas sociais diferentes – capitalismo e socialismo. Com base nesse
confronto, o imperialismo internacional (principalmente os Estados
Unidos, assim como os países da Europa Ocidental) desenvolveu uma
estratégia bastante flexível para a subversão e o derrubamento do
socialismo. Lembremos que 12 anos antes da “Primavera de Praga”, em
1956, outra contrarrevolução (disfarçada de “revolução”) ocorreu na
vizinha Hungria.

 

A experiência da Hungria levou a uma modificação da política do
imperialismo em relação ao bloco socialista. Essa política foi explicada
por um dos “arquitetos” da então política externa dos EUA, que mais
tarde se tornou conselheiro de segurança nacional do presidente
Carter. Zbigniew Brzezinski escrevia que o tipo de mudança mais desejado
começaria com uma “liberalização interna” dos Estados do leste
europeu. Ele previa que tal “mudança” poderia ocorrer mais facilmente na
Checoslováquiaa  e depois na Hungria e na Polónia [2].

 

Antes de Brzezinski, na década de 1950, a promoção de atividades
contrarrevolucionárias “internas” nos países socialistas tinha sido
colocada como pilar da política externa norte-americana por John Foster
Dulles, secretário de Estado norte-americano durante o governo
Eisenhower. O conceito de “liberalização interna”, que Brzezinski tinha
analisado, foi a “chave” utilizada pelo imperialismo norte-americano e
seus aliados para o “desbloqueamento” da contrarrevolução na
Checoslováquiaa. A prevalência de forças oportunistas de direita na
liderança do Partido Comunista da Checoslováquiaa, sob a direção do novo
secretário-geral  Alexander Dubček, em janeiro de 1968, abriu caminho
para uma série de “reformas” e a “liberalização” do modelo socialista.


A versão projetada pelas forças burguesas e oportunistas sobre os
acontecimentos da época é que a “Primavera de Praga” (assim  foram
denominadas as reformas da liderança de Dubček) visava a
“democratização” do modelo socialista da Checoslováquiaa e o
estabelecimento de um suposto “socialismo”. com rosto humano”. Claro,
esta é uma mentira historicamente comprovada.

 

A chamada “Primavera de Praga” foi na verdade o “cavalo de tróia” do
imperialismo. Os problemas reais do sistema socialista (por exemplo, na
economia, na produção, na educação socialista, etc.)  foram usadas como
pretexto, pelas forças reacionárias no quadro ideológico do
revisionismo, com vista à implementação de políticas antossocialistas
que levariam, lenta mas firmemente à restauração do capitalismo. Anos
depois, um dos protagonistas da “Primavera de Praga”, o economista checo
Ota Šik [3], admitiu o real objetivo das reformas de 1968. Šik, um
defensor da chamada “Terceira Via”, admitiu cinicamente que as reformas
não passavam de uma manobra enganosa e que, naquela época, estava
“convencido de que a única solução era o capitalismo puro”

 

*OS PLANOS IMPERIALISTAS E A SOLIDARIEDADE INTERNACIONALISTA DA UNIÃO
SOVIÉTICA*

 

O plano para a restauração de um sistema “capitalista puro” na
Checoslováquia em 1968 foi significativamente auxiliado por uma série de
atividades contrarrevolucionárias do imperialismo internacional. Vários
documentos desclassificados da CIA e do Departamento de Estado revelam a
existência de “planos operacionais”, organizados pelo governo dos EUA,
para a desestabilização da Checoslováquia. Esses planos incluíam
sabotagens prolongadas, propaganda anticomunista generalizada,
organização e financiamento de grupos contrarrevolucionários dentro do país.

 

É significativo que apenas uma semana antes da intervenção militar dos
países do Pacto de Varsóvia, cerca de 10 a 12 mil alemães ocidentais
chegaram a Praga, enquanto vários agentes da CIA já operavam abertamente
na capital da Checoslováquiaa. Um jornal local da Califórnia tinha
publicado declarações do líder de uma organização chamada “New Americans
for Liberty”, que acabara de voltar da Checoslováquia. A sua missão,
segundo o relatório, era organizar grupos de estudantes contra o
comunismo e preparar grupos de terroristas contrarrevolucionários [5].

 

Um papel importante nos planos contrarrevolucionários imperialistas na
Checoslováquia foi desempenhado pela República Federal da Alemanha. Na
primavera de 1968, milhares de agentes secretos, espiões e sabotadores -
misturados com turistas - passaram pelas fronteiras. Em abril de 1968,
cinco postos de controle de passaportes foram abertos nas fronteiras da
Checoslováquiaa-Alemanha Ocidental; aproximadamente passavam 7.000
carros em cada um desses postos de controle todos os dias [6].

 

No início de agosto, o laço contrarrevolucionário apertava o pescoço da
Checoslováquiaa. Munições fabricadas nos EUA e na Alemanha Ocidental
foram encontradas nas caves de prédios governamentais enquanto, com a
ajuda da CIA e dos serviços secretos da Alemanha Ocidental, estações de
rádio móveis de alta potência transmitiam propaganda anticomunista por
todo o país. Foi uma questão de dias para que a revolta apoiada pelo
imperialismo se transformasse num golpe de Estado contrarrevolucionário
aberto.


A intervenção militar dos países do Pacto de Varsóvia, em 20 de agosto
de 1968, ocorreu no exato momento em que as forças
contrarrevolucionárias, com a ajuda dos imperialistas norte-americanos e
europeus, estavam a “estrangular” a Checoslováquiaa e o seu povo. A
presença das tropas soviéticas em Praga foi uma ação de solidariedade
que cancelou os planos imperialistas e salvou o povo do país do
derramamento de sangue de uma guerra civil iminente.

 

Não surpreendentemente, a historiografia burguesa e oportunista registou
a intervenção internacionalista da União Soviética e dos países do Pacto
de Varsóvia na Checoslováquia como uma “invasão soviética” que,
supostamente, ultrapassou a soberania territorial do país. Isso é uma
mentira descarada. Diante da ameaça contra-revolucionária, membros do CC
do Partido Comunista da Checoslováquiaa, bem como membros da Assembleia
Nacional, solicitaram a intervenção da URSS e dos países do Pacto de
Varsóvia. Sem a intervenção soviética, a Checoslováquia, provavelmente,
afundar-se-ia no caos de uma guerra civil sangrenta e destrutiva, antes
de se tornar outro estado-fantoche dos EUA e da  NATO.

 

Hoje, mais de 50 anos após a “Primavera de Praga” e 27 anos após as
mudanças contrarrevolucionárias na Europa Oriental, o povo da então
Checoslováquia – agora dividida em República Checa e República Eslovaca
– está a sentir os resultados da “liberdade capitalista”. Destruição dos
direitos sociais e laborais, aumento do desemprego, privatizações
extensas, aumento rápido dos sem-abrigo, aprofundamento do fosso entre
ricos e pobres, são apenas alguns dos “presentes” dados pelo capitalismo
e pela UE. Os monopólios e os grandes grupos empresariais são agora os
donos da riqueza tanto na República Checa como na Eslovaca.

 

A história é uma fonte extremamente rica de conhecimento. O caso da
Checoslováquiaa e a “Primavera de Praga” fornecem-nos  conclusões
interessantes para o passado, mas o mais importante, para as lutas de
hoje e de amanhã.

 

Notas:

 

(1) Alexander Dubček (1921-1992), foi Primeiro Secretário do Presidium
do CC do Partido Comunista da Checoslováquiaa de janeiro de 1968 a abril
de 1969.

(2) /Alternative to Partition: For a Broader Conception of America's
Role in Europe, Atlantic Policy Studies/, Nova York: McGraw-Hill, 1965.

(3) Ota Šik (1919-2004), Economista e Político, uma das figuras-chave
por trás do plano de liberalização económica.

(4) Entrevista no jornal Mlada Fronta, 8/2/1990.

(5) Gus Hall, /Imperialism today: an assessment of major issues and
events of our time,/ New York: International Publishers, 1972.

(6) /Anticomunismo: ontem e hoje/, Comité Ideológico do CC do KKE,
Synchroni Epochi, Atenas, 2006.

Em
PELO SOCIALISMO
https://pelosocialismo.blogs.sapo.pt/a-primavera-de-praga-de-1968-a-211556
26/8/2022
 

 

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