sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Eric Hobsbawm sobre Gaza (2009)

Eric Hobsbawm sobre Gaza (2009)

Este depoimento do grande pensador de origem judaica Eric Hobsbawm foi publicado
na altura da ofensiva sionista de 2009. Continuaria válido face à ofensiva de
2012. Permanece válido em 2014, perante a actual acção genocida desencadeada por
Israel. É importante recordá-lo, além do mais para desmontar a histérica
argumentação que pretende fazer crer que a condenação dos crimes de Israel
significa anti-semitismo. Muitos judeus são também vítimas do sionismo.


Há já três semanas que a barbárie está exposta aos olhos da opinião pública
universal, que está vendo, julgando e, com poucas excepções, rejeitando o
terrorismo armado que Israel emprega contra meio milhão de palestinos cercados,
desde 2006, na Faixa de Gaza.Nunca antes qualquer explicação oficial para a
invasão fora tão flagrantemente refutada por uma combinação de imagens de
televisão e aritmética; ou o papaguear dos jornais sobre “alvos militares”,
pelas imagens de crianças ensanguentadas e escolas incendiadas. 13 mortos de um
lado, 1.360 do outro: não é difícil concluir quem são as vítimas. Nem é preciso
dizer muito mais sobre a horrenda operação militar de Israel contra Gaza.Mas
para nós, judeus, é efectivamente preciso dizer mais.Numa história longa e sem
segurança, de povo em diáspora, a nossa reacção natural a quase todos os
acontecimentos públicos inclui inevitavelmente a pergunta “Isso é bom ou é mau
para os judeus?” E, no caso da violência de Israel contra Gaza, a resposta só
pode ser uma: “é mau para os judeus”.É muito evidentemente mau para os 5,5
milhões de judeus que vivem em Israel e nos territórios ocupados de 1967, cuja
segurança é gravemente ameaçada pelas acções militares que o governo de Israel
empreende em Gaza e no Líbano; acções que demonstram a incapacidade dos
militares israelitas para trabalhar a favor dos objectivos que eles mesmos
declaram, e actos que só servem para perpetuar e intensificar o isolamento de
Israel num Médio Oriente hostil.O genocídio ou a expulsão em massa de palestinos
do que resta do seu território nativo original é nada mais nada menos do que
adoptar uma agenda prática que só pode levar à destruição do Estado de Israel.
Só a convivência negociada em termos igualitários e justos entre os dois grupos
é garantia de futuro estável.A cada nova aventura militar de Israel, como a que
se viu no Líbano e se vê agora [2009] em Gaza, a solução torna-se mais difícil;
e mais se fortalece, em Israel, o jugo da direita; e, na Cisjordânia, o mando
dos colonos que, em primeiro lugar, nunca quiseram qualquer solução
negociada.Tal como aconteceu na guerra do Líbano em 2006, Gaza, agora, torna
ainda mais obscuro o futuro de Israel. E o futuro torna-se mais negro, também,
para os nove milhões de judeus que vivem na diáspora.Sejamos bem claros:
criticar Israel não implica qualquer anti-semitismo, mas as acções do governo de
Israel cobrem de vergonha os judeus e, mais do que tudo, fazem renascer o
anti-semitismo, em pleno século 21.Desde 1945 os judeus, dentro e fora de
Israel, beneficiaram enormemente da má consciência de um mundo ocidental que se
recusou a receber imigrados judeus nos anos 1930, antes de ou cometer genocídio
ou de não se opor a ele. Quanta dessa má consciência, que virtualmente derrotou
por 60 anos o anti-semitismo no Ocidente e produziu uma era de ouro para a
diáspora, sobrevive hoje?Israel em acção em Gaza não é o povo vítima da
história. Não é sequer a “valente pequena Israel” da mitologia de 1948-67, um
David derrotando vários Golias que o cercavam.Israel está a perder a
solidariedade do mundo, tão rapidamente quanto os EUA perderam a solidariedade
do mundo no governo de George W. Bush, e por razões semelhantes: cegueira
nacionalista e a megalomania do poderio bélico.O que é bom para Israel e o que é
bom para os judeus como povo são coisas evidentemente associadas, mas até que
seja encontrada uma solução justa para a questão palestina essas duas coisas não
são nem podem ser idênticas. E é essencialmente importante que os judeus o
declarem, bem claramente.Original publicado em London Review of Books, vol. 31,
n. 2, 29 January 2009, pages 5-6 “Responses to the War in Gaza” Fonte:
http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2012/11/eric-hobsbawm-sobre-gaza-2009_18.html

In
O Diário.Info
http://www.odiario.info/?p=3355
31/7/2014

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