sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Desigualdade: estudos sobre as famílias ricas mostram que os pobres são os mesmos de sempre.



Por Donato

No ano de 1427, a então pequena província de Florença elaborou um censo entre
seus habitantes com a finalidade de cobrar impostos. Ali ficou registrado, além
do nome, o que faziam, quanto ganhavam e qual o patrimônio dos moradores da
cidade que já tinha dado ao mundo Dante Alighieri e ainda nos presentearia com
Leonardo Da Vinci.
Recentemente aquele levantamento foi digitalizado e disponibilizado na internet.
Foi então que dois economistas da Banca D’Italia (o Banco Central italiano),
realizaram um estudo com base nas informações disponíveis cruzando-as com as
declarações de renda de famílias remanescentes na cidade até 2011. Guglielmo
Barone e Sauro Mocetti ficaram espantados. Num arco de seis séculos, mais
precisamente após 584 anos, as famílias mais ricas em 1427 eram as mesmas em
2011. E ainda: os sobrenomes dos contribuintes mais pobres também não haviam
mudado.

A tecnologia da digitalização permitiu não apenas fazer um comparativo sobre uma
linha temporal longa, como colocou em dúvida alguns mitos sobre o capitalismo.
No geral esses estudos cobrem 2 ou 3 gerações contíguas e podem dar uma sensação
de alternância ou de migração de riqueza para outras mãos. Por vezes, um filho
playboy mais rebelde e inconsequente termina mal e isso indicaria, numa medição
precipitada, que haveria uma anulação na transmissão de bens e nas vantagens
sociais e econômicas. Errado. A hereditariedade e os mecanismos de proteção das
elites, quando analisados numa linha de tempo maior, comprovam uma estabilidade
assombrosa.
Nas estatísticas, desde então a renda per capita em Florença foi multiplicada
por doze, a população aumentou dez vezes e a cidade cresceu. É a maior cidade e
também capital da Toscana. Em números frios, tudo melhorou, certo? Porém os mais
ricos continuam sendo os mais ricos e os mais pobres permanecem ralando dia e
noite para chegar lá, sem sucesso. Onde está a mobilidade social?
Os italianos não foram os únicos a constatarem essa realidade. Pesquisadores
ingleses também já tinham feito um outro levantamento no qual ficou demonstrado
que famílias da Inglaterra são ricas e poderosas há 28 gerações. Uma prova de
que o 1% está no alto do pódio há mais de 800 anos.
O trabalho dos pesquisadores da terra da rainha abrangeu o período entre os anos
de 1170 e 2012 e, além de analisarem os dados priorizando os sobrenomes das
famílias, utilizaram informações sobre grau de escolaridade e instituições de
ensino frequentadas. Daí vemos aquela confirmação daquilo que todos intuímos.
Gregory Clark e Neil Cummins revelaram que as famosas Oxford e Cambridge
despontam entre as classes mais ricas e evidenciam uma seletividade obscena
mesmo com o acesso livre durante um período. Os pesquisadores acreditavam que o
apoio do Estado com o fornecimento de bolsas para o ingresso nas universidades
iria ser traduzido em uma maior variedade de sobrenomes entre aqueles que nelas
se formavam. “Não há nenhuma evidência disso. Os nomes da elite persistiram tão
tenazmente a partir de 1950 como antes do incentivo. O status social é
fortemente herdado”, afirmaram. Ou seja, de nada resolve abrir as portas do
ensino universitário sem ter oferecido uma boa base.
“Essa correlação é inalterada ao longo dos séculos. Ainda mais notável é a falta
de um sinal de qualquer declínio na persistência de status social durante os
períodos de mudanças institucionais como a Revolução Industrial do século XVIII,
a disseminação da escolarização universal no final do século XIX, ou a ascensão
do estado social-democrata no século XX. A mobilidade social na Inglaterra em
2012 foi pouco maior do que no tempo pré-industrial”, cravou Neil Cummins, da
London School of Economics.
Thomas Piketty, em seu “O capital no século XXI”, sustenta que a concentração de
renda vem aumentando os índices de desigualdade. Os estudos dos economistas
italianos e ingleses não afirmam isso mas ratificam o livro do francês. Se o
topo da sociedade é habitado pelos mesmos há séculos, se a correlação entre
sobrenomes e status social não se altera nunca, é lógico supor que a propensão é
por um maior distanciamento entre as camadas.
O que esses estudos dizem com todas as letras (e números) é que os ricos se
mantém ricos ao longo de séculos sem muitas dificuldades. E que o capitalismo
que sugere ser dinâmico, meritocrático, justo, etc e tal, não passa de
propaganda enganosa. No longo prazo, pouca coisa muda. É culpa exclusiva do
sistema então? Não, até porque concentração de renda é ruim para o próprio
capitalismo. O dinheiro não circula, está sempre as mãos dos mesmos. Mas sem uma
preocupação social de base, que realmente dê oportunidades iguais a todos,
teremos que continuar a responder à pergunta “Qual a possibilidade de um jovem
mudar seu destino em relação a suas origens?” com um desanimador “Praticamente
nenhuma”.
O Brasil tem uma história recente (italianos e ingleses fizeram levantamentos
desde um período em que Cabral nem haviam chegado por aqui), não temos portanto
nenhum estudo que passe perto disso. Mas se puxarmos as listas da publicação
Forbes, é possível constatar que não fugiremos da regra. O primeiro ranking da
revista, feito em 1987, contava com apenas três brasileiros: Roberto Marinho,
Sebastião Camargo e Antonio Ermírio de Moraes. Vinte e sete anos depois, em
2014, já eram 65 os bilionários brasileiros na lista e lá continuavam os
Marinho, os Camargo e os Moraes. Com um detalhe que confirma as pesquisas de
Mocetti, Barone, Clark e Cummins: dos 65 brasileiros, 25 eram parentes.
Este ano, a Forbes aponta uma redução do número de bilionários
verdes-e-amarelos. São 31 mas… tcharam! Lá estão nosso amigos de sempre em
companhia de nomes que sabemos irão se perpetuar e facilmente identificados em
levantamentos recentes: Safra, Moreira Salles e por aí vai.
O filho de Michel Temer já possui um patrimônio de R$ 2 milhões em imóveis.
Michelzinho tem 7 anos de idade. O que ele fez para isso? Nada, nasceu. Essa é a
forma mais eficiente de ficar rico.


 In
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/desigualdade-estudos-sobre-as-familias-ricas-mostram-que-os-pobres-sao-os-mesmos-de-sempre-por-donato/http://www.diariodocentrodomundo.com.br/desigualdade-estudos-sobre-as-familias-ricas-mostram-que-os-pobres-sao-os-mesmos-de-sempre-por-donato/
13/7/2016

Nenhum comentário:

Postar um comentário