segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Uma guerra esquecida – A derrota dos EUA no Laos




       por Miguel Urbano Rodrigues 


       Essa é uma guerra esquecida de que se não fala.
       É portanto natural que tenha chamado a minha atenção um livro que
      encontrei em Havana num alfarrabista:  La derrota del Imperialismo yanqui
      en Lao [1] . 
       O autor, Luis M. Arce, é um jornalista cubano que teve a oportunidade de
       acompanhar, como correspondente do Granma, o desfecho do conflito armado,
       quando o pessoal diplomático americano, os agentes da CIA e os
       funcionários da USAID abandonavam Vientiane, a capital do Laos, em
       debandada caótica (caos que se repetiria em Saigão em 1975).
       ANTECEDENTES 
       O Laos (236 mil km2) era o país mais atrasado do Sudeste asiático quando
      a França, já estabelecida no Vietnam e no Camboja, o invadiu e ocupou em
      1893. Era também o menos povoado; hoje tem somente 7 milhões de
      habitantes.
       Tal como no Vietnam, os franceses, impuseram um Protetorado, mantendo a
       monarquia. Mas o rei era uma marionete decorativa. O povo reagiu ao
      regime colonial através de sucessivas rebeliões. A partir de 1930, a luta
      armada, permanente nas montanhas, foi liderada pelo Partido Comunista da
       Indochina que precedeu o atual Partido Revolucionário Popular do Laos.
       Após a expulsão dos japoneses, que ocuparam o país com a cumplicidade de
      Vichy, um governo nacional provisório proclamou a independência do Laos em
      Outubro de 1945.
       O combate contra os franceses intensificou-se. Os Acordos de Genebra de
      1954 consagraram o direito à independência do povo laociano. Mas o
       imperialismo estado-unidense, que substituira na Região o francês,
       decidiu então fazer do Laos "um baluarte contra o comunismo", "um bastão
      da liberdade" na fórmula de John Foster Dulles.
       Teoricamente independente, o Laos foi tratado por Washington como colónia
      de novo tipo.
       A CIA instalou-se em Vientiane, assim como a USAID, e durante vinte anos
       impôs a sua vontade a sucessivos governos títeres.
       O facto de o Laos ser um país multinacional favoreceu a estratégia
      imperialista. Aproximadamente 60% dos habitantes são laocianos; os
      restantes pertencem a minorias étnicas, a maioria das quais agrupadas em
      tribos montanhesas que falam dezenas de idiomas diferentes.
       Foi nessas minorias tribais que a CIA recrutou o núcleo do exército
      mercenário que constituiu para lutar contra o Pathet Lao (Terra do Laos),
      a organização unitária que conduziu a luta pela libertação do país. Para
      comandar esse exército foi designado um criminoso de guerra, o famoso
       "general" Vang Pao. Um orçamento especial da CIA financiou a criação
      dessa força mercenária.
       Cabem ao presidente John Kennedy responsabilidades pelo envolvimento
      crescente dos EUA na estratégia que desembocou nas guerras criminosas
      contra os povos do Vietnam, do Laos e do Camboja. Foi ele quem deu o aval
      ao assassínio do presidente vietnamita Ngo Dinh Diem. Mas a escalada
       militar ocorreu durante os mandatos de Johnson e Nixon.
       EPOPEIA DESCONHECIDA 
       No seu livro, Luis Arce dedica alguns capítulos a uma epopeia quase
       desconhecida.
       Em 1968, 80% do território nacional estava sob controle das forças
      armadas revolucionarias.
       Como os bombardeamentos da aviação americana eram diários – a capital
      provisória, Sam Neua, fora destruída – tornou-se necessária uma
      organização administrativa que protegesse a população, maioritariamente
      camponesa, garantindo-lhe a sobrevivência e condições de trabalho.
       E aconteceu o inimaginável. Nas montanhas foram abertos tuneis e
       construídas autenticas cidades subterrâneas.
       O mundo continua a desconhecer que na zona livre se instalou um Estado
       revolucionário com órgãos executivos, legislativos e judiciais.
       Os pilotos da USAF ignoravam que, sob a densa floresta tropical,
      existiam, no subsolo, e ali funcionavam fábricas, imprensas, centrais
       telefónicas, rádios, armazéns militares, escolas, hospitais, cinemas,
      creches, albergues para visitantes estrangeiros. Havia também pagodes
      budistas, porque mais de metade da população professava aquela religião.
      Em algumas províncias, milhares de pessoas residiam também em bairros
       subterrâneos.
       "Esse era o outro Laos – escreveu Luis Arce – o do futuro do país, que
      nunca puderam conhecer nem penetrar os imperialistas norte-americanos".
       A "GUERRA SEM FRONTEIRAS" 
       Quando Nixon assumiu a presidência, o exército dos Estados Unidos
       acumulava derrotas no Vietnam.
       Decidiu então, cedendo a pressões dos falcões do Pentágono, generalizar a
      guerra a toda a península da Indochina, desconhecendo fronteiras e
      tratados.
       O Camboja foi invadido em 1970 e no Laos os efetivos do exército
       mercenário de Vang Poa foram elevados para 100 mil homens. De acordo com
       a chamada "Doutrina Nixon", era preciso "lançar asiáticos contra
      asiáticos". Mas, para missões especiais foram enviados para o Laos
      milhares de tropas de elite norte-americanas.
       A tarefa principal foi porem atribuída à Força Aérea. Segundo
      historiadores militares, a USAF lançou mais de dois milhões de toneladas
      de bombas sobre o território laociano. O custo dessas operações foi
      avaliado em mais de 3,5 milhões de dólares diários somente no ano de 1970.
       O alvo principal nessa guerra aérea foi a Pista de Ho Chi Minh, a rede de
      estradas e trilhas, com milhares de quilómetros, que ligava Hanói ao sul
      do Vietnam, parte da qual atravessava o território laociano.
       Em fevereiro de 1971,Nixon tomou a decisão de ocupar o Laos. Para o
       efeito mobilizou 45 mil homens, 800 helicópteros e 500 aviões, entre os
      quais 50 fortalezas voadoras B -52.
       O desfecho da agressão foi outra humilhante derrota militar.
       Nos primeiros dois dias foram abatidos 64 helicópteros e destruídos 40
      tanques.
       Nos EUA o movimento de oposição à guerra crescia torrencialmente.
      Washington foi forçada a abrir negociações de paz em Paris.
       O fim da guerra tardou. Mas em fevereiro de 1974 foi finalmente assinado
      o Acordo para a criação de um governo de transição. Tal como no Vietnam,
      Washington acreditou erradamente que os seus aliados no país,
      generosamente armados e financiados, tinham condições para se manter no
      poder. Essa esperança foi rapidamente desmentida pelo rumo da História.
      Nos quarteis a maioria dos soldados rebelaram-se contra os comandantes
      mercenários e aderiram massivamente ao Pathet Laos.
       Duas décadas de uma guerra hoje esquecida, na qual os EUA foram
       derrotados, findaram com a instauração da Republica Popular Democrática
      do Laos, dirigida pelo partido comunista.

      05/Agosto/2016
      [*] Luis M.Arce,  La derrota del imperialismo yanqui en Lao,  Editorial
      Letras Cubanas, 174 pg, La Habana, 1979 


  
In
O DIÁRIO INFO
   www.odiario.info/uma-guerra-esquecida-a-derrota-dos/ 

5/8/2016

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