Stedile: Desafio para Reforma Agrária é democratizar Estado e mudar política 
Por Rafael Soriano
 
Após dois anos de intensos debates, os trabalhadores rurais chegaram ao VI 
Congresso Nacional do MST para consolidar seu novo programa agrário, que é 
chamado de Reforma Agrária Popular.
Em diálogo na manhã desta terça-feira (11/02), João Pedro Stédile, da 
Coordenação Nacional do Movimento, e Guilherme Delgado, doutor em economia 
(Unicamp), ajudaram a aprofundar o tema.
“Não fizemos e nem acontecerá a Reforma Agrária clássica”, esclarece João Pedro 
Stédile, se referindo ao modelo de reforma agrária realizado pelos países 
capitalistas desde o século XIX, como Alemanha e Estados Unidos, sob direção 
política da burguesia industrial, que precisava ampliar mercados consumidores e 
o fornecimento de matérias-primas para indústria.
“O melhor exemplo que temos na história recente do país, foi a iniciativa de 
Reforma Agrária proposta por Celso Furtado, que conhecia bem a realidade do 
Nordeste. Essa proposta previa a desapropriação de todas as fazendas acima de 
500 ha. Teria sido uma revolução, porém parte da burguesia não aceitou e, se 
aliando ao império, nos impôs uma ditadura violenta de mais de vinte anos”, 
disse o dirigente do movimento.
Assim, a Reforma Agrária Popular se remete à divisão das terras, o fim do 
latifúndio, aliada, contudo, à superação do modelo de produção e de relação com 
a natureza difundido pelo agronegócio.
O modelo do agronegócio, dentro do atual estágio de desenvolvimento do 
capitalismo no campo em nível global, é responsável por direcionar o uso 
majoritário das terras cultiváveis no país para a produção de commodities (bens 
agrícolas exportáveis, com cotação nas bolsas de valores).
“Não podemos pegar a terra e imitar os fazendeiros em seu modelo, arrendar 
terra, colocar peão pra trabalhar”, afirma Stédile.
O MST defende que se desenvolvam técnicas de produção no sentido da transição 
agroecológica, que incorpore a mão-de-obra camponesa e com capacidade para 
produzir sem agrotóxicos.
Outros pilares deste novo programa são a incorporação da proteção às sementes e 
à natureza em geral, com um amplo programa de reflorestamento em áreas de 
assentamentos; a criação de agroindústrias sob controle cooperado dos 
trabalhadores, garantindo também aumento de renda através da comercialização de 
produtos beneficiados
Segundo ele, é necessário lutar por avanços sociais como o direito à educação no 
campo, construção de infra-estruturas sociais, atenção de saúde e outros avanços 
que melhorem a vida das famílias camponesas.
Desafios para a luta pela terra
Segundo o pesquisador Guilherme Delgado, doutor em economia pela Universidade de 
Campinas (Unicamp), a reforma agrária ao longo da história foi proposta como 
resposta a questões agrárias geradas pelo regime de propriedade, posse e uso das 
terras, em certos países.
Assim, a democratização da terra caracterizava-se por incidir nessas relações, 
alterando a estrutura fundiária, com distribuição de terras antes concentradas, 
com vistas à igualdade.
“A questão agrária que gerou as contradições que levaram à criação do MST foi 
reprimida durante os vinte anos de ditadura Civil-Militar e desaguaram na 
Constituição de 1988”, analisa Delgado.
Ele credita ao movimento camponês o mérito de conseguir colocar temas 
progressistas na Carta Magna. “A Constituição é, na verdade, um desenho 
arquitetônico e a montagem de um alicerce, porque quem faz a Reforma Agrária 
posteriormente é a luta política", afirma
"O processo político, a hegemonia política, que se instaura na sociedade e 
Estado, vai tornar aquele desenho do regime fundiário uma realidade. O que temos 
de pós Constituinte é um processo completamente antagônico, negativo, contrário 
ao regime fundiário instituído pela Constituição de 88”, indica Delgado, em 
relação à perda contínua de direitos e desregulamentações legais em curso 
capitaneados pelo Congresso.
Indagando sobre a viabilidade de uma guinada da luta em direção à concretização 
da Reforma Agrária Popular, Stédile complementa pontuando os principais desafios 
colocados ao Movimento.
Entre os desafios, ele apresenta a construção de alianças entre os trabalhadores 
rurais, independente de sua forma de organização; bem como aprimorar a aliança 
com os setores urbanos, que concentram a maior parte da população.
“Precisamos acumular forças nas áreas já conquistadas e ir colocando em prática 
essas ideias de mudanças. Temos que aprimorar as lutas de massas, de modo que o 
inimigo passe a temer nossa ação, por isso nossa força está na capacidade de 
fazer lutas de massas", afirma Stedile.
"Numa perspectiva mais geral, com as lutas nos engajarmos nas reivindicações 
pela democratização do Estado, como se apresenta atualmente a luta pela mudança 
nas regras políticas, e, com isso, continuar acumulando forças para produzir 
governos populares que tenham condições de realizar as mudanças necessárias”, 
finaliza Stedile.
6° Congresso Nacional
In
http://www.mst.org.br/node/15702
11/2/2014
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