quinta-feira, 4 de junho de 2015

A duplicidade como política de Washington para a América Latina – Marines para a América Central e diplomatas para Cuba



por James Petras

Toda a gente, desde sabichões políticos em Washington até o Papa em Roma,
incluindo a maior parte dos jornalistas nos mass media e na imprensa
alternativa, centrou a atenção nos movimentos dos EUA rumo à finalização
do bloqueio económico de Cuba e à abertura gradual de relações
diplomáticas.

Fala-se muito de uma "grande mudança" na política estado-unidense em
relação à América Latina com ênfase na diplomacia e na reconciliação.
Mesmo autores e jornais progressistas deixaram de escrever acerca do
imperialismo dos EUA.

Contudo, há evidências crescentes de que as negociações de Washington com
Cuba simplesmente fazem parte de uma política dúplice, de duas vias
(two-track policy). Há claramente uma grande acumulação [de forças] dos
EUA na América Latina, com dependência crescente em "plataformas
militares" destinadas a lançar intervenções militares directas em países
estratégicos.

Além disso, decisores políticos dos EUA envolvem-se activamente na
promoção de partidos de oposição, movimentos e personalidades "clientes" a
fim de desestabilizar governos independentes e estão decididos a
re-impor a dominação estado-unidense.

Neste ensaio começaremos por discutir as origens e o desdobrar desta
política de duas vias, suas manifestações actuais e projecções no
futuro. Concluiremos avaliando as possibilidades de restabelecer a
dominação imperial dos EUA na região.

Origens da política de duas vias

A "política de duas vias" de Washington, baseada na combinação de
"políticas reformistas" em relação a algumas formações políticas, enquanto
trabalhava para derrubar outros regimes e movimentos pela força e
intervenção militar, foi praticada pela antiga administração Kennedy a
seguir à revolução cubana. Kennedy anunciou um vasto programa económico de
ajuda, empréstimos e investimentos – chamado "Aliança para o Progresso" –
para promover o desenvolvimento e a reforma social em países
latino-americanos desejosos de se alinharem com os EUA. Ao mesmo tempo o
regime Kennedy escalou a ajuda militar estado-unidense e exercícios
conjuntos na região. Kennedy patrocinou um grande contingente de Forças
Especiais – os "Boinas Verdes" – destinados à guerra de
contra-insurgência. A Aliança para o Progresso destinava-se a conter a
atracção maciça das mudanças sociais revolucionárias em curso em Cuba com
o seu próprio programa de "reforma social". Se bem que Kennedy promovesse
reformas diluídas na América Latina, ele lançou a invasão "secreta" de
Cuba (Baia dos Porcos) em 1961 e um bloqueio naval em 1962 (a chamada
"crise dos mísseis"). A política de duas vias acabou por sacrificar
reformas sociais e fortalecer a repressão militar. Em meados da década de
1970, as "duas vias" tornaram-se uma só – a força. Os EUA invadiram a
República Dominicana em 1965. Apoiaram uma série de golpes militares em
toda região, isolando Cuba efectivamente. Em consequência, a força de
trabalho latino-americana experimentou cerca de um quarto de século de
declínio dos padrões de vida.

Na década de 1980 os ditadores-clientes dos EUA haviam perdido sua
utilidade e Washington mais uma vez adoptou uma estratégia de duas vias.
Numa, a Casa Branca apoiou incondicionalmente a agenda neoliberal dos
seus militares-clientes governantes e patrocinou-os como parceiros júniors
na hegemonia regional de Washington. Na outra via, promoveu mudanças para
uma política eleitoral altamente controlada, a qual foi descrita como
"transição democrática", a fim de "descomprimir" pressões sociais de
massa contra seus clientes militares. Washington assegurou a introdução de
eleições e promoveu políticos clientes desejosos de continuar a estrutura
sócio-económica neoliberal estabelecida pelos regimes militares.

Na viragem do novo século, os descontentamentos acumulados em trinta anos
de domínio repressivo, de políticas sócio-económicas regressivas e de
desnacionalização e privatização do património nacional provocaram uma
explosão de descontentamento social em massa. Isto levou ao derrube e
derrota eleitoral dos regimes clientes neoliberais de Washington.

Na maior parte da América Latina movimentos de massas estavam a exigir
uma ruptura com os programas de "integração" centrados nos EUA. O
anti-imperialismo aberto crescia e intensificava-se. Este período assistiu
à emergência de numerosos governos de centro-esquerda na Venezuela,
Argentina, Equador, Bolívia, Brasil, Uruguai, Paraguai, Honduras e
Nicarágua. Além das mudanças de regime, forças económicas mundiais fizeram
crescer mercados asiáticos, seus pedidos de matérias-primas
latino-americanas e a ascensão dos preços das commodities ajudou a
estimular o desenvolvimento de organizações regionais centradas na América
Latina – fora do controle de Washington.

Ainda estavam entranhados em Washington os seus 25 anos de política "via
única" de apoio a políticas autoritárias civis-militares e de imposição
neoliberal e era incapaz de responder e apresentar uma alternativa de
reforma ao desafio anti-imperialista e de centro-esquerda à sua
dominação. Washington trabalhou para reverter a nova configuração de
poder. Suas agências para o exterior, a Agency for International
Development (AID), a Drug Enforcement Agency (DEA) e embaixadas
trabalhavam para desestabilizar os novos governos na Bolívia, Equador,
Venezuela, Paraguai e Honduras. A "via única" de intervenção e
desestabilização estado-unidense fracassou durante a primeira década do
novo século (com a excepção de Honduras e Paraguai).

No fim, Washington acabou politicamente isolada. Seus esquemas de
integração foram rejeitados. Suas fatias de mercado na América Latina
declinaram. Washington não só perdeu sua maioria automática na Organização
dos Estados Americanos (OEA) como se tornou uma minoria nítida.

A política "via única" de Washington de confiar no "porrete" e evitar a
"cenoura" era baseada em várias considerações. Os regimes Bush e Obama
estavam profundamente influenciados pelos vinte e cinco anos de dominação
da região (1975-2000) e a noção de que os levantamento e mudanças
políticas na América Latina na década seguinte eram efémeros, vulneráveis
e facilmente reversíveis. Além disso, Washington, acostumada durante mais
de um século de dominação económica de mercados, recursos e trabalho,
considerou como garantido que a sua hegemonia era inalterável . A Casa
Branca falhou em reconhecer a força da participação crescente da China no
mercado latino-americano. O Departamento de Estado ignorou a capacidade de
governos latino-americanos para integrarem seus mercados e excluírem os
EUA.

Responsáveis do Departamento de Estado dos EUA nunca se afastaram da
desacreditada doutrina neoliberal que haviam promovido com êxito na
década de 1990. A Casa Branca fracassou na adopção de uma viragem
"reformista" para conter o apelo de reformadores radicais como Hugo
Chávez, o presidente venezuelano. Isto foi mais evidente nos países
caribenhos e andinos onde o Presidente Chávez lançou suas duas "alianças
para o progresso": a "Petro-Caribe" (programa da Venezuela de
fornecimento de combustível barato, fortemente subsidiado, a países pobres
da América Central e do Caribe e de óleo de calefacção para bairros pobres
nos EUA) e o "ALBA" (união político-económica de estados andinos, mais
Cuba e Nicarágua, concebida para promover solidariedade política e laços
económicos regionais). Ambos os programas foram fortemente financiados por
Caracas. Washington fracassou em propor um plano alternativo com êxito.

Incapaz de vencer diplomaticamente ou na "batalha de ideias", Washington
recorreu ao "grande porrete" e procurou perturbar o programa económico
regional da Venezuela ao invés de competir com os generosos e benéficos
pacotes de ajuda de Chávez. As "tácticas destruidoras" dos EUA saíram pela
culatra. Em 2009, o regime Obama apoiou um golpe militar em Honduras,
removendo o liberal e reformista Presidente eleito, Zelaya, e instalou uma
tirania sangrenta, uma reversão à década de 1970 quando os EUA apoiaram o
golpe chileno que levou o general Pinochet ao poder. A secretária de
Estado Hilary Clinton, num acto de pura palhaçada política, recusou-se a
chamar de golpe o derrube violento de Zelaya e rapidamente reconheceu a
ditadura. Nenhum outro governo apoiou os EUA na sua política de Honduras.
Houve uma condenação universal do golpe , destacando o isolamento de
Washington.

Repetidamente, Washington tentou utilizar sua "carta hegemónica" mas foi
vencida sem rodeios em reuniões regionais. Na Cimeira das Américas em
2010, países latino-americanos afastaram objecções dos EUA e votaram por
convidar Cuba à sua reunião seguinte, desafiando um veto estado-unidense
de 50 anos. Os EUA foram deixados sós na sua oposição.

A posição de Washington foi mais uma vez enfraquecida pelo boom de
commodities ao longo de uma década (estimulado pela procura voraz da China
por produtos agro-minerais). O "mega-ciclo" pôs em causa a antecipação dos
Departamentos do Tesouro e do Estado dos EUA de um colapso de preços .
Nos ciclos anteriores, "baixas" de preços de commodities haviam forçado
governos de centro-esquerda a correrem ao Fundo Monetário Internacional
(FMI) controlado por Washington à procura de empréstimos altamente
condicionados para sanar balanças de pagamentos, nos quais a Casa Branca
costumava impor suas políticas neoliberais e dominação política. O
"mega-ciclo" gerou receitas e rendimentos ascendentes. Isto deu enorme
alavancagem a governos de centro-esquerda para evitar as "armadilhas da
dívida" ("debt traps") e marginalizar o FMI. Isto virtualmente eliminou
a condicionalidade imposta pelos EUA e permitiu a governos
latino-americanos prosseguirem políticas populistas-nacionalistas. Estas
políticas diminuíram a pobreza e o desemprego. Washington jogou a "carta
da crise" e perdeu. No entanto, Washington continuou a trabalhar com
grupos de oposição de extrema direita para desestabilizar os governos
progressistas, na esperança de que "chegassem ao desastre", caso em que
os apaniguados de Washington "valsariam" e tomariam o poder.

A reintrodução da política de "duas vias"

Após uma década e meia de golpes duras, de fracassos repetidos das suas
políticas do "grande porrete", de rejeição de esquema de integração
centrados nos EUA e de múltiplas derrotas inequívocas de políticos seus
clientes nas urnas eleitorais, Washington finalmente começou a "repensar"
sua política de "via única" e hesitantemente explora uma limitada
abordagem pelas "duas vias".

Contudo, as "duas vias" incluem polaridades claramente marcadas pelo
passado recente. Enquanto o regime Obama abriu negociações e avançou para
o estabelecimento de relações com Cuba, ele escalou as ameaças
militares em relação à Venezuela ao absurdamente etiquetar Caracas como
uma "ameaça à segurança nacional dos EUA".

Washington acordou para o facto de que a sua política belicosa em relação
a Cuba foi rejeitada universalmente e deixou os EUA isolados da América
Latina. O regime Obama decidiu afirmar algumas "credenciais reformistas"
com a exibição da sua abertura a Cuba . A "abertura a Cuba" realmente
faz parte de uma mais vasta intervenção política mais activa na América
Latina . Washington tomará pleno proveito da vulnerabilidade agravada dos
governos de centro-esquerda quando o mega-ciclo das commodities chega ao
fim e os preços entram em colapso. Washington aplaude o programa de
austeridade orçamental perseguido pelo regime de Dilma Rousseff no
Brasil. Apoia calorosamente o recém eleito regime "Frente Ampla" de
Tabaré Vázquez no Uruguai com suas políticas de mercado livre e
ajustamento estrutural. Apoia publicamente a recente nomeação pela
presidente chilena Bachelet de democratas-cristãos de centro-direita para
postos ministeriais a fim de obsequiar o big business.

Estas mudanças dentro da América Latina proporcionam uma "abertura" para
Washington prosseguir uma política de "duas vias". Por um lado Washington
está a aumentar a pressão política e económica e a intensificar sua
campanha de propaganda contra políticas e regimes de "intervenção estatal"
no período imediato . Por outro lado, o Pentágono está a intensificar e
escalar sua presença na América Central e sua vizinhança imediata. O
objectivo é finalmente recuperar alavancagem sobre o comando militar no
resto do continente sul-americano.

O Miami Herald (10/05/15) informou que a administração Obama enviou 280
marines para a América Central sem qualquer missão específica ou
pretexto. Verificando-se logo após a Cimeira das Américas no Panamá
(10-11/Abril/2015), esta acção tem grande importância simbólica . Se bem
que a presença de Cuba na Cimeira possa ter sido louvada como uma vitória
diplomática da reconciliação dentro das Américas, o despacho de centenas
de fuzileiros navais estado-unidenses para a América Central sugere que
outro cenário está em preparação.

Ironicamente, na reunião da Cimeira, o secretário-geral da União das
Nações Sul Americanas (UNASUL), o antigo presidente colombiano (1994-98)
Ernesto Samper, conclamou os EUA a removerem todas as suas bases militares
da América Latina, incluindo Guantanamo: "Um bom ponto na nova agenda de
relações na América Latina seria a eliminação das bases militares
estado-unidenses".

A ideia da "abertura" dos EUA a Cuba é precisamente assinalar seu maior
envolvimento na América Latina, o qual inclui um retorno a uma mais
robusta intervenção militar estado-unidense. A intenção estratégica é
restaurar regimes clientes neoliberais, pelos votos ou pelas balas.

Conclusão

A actual adopção de Washington de uma política de duas vias é uma "versão
barata" da política de John F. Kennedy de combinar a "Aliança para o
Progresso" com as "Boinas Verdes". Contudo, Obama oferece pouco
quanto a apoio financeiro para modernização e reforma a fim de
complementar seu desejo de restaurar a dominância neoliberal.

Após uma década e meia de recuo político, isolamento diplomático e perda
relativa de alavancagem militar, o regime Obama levou seis anos para
reconhecer a profundidade do seu isolamento. No momento em que a
secretária assistente para Assuntos do Hemisfério Ocidental, Roberta
Jacobson, afirmou que estava "surpreendida e desapontada" quando todos
os países latino-americanos se opuseram à afirmação de Obama de que a
Venezuela representava uma "ameaça à segurança nacional dos Estados
Unidos", ela mostrou quão ignorante e fora de sintonia se tornou o
Departamento de Estado em relação à capacidade de Washington para
influenciar a América Latina no apoio à sua agenda de intervenção
imperial.

Com o declínio e recuo do centro-esquerda, o regime Obama tem estado
ansioso por explorar a estratégia das duas vias. Na medida em que as
conversações de paz na Colômbia entre as FARC e o Presidente Santos
avancem, é provável que Washington reajuste sua presença militar na
Colômbia para enfatizar sua campanha de desestabilização contra a
Venezuela. O Departamento de Estado aumentará aberturas diplomáticas à
Bolívia. A National Endowment for Democracy intensificará sua intervenção
nas eleições argentinas deste ano.

Circunstâncias variadas e cambiantes ditam tácticas flexíveis . A pairar
sobre as mudanças tácticas de Washington está uma perspectiva estratégica
odiosa destinada a aumentar a alavancagem militar . Quando as
negociações de paz entre o governo colombiano e as guerrilhas das FARC
avançam rumo a um acordo, diminui o pretexto para manter sete bases
militares estado-unidenses e vários milhares de militares dos EUA, assim
como suas tropas de Forças Especiais. Contudo, o presidente Santos da
Colômbia não deu indicação de que um "acordo de paz" estaria
condicionado à retirada de tropas estado-unidenses ou ao encerramento das
suas bases. Por outras palavras, o US Southern Command reteria uma
plataforma militar vital e uma infraestrutura capaz de lançar ataques
contra a Venezuela, Equador, América Central e o Caribe. Com bases
militares por toda a região, na Colômbia, em Cuba (Guantanamo), Honduras
(Soto Cano em Palmerola), Curaçao, Aruba e Peru, Washington pode
rapidamente mobilizar forças de intervenção. Laços militares com as forças
armadas do Uruguai, Paraguai e Chile asseguram contínuos exercícios
conjuntos e estreita coordenação das chamadas políticas de "segurança" no
"Cone Sul" da América Latina. Esta estratégia está concebida
especificamente para preparar a repressão interna contra movimentos
populares , sempre e em todo momento em que a luta de classe se
intensifique na América Latina. A política de duas vias, hoje em vigor, é
executada através de estratégias político-diplomáticas e militares.

No período imediato , na maior parte da região, Washington busca uma
política de intervenção e pressão política, diplomática e económica. A
Casa Branca está a contar com o "giro para direita" de antigos governos de
centro-esquerda a fim de facilitar o retorno ao poder de regimes clientes
descaradamente neoliberais em futuras eleições. Isto é especialmente
verdadeiro em relação ao Brasil e à Argentina.

A "via político-diplomática" é evidente nos movimentos de Washington para
restabelecer relações com a Bolívia e fortalecer aliados alhures a fim de
alavancar políticas favoráveis no Equador, Nicarágua e Cuba. Washington
propõe oferecer acordos diplomáticos e comerciais em troca de um
"amaciamento" da crítica anti-imperialista e do enfraquecimento dos
programas da "era Chávez" de integração regional.

A "abordagem em duas vias", tal como aplicada à Venezuela, tem uma
componente militar mais aberta do que alhures. Washington continuará a
subsidiar violentos cruzamentos paramilitares da fronteira com a Colômbia.
Continuará a encorajar a sabotagem terrorista interna da rede eléctrica e
do sistema de distribuição alimentar. O objectivo estratégico é desgastar
a base eleitoral do governo Maduro, como preparação para as eleições
legislativas no fim de 2015. Quando se trata da Venezuela, Washington está
a seguir uma estratégia em "quatro passos":

(1) Intervenção violenta indirecta para desgastar o apoio eleitoral do
governo

(2) Financiamento em grande escala da campanha eleitoral da oposição
parlamentar para assegurar uma maioria no Congresso

(3) Uma campanha maciça nos media em favor de um voto do Congresso para
um referendo impedindo (impeaching) o Presidente

(4) Uma campanha em grande escala financeira, política e nos media para
assegurar uma maioria de votos para o impeachment por referendo.

Na possibilidade de uma votação por margem estreita, o Pentágono
prepararia uma intervenção militar rápida com seus colaboradores internos
– procurando um derrube de Maduro "estilo Honduras".

A fraqueza estratégica e táctica da política de duas vias é a ausência
de qualquer ajuda económica prolongada e abrangente, com programas de
comércio e investimento que atraíssem e mantivessem eleitores da classe
média. Washington está a contar mais com os efeitos negativos da crise
para restaurar seus clientes neoliberais. O problema com esta abordagem é
que as forças pró EUA só podem prometer um retorno a programas de
austeridade ortodoxos, com reversão de programas sociais e de bem-estar
público, fazendo ao mesmo tempo concessões económicas em grande escala aos
maiores investidores e banqueiros estrangeiros. A implementação de tais
programas regressivos iriam atear e intensificar conflitos de classe, de
comunidades e étnicos.

A estratégia de "transição eleitoral" dos EUA é um expediente
temporário , à luz das políticas económicas altamente impopulares que
certamente implementariam. A ausência completa de qualquer ajuda
sócio-económica substancial dos EUA para amortecer os efeitos adversos
sobre famílias trabalhadoras significa que as vitórias eleitorais dos
clientes dos EUA não perdurarão. Eis porque e quando a acumulação militar
estratégica entra em cena. O êxito da via única, a busca de tácticas
político-diplomáticas, inevitavelmente polarizará a sociedade
latino-americana e aumentará as perspectivas para a luta de classe.
Washington espera ter seus aliados-clientes político-militares prontos
para responder com repressão violenta. A intervenção directa e o aumento
da repressão interna entrarão em cena para assegurar a dominância
estado-unidense.

A "estratégia de duas vias", mais uma vez, evoluirá para uma
"estratégia de via única" destinada a devolver a América Latina à
[condição de] região satélite, pronta para a pilhagem por multinacionais
extractivas e especuladores financeiros.

Como temos visto ao longo da última década e meia, "políticas de duas
vias" levam a levantamentos sociais. E na próxima ocasião os resultados
podem ir muito além de regimes progressistas de centro-esquerda , rumo a
governos verdadeiramente sociais-revolucionários!

Epílogo

Os construtores do império estado-unidense demonstraram claramente por
todo o mundo a sua incapacidade para intervir e produzir estados clientes
estáveis, prósperos e produtivos (Iraque e Líbia são casos exemplares).
Não há razão para acreditar, mesmo que a "política das duas vias" leve a
vitórias eleitorais temporárias, que os esforços de Washington para
restaurar a sua dominância terão êxito na América Latina, ainda menos
porque à sua estratégia falta qualquer mecanismo para a ajuda económica
e reformas sociais que mantivesse uma elite pró EUA no poder. Exemplo:
como poderiam os EUA compensar de algum modo o pacote de ajuda da China ao
Brasil de US$50 mil milhões senão através da violência e da repressão?

É importante analisar como a ascensão da China, Rússia, de fortes
mercados regionais e de novos centros financeiros enfraqueceram gravemente
os esforços de regimes clientes para realinharem com os EUA. Golpes
militares e mercados livres já não são mais fórmulas garantidas de êxito
na América Latina. Seus fracassos passados são demasiado recentes para
serem esquecidos.

Finalmente, a "financiarização" da economia estado-unidense, que até o
Fundo Monetário Internacional descreve como impacto negativo de
"demasiada finança" (Financial Times, 13/Maio/15, p. 4), significa que
os EUA não podem conceder recursos capitais para desenvolver a actividade
produtiva na América Latina. O estado imperial só pode servir de violento
cobrador de dívidas para os seus bancos no contexto do desemprego em
grande escala . O imperialismo financeiro e extractivo é um cocktail
político-económico para detonar a revolução social num continente
inteiro , muito para além da capacidade dos fuzileiros navais
estado-unidenses o impedirem ou suprimirem.


28/Maio/2015

O original encontra-se em petras.lahaine.org/?p=2035

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

http://www.resistir.info/petras/petras_28mai15.html

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