sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Reforma de ensino médio do (des) governo de turno: decreta-se uma escola para os ricos e outra para os pobres




Por Gaudêncio Frigotto*, no site da ANPED


A reforma de ensino médio proposta pelo bloco de poder que tomou o Estado
brasileiro por um processo golpista, jurídico, parlamentar e midiático, liquida
a dura conquista do ensino médio como educação básica universal para a grande
maioria de jovens e adultos, cerca de 85% dos que frequentam a escola pública.
Uma agressão frontal à constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes da Educação
Nacional que garantem a universalidade do ensino médio como etapa final de
educação básica.
Os proponentes da reforma, especialistas analfabetos sociais e doutores em
prepotência, autoritarismo e segregação social, são por sua estreiteza de
pensamento e por condição de classe, incapazes de entender o que significa
educação básica.
E o que é pior, se entende não a querem para todos.
Com efeito, por rezarem e serem co-autores da cartilha dos intelectuais do Banco
Mundial, Organização Mundial do Comércio, etc., seus compromissos não são com
direito universal à educação básica, pois a consideram um serviço que tem que se
ajustar às demandas do mercado.
Este, uma espécie de um deus que define quem merece ser por ele considerado num
tempo histórico de desemprego estrutural.
O ajuste ou a austeridade que se aplica à classe trabalhadora brasileira, da
cidade e do campo, pelas reformas da previdência, reforma trabalhista e
congelamento por vinte anos na ampliação do investimento na educação e saúde
públicas, tem que chegar à escola pública, espaço onde seus filhos estudam.
A reforma do ensino médio que se quer impor por Medida Provisória segue figurino
da década de 1990 quando MEC era dirigido por Paulo Renato de Souza no Governo
Fernando Henrique Cardoso.
Não por acaso Maria Helena Guimarães é a que de fato toca o barco do MEC.
Também não por acaso que o espaço da mídia empresarial golpista é dado a figuras
desta década.
Uma reforma que retrocede ao obscurantismo de autores como Desttut de Tracy que
defendia, ao final do século XIX, ser da própria natureza e, portanto,
independente da vontade dos homens, a existência de uma escola rica em
conhecimento, cultura, etc., para os que tinham tempo de estudar e se destinavam
a dirigir no futuro e outra escola rápida, pragmática, para os que não tinham
muito tempo para ficar na escola e se destinavam (por natureza) ao duro ofício
do trabalho.
Neste sentido é uma reforma que anula Lei Nº. 1.821 de 12 de março de 1953.
Que dispõe sobre o regime de equivalência dos cursos de grau médio para efeito
de matrícula nos curso superiores e cria novamente, com outra nomenclatura, o
direcionamento compulsório à universidade.
Um direcionamento que camufla o fato de que para a maioria da classe
trabalhadora seu destino são as carreiras de menor prestigio social e de valor
econômico.
Também retrocede e torna, e de forma pior, a reforma do ensino médio da ditadura
civil militar que postulava a profissionalização compulsória do ensino
profissional neste nível de ensino.
Piora porque aquela reforma visava a todos e esta só visa os filhos da classe
trabalhadora que estudam na escola pública.
Uma reforma que legaliza o apartheid social na educação no Brasil.
O argumento de que há excesso de disciplinas esconde o que querem tirar do
currículo – filosofia, sociologia e diminuir a carga de história, geografia,
etc.
E o medíocre e fetichista argumento que hoje o aluno é digital e não agüenta uma
escola conteudista mascara o que realmente o aluno desta, uma escola degradada
em seus espaços, sem laboratórios, sem auditórios de arte e cultura, sem espaços
de esporte e lazer e com professores esfacelados em seus tempos trabalhando em
duas ou três escolas em três turnos para comporem um salário que não lhes
permite ter satisfeitas as suas necessidades básicas.
Um professorado que de forma crescente adoece.
Os alunos do Movimento Ocupa Escolas não pediram mais aparelhos digitais, estes
eles têm nos seus cotidianos.
Pediram justamente condições dignas para estudar e sentir-se bem no espaço
escolar.
Por fim, uma traição aos alunos filhos dos trabalhadores, ao achar que deixando
que eles escolham parte do currículo vai ajuda-los na vida.
Um abominável descompromisso geracional e um cinismo covarde, pois seus filhos e
netos estudam nas escolas onde, na acepção de Desttut de Tracy estudam os que
estão destinados a dirigir a sociedade.
Uma reforma que legaliza a existência de uma escola diferente para cada classe
social.
Justo estes intelectuais que em seus escritos negam a existência das classes
sociais.
Quando se junta prepotência do autoritarismo, arrogância, obscurantismo e
desprezo aos direitos da educação básica plena e igual para todos os jovens, o
seu futuro terá como horizonte a insegurança e a vida em suspenso.
* Filósofo e Educador. Professor do Programa de Pós Graduação em Políticas
Públicas e Formação Humana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
In
VIOMUNDO
http://www.viomundo.com.br/denuncias/gaudencio-frigotto-reforma-de-temer-legaliza-o-apartheid-social-no-brasil.html
22/9/2016

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