quinta-feira, 26 de abril de 2018

Xadrez do desastre da nova legislação trabalhista, por Luis Nassif


Luis Nassif

A economia é uma engrenagem complexa, similar a um jogo do xadrez, no qual a
mudança de uma peça mexe com o equilíbrio das demais.
Aprovada no governo Castello Branco, a legislação trabalhista em vigor garantia
não apenas os direitos do trabalhador, mas um complexo e eficiente sistema de
arrecadação de tributos – através do desconto na folha -, e de financiamento da
infraestrutura – especialmente saneamento e habitação popular.
O pensamento monofásico-ideológico da equipe econômica, somado ao atraso
visceral do governo Temer, montou uma legislação para atender aos reclamos
imediatos dos empresários com os custos trabalhistas. Não cuidou de nenhuma
análise das consequências. Como resultado, coloca em xeque todo um complexo
sistema de arrecadação e financiamento, sem colocar nada no lugar.
Entenda os desdobramentos da legislação trabalhista.
Consequência 1 – aumento da instabilidade social
Marcelo Nery, especialista em políticas públicas da Fundação Getúlio Vargas
(FGV), estimou que a ampliação do emprego com carteira de trabalho foi mais
importante que o Bolsa Família na ascensão social da classe D.
De fato, a carteira de trabalho traz estabilidade ao trabalhador, abre espaço
para o crédito, insere-o nas redes de proteção social. E, na outra ponta,
aumenta a arrecadação pública.
A partir de agora, haverá enorme retrocesso promovido pela crise econômica
somada ao fim das restrições ao trabalho precário, visível na redução do salário
médio da economia e, à médio prazo, da massa salarial.
Consequência 2 – inviabilização da Previdência Social
A grande fonte de financiamento da Previdência são as contribuições descontadas
em folha, das empresas e dos empregadores.
Havia enormes distorções a serem corrigidas. Por exemplo, o sistema financeiro
tem menos encargos que, por exemplo, a indústria têxtil, intensiva em mão de
obra. Para reduzir os encargos sobre a folha, a alternativa pensada sempre foi a
substituição por contribuições sobre o faturamento.
A reforma na legislação trabalhista compromete radicalmente o financiamento da
Previdência pelo desconto em folha, só possível no emprego formal, sem ter
colocado nada no lugar.
Agora, se terá de um lado a redução gradativa do emprego formal reduzindo
drasticamente a arrecadação; de outro, o aumento de dificuldades para a obtenção
dos benefícios previdenciários, induzindo os mais jovens a buscarem outras
formas de garantia do futuro.
Alertamos na época que significaria a inviabilização final da Previdência
pública, com consequências drásticas. Os efeitos estão aparecendo muito mais
rapidamente do que o previsto.
Consequência 3 – inviabilização do orçamento público
Na definição das fontes de receita do orçamento público, bastava o gestor olhar
o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) para ter estimativas
precisas sobre o Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Com a pejotização e a
precarização do emprego, perderá a maior ferramenta de arrecadação existente. A
queda na arrecadação do INSS já está se manifestando, mesmo com a economia
saindo do buraco profundo em que se meteu.
Os impostos recolhidos na fonte – sobre folha salarial + Previdência –
correspondem a 45% da arrecadação fiscal brasileira, sem contar o FGTS, e tinham
na legislação trabalhista sua grande garantia de estabilidade. Está se jogando
fora uma peça fundamental do sistema de arrecadação.
A diminuição da arrecadação previdenciária, por outro lado, inviabiliza
completamente a maluquice do teto de gastos aprovado no ano passado. O próximo
presidente assumirá com um orçamento totalmente inviabilizado.
Consequência 4 – o comprometimento do financiamento do saneamento
Havia uma previsão de destinação de R$ 330 bilhões dos recursos do FGTS nos
próximos quatro anos, para programas de saneamento e habitação popular. Água
tratada é serviço autossuficiente, bancado pelas tarifas. Saneamento, tratamento
de esgoto, depende fundamentalmente de fontes públicas de financiamento. Com a
nova legislação trabalhista, o FGTS, esvazia-se a principal fonte de
financiamento do setor.

In
GGN
https://jornalggn.com.br/noticia/xadrez-do-desastre-da-nova-legislacao-trabalhista-por-luis-nassif

26/4/2018

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