quinta-feira, 30 de maio de 2019

Por uma agricultura patriótica, popular e (portanto) ecológica!



*por Guillaume Suing [*]

Nos países imperialistas do Norte, tal como nos países semicolonizados
do Sul, a questão "ecológica" é sempre mal colocada. Parte do ponto de
vista do consumidor sem nunca colocar a questão da luta de classes nas
relações de produção. É por essa razão que a ecologia, no plano
político, se tornou numa deformação da luta militante, muito oportuna
para a burguesia, que passa o tempo (e consagra uma parte do seu
capital) a desviar as acusações. Os maiores produtores de embalagens
plásticas, por exemplo, (a começar pela Coca Cola americana) são os
protagonistas de toda as campanhas de limpeza benevolente das praias e
de publicidades que criminalizam os consumidores "poluidores" a fim de
melhor se desculparem por terem abandonado o vidro, menos rentável. São
também os /lobbies / do leite em pó, alegadamente "bio", que fazem
campanha contra o aleitamento maternal – que é aconselhado pela OMS –
porque este seria suscetível de transmitir ao bebé os pesticidas
absorvidos pela mãe… Com efeito, é mais rentável para o patronato que as
mães voltem ao trabalho, graças a um desmame precoce, do que financiar
as licenças por maternidade durante um ano, a 100% do salário, como era
o caso na URSS.

A poluição dos solos, sobretudo através dos pesticidas, é no entanto uma
questão estratégica fundamental para todos os países em luta contra o
imperialismo, e não é sem razão que Cuba socialista, privada do apoio
soviético desde 1990, se tenha tornado líder mundial da agroecologia,
reconhecido pela ONU e por várias ONG, entre elas a World Wildlife Fund.
Reduzir a pegada ecológica (a pegada do homem sobre o seu ambiente) é a
primeira preocupação dos agricultores para garantir a segurança e a
soberania alimentar do seu povo, permitir a fertilidade, mais lenta é
certo a instalar-se, mas mais resistente e mais duradoura, graças à vida
do solo – vermes, cogumelos e bactérias que os produtos químicos da
agricultura intensiva matam.

Tal como a URSS que foi forçada, durante a II Guerra Mundial, a
fertilizar todas as superfícies exploráveis, incluindo nas cidades, com
métodos menos "químicos", Cuba encontrou-se numa situação semelhante nos
anos 90, sem a URSS e sob um bloqueio cada vez mais rígido. Este
"período especial em tempo de paz" foi uma crise histórica para a ilha
revolucionária, que só saiu dela impondo uma transição agroecológica
radical, cujos resultados foram para os produtores uma agradável
surpresa: a produtividade apanhara em poucos anos a anterior a 1990 e,
além disso, uma diversidade alimentar maior ao serviço duma soberania
alimentar mais segura, passando duma monocultura intensiva da
cana-de-açúcar para uma policultura agroecológica produtora de frutos e
legumes variados para o mercado interno.

Na URSS, tinham-se observado os mesmos resultados, o que, entre outras
coisas, convidou o governo a lançar de seguida um "grande plano de
transformação da natureza", em 1948. Foi o plano mais amplo de
policultura agroflorestal da História, um gigantesco repovoamento
florestal no sul do território, associado a uma forma extensiva de
"permacultura", sem pesticidas nem adubos químicos. A rotura da URSS com
a agroecologia só ocorrerá com Khrushchov, que alinhou pelo modelo
agroquímico americano, mais rentável a curto prazo e menos dispendioso
no plano do investimento estatal (formação de agrónomos, investigação em
biologia, elevação do nível social dos camponeses).

Nessa época, tal como hoje com Cuba, a agroecologia é uma questão de
relações de produção e não de consumidores: é porque o Estado possui a
terra e pode redistribuí-la de forma justa, e fixa os preços do mercado
interno, que os consumidores ficam satisfeitos com uma alimentação,
simultaneamente sã e barata.

Claro que, em Cuba, a agricultura está coletivizada, pois a revolução
socialista expulsou os proprietários (a maior deles agora sem hipótese
de prejudicar, em Miami). Os camponeses, na maior parte dos casos, estão
organizados em /kolkhozes, / coletivos de trabalhadores que, no seu
terreno, levam a efeito simultaneamente, várias atividades produtivas e
ligadas entre si. É um modelo radicalmente diferente do da Tunísia,
ainda maioritariamente feudal e sem grandes meios técnicos e científicos
para pôr em marcha uma produção variada, sã e duradoura. Há anos que
Cuba constata que a alimentação dos habitantes, baseada em sementes
locais, não modificadas pela agroindústria imperialista, produzida sem
pesticidas, melhora o seu nível de saúde, mas também produz muitos
outros serviços. Em especial, o facto de que, nos coletivos de trabalho,
mais técnico e intelectual, menos rude e menos manual, as mulheres
rurais ocupam um lugar cada vez mais importante, a par dos homens,
incluindo a tomada de decisões, o que contribui de forma indireta, mas
muito concreta, para a luta do povo contra o patriarcado. A
coletivização também permite que todas as crianças frequentem a escola e
que todos os trabalhadores, partilhando as tarefas por turnos, possam
ter férias regularmente.

No contexto tunisino, as lutas de vanguarda no campo estão, quase
sempre, ligadas aos recuos de uma falsa "reforma agrária" já antiga, mas
cujos vestígios continuam a sofrer a repressão económica, judiciária,
policial e mediática. Os trabalhadores das plantações de palmeiras de
Jemna, por exemplo, constituíram-se numa cooperativa, com a diferença de
não terem sido encorajados pelo Estado, como em Cuba, mas, pelo
contrário, pressionados por ele de todas as formas. Assim sendo, é
necessário um projeto de produção agroflorestal sem pesticidas para que
a produção venha a ser duradoura e segura, tal como a terra torna
possível. Mas são necessários meios para pôr em marcha esse projeto,
pois abandonar os pesticidas supõe conhecimentos agronómicos precisos e
máquinas especializadas na policultura, de modo a produzir pelo menos
tanto como anteriormente, a um custo menor (sem a compra de produtos
químicos). Segundo a palavra de um camarada do PPDS, na Tunísia e, sem
dúvida, em todos os países semifeudais, semicolonizados, é necessária
uma "reforma agrária duradoura", para a qual o modelo cubano, graças à
ajuda internacionalista da ANAP <https://www.ecured.cu/ANAP> , o
sindicato cubano dos pequenos agricultores, poderia ser de grande ajuda.
É, sobretudo, deste tipo de ajuda que o povo tunisino precisa, e não da
"ajuda" criminosa da União Europeia (a ALECA
<https://fr.wikipedia.org/wiki/Accord_de_libre-%C3%A9change_complet_et_approfondi>
que será imposta por Bruxelas, por Paris, com a cumplicidade da
burguesia tunisina) que pretendem fazer do país um vassalo submisso
obrigado a produzir apenas para a exportação para a Europa e dependente
cada vez mais do imperialismo no plano alimentar.

*[*] Professor agregado de Ciências da Vida e da Terra. Autor de
/Evolution: La preuve par Marx/
<http://www.librairie-renaissance.fr/9782915854930-evolution-la-preuve-par-marx-depasser-la-legende-noire-de-lyssenko-suing-guillaume/>
(2016) e de /L'Ecologie réelle, une expérience soviétique et cubaine/
<http://www.librairie-renaissance.fr/9782376071341-l-ecologie-reelle-une-histoire-sovietique-et-cubaine-suing-guillaume/>
(2018)

O original encontra-se no jornal tunisino /Al Oufouk / e em
germinallejournal.jimdo.com/...
<https://germinallejournal.jimdo.com/2018/10/06/pour-une-agriculture-patriotique-populaire-et-donc-%C3%A9cologique/>
Tradução de Margarida Ferreira. *


In
RESISTIR.INFO
https://www.resistir.info/ambiente/agroecologia_06out18_p.html
6/10/2018
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