sábado, 20 de maio de 2017

As opções abertas em meio à crise brasileira


por Roberto Bitencourt da Silva

O cenário nacional está totalmente imprevisível, contando com possibilidades e
alternativas as mais diferentes para responder aos dilemas presentes.
Evidentemente, o jogo articulado por cima prevalece no horizonte.
Mas, não enclausura as possibilidades de tentativas radicalmente diferentes de
equacionar a crise política, econômica e moral que assola o País. Muito
esquematicamente, considerando que, mais dia menos dia Temer seja carta fora do
baralho, abaixo menciono algumas possibilidades advogadas e hipóteses ventiladas
por distintos setores da sociedade.
1. Por cima, da ótica dos poderosos estratos burgueses e oligárquicos
(sobretudo, bancos, conglomerados de mídia, multinacionais, latifundiários,
rentistas, partidos conservadores):
A) Eleição indireta, a base de uma indicação do nome do presidente da República
pelo Congresso vigente. Nome possivelmente sem vínculos com o sistema
partidário-eleitoral, em franca erosão de credibilidade. Longe de ser
"apolitico", mas dotado da projeção de alguma imagem pretensamente técnica em
seu campo de atuação: finanças, direito. Via imediatamente segura para aprovar
as contrarreformas desfavoráveis ao País e ao Povo. Todavia, persistiriam os
"riscos" de instabilidade social, econômica e política. Alternativa que peca por
precaríssima legitimidade.
B) Eleição presidencial direta. Visaria proporcionar credibilidade e investir o
laureado de uma imagem democrática, sob o influxo e a base da pauta dos
conglomerados de mídia e do Congresso em vigor, dando maior força às
contrarreformas trabalhistas e previdenciárias. O calcanhar de Aquiles é o
imponderável de uma consagração de personagem refratário, em parte ou na
íntegra, à agenda reacionária e colonizante. A instabilidade, para o poder,
permaneceria.
​C) Junto com a eleição direta para presidente, promoção de uma assembleia
constituinte. Apoiando-se na cantilena diuturnamente preconizada pela mídia
massiva, daria eventualmente legitimidade ao novo governo e, particularmente, às
contrarreformas asseguradas em nova Constituição, que perderia, ou teria
significativa redução dos parcos direitos sociais garantidos na Constituição de
88. Hipótese que poderia fechar por muito tempo o sistema político, assentado em
grande credibilidade reacionária. Porém, o "risco" óbvio é de incidência das
pautas populares e de maior número de representantes progressistas, a partir de
grandes e emergentes mobilizações cívicas e sindicais, na Constituinte.
2. Por baixo, da ótica da organização dos setores progressistas (parcelas da
pequena burguesia, das classes trabalhadoras humildes, medianas e altas, do
estudantado, de partidos políticos e demais organismos coletivos no quadrante à
esquerda):
D) Eleição direta para presidente, apoiando-se na realização de grandes
movimentos cívicos nas ruas (pós expediente de trabalho), escanteando ou
secundarizando a promoção de greves gerais. Partes expressivas das hostes
petistas já dão sinais nesse sentido, apostando em um retorno de Lula, novamente
consagrado nas urnas. Entre outras limitações não aventadas, o potencial
bloqueio parlamentar a qualquer ação do ex-presidente reconduzido. O
esvaziamento da notória habilidade conciliatória do líder petista, em uma
conjuntura em que a conciliação dos de cima com os de baixo desmoronou. A guerra
de classes travada pelas burguesias doméstica e gringa contra o Povo Trabalhador
é aguda e não demonstra sinal de recuo.
E) A anulação do impeachment da presidente Dilma Rousseff, com a sua recondução
ao cargo. Se possui lógica do ângulo potencialmente juridico e simbólico, a
limitação que se pode identificar nessa alternativa é a mesma revelada no item
anterior, só que com acento bem maior. Em que pese o óbvio processo de natureza
golpista que afastou a presidente Dilma, a solução a ser alcançada na atual e
imprevisível conjuntura é eminentemente política. Diz respeito à correlação de
forças. Abandonando a sua tímida agenda apresentada na eleição e buscando
atender, em boa medida, bandeiras provenientes das hostes entreguistas e
privatistas do PSDB e do DEM, a presidente perdeu absoluta popularidade, não
tendo qualquer força para mobilizar dilatadas camadas dos estratos médios e
populares contra o golpe. Hoje, menor força ainda teria. Abdicou, inclusive, de
uma denúncia e interpelação popular via cadeia nacional de rádio e TV, para o
esclarecimento do público sobre o que estava em jogo.
F) Eleições gerais para o Congresso e a Presidência, sob a base de ampla
mobilização contra a agenda ultraconservadora, também contra a ilegitmidade de
grossa parte dos mandatos parlamentares, talhados no financiamento velado ou
aberto de campanhas por grandes empresarias. Hipótese que seria especialmente
apoiada em iniciativas cívicas e sindicais articuladas. As paralisações e greves
dos trabalhadores consistiriam em formas de repercutir com vigor o ponto de
vista dos de baixo, para interferir no jogo político institucional. Não oferece
garantia alguma - para as camadas populares e médias, diga-se, ela não existe -,
mas pode ao menos atenuar o furor privatista, lesa pátria e reacionário do
condomínio do poder. Este tem como maior preocupação as restrições à circulação
e à reprodução do dinheiro e dos lucros empresariais. Só a greve geral, e por
tempo indeterminado, tem a capacidade de oferecer essa restrição, guardando
força de incidência no debate político.
Para não ficar na mera observação e descrição, o autor dessas linhas se
posiciona: o ideal seria um grande movimento cívico-militar, norteado por
propósitos anti-imperialistas, nacionalistas, distributivistas e socializantes,
de sorte a responder com vigor as sérias ameaças de neocolonização do Brasil.
Uma agenda de combate e ruptura com a dependência externa, o neocolonialismo
galopante e o subdesenvolvimento atroz.
Recentemente, a experiência mais conhecida é a do bolivarianismo chavista na
Venezuela. Contudo, a história brasileira também já ensaiou relevante fenômeno
dessa natureza, entre as décadas de 1950-60, envolvendo trabalhistas,
comunistas, socialistas, getulistas e frações católicas nos meios políticos,
estudantis, sindicais, camponeses, populares, pequeno-burgueses, intelectuais e
militares. Naufragou com o golpe civil-militar dos de cima, em 1964. Mas teve
bastante expressão.
O jogo golpista, reacionário e entreguista é articulado dentro e fora do País,
com graves riscos à preservação de um fiapo ao menos de soberania nacional e
popular.
Contudo, para atender àquele ideal precisaríamos de amplas frações das Forças
Armadas dotadas da visão patriótica e democrática do general da reserva do
Exército, sr. Bolívar Marinho Meirelles. Estamos longe de poder contar com isso.
O fundamental é a organização e a mobilização populares, nessa quadra altamente
perigosa e crítica, em que a alienação do patrimônio e da soberania nacional,
assim como a potencial escravização do Povo brasileiro, são riscos salientes.
A greve geral é o maior instrumento e que antecede a qualquer reflexão e
alternativa sobre a atuação nas mudanças políticas em curso, do ângulo
popular-democrático das esquerdas e do mundo do trabalho. Recurso mais
importante à disposição do Povo para interferir, como sujeito político com
escolha e capacidade de ação, nos rumos da Nação.
Roberto Bitencourt da Silva - historiador e cientista político.
In
JORNAL GGN
http://jornalggn.com.br/blog/roberto-bitencourt-da-silva/as-opcoes-abertas-em-meio-a-crise-brasileira-por-roberto-bitencourt-da-silva
20/5/2017

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