domingo, 13 de maio de 2018

O “Golpe de Mestre” dos Estados Unidos contra a Venezuela (Documento do Comando Sul)


Stella Calloni

As negociações em torno da península de Coreia e a retirada norte-americana do
acordo sobre o programa nuclear iraniano (JCPOA ou Acordo dos 5+1) não devem
interpretar-se como um reposicionamento das Forças Armadas dos Estados Unidos.
Sem importar que Administração esteja no Poder em Washington, o Pentágono segue
em frente com o seu plano de domínio à escala mundial. Stella Calloni revela que
o SouthCom (o tristemente célebre “Comando Sul”) tem planificada uma operação
militar contra a Venezuela, antes da eleição presidencial de 20 de Maio.
Baseando-se num documento interno do Pentágono, Stella Calloni põe a nu a
implicação da Argentina, Colômbia, Brasil, Guiana e Panamá nesse projecto de
derrube de um Poder democrático, nascido do voto popular. É um plano de
destruição de toda uma sociedade. As Forças Armadas dos Estados Unidos estão de
volta contra os povos na América Latina.
urt W. Tidd, Comandante-em-chefe do Comando Sul norte-americano
  (SouthCom)
Os Estados Unidos e seus sócios preparam em silencio um brutal «Plano para
acabar com a ditadura da Venezuela»: o «Golpe de Mestre» («Masterstroke») [1],
que já está em marcha e cuja primeira parte começaria antes das próximas
eleições venezuelanas e que, se não tiverem êxito em derrubar o Presidente
Nicolás Maduro com a nova ofensiva, que utilizará todo o aparelho
propagandístico e mediático mais acções violentas em «defesa da democracia»,
acionarão o Plano B, o qual incluirá vários países impondo uma «força
multilateral» para intervir militarmente.
Panamá, Colômbia, Brasil, Guiana são pontos-chave da operação militar, com o
apoio da Argentina e de «outros amigos», sob controle do Pentágono. Já têm
preparadas nas bases que ocuparão, nos países de apoio directo (fronteiriços),
até hospitais e centros de provisão de víveres para os seus soldados.
Tudo isso aparece especificado num documento real, de 11 páginas, que leva a
assinatura do Almirante Kurt Walter Tidd, actual Comandante-em-chefe do Comando
Sul [SouthCom] norte-americano, documento ainda não divulgado.
O documento analisa a situação actual ratificando a guerra que se trava contra a
Venezuela, mas também o preverso esquema de guerra psicológica que permite
entender a perseguição, o assédio, o descrédito, a mentira criminosa que se
utilizam para acabar não só com as líderanças populares mas também contra os
povos da região.
Ao referir-se à situação actual na Venezuela, o Plano menciona que titubeia a
«ditadura venezuelana chavista como resultado dos seus problemas internos, da
grande escassez de alimentos, do esgotamento das fontes de dinheiro externo e de
uma corrupção desenfreada, que diminuiu o apoio internacional, ganho com
petrodólares, e que o valor da moeda nacional dura pouco tempo e o poder
aquisitivo da moeda nacional está em queda constante».
Assumem que este cenário, que admitem ter criado eles próprios, com uma
impunidade que aterra, não mudará. Assim, justificam as suas acções afirmando
que o governo venezuelano recorrerá a novas medidas «populistas» para conservar
o Poder.
Assombra o lugar em que colocam a oposição que os próprios Estados Unidos
manejam, aconselham e pagam, ao assumir que «o corrupto regime de Maduro
colapsará, mas lamentavelmente as forças opositoras, defensoras da democracia e
do bem-estar do seu povo, não têm poder suficiente para pôr fim ao pesadelo da
Venezuela» por disputas internas e até por «corrupção semelhante à dos seus
rivais, bem como a escassez de raízes» que não lhes permite tirar «o máximo
proveito desta situação e dar o passo necessário para ultrapassar o estado de
penúria e a situação precária em que o grupo de pressão que exerce a ditadura de
esquerda submergiu o país».
O que é aterrador é que embora considerem que se está perante «uma ação
criminosa sem precedentes na América Latina», referindo-se ao governo da
Venezuela —um governo que nunca actuou contra nenhum dos seus vizinhos e que tem
sido de uma forte solidariedade regional e mundial—, o Plano norte-americano
sustenta que a «democracia avança na América, continente no qual o populismo
radical estava destinado a tomar o controle». Argentina, Equador e Brasil são
exemplos disso. «Este renascimento da democracia (como a chamam) é apoiado pelas
mais valiosas determinações e as condições da região estão a seu favor. Este é o
momento para que os Estados Unidos provem, com acções concretas, que estão
empenhados nesse processo, no qual o derrube da ditadura venezuelana seguramente
representará um ponto de inflexão continental».
Por outro lado, eles encorajam o Presidente dos EUA, Donald Trump, a agir
considerando que «esta é a primeira oportunidade da Administração Trump para
demonstrar e levar avante a sua visão de democracia e segurança» e convencê-lo
de que «a sua participação activa é crucial, não apenas para a Administração,
mas, também para o continente e o mundo. Chegou o momento».
Isso significa «intensificar o derrube definitivo do chavismo e a expulsão do
seu representante, minar o apoio popular» ao governo e

«Incentivar a insatisfação popular, aumentando o processo de desestabilização e
de falta de abastecimento» [para] «garantir a deterioração irreversível do seu
actual ditador».
Se alguém quiser entender a fundo a arte da perversão contra-insurgente basta
ler a parte em que o documento se refere ao Presidente da Venezuela, Nicolás
Maduro, encorajando a «assediá-lo, ridicularizá-lo e mostrá-lo como um símbolo
de torpeza e incompetência, expô-lo como uma marionete de Cuba».
Mas também sugerem :

«Exacerbar a divisão entre os membros do grupo do governo, revelando as
diferenças das suas condições de vida e dos seus seguidores e, ao mesmo tempo,
incitando-os a manter essas divergências em crescendo».
O plano está destinado a ser executado rápida e furiosamente, tal como as
medidas tomadas pelos mordomos de Washington, Mauricio Macri (Argentina) e
Michel Temer (Brasil), ambos com uma história escandalosa de corrupção, mas
transformados pelo Império em «líderes da transparência» que tomaram medidas, em
horas, para a destruição dos Estados nacionais com tanta certeza como a do
disparo de um míssil.
O documento assinado pelo Chefe do Comando Sul norte-americanos demanda tornar o
governo de Maduro insustentável, forçando-o a claudicar, negociar ou escapar.
Este Plano para acabar em curtíssimo prazo com a chamada «ditadura» da
Venezuela, apela a:

«Incrementar a instabilidade interna para níveis críticos, intensificando a
descapitalização do país, a fuga de capitais estrangeiros e a deterioração da
moeda nacional, mediante a aplicação de novas medidas inflacionárias que
incrementem essa deterioração».
Outro objectivo é

«obstruir todas as importações e ao mesmo tempo desmotivar os possíveis
investidores estrangeiros»
para –e vejam a bondade do Império–

«contribuir para tornar mais crítica a situação da população».
Também abarca o Plano nas suas 11 páginas

«apelar a aliados domésticos, assim como a outras pessoas inseridas no cenário
nacional, com o objectivo de gerar protestos, distúrbios e insegurança,
pilhagem, saques, roubos, assaltos e sequestros de navios e de outros meios de
transporte, com a intenção de cortar o abastecimento do país, através de todas
as fronteiras e de outras maneiras possíveis, pondo em perigo a segurança
nacional dos seus vizinhos».
Consideram importante «causar vítimas» e apontar como responsável o governo da
Venezuela «ampliando, perante o mundo, a crise humanitária a que está submetido
o país», usando a mentira de uma corrupção generalizada dos governantes e «ligar
o governo ao narcotráfico para desacreditar a sua imagem perante o mundo e os
seus seguidores internos», além de promover «o cansaço entre os membros do PSUV»
[Partido Socialista Unificado da Venezuela] «incitando a discórdia entre eles
próprios, para que rompam ruidosamente as relações com o governo e para que
rechacem as medidas e restrições que também os afectam» e torná-los «tão débeis
quanto a oposição, criando fricções entre o PSUV e Somos Venezuela».
A proposta vai aumentando de tom como quando apela a

«estruturar um plano para lograr a deserção dos profissionais mais qualificados
do país, para o deixá-los totalmente sem profissionais, o que agravará ainda
mais a situação interna e neste sentido culpar o governo».
A mão militar
Como numa série policial, este Plano apela para «utilizar os oficiais do
exército como uma alternativa de solução definitiva» e

«continuar endurecendo a situação dentro das Forças Armadas para levar a cabo um
Golpe de Estado, antes que finalize 2018, se esta crise não levar a que a
ditadura colapse, ou se o ditador não se decide afastar-se».
Supondo que todo o exposto pode falhar, e com evidente desprezo pela oposição
venezuelana, o Plano apela a «continuar o fogo contínuo na fronteira com a
Colômbia, multiplicar o tráfico de combustível e outros bens, o movimento dos
paramilitares, incursões armadas e tráfico de drogas, provocando incidentes
armados com as forças de Segurança da Fronteira» venezuelana e além disso a

«recrutar paramilitares principalmente dos campos de refugiados em Cúcuta, La
Guajira e Norte de Santander, áreas sobretudo habitadas por cidadãos colombianos
que emigraram para a Venezuela e que agora retornaram, fugindo do regime que
intensificou a desestabilização das fronteiras entre os dois países, usando o
espaço vazio deixado pelas FARC [Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia], a
beligerância do ELN [Exército de Libertação Nacional (Colômbia)] e as
actividades na área do Cartel do Golfo (paramilitares)».
Aqui vem a estruturação do golpe final quando se planeia

«preparar o envolvimento de forças aliadas, em apoio aos oficiais do exército
venezuelano, ou para controlar a crise interna no caso em que se demore muito a
iniciativa (…) estabelecer um cronograma rápido que previna que o ditador
continue ganhando o controle no cenário interno. Se necessário fôr, actuar antes
das eleições estipuladas para o próximo mês de Abril».
Na realidade, essas eleições serão a 20 de Maio e desde já os Estados Unidos, e
os seus comparsas, fizeram saber que não as reconhecem.
O cerne da questão é

«Obter o apoio e cooperação das autoridades aliadas de países amigos (Brasil,
Argentina, Colômbia, Panamá e Guiana). Organizar as provisões das tropas, apoio
logístico e médico desde o Panamá. Fazer bom uso das instalações de vigilância
eletrônica e de sinais inteligentes; de hospitais e instalações existentes em
Darién (selva panamenha), do equipamento de drones do Plano Colômbia, bem como
dos terrenos das antigas bases militares de Howard e Albroock (Panamá), bem como
as pertencentes ao Rio Hato. Além disso do Centro Regional Humanitário das
Nações Unidas, projectado para situações de catástrofe e emergência
humanitárias, que conta com uma pista de aviação (aterrissagem-br) e armazéns
próprios».
Como vemos, já se trata de um cenário de intervenção onde se propõe

«Avançar no estacionamento de aviões de combate e helicópteros, veículos
blindados, posições de inteligência e unidades militares de logística especiais
(polícia, oficiais militares e prisões) (...)

«Desenvolver a operação militar sob bandeira internacional, patrocinada pela
Conferência dos Exércitos Latino-Americanos, sob a protecção da OEA e a
supervisão, no contexto jurídico e mediático, do Secretário-Geral [da OEA] Luis
Almagro».

«Declarar a necessidade de o Comando Continental fortalecer a acção, usando o
instrumento do Capítulo Democrático Inter-americano, com o objectivo de evitar a
ruptura democrática».
E ainda mais

«Unindo o Brasil, Argentina, Colômbia e Panamá afim de contribuir para o número
apropriado de tropas, fazer uso da sua proximidade geográfica e experiência em
operações em regiões de floresta ou de selva. Fortalecendo o seu status
internacional com a presença de unidades de combate dos Estados Unidos e das
nações mencionadas; sob o comando geral do Estado-Maior Conjunto liderado pelos
Estados Unidos».
Assombra a impunidade com que tudo se está preparando nas costas dos povos, em
absoluta ilegalidade. E, isto torna compreensíveis as recentes manobras
militares dos Estados Unidos nesta região na fronteira do Brasil com a Venezuela
(Brasil, Peru, Colômbia), no Atlântico Sul (Estados Unidos, Chile, Grã-Bretanha,
Argentina), no caso argentino sem autorização do Congresso Nacional, de Outubro
a Novembro passado.

«Usando as instalações do território panamenho (panamense-br) para retaguarda e
as capacidades da Argentina pela segurança dos seus portos e posições marítimas
(...)
 Propor ao Brasil e à Guiana fazer uso da situação migratória, a qual
pretendemos incentivar na fronteira com a Guiana.
 Coordenar o apoio à Colômbia, Brasil, Guiana, Aruba, Curaçao, Trinidad e Tobago
e outros Estados frente ao fluxo de migrantes venezuelanos devido aos eventos da
crise».
Mas além disso, prevê-se

«Promover a participação internacional neste esforço como parte da Operação
Multilateral com contribuição de Estados, de organizações não estatais, e
organismos internacionais, e fornecer logística adequada, inteligência, apoios,
antecipando especialmente os pontos mais valiosos em Aruba, Puerto Carreño,
Inirida, Maicao, Barranquilla e Sincelejo na Colômbia, e Roraima, Manaus e
Boavista no Brasil».
Incrível mapa de uma guerra de intervenção anunciada.
Informação estratégica
É assombroso o plano para silenciar «o simbolismo da presença da
representatividade de Chávez e o apoio popular» e manter o assédio «ao ditador
como único responsável da crise em que ele mergulhou a nação», e os seus mais
próximos seguidores, a quem se acusará da crise e da impossibilidade de sair da
mesma.
Noutro parágrafo apela-se a

«intensificar o descontentamento contra o regime de Maduro (...) assinalar a
incompetência dos mecanismos de integração criados pelos regimes de Cuba e da
Venezuela, especialmente a ALBA (Aliança Bolivariana dos Povos da Nossa América)
e a Petrocaribe».
Quanto ao tema mediático, o plano desenhado pelos Estados Unidos apela a
incrementar dentro do país, através dos meios de comunicação locais e
estrangeiros, a disseminação de mensagens desenhadas e baseadas em depoimentos e
publicações originadas no próprio país, fazendo uso de todas as capacidades
possíveis, incluindo as redes sociais, e, por outro lado, «apelar através dos
meios de comunicação para a necessidade de pôr fim a essa situação porque é, em
essência, insustentável».
Num dos últimos parágrafos do documento, trata-se de «assegurar» ou mostrar o
uso de meios violentos por parte da «ditadura» para obter apoio internacional,
utilizando

«todas as capacidades de Guerra Psicológica do Exército dos Estados Unidos».
Por outras palavras, repetindo os mesmos cenários de mentiras, armados de
notícias, fotografias e vídeos falsos, e tudo o que já foi usado nas guerras
coloniais do século XXI.
O documento também assinala igualmente que «os Estados Unidos deverão apoiar
internamente os Estados americanos que o apoiam», elevar a imagem destes e da
«ordem multilateral de instituições do sistema inter-americano, como
instrumentos para a solução dos problemas regionais. Promover a necessidade do
envio da Força Militar da ONU para imposição da paz, uma vez que a ditadura
corrupta de Nicolás Maduro seja derrubada».
Stella Calloni
Tradução
Alva


In
VOLTAIRE.NET
http://www.voltairenet.org/article201130.html
13/5/2018

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