sábado, 12 de maio de 2018

Tereza Cruvinel: documento da CIA vem em boa hora




"Em boa hora vem este documento com sua verdade, quando pesquisas mostram a
perda de apreço pela democracia e o flerte com soluções autoritárias", escreve a
colunista Tereza Cruvinel, sobre o documento que revela que os generais Ernesto
Geisel e João Batista Figueiredo autorizaram assassinatos durante a ditad

Por Tereza Cruvinel, no Jornal do Brasil – Quem viveu a ditadura sempre esperou
pela confirmação desta verdade, a de que a cúpula do regime, inclusive os
generais-presidente, conheciam e autorizavam os crimes hediondos cometidos pelo
aparato repressivo.

Ela vem neste documento secreto do Departamento de Estado dos EUA, revelado pelo
jornalista e pesquisador Matias Spektor, e explica muitos aspectos da transição
brasileira, inclusive o fato de a anistia aprovada em 1979 ter sido recíproca,
vale dizer, ter vedado a punição dos responsáveis por torturas, desaparecimentos
e assassinatos.
Do contrário, não só torturadores, mas também ex-presidentes poderiam ser presos
e punidos, como aconteceu na Argentina com o sanguinário Videla.
O documento que Spektor chamou de "perturbador" ilumina a História mas deve
servir também ao nosso presente tumultuado, em que jovens nascidos na democracia
pedem a volta dos militares por não saberem o que foi a ditadura.
Em que uma extrema-direita sai do armário espalhando ódio e praticando
violências, toleradas e naturalizadas como consequência da polarização política,
como se viessem de dois polos, e não apenas do extremo intolerante.
Falo dos tiros contra a caravana de Lula e contra seus apoiadores acampados em
Curitiba, onde um delegado federal histérico também destruiu estes dias o
equipamento de som.
Há um assanhamento político perigoso nos quartéis, um general pretende disputar
a presidência e mais de 60 serão candidatos a cargos legislativos. Observando as
regras democráticas, eles podem participar do processo político, mas não
pregando golpes.
O problemas do Brasil são muitos e não são fáceis, mas se não forem resolvidos
na democracia, na ditadura é que não serão.
O documento revela que o ex-presidente Geisel, logo depois de empossado, foi
informado sobre a "política" de execuções que já havia eliminado 104
"subversivos e terroristas".
Depois de uma reflexão ele comunicou a seus generais que ela deveria prosseguir
mas que "grandes precauções deveriam ser tomadas para assegurar que apenas
subversivos perigosos fossem executados".
O CIE (órgão repressivo do Exército) informaria de cada prisão o chefe do SNI,
general Figueiredo, que autorizaria a execução. Este relato faz esfarelar certa
historiografia que tenta redimir Geisel, apresentando-o como artífice de uma
abertura que tinha como meta a democratização.
"O objetivo da abertura de Geisel era a sobrevivência do regime, não a
democracia. Em seu governo o regime continuou matando, e já não havia luta
armada nem "subversivos perigosos", diz o ex-deputado Nilmário Miranda,
ex-membro da Comissão de Anistia e secretário de Direitos Humanos no governo
Lula.
Em seu governo, 11 membros do Comitê Central e outros tantos militantes do PCB
foram executados, e o "partidão" não havia pegado em armas.
Apostava na luta institucional, atuando dentro do MDB. O PCB precisava ser
contido para não se tornar um partido forte e influente na abertura. Entre os
assassinados, David Capistrano e Walter Ribeiro, esquartejados na Casa da Morte,
em Petrópolis.
Por fim, morreram sob tortura o jornalista Vladimir Herzog e o operário Manuel
Fiel Filho.
Sob Geisel aconteceu também, em 1976, a Chacina da Lapa, na qual foram
executados os dirigentes do PC do B Pedro Pomar e Ângelo Arroyo, quatro anos
depois do extermínio dos guerrilheiros do Araguaia.
Outros militantes foram presos no local e levados ao porão de tortura, onde um
deles, João Batista Drummond, não resistiu e morreu.
Geisel seguiu com a abertura, garantindo sobrevida ao regime que matava.
Seu sucessor Figueiredo impôs, em 1979, uma anistia restrita e recíproca. O
projeto da oposição foi derrotado por oito votos.
Em 2010, julgando ação da OAB pela revisão da lei, que permitiria o julgamento
de torturadores e assassinos, o STF disse não.
Em boa hora vem este documento com sua verdade, quando pesquisas mostram a perda
de apreço pela democracia e o flerte com soluções autoritárias.


In
BRASIL247
https://www.brasil247.com/pt/247/brasil/354591/Tereza-Cruvinel-documento-da-CIA-vem-em-boa-hora.htm
12/5/2018

Nenhum comentário:

Postar um comentário