sábado, 12 de setembro de 2015

«Syriza nº 2» e a nova tentativa de enganar o povo



KKE


«Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio» dizia o antigo filósofo Heráclito,
mas alguns gregos da época actual parecem ignorar essa afirmação. Trata-se das
forças políticas que recentemente se separaram de SYRIZA e declararam a criação
de um novo partido, da «Unidade Popular» (LAEN). O Secretário-Geral do Comité
Central do KKE, Dimitris Kutsumbas, referiu-se a esse acontecimento e sublinhou
que «não se deve aceitar outra vez a mesma manobra contra o povo. Além do mais,
normalmente as continuações são piores do que o primeiro filme».

O sistema usou a sua «reserva de esquerda»

Para entender este último acontecimento político na Grécia vale a pena mencionar
alguns dados sobre a história de SYRIZA. SYRIZA constituiu-se como uma
unificação de diversos grupos oportunistas, com SYNASPISMOS (SYN) como núcleo
fundamental, ou seja as forças que se afastaram do KKE na década de noventa,
influenciadas pelas ideias de Gorbatchov, depois de terem, sem êxito, tratado de
social-democratizar e autodissolver organizativamente o KKE. A essas forças
tinham-se juntado anteriormente, em 1968, aqueles que tinham saído do KKE sob a
influência da corrente oportunista eurocomunista.

O programa de SYN foi sempre um programa de gestão social-democrata, através de
reformas.

Desde os inícios da década de 2000 e mais tarde, sobretudo através da
incorporação de diferentes grupos (trotskistas, maoistas, etc.) e da evolução
posterior de SYN a SYRIZA, este programa social-democrata vestiu-se
primorosamente com uma aparência «radical», «anti-sistema», «de movimento».
Algo que se reforçou depois de 2010, na sequência da eclosão da crise económica
capitalista. A assinatura dos acordos antipopulares (memorandos) dos governos de
PASOK e ND com os organismos imperialistas (UE, FMI, BCE), acompanhados de duras
medidas antipopulares, trouxe também a adopção da turva linha «anti memorando»
por parte de SYRIZA. Ao mesmo tempo, a rápida desagregação do social-democrata
PASOK levou à absorção de vários quadros desse partido por parte de SYRIZA. O
falso dilema «memorando-antimemorando» deu a SYRIZA a possibilidade de usar
tendenciosamente ideias, de enganar as forças populares, prometendo que pode
haver um alívio para o povo das duras medidas anti-operárias dentro do quadro da
UE, do caminho de desenvolvimento capitalista, promovendo a reivindicação de
reduzir parte da dívida pública, ou seja na realidade aceitando que a dívida,
que os governos da plutocracia criaram, deve pagá-la o povo.

No quadro da reforma do cenário político dentro do ano de 2012, SYRIZA foi
apoiado por uma parte da burguesia e cresceu eleitoralmente, conseguindo ganhar
as eleições de Janeiro de 2015. Formou governo com outro partido, ANEL, cujo
tronco provém do partido conservador ND e que tem referencias nacionalistas.

Após seis meses de governo de SYRIZA-ANEL, o povo grego viu-se perante um 3º
memorando, que inclui novas medidas anti operárias-anti populares.

A linguagem «de esquerda» ao serviço do capital

Se algo ficou comprovado da forma mais flagrante através dos acontecimentos dos
últimos meses no que se refere a SYRIZA e seu governo burguês, é a bancarrota
total da política que apregoa que pode servir ao mesmo tempo tanto os monopólios
como o povo. Que se pode, com um governo burguês, dentro da União Europeia e das
alianças imperialistas, nas condições da barbárie capitalista, servir os
interesses populares. Com a assinatura do co-governo de SYRIZA-ANEL, que se
mostraram dignos continuadores do co-governo ND-PASOK, foi adoptado, com o voto
dos demais partidos burgueses (ND, PASOK, EL RIO) o novo massacre do povo grego,
das famílias operárias e populares.

Entre as medidas deste 3º memorando já insuportável, incluem-se novos dramáticos
cortes de salários e pensões, degradação das relações laborais, nova política
fiscal abusiva, redução dos serviços de saúde, educação, assistência social,
privatizações, bem como o golpe de misericórdia contra os camponeses pobres e os
pequenos profissionais. E tudo isso enquanto são mantidos os memorandos
anteriores e as 400 leis antipopulares da sua aplicação.
Face a esse desnudamento em poucos meses e à bancarrota da social-democracia
novata - que o KKE havia previsto com exactidão e disso tinha advertido o povo -
é óbvia a necessidade do sistema político burguês de criar novos muros de
contenção à radicalização do povo.

É assim que o filme que se apresentou de 2012 a 2014 com SYRIZA como
protagonista, se repete agora na Grécia com a recém-construída «Unidade Popular»
de P. Lafazanis, até há pouco ministro da Energia do governo de SYRIZA-ANEL. O
grupo parlamentar com este nome, que surgiu 6ª feira, 21 de Agosto, depois da
independentização de 25 deputados de SYRIZA, aspira a que constitua o indicio de
uma nova formação política, de um muro de contenção para aqueles esquerdistas,
radicais, lutadores que nos anos anteriores tinham ilusões por/sobre SYRIZA, o
seu governo, e a possibilidade de abrir uma nova perspectiva a favor do povo no
país. LAEN projecta-se como uma alternativa de retorno à moeda nacional e faz
uma evidente reprodução de posições e propostas neokeynesianas, com as quais
SYRIZA cultivou nos últimos anos ilusões sobre uma gestão do capitalismo
pró-popular e de esquerda.

De primeira categoria a enganar

Esta divisão de SYRIZA efectuou-se por parte forças que tinham cargos de
primeiro plano como ministros do governo SYRIZA-ANEL, que materializaram com
rigor tudo aquilo que previam os dois primeiros memorandos e que aceitaram sem
protesto todas as decisões que preparavam o muito duro 3º memorando.

Essas forças, que já estavam no SYRIZA como sua «plataforma de esquerda»,
aceitaram o acordo de 20 de Fevereiro do governo com a UE, o BCE e o FMI, que
previa a materialização de todas las medidas antioperárias dos dois primeiros
memorandos e a aceitação de todas as reivindicações do grande capital.
Aceitaram todo esse tempo também as propostas do governo à troika sobre um novo
memorando de insuportáveis medidas antioperárias. É típico que não tenham feito
cair o governo SYRIZA-ANEL antes da adopção do cruel memorando e continuaram
assegurando de todas as maneiras que apoiam o governo apesar de estarem em
desacordo… até que o próprio primeiro-ministro Tsipras declarou a demissão do
seu governo…

Estas forças nada disseram quando o governo SYRIZA-ANEL prometeu aos Estados
Unidos e à NATO uma nova base militar no mar Egeu, e o mesmo quando o seu
governo organizava manobras militares em comum com os Estados Unidos e Israel,
ou quando votava pela continuação das sanções da UE contra a Rússia, ou quando o
ministro da Defesa declarava que o país vai participar em todas as actividades
imperialistas da NATO e da UE.

Agora apresentam-se como «donzelas enganadas» e como os verdadeiros
representantes do «radicalismo» de SYRIZA e apresentam-se sozinhos às eleições
de 20 de Setembro.

Uma Grécia capitalista com moeda nacional

Mas, ¿o que é que propõe esta força política? Se o SYRIZA prometia até agora que
o país ia manter-se na zona do euro, LAEN fala de uma «saída ordenada do euro,
se necessário». Contudo, de nenhuma forma coloca o tema da saída do país da UE e
do caminho de desenvolvimento capitalista. ¿Porque fala LAEN de uma «saída do
euro se necessário»? Como explicou o chefe de LAEN P. Lafazanis, piscando o olho
ao capital, esta saída vai dar-se apenas se a economia capitalista o necessitar
para conseguir a sua recuperação. Para além disso, LAEN «recicla» um monte de
medidas conhecidas de gestão neokeynesiana, p.ex. a «socialização dos bancos
para que desempenhem um papel de desenvolvimento», defendendo assim a posição de
que os bancos podem converter-se em «fundações caritativas» que vão repartir
dinheiro estatal para desse modo apoiar a famosa recuperação capitalista. Dessa
forma semeia ilusões entre o povo, ocultando as leis sobre as quais se move a
economia capitalista que requer continuamente novos «sacrifícios» dos
trabalhadores, redução dos direitos sociais e laborais e dos rendimentos
populares para que se recupere a rentabilidade do capital.

Finalmente, LAEN fala da «anulação da maior parte da dívida para que o país
respire», reconhecendo pela sua parte, como fazem os demais partidos do sistema,
que a culpa da dívida tem-na o povo e por isso deve pagar.

Os quadros de LAEN mencionam como exemplo «outros países fora do euro que
avançam favoravelmente». ¿Que países enuncia o chefe do novo partido
oportunista, Lafazanis? A Grã-Bretanha, a Dinamarca que não pertencem à zona do
euro, facto que não obstaculiza os golpes contra os direitos laborais e
populares nesses países, enquanto outros quadros de LAEN apelam à Frente
Nacional de Le Pen em França, aos industriais italianos, a uma parte do capital
alemão…

¿Que têm que ver os povos desses países, o povo da Grécia e a esperança de
satisfazer as suas necessidades com as aspirações dos seus exploradores que se
reflectem em propostas políticas sobre moedas nacionais, propostas que levam a
capa da radicalização para enganar e ocultar o seu real conteúdo antipopular?
Essa nova falsa separação entre «euro e dracma» quer ocultar ao povo que o
fundamental é o caminho do capital e o seu poder, é a participação na UE e no
sistema imperialista. É contra isso que o povo tem lutar. E não aderir a partes
do capital que devaneiam com a ideia de uma moeda nacional, de outra aliança
monetária.

Que fracasse a nova tentativa de enganar

A tentativa de criar um SYRIZA nº 2, agora que desaparece a dúvida sobre o papel
do nº 1, não deve encontrar eco por parte do povo que já viveu o doloroso
desmentido das esperanças que lhe cultivaram e que não tem já a possibilidade
de novas decepções que lhe façam novamente perder tempo valioso, confiar em algo
que está contra si.

O povo tem experiencia, pode retirar as suas conclusões, não deve deixar-se
enganar uma vez mais. Não pode existir uma solução a favor do povo dentro do
sistema capitalista, através de uma alternância de governos de gestão burguesa,
sem romper com o caminho do desenvolvimento capitalista e o sistema
imperialista. O povo não deve deixar-se enganar por aqueles que colocam como
objectivo fundamental a reconstrução produtiva da economia capitalista, aqueles
que serviram este objectivo, inclusivamente em cargos governamentais. Aqueles
que piscam o olho a partes do capital, que namoram a ideia da Grécia capitalista
com moeda nacional, não podem seguir um caminho diferente daquele que conduz à
bancarrota popular. Não tem importância se esta se vai realizar com ou sem
memorando. Não tem importância se se vai realizar dentro ou fora da zona do
euro. O que tem importância é que se anule a tentativa de aprisionar o povo
dentro de mais uma opção a favor do capital.

O povo, as camadas populares pobres que têm inclinações radicais não devem
permitir que se convertam uma vez mais em espectadores da mesma obra, a viver
novas desilusões. Hoje em dia, tanto na sua luta diária nos locais de trabalho e
nos bairros operários como também nas próximas eleições podem esperar mais, ter
mais confiança no KKE. Confiar, porque nunca los traiu, nem faltou na luta em
defesa dos seus interesses. Porque é a única força que tem uma proposta de saída
verdadeiramente alternativa, realista, carregada de esperança, cujos eixos são
desvincular-se da UE e da NATO, anular unilateralmente a dívida e socializar as
riquezas que este país tem, com o povo no poder.

(Artigo da Secção de Relações Internacionais do CC do KKE)

In
O DIÁRIO.INFO
http://www.odiario.info/?p=3766
12/9/2015

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