sábado, 18 de junho de 2016

Moniz Bandeira denuncia apoio dos EUA a golpe no Brasil




do PT na Câmara

O cientista político e historiador Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira alertou
nesta terça-feira (14) que por trás do processo golpista no Brasil, que levou à
ascensão do presidente interino Michel Temer no lugar da presidenta legítima
Dilma Rousseff, há poderosos interesses dos Estados Unidos, para ampliar sua
presença econômica e geopolítica na América do Sul.

“Esse golpe deve ser compreendido dentro do contexto internacional, em que os
EUA tratam de recompor sua hegemonia sobre a América do Sul, ao ponto de
negociar e estabelecer acordos com o presidente Maurício Macri para a instalação
de duas bases militares em regiões estratégicas da Argentina. O processo de
impeachment da presidenta Dilma Rousseff não se tratou, portanto, de um ato
isolado, por motivos domésticos, internos do Brasil”, afirmou Moniz Bandeira, em
entrevista concedida por e-mail ao PT na Câmara.

Moniz, que é autor de mais de 20 obras, entre elas A Segunda Guerra Fria —
Geopolítica e dimensão estratégica dos Estados Unidos (2013, Civilização
Brasileira) e está lançando agora A Desordem Internacional, entende que o
processo golpista no Brasil recebeu apoio dos EUA e de outros setores
estrangeiros com interesse nas riquezas do País.

Ele criticou também setores da burocracia do Estado (como Procuradoria-Geral da
República, Polícia Federal e Judiciário) por atuarem para solapar a democracia
brasileira, prejudicar empresas nacionais e abrir caminho para a consolidação de
interesses estrangeiros no País, em especial dos EUA.

“Muito dinheiro correu na campanha pelo impeachment. E a influência dos EUA
transparece nos vínculos do juiz Sérgio Moro, que conduz o processo da
Lava-Jato. Ele realizou cursos no Departamento de Estado, em 2007”, disse.

Leia a entrevista completa:

Como o senhor avalia o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff?

O fato de que o presidente interino Michel Temer e seus acólitos, nomeados
ministros, atuarem como definitivos, mudando toda a política da presidenta Dilma
Roussefff, evidencia nitidamente a farsa montada para encobrir o golpe de
Estado, um golpe frio contra a democracia, desfechado sob o manto de
impeachment.

Esse golpe, entretanto, deve ser compreendido dentro do contexto internacional,
em que os Estados Unidos tratam de recompor sua hegemonia sobre a América do
Sul, ao ponto de negociar e estabelecer acordos com o presidente Maurício Macri
para a instalação de duas bases militares em regiões estratégicas da Argentina.

O processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff não se tratou, portanto,
de um ato isolado, por motivos domésticos, internos do Brasil.

Onde seriam implantadas tais bases?

Uma seria em Ushuaia, na província da Terra do Fogo, cujos limites se estendem
até a Antártida; a outra na Tríplice Fronteira (Argentina, Brasil e Paraguai),
antiga ambição de Washington, a título de combater o terrorismo e o
narcotráfico. Mas o grande interesse, inter alia, é, provavelmente, o Aquífero
Guarani, o maior manancial subterrâneo de água doce do mundo, com um total de
200.000 km2, um manancial transfronteiriço, que abrange o Brasil (840.000l Km²),
Paraguai (58.500 Km²), Uruguai (58.500 Km²) e Argentina (255.000 Km²).

Aí os grandes bancos dos Estados Unidos e da Europa — Citigroup, UBS, Deutsche
Bank, Credit Suisse, Macquarie Bank, Barclays Bank, the Blackstone Group,
Allianz, e HSBC Bank e outros –compraram vastas extensões de terra.

A eleição de Maurício Macri significa que a Argentina vai voltar ao tempo em que
o ex-presidente Carlos Menem, com a doutrina do “realismo periférico”, desejava
manter “relações carnais” com os Estados Unidos?

Os EUA estão a buscar a recuperação de sua hegemonia na América do Sul,
hegemonia que começaram a perder com o fracasso das políticas neoliberais na
década de 1990. Com a eleição de Maurício Macri, na Argentina, conseguiram
grande vitória.

E, na Venezuela, o Estado encontra-se na iminência do colapso, devido à
conjugação de desastrosas políticas dos governos de Hugo Chávez e Nicolás Maduro
com a queda do preço do petróleo e as operações para a mudança de regime,
implementadas pela CIA, USAID, NED e ONGs financiadas por essas e outras
entidades.

A implantação de bases militares em Ushuaia e na Tríplice Fronteira, além de
ferir a soberania da Argentina, significa séria ameaça à segurança nacional não
só do Brasil como dos demais países da região.

Os EUA possuem bases na Colômbia e alguns contingentes militares no Peru, a
ostentarem sua presença nos Andes e no Pacifico Ocidental. E com as bases na
Argentina completariam um cerco virtual da região, ao norte e ao sul, ao lado do
Pacífico e do Atlântico.

Que implicações teria o estabelecimento de tais bases na Argentina?

Quaisquer que sejam as mais diversas justificativas, inclusive científicas, a
presença militar dos EUA na Argentina implicaria maior infiltração da OTAN, na
América do Sul, penetrada já, sorrateiramente, pela Grã-Bretanha no arquipélago
das Malvinas, e anularia de facto e definitivamente a resolução 41/11 da
Assembleia Geral das Nações Unidas, que, em 1986, estabeleceu o Atlântico Sul
como Zona de Paz e Cooperação (ZPCAS).

E o Brasil jamais aceitou que a OTAN estendesse ao Atlântico Sul sua área de
influência e atuação.

Em 2011, durante o governo da presidente Dilma Rousseff, o então ministro da
Defesa do Brasil, Nelson Jobim (do PMDB, o mesmo partido do presidente
provisório Temer), atacou a estratégia de ampliar a área de ingerência da OTAN
ao Atlântico Sul, afirmando que nem o Brasil nem a América do Sul podem aceitar
que os Estados Unidos “se arvorem” o direito de intervir em “qualquer teatro de
operação” sob “os mais variados pretextos”, com a OTAN “a servir de instrumento
para o avanço dos interesses de seu membro exponencial, os Estados Unidos da
América, e, subsidiariamente, dos aliados europeus”.

Mas estabelecer uma base militar na região da Antártida não é uma antiga
pretensão dos EUA?

Sim. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial esse é um objetivo estratégico do
Pentágono a fim de dominar a entrada no Atlântico Sul. E, possivelmente, tal
pretensão agora ainda mais se acentuou devido ao fato de que a China, que está a
construir em Paraje de Quintuco, na província de Neuquén, coração da Patagônia,
a mais moderna estação interplanetária e a primeira fora de seu próprio
território, com poderosa antena de 35 metros para pesquisas do “espaço
profundo”, como parte do Programa Nacional de Exploração da Lua e Marte.

A previsão é de que comece a operar em fins de 2016. Mas a fim de recuperar a
hegemonia sobre toda a América do Sul, na disputa cada vez mais acirrada com a
China era necessário controlar, sobretudo, o Brasil, e acabar o Mercosul, a
Unasul e outros órgãos criados juntamente com a Argentina, seu principal sócio e
parceiro estratégico, a envolver os demais países da América do Sul.

A derrubada da presidente Dilma Rousseff poderia permitir a Washington colocar
um preposto para substituí-la.

A mudança na situação econômica e política tanto da Argentina como do Brasil
afigura-se, entretanto, muito difícil para os EUA. A China tornou-se o principal
parceiro comercial do Brasil, com investimentos previstos superiores a US$54
bilhões, e o segundo maior parceiro comercial da Argentina, depois do Brasil.

O Brasil, ao desenvolver uma política exterior com maior autonomia, fora da
órbita de Washington, e de não intervenção nos países vizinhos e de integração
da América do Sul, conforme a Constituição de 1988, constituía um obstáculo aos
desígnios hegemônicos dos EUA, que pretendem impor a todos os países da América
tratados de livre comércio similares aos firmados com as repúblicas do Pacífico.

Os EUA não se conformam com o fato de o Brasil integrar o bloco conhecido como
BRICs e seja um dos membros do banco em Shangai, que visa a concorrer com o FMI
e o Banco Mundial.

Como o senhor vê a degradação da democracia no Brasil, com a atuação de setores
da burocracia do Estado (Ministério Público, Polícia Federal e Judiciário) que
agem de modo a rasgar a Constituição, achicanando o país?

A campanha contra a corrupção, nos termos em que o procurador-geral Rodrigo
Janot e o juiz Sérgio Moro executam, visou, objetivamente, a desmoralizar a
Petrobras e as grandes construtoras nacionais, tanto que nem sequer as empresas
estrangeiras foram investigadas, e elas estão, de certo, envolvidas também na
corrupção de políticos brasileiros.

Ao mesmo tempo se criou o clima para o golpe frio contra o governo da presidente
Dilma Rousseff, adensado pelas demonstrações de junho de 2013 e as vaias contra
ela na Copa do Mundo.

A estratégia inspirou-se no manual do professor Gene Sharp, intitulado Da
Ditadura à Democracia, para treinamento de agitadores, ativistas, em
universidades americanas e até mesmo nas embaixadas dos Estados Unidos, para
liderar ONGs, entre as quais Estudantes pela Liberdade e o Movimento Brasil
Livre, financiadas com recursos dos bilionários David e Charles Koch,
sustentáculo do Tea Party, bem como pelos bilionários Warren Buffett e Jorge
Paulo Lemann, proprietários dos grupos Heinz Ketchup, Budweiser e Burger King, e
sócios de Verônica Allende Serra, filha do ex-governador de São Paulo José
Serra, na sorveteria Diletto.

Outras ONGs são sustentadas pelo especulador George Soros, que igualmente
financiou a campanha “Venha para as ruas”.

Os pedidos de prisão de próceres do PMDB e do presidente do Senado, encaminhados
pelo procurador-geral da República, podem desestabilizar o Estado brasileiro?

Os motivos alegados, que vazaram para a mídia, não justificariam medida tão
radical, a atingir toda linha sucessória do governo brasileiro.

O objetivo do PGR poderia ser de promoção pessoal, porém tanto ele como o juiz
Sérgio Moro atuam, praticamente, para desmoralizar ainda mais todo o Estado
brasileiro, como se estivessem a serviço de interesses estrangeiros.

E não só desmoralizar o Estado brasileiro. Vão muito mais longe nos seus
objetivos antinacionais.

As suspeitas levantadas contra a fábrica de submarinos, onde se constrói,
inclusive, o submarino nuclear, todos com transferência para o Brasil de
tecnologia francesa, permitem perceber o intuito de desmontar o programa de
rearmamento das Forças Armadas, reiniciado pelo presidente Lula e continuado
pela presidente Dilma Rousseff.

E é muito possível que, em seguida, o alvo seja a fabricação de jatos, com
transferência de tecnologia da Suécia, o que os EUA não fazem, como no caso do
submarino nuclear.

É preciso lembrar que, desde o governo de Collor de Melo e, principalmente,
durante a gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso, o Brasil foi
virtualmente desarmado, o Exército nem recursos tinha para alimentar os recrutas
e foi desmantelada a indústria bélica, que o governo do general Ernesto Geisel
havia incentivado, após romper o Acordo Militar com os Estados Unidos, na
segunda metade dos anos 1970.

O senhor julga que os Estados Unidos estiveram por trás da campanha para
derrubar o governo da presidente Dilma Rousseff?

Há fortes indícios de que o capital financeiro internacional, isto é, de que
Wall Street e Washington nutriram a crise política e institucional, aguçando
feroz luta de classes no Brasil.

Ocorreu algo similar ao que o presidente Getúlio Vargas denunciou na
carta-testamento, antes de suicidar-se, em 24 de agosto de 1954: “A campanha
subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados
contra o regime de liberdade e garantia do trabalho”.

Muito dinheiro correu na campanha pelo impeachment. E a influência dos EUA
transparece nos vínculos do juiz Sérgio Moro, que conduz o processo da
Lava-Jato.

Ele realizou cursos no Departamento de Estado, em 2007.

No ano seguinte, em 2008, passou um mês num programa especial de treinamento na
Escola de Direito de Harvard, em conjunto com sua colega Gisele Lemke. E, em
outubro de 2009, participou da conferência regional sobre “Illicit Financial
Crimes”, promovida no Rio de Janeiro pela Embaixada dos Estados Unidos.

A Agência Nacional de Segurança (NSA), que monitorou as comunicações da
Petrobras, descobriu a ocorrência de irregularidades e corrupção de alguns
militantes do PT e, possivelmente, passou informação sobre o doleiro Alberto
Yousseff a um delegado da Polícia Federal e ao juiz Sérgio Moro, de Curitiba, já
treinado em ação multi-jurisdicional e práticas de investigação, inclusive com
demonstrações reais (como preparar testemunhas para delatar terceiros).

Não sem motivo o juiz Sérgio Moro foi eleito como um dos dez homens mais
influentes do mundo pela revista Time.

Ele dirigiu a Operação Lava-Jato, coadjuvado pelo procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, como um reality show, sem qualquer discrição, vazando
seletivamente informações para a mídia, com base em delações obtidas sob ameaças
e coerção, e prisões ilegais, com o fito de macular e incriminar, sobretudo, o
ex-presidente Lula. E a campanha continua.

Aonde vai?

Vai longe. Visa a atingir todo o Brasil como Nação.

E daí que se prenuncia uma campanha contra a indústria bélica, a começar contra
a construção dos submarinos, com tecnologia transferida da França, o único país
que concordou em fazê-lo, e vai chegar à construção dos jatos, com tecnologia da
Suécia e outras indústrias.

Essas iniciativas dos presidentes Lula da Silva e Dilma Rousseff afetaram e
afetam os interesses dos Estados Unidos, cuja economia se sustenta, largamente,
com a exportação de armamentos.

Apesar de toda a pressão de Washington, o Brasil não comprou os jatos F/A-18
Super Hornets da Boeing, o que contribuiu, juntamente com o cancelamento das
encomendas pela Coréia do Sul, para que ela tivesse de fechar sua planta em Long
Beach, na Califórnia.

A decisão da presidente Dilma Rousseff de optar pelos jatos da Suécia
representou duro golpe na divisão de defesa da Boeing, com a perda de um negócio
no valor US$4,5 bilhões.

Esse e outros fatores concorreram para a armação do golpe no Brasil.

E qual a perspectiva?

É sombria. O governo interino de Michel Temer não tem legitimidade, é impopular
e, ao que tudo indica, não há de perdurar até 2018. É fraco. Não contenta a
gregos e troianos.

E, ainda que o presidente interino Michel Temer não consiga o voto de 54
senadores para efetivar o impeachment, será muito difícil a presidenta Dilma
Rousseff governar com um Congresso, em grande parte corrompido, e o STF
comprometido pela desavergonhada atuação, abertamente político-partidária, de
certos ministros.

Novas eleições, portanto, creio que só as Forças Armadas, cujo comando do
Exército, Marinha e Aeronáutica até agora está imune e isento, podem organizar e
presidir o processo.

Também só elas podem impedir que o Estado brasileiro seja desmantelado, em meio
a esse clima de inquisição, criado e mantido no País, em colaboração com a mídia
corporativa, por elementos do Judiciário, como se estivessem acima de qualquer
suspeita. E não estão. Não são deuses no Olimpo.

In
VIOMUNDO
http://www.viomundo.com.br/denuncias/moniz-bandeira-eua-apoiaram-golpe-de-temer-para-recompor-hegemonia-sobre-america-do-sul.html
14/6/2016

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