quinta-feira, 31 de março de 2016

Há golpe no ar: o complô para desestabilizar Rousseff, Lula e o Brasil






Shobhan Saxena


Partidos neoliberais, mídia comercial, Judiciário conservador, lobbyistasdas
petroleiras, elite branca e grupos de direita, com ajuda abundante que vem de
fora do país, reuniram-se em gangue para derrubar o governo do Brasil. E a coisa
está sendo feita de modo a fazer crer que teria havido um levante popular contra
regime corrupto.

São Paulo: Em novembro de 2009, The Economist põe o Brasil na capa. "Brasil
Takes Off" [Brasil decola], diz a manchete, sobre uma foto do icônico Cristo
Redentor, como se decolasse sobre o mar azul, feito uma nave espacial. Prevendo
que "o Brasil está a caminho de tornar-se a 5ª maior economia do mundo,
deslocando a Grã Bretanha e a França", a revista dizia que a maior economia da
América do Sul deveria "tomar maior velocidade nos próximos cinco anos, com a
ativação dos campos de petróleo de mar profundo, e os países asiáticos ainda
famintos de alimento e minérios da vasta e dadivosa terra do Brasil."

Em 2009, mesmo com o mundo ainda convalescendo de uma catastrófica crise
financeira, The Economist viu o Brasil como a maior esperança do capitalismo
global.

Naquele momento, a revista britânica não era a única apaixonada pelo Brasil.
Sob a liderança de Lula da Silva, o país testemunhava prosperidade sem
precedentes e mudança social. A própria ascensão pessoal de Lula, de menino
pobre e empregado metalúrgico à presidência do maior país da América Latina era
material do que se enchem as lendas. Foi tema de vários livros e de um filme de
sucesso. Na reunião do G-20 em Londres, em abril de 2009, o presidente dos EUA
Barrack Obama disse dele que era "o político mais popular da Terra". E dois dois
maiores espetáculos esportivos - a Copa do Mundo da FIFA (2014) e as Olimpíadas
(2016) - marcadas para acontecer no país, o Brasil, há tanto tempo conhecido
como "o país do futuro", pareceu estar chegando finalmente ao centro do palco
global.

Sete anos adiante, o Brasil já parece um país completamente diferente. Lula,
que concluiu o segundo mandato em 2010, com aprovação de 80% da população, foi
detido, esse mês, para ser interrogado na investigação de um escândalo de
corrupção que já pôs na cadeia alguns de seus camaradas do Partido dos
Trabalhadores (PT). A sucessora de Lula, presidenta Dilma Rousseff enfrenta
pedido de impeachment no Congresso. A economia do país encolheu 3,5% ano
passado, e esse ano não verá melhor resultado. A inflação chegou aos dois
dígitos e centenas de milhares de brasileiros enfrentam o desemprego. E milhões
de pessoas tomaram as ruas, muitos em apoio, muitos em oposição, ao governo.
Ninguém parece nem remotamente preocupado com as Olimpíadas do Rio de Janeiro,
que estão a menos de cinco meses de começarem. E a mídia comercial - global e
brasileira - já rifou Lula, Rousseff e o Brasil.

A história do Brasil começou a perder grande parte do brilho em 2013,
especialmente aos olhos da mídia-empresa internacional e de negócios. Em
setembro de 2013, novamente The Economist põe o Brasil na capa. A matéria
pingava veneno e culpava Rousseff, então no governo há três anos, mas que
enfrentaria eleições de reeleição no ano seguinte, por ter feito "muito pouco
para reformar seu governo nos anos do boom." Acusava o Brasil de ter "impostos
demais", "excessivo gasto público" e de pagar aposentadorias exageradamente
"generosas".

Aquele não foi um bom ano para o Brasil. A economia patinava e centenas de
milhates de pessoas saíram às ruas em manifestações contra o governo, pouco
antes do início da Copa das Confederações da FIFA, para protestar contra a
corrupção e exigir melhores serviços públicos. A economia parecia estar
completamente paralisada.

Mas... O que deu errado entre 2009 e 2013? Como aconteceu de Rousseff, que em
2010 a revista Forbes declarara a mulher mais poderosa do mundo, virar, de
repente, fraca e incompetente? Como aconteceu de a história do Brasil passar, da
esperança ao desespero, em tempo tão curto?

A resposta é simples: petróleo e o dinheiro, a força e a política que o
petróleo gera.

Em 2007, o Brasil descobriu um campo de petróleo com quantidades imensas de
petróleo numa região do pré-sal em águas oceânicas profundas. No período de um
ano, o país descobriu reservas de petróleo e gás natural que ultrapassam os 50
bilhões de barris - a maior reserva confirmada na América do Sul. Com isso, o
Brasil passou a ser o queridinho dos mercadores de petróleo do planeta e de Wall
Street.

A empresa estatal petroleira do Brasil, Petrobrás sempre tivera o monopólio da
exploração do petróleo no Brasil desde a criação da empresa, em 1953, mas o
setor abriu-se, em 1997, para a Royal Dutch Shell. Com as descobertas de
2007-08, gigantes globais como as empresas Chevron, Shell e ExxonMobil puseram
os olhos no Brasil, antevendo contratos lucrativos. Mas não fecharam negócio
algum.

Em 2007, Lula restabeleceu parcialmente o monopólio da Petrobrás sobre o
petróleo brasileiro. Prepararam-se leis, sob orientação de Rousseff, então
ministra de Lula, que deram à Petrobrás direitos de exclusividade na exploração,
com todos os lucros do petróleo orientados para os programas sociais do governo,
de Educação e Saúde. E a Petrobrás também iniciou parcerias com outras
petroleiras estatais de outros países, principalmente com petroleiras chinesas
(as petroleiras indianas ONGC e Bharat Petroleum também são parceiras da
Petrobrás e têm escritórios no Rio de Janeiro, onde opera o quartel-general da
empresa brasileira).

Imediatamente o Departamento de Estado e a Agência de Informação de Energia,
AIE [ing.Energy Information Agency (EIA)] dos EUA puseram-se a trabalhar no
lobbying de funcionários brasileiros, a favor das empresas dos EUA.

Telegramas diplomáticos secretos dos EUA distribuídos por Wikileaks em 2010
relevaram o quanto os norte-americanos estavam preocupados com a presença de
empresas estatais chinesas no Brasil; e um dos telegramas expõe detalhadamente
como os EUA tentavam naquele momento alterar as leis a seu favor (2/12/2009,
"Pode a indústria do petróleo fazer retroceder a lei do pré-sal", Emb. do RJ,
Confidencial).

Em pouco tempo o Brasil entrou em modo de escolher quem sucederia Lula; e seu
partido, PT, indicara Rousseff como sua candidata. O principal partido de
oposição, o Partido da Social Democracia Brasileira, PSDB, que sempre apoiara a
privatização da Petrobrás, escolheu, como seu candidato, o ex-governador de São
Paulo, José Serra.

Os EUA acompanhavam muito de perto as eleições; documentos distribuídos por
Wikileaks mostram que os EUA apostavam numa vitória de José Serra, para mudar as
leis. "Deixe esses sujeitos (o PT) fazerem o que quiserem. Os leilões e
concorrências não acontecerão, e depois nós mostraremos a todos que o velho
modelo funcionava (...) e faremos tudo voltar ao que era antes" - lê-se em
conversa entre José Serra com o lobby do petróleo.[1]

Mas Serra foi à lona, na disputa eleitoral contra Rousseff nas eleições de
2010. E a Petrobrás continuou como única operadora dos campos de petróleo do
Brasil, e a renda do petróleo continuou a ir para programas sociais do governo.

Rapidamente, a chinesa Sinopec tornou-se ativa na exploração de petróleo em
águas brasileiras, nos termos determinados pela lei, que estipulava um mínimo de
30% para a Petrobrás em todas as ventures. Esse foi o fim da lua-de-mel do
chamado 'Ocidente', com o Brasil.

"Dado que o lobbying deles não conseguiu arrancar contratos de petróleo, o
Brasil virou vilão, como a Venezuela. O governo dos EUA e empresas de petróleo
lançaram contra nós um ataque clandestino. A mídia-empresa deles fez como manda
o figurino" - disse no Itamaraty um experiente diplomata brasileiro, pedindo que
seu nome não fosse divulgado. "Mas o governo também errou, ao depositar
excessivas esperanças na Petrobrás e no petróleo, esquecendo que o petróleo
écommodity cujo preço desaba quando menos se espera" - completou ele.

Chegado ao poder sobre a promessa de fazer do Brasil uma sociedade mais
igualitária, com estado de bem-estar forte, o petróleo e a Petrobrás estavam no
centro dos planos dos governos de esquerda para usar recuros e dinheiro público
para combater a miséria, criar empregos públicos e levar o desenvolvimento para
as áreas mais remotas do país. A Petrobrás não era aposta errada.

Em 2007, a capitalização da empresa no mercado alcançou $190 bilhões. Em 2010,
último ano de Lula no governo, o Brasil crescera 7,5% e as coisas caminhavam
para cima. Embora nos anos seguintes tenha havido uma queda na capitalização e
nos lucros da Petrobrás, a empresa permaneceu como uma das maiores petroleiras
do mundo. Mas as coisas ainda piorariam.

Entra em cena a Agência de Segurança Nacional dos EUA

Em junho de 2013, Edward Snowden, administrador de sistemas da Agência de
Segurança Nacional dos EUA (NSA, em inglês), fugiu para Hong Kong com uma vasta
quantidade de documentos confidenciais. Nos meses seguintes, trabalhando junto a
vários jornalistas de diferentes órgãos de imprensa, Snowden disponibilizou uma
série de arquivos, demonstrando como o governo norte-americano espionava
políticos, governos, empresas e movimentos sociais ao redor do mundo.
Surpreendentemente, o Brasil estava no topo da lista de alvos da NSA, que
coletava mais informações daqui do que da Rússia ou da China. O governo
americano alegou que a vigilância fazia parte de suas medidas antiterrorismo,
mas os documentos sobre o Brasil - e países como a Índia - revelaram um quadro
totalmente diferente. Logo ficou evidente que os alvos principais da NSA no
Brasil eram a Petrobras e Rousseff.

O e-mail de Dilma, o telefone oficial e seu celular pessoal foram rastreados
pela NSA, assim como todos os e-mails, telefonemas, mensagens e documentos
oficiais da rede da Petrobras. Com essas revelações, a relação Estados
Unidos-Brasil atingiu seu ponto mais baixo. Autoridades brasileiras foram
rápidas em declarar que a espionagem tinha sido realizada em razão dos
interesses dos EUA no petróleo e gás do Brasil.

Naquele período, a Petrobras estava prestes a leiloar uma de suas maiores
jazidas petrolíferas, com a esperada participação de várias empresas americanas.
Mas após Dilma ignorar Obama na reunião do G-20 na Rússia e as autoridades da
Petrobras acusarem os Estados Unidos de roubarem informação que lhes daria
"posição privilegiada no leilão", histórias negativas sobre a empresa brasileira
e seu iminente leilão começaram a surgir na mídia ocidental. Quando o leilão foi
realizado, nenhuma empresa americana deu qualquer lance. O que Serra 'previra',
aconteceu.

Com os segredos e informações sobre seus ativos copiados pelas instalações da
NSA, a Petrobras era agora um alvo fácil. Sua queda apenas começava.

Em março de 2014, Alberto Yousseff, doleiro condenado por lavagem de dinheiro
que havia sido preso cinco vezes, começou a dar com a língua nos dentes após
negociar um acordo de delação premiada com os procuradores de Curitiba, capital
do estado do Paraná, no sudeste do Brasil. Youssef denunciou muitas pessoas do
alto escalão que, segundo ele, haviam sido beneficiárias de suborno, propina e
lavagem de dinheiro na Petrobras. Desde então, a investigação sobre esse
escândalo, chefiada pelo juiz Sergio Moro, levou a nomes de altos executivos
brasileiro no ramo do petróleo e, mais importante, da liderança do PT.

Conhecida como "Operação Lava Jato", a investigação se desenrola como uma
telenovela, com pessoas de renome sendo levadas pela polícia ou mandadas para
prisão por Moro em intervalos regulares.

Neste mês, o impensável aconteceu. O líder mais popular da história do Brasil
esteve prestes a ser preso por suspeita de corrupção relacionada à Petrobras. No
dia 3 de março, a Polícia Federal levou Lula de sua casa sob um "mandado de
condução coercitiva" (que força a pessoa a testemunhar sobre um caso) e o deteve
por cinco horas em um dos escritórios da polícia no aeroporto para voos
domésticos de São Paulo.

Enquanto Lula era detido e liberado, a tensão foi-se acumulando pelo país com
uma parte da sociedade brasileira - classe alta e de maioria branca - celebrando
a ação policial, enquanto a outra parte protestava contra o "golpe". O Brasil
dividiu-se verticalmente no dia em que Lula foi detido.

História de golpes

O Brasil é país dividido, já há um bom tempo. Poucas pessoas no país aceitam a
existência de linhas de ruptura de classe e raça, mas elas são visíveis todos os
dias nos conflitos sociais e políticos do Brasil. Após anos de estresse, as
linhas começaram a se agitar em junho de 2013 enquanto o Brasil se preparava
para receber a Copa das Confederações da FIFA; milhares foram às ruas protestar
contra o governo, com alguns pedindo o impeachment e outros ainda pedindo
intervenção militar.

Ignorando a natureza racial e de classe dos protestos, a mídia - local e
internacional - chamou aquilo de "primavera brasileira" - um levante contra
governo impopular e corrupto.

Narrativa similar se repetiu nos últimos dias desde a detenção de Lula. Mas
muitos do governo veem isso como conspiração. "O que está acontecendo no país é
uma conspiração nacional e internacional para destruir o PT e introduzir no
Brasil um modelo econômico como o atual (neoliberal) da Argentina" - disse o
veterano diplomata brasileiro Samuel Guimarães a repórteres, após Lula ser
detido pela polícia. "Isto é um golpe em andamento".

O Brasil tem familiaridade com golpes. Assim como com as interferências
externas dos Estados Unidos. No século 20, pelo menos três presidentes
brasileiros perderam o mandato - e um, a vida - por realizar políticas
populares, despertando a ira das elites do país e de Washington.

Em todos os casos, o culpado pela queda dos presidentes foi a alta da inflação,
queda da renda e má administração da economia. Há um claro padrão nisso tudo.
Getúlio Vargas, criador da Petrobras como uma empresa estatal e que deu direitos
sociais aos pobres do país, foi acusado pela elite carioca, liderada pelo
conglomerado midiático, de corrupção que ele nunca cometeu. Em 1954, pôs fim à
humilhação pública ininterrupta com uma bala no peito.

O próximo a cair foi Jânio Quadros, vencedor da eleição presidencial com margem
de diferença recorde em 1961. No mesmo ano, Jânio convidou o revolucionário
argentino Ernesto "Che" Guevara ao Brasil, e o honrou com a Ordem Nacional do
Cruzeiro do Sul. Essa iniciativa alarmou a elite brasileira e os americanos,
ambos paranoicos com a expansão do comunismo na América do Sul. Então, Jânio
cometeu um erro ainda maior: nacionalizou jazidas minerais. Em menos de um ano,
foi retirado do poder por um Congresso dominado por antigos capitalistas e
pessoas leais a Washington.

Jânio foi substituído por João Goulart. Líder de centro com visões
progressistas, Goulart começou a implementar políticas de aumento salarial para
os trabalhadores, reforma agrária, direito ao voto para todos os brasileiros e
justiça social. Enquanto o governo brasileiro se dirigia levemente para a
esquerda, John F. Kennedy, o então presidente americano que ainda se recuperava
do infortúnio na Baía dos Porcos em Cuba, começava a discutir com seus aliados
as maneiras de tirar Goulart do poder.

De acordo com documentos do Arquivo da Segurança Nacional dos EUA, em março de
1963, Kennedy disse a seus aliados: "Temos que fazer alguma coisa quanto ao
Brasil". Logo depois, a mídia brasileira chamava Goulart de comunista e
reclamava sobre a alta da inflação. Em 1964, sob o comando dos EUA, o exército
brasileiro derrubou Goulart para "salvar o país" do comunismo. Até hoje, muitos
círculos da elite brasileira chamam aquele golpe de "revolução".

O mundo sabe dos regimes ditatoriais brutais da Argentina e do Chile, mas tudo
começou no Brasil - em 1964. A maioria dos países sul-americanos foi devastada
por décadas de ditaduras patrocinadas pelos EUA. Os países só iniciaram o
retorno à democracia nos anos 90, após o fim da Guerra Fria.

Então, numa virada irônica de grande abalo para a Doutrina Monroe, um país após
o outro, começando pela Venezuela, depois Brasil, Argentina, Uruguai e Chile
elegeram governantes de esquerda. A América do Sul não era mais o quintal de
Washington.

Nos últimos 15 anos, todas as nações sul-americanas testemunharam acelerado
crescimento econômico à medida em que estabeleceram relações com a China,
fazendo do país asiático o maior ator na região.

Tragédia pela segunda vez

A contínua marcha para a esquerda na América do Sul disparou os alarmes de
Washington novamente e também tirou o sono da elite local. Depois de 13 anos de
governo petista, durante o qual enormes planos de bem-estar social foram
implementados, a elite brasileira está cega de preocupação com a "bolivarização"
do Brasil - referência às políticas de esquerda da Venezuela sob o governo de
Hugo Chávez. Em São Paulo, a capital financeira da América do Sul, as conversas
de bar geralmente são em torno de como o Brasil está se "tornando uma
Venezuela". Os manifestantes antigoverno nas ruas repetem os mesmos slogans,
enquanto agridem agridem qualquer um que lhes apareça vestido de vermelho.

Muitos dizem que a tragédia de 1964 está-se repetindo. "Estamos enfrentando uma
estratégia de golpe de estado contra uma presidente eleita", informou
recentemente o historiador Paulo Alves de Lima ao jornal RT. "Estamos à beira de
uma nova etapa de contrarrevolução, com uma democracia ainda mais restrita,
impregnada de arrogância e violência institucional...", disse Lima ao jornalista
brasileiro Pepe Escobar, que vê a 'mudança de regime' no Brasil como um ataque
contra o grupo BRICS.

No Brasil, muitos intelectuais, observadores políticos, ativistas sociais,
peritos judiciais e membros do governo acreditam que, diferentemente de 1964,
quando o exército liderou a tomada do governo, a atual "contrarrevolução" está
sendo organizada e liderada pelos partidos neoliberais em conluio com lobistas
do país, grupos de direita, a mídia corporativa e um "judiciário altamente
politizado".

Liderando o ataque ao governo Dilma Rouseff está o PSDB, autoproclamado
democrata social, mas que de fato é um partido de direita que advoga políticas
neoliberais e destruição de políticas sociais. Tendo perdido quatro eleições
consecutivas para o PT, o PSDB testemunha uma guerra amarga entre seus líderes -
todos desejando ser o presidente do país. O partido sentiu uma chance de vitória
em 2015, após as pesquisas de opinião projetarem Dilma enfraquecida pelo
escândalo da Petrobras e pelos protestos das ruas. No meio do processo
eleitoral, após Eduardo Campos, um popular candidato do Partido Socialista
Brasileiro, ter misteriosamente falecido num acidente de avião, o candidato pelo
PSDB, Aécio Neves, começou a imaginar-se no palácio presidencial. A mídia
ocidental o projetou como o salvador do Brasil. Banqueiro do Morgan Stanley
chegou a comparar a 'ascensão' de Aécio ào do Primeiro-ministro indiano Narendra
Modi.

Aécio estava certo de sua vitória após a revista Veja publicar uma matéria na
véspera do 2º turno das eleições em dezembro de 2014, alegando que o doleiro
Yousseff havia dito à polícia que Dilma e Lula sabiam da corrupção na Petrobras.
Mas mesmo assim, Aécio perdeu a eleição. Um mês após o início do segundo
governo Dilma Rousseff, em janeiro de 2015, Aécio iniciou o pedido de
impeachment, ainda tendo o artigo de Veja como "prova" da cumplicidade da
presidente com o escândalo.

O artigo, publicado sem nenhuma resposta de Lula e Dilma, não era exceção. Os
julgamentos da "Operação Lava Jato" estavam tanto na mídia quanto nas cortes,
com vazamentos regulares de acusações feitas em delações premiadas. O magistrado
de Curitiba, declaradamente influenciado pela operação Mani Pulite da Itália,
tornou-se cultuado pela classe média, com suas fotos e frases espalhadas por
revistas e jornais quase que diariamente.

Mas Moro, o juiz, também tem enfrentado críticas por suas táticas de manter os
acusados na prisão, sem fiança, e utilizando-se de acordos de delação premiada
para construir casos contra outros. Até o The Sunday Times de Londres
recentemente publicou artigo sobre o juiz brasileiro, questionando a forma como
ele conduz o caso.+

O complexo judicial-jornalístico



Moro pareceu dar importância mínima a essas críticas, quando enviou a Polícia à
casa de Lula para prendê-lo. Apesar de o nome do ex-presidente aparecer citado
em incontáveis artigos que o dão como ligado ao escândalo, a verdade é que, até
hoje ninguém apresentou qualquer tipo de prova contra ele - nem em tribunais nem
em algum veículo de imprensa comercial. Além disso, o ex-presidente jamais se
recusou a cooperar com a investigação. Portanto, quando Lula foi preso por
mandato coercitivo assinado por juiz, muitos entenderam que o juiz Moro pisara
fora da linha. Um juiz da Suprema Corte brasileira, Marco Aurélio Mello,
criticou publicamente o juiz, porque "coerção só se aplicaria se Lula tivesse
sido intimado e se recusasse a depor, o que não aconteceu."

Mas, mesmo com a tática dura de Moro, a detenção de Lula não saiu conforme o
script. Tão logo a notícia da prisão espalhou-se por São Paulo, começaram as
brigas a murros na calçada em frente ao prédio onde Lula mora. E a conta do PT
no Twitter lançou mensagem em que Lula era chamado de "preso político". Com as
mídias sociais fervilhando de notícias sobre o "sequestro" de Lula pela polícia,
centenas de pessoas começaram a reunir-se pelas ruas em São Paulo, gritando "Não
vai ter golpe" [N. Quando já começavam a chegar notícias de multidões
mobilizadas em outras cidades do país, o ex-presidente Lula foi deixado partir.]
E dirigiu-se diretamente à sede do Partido dos Trabalhadores, onde falou a uma
multidão de ativistas e estudantes. "Mereço mais respeito nesse país" - disse
Lula, com ar cansado, mas resoluto. Na mesma noite, Lula estava numa reunião de
sindicalistas, onde disse que, sim, pode candidatar-se à presidência em 2018.
"Sinceramente, espero que tenha outras pessoas para serem candidatas. Agora, uma
coisa pode ficar certa: se for necessário, eu vou para a disputa em 2018" -
disse Lula a uma multidão reunida para ouvi-lo, no centro de São Paulo.

Até apoiadores ferrenhos do PT e de Lula consideram que o Partido dos
Trabalhadores é em parte responsável pelo que acontece hoje no Brasil. O
envolvimento de líderes do partido em atos de corrupção maculou sua imagem até
entre seguidores. Além disso, o núcleo duro de apoio ao partido, sindicatos,
movimentos sociais, ativistas e ideólogos de esquerda já se afastaram do PT, com
Rousseff empurrando o governo para o centro e, ela própria, afastando-se
daquelas bases. Nesse cenário, a prisão de Lula deveria ser o golpe de morte
contra o PT. Na mídia comercial - local e global - Lula era apresentado como
figura isolada. Na verdade, a situação em campo mostrou-se muito diferente, ante
os milhões de apoiadores que se apresentaram nas ruas em apoio ao ex-presidente.

Mas outras reviravoltas estavam por vir.

Dia 11 de março, Rousseff ofereceu a Lula um posto de ministro de seu governo.
Depois de muita discussão e adiamento, Lula afinal aceitou ser ministro da Casa
Civil da presidenta Dilma (cargo, aproximadamente, de primeiro-ministro). O
movimento foi considerado pelos petistas como necessário para salvar o governo
do "golpe" em curso; a oposição não tardou a 'denunciar' o que, para ela, seria
tentativa de salvar Lula de ser preso no "escândalo da corrupção". Dia seguinte,
o juiz Moro entregou à Globo TV a gravação de uma conversa telefônica entre a
presidenta e o ex-presidente, em que conversam sobre a ida de Lula para o
ministério. À noite, a TV Globo exibiu a gravação em horário nobre,
interpretando as falas como se fossem uma espécie de 'arranjo', para garantir a
Lula um cargo que o poria em situação de só poder ser julgado pela Suprema
Corte.

Como se não bastasse divulgar material sem verificar a veracidade dos fatos e
sem autorização legal, os âncoras e repórteres da TV Globo puseram-se a incitar
a população a ir para as ruas protestar contra Lula e Rousseff.

A gravação pela Polícia Federal, de conversas de Rousseff no próprio telefone,
quando a presidenta falava com um ex-presidente, imediatamente disparou uma
comparação com a vigilância ilegal da Agência de Segurança Nacional dos EUA.
Vários importantes juristas e especialistas em questões de escutas ilegais
questionaram a decisão de Moro, de gravar conversas privadas e 'vazá-las' para a
TV Globo, antes de a gravação ter sido apresentada como prova na corte. Mas Moro
justificou sua ação, comparando o caso brasileiro ao escândalo Watergate que
envolveu o ex-presidente Richard Nixon.

A gravação de 30 segundos, que já não tem qualquer valor judicial, deu munição
à oposição para exigir a prisão de Lula e que se acelerasse a tramitação de um
pedido de impeachment contra Rousseff.

Apesar de o ministro Mello da Suprema Corte já ter criticado Moro duramente,
chamando de "crime" a ação de gravar clandestinamente conversas da presidenta, o
vazamento da gravação e as manchetes histéricas de O Globo e da TV do mesmo
grupo Globo tiveram o efeito desejado: a nomeação de Lula ao cargo de ministro
foi bloqueada - e eclodiram movimentos de rua contra o governo Rousseff.

Dois Brasis, duas narrativas

No dia seguinte ao vazamento da conversa gravada, cerca de 1,5 milhão de
pessoas, muitas usando a camisa amarela da seleção de futebol do Brasil e
ostentando bandeiras do Brasil, saíram às ruas pelo país.

Com muitos fotógrafos e cinegrafistas em helicópteros registrando o mar de
verde-e-amarelo na Av. Paulista em SP, onde se reuniram 400 mil pessoas, no
maior protesto antigoverno da história da cidade, dia seguinte os jornais
estavam também pintados de verde-e-amarelo. Quem visse pensaria que todo o
Brasil exigia a cabeça do PT. Foi o que bastou para que a velha narrativa de
"levante popular contra governo corrupto e ineficiente" voltasse às páginas da
mídia comercial internacional.

A verdade é um pouco mais complicada.

Embora vestidos com as cores nacionais, as pessoas que protestaram naquele dia
na Av. Paulista seriam qualquer coisa, exceto nacionalistas. Pesquisa da empresa
Datafolha revelou que 80% dos 'manifestantes' anti-Rousseff e anti-PT eram
brancos; 77% com formação universitária; e 75% classificados nos grupos de mais
alta renda.

Num país cuja população apresenta 50% de brancos, 11% apenas, com formação
universitária e menos de 6% classificados nos grupos de mais alta renda, não é
difícil entender quem, afinal de contas, manifestava-se nas ruas contra o
governo Rousseff. Praticamente todos ali eram representantes da elite da
sociedade brasileira: ricos, brancos e conservadores.

A elite brasileira sempre manifestou grande incômodo com a vitória de
candidatos populares de tendência de esquerda; o partido preferencial da elite
era o PSDB - várias vezes derrotado nas urnas. No governo do PT, mais de 40
milhões de pessoas superaram a pobreza e ascenderam socialmente. Foi o período
de mais consistente inclusão social, num país conhecido pela terrível
desigualdade. Aconteceram mudanças sociais amplas no Brasil. Com leis que
garantem salários mínimos e aposentadorias e pensões, a classe média alta deixou
de poder manter empregados domésticos e motoristas. Com quotas asseguradas para
o acesso à educação, estudantes negros entram afinal nas universidades públicas
e no mercado de trabalho profissional, em números jamais vistos no Brasil. E com
renda melhor, os pobres afinal viajam de avião, compram em shopping centers e
compram casa própria em bairros tradicionalmente 'de ricos' (e brancos). Fato é
que os governos do Partido dos Trabalhadores, sim, perturbaram a velha ordem
estabelecida.

Poucos países viram, em toda a história, mudança social tão ampla, em tão pouco
tempo. Assim como os ricos explodiram em fúria nos tempos de mudanças nos
governos de Getúlio Vargas e João "Jango" Goulart,também dessa vez as classes
privilegiadas do Brasil estão furiosas contra o PT por dar dinheiro diretamente
às mães pobres, no programa Bolsa Família - que inspirou o programa indiano
Mahatma Gandhi National Rural Employment Guarantee Act, MNREGA (Lei Mahatma
Gahdhi de Garantia Nacional de Emprego Rural).

Em seus discursos, Lula frequentemente denuncia a elite brasileira por não
aceitar essa mudança social e ressentir-se por a vida dos mais pobres ter
melhorado um pouco. No Brasil, muitos entendem que a atual crise foi urdida pela
elite brasileira, para desestabilizar o governo e conseguir voltar ao poder.

"Os primeiros protestos contra Dilma aconteceram em 2013, quando nos
preparávamos para receber a Copa das Confederações da FIFA. Naquele momento, o
desemprego era o mais baixo que jamais houve no Brasil, inflação de um dígito,
salários em alta, e Dilma tinha aprovação de 70%. E tanta gente exigia
'mudanças'?! Claro q há mudanças a fazer, mas reivindicar naquele momento, e não
em tantos outros, não fazia sentido. De fato, foi o início de uma operação de
mudança de regime, mais uma 'revolução colorida', dessa vez no Brasil" - diz
membro do PT que pede para não ser identificado. "Foram ações organizadas e
promovidas pelas mídias sociais. Foi quase como uma operação de inteligência" -
acrescenta.

Embora não haja prova de que os protestos antigoverno de 2013 tenham sido
arquitetados de fora, também ali, sem dúvida possível, a multidão era
indiscutivelmente 'elite'. Pesquisa da Datafolha feita naquele momento mostrou
que 90% dos manifestantes eram brancos; 77% com formação universitária. Desde
2013, todos os protestos contra o governo acontecem em áreas de classe média
rica, longe das áreas onde vive a maioria da população mais pobre. Mas as mídias
comerciais sempre falam da "indignação dos brasileiros", como se todos fossem
igualmente ricos, ou igualmente pobres.

No Brasil toda a imprensa/mídia comercial é controlada por oligarcas - e o país
já foi chamado de "Um país de 30 Berlusconis" em documento dos Jornalistas Sem
Fronteiras. Sempre houve, desde o primeiro mandato de Lula em 2003 - governo de
tendência de esquerda ou apenas progressista -, guerra declarada àquele governo,
pelas empresas da imprensa comercial no Brasil.

Nos anos Rousseff, a guerra tornou-se ainda mais suja. O massacre contra os
governos petistas sempre foi comandado pelo Grupo Globo, que inclui dúzias de
jornais, revistas, canais de TV e websites. O conglomerado, que tem monopólio
quase total sobre noticiário, entretenimento, futebol e carnaval, sempre,
historicamente, foi anti-PT. O grupo também apoiou ativamente o golpe militar de
1964 e cresceu, com lucros gigantes, durante os 21 anos do governo dos
militares.

Mas o tom beligerante da TV Globo não caiu bem entre os brasileiros pobres e
das classes médias, e muitos já trabalham para boicotar a rede. Um dia depois
que o canal de TV do grupo exibiu a fita da conversa entre Lula e Rousseff, o
famoso ator brasileiro Wagner Moura, astro deNarcos em Netflix, distribuiu um
vídeo por sua página de Facebook, manifestando preocupação com o "circo
midiático" e a "agenda política" do Judiciário. "A mídia, claro, se se examina o
passado, todos os grupos estiveram envolvidos no golpe de 64" - diz Moura no
vídeo.

A noite das facas longas

A mídia comercial brasileira dominante tem poder tremendo no país, mas raramente
usa esse poder para questionar o Judiciário. Todos os 'vazamentos seletivos'
feitos por Moro e pela polícia federal foram cuidadosamente publicados e
repetidos.

E há graves acusações por corrupção contra altos chefes do PSDB, inclusive
contra Aécio Neves e contra o presidente da Câmara de Deputados, Eduardo
Cunha... o mesmo que, agora, conduz o processo de impeachment contra Rousseff.
Mas a imprensa comercial absolutamente não se interessou por levantar qualquer
discussão que envolva esses chefes.

Os principais intelectuais brasileiros vêm problema maior que esse. Nas
palavras de Jesse Jose Freire de Souza de Souza, sociólogo renomado, o
Judiciário tomou a posição de "força moderadora superior", acima da política, a
mesma que, na ditadura, era ocupada pelos ditadores militares e, antes ainda,
pela monarquia. "Quem possibilitou tudo isso foi a mídia-empresa comercial" -
Jesse escreveu em artigo publicado semana passada.

Para comentaristas de esquerda, o país enfrenta "golpe", e as empresas
comerciais de mídia e o Judiciário trabalham juntos. Miguel do Rosário, editor
de O Cafezinho, website não comercial, de esquerda, vê conspiração ainda maior
que em 1964. "Semelhante a 1964, o golpe atual é apoiado pela maior empresa de
mídia comercial do Brasil, Globo. Diferente de 1964, o golpe atual é resultado
da ação de um Judiciário ideologicamente tendencioso, que tem três objetivos:
derrubar presidenta democraticamente eleita; impedir que o ex-presidente Lula
concorra às eleições de 2018; e, afinal, pôr na ilegalidade o Partido dos
Trabalhadores brasileiro" - escreveu ele.

Pode soar alarmista, mas há medo no ar, no Brasil, pelo modo como as coisas
vão-se desdobrando: medo pelo futuro da democracia e do Estado de Direito.

Dia 18 de março, centenas de milhares de pessoas comuns encheram as ruas em
"defesa da democracia", em 45 cidades em todo o país. A maior concentração
aconteceu em São Paulo onde 250 mil pessoas, inclusive críticos do governo de
Dilma e de Lula, encheram a Avenida Paulista, apesar das ameaças de violência
por gangues de direita. Foi um show de força, contra "o golpe". Foi um show da
diversidade do Brasil. A noite incendiou-se quando Lula, vestindo camisa
vermelha [sempre usou camisa vermelha em todos os atos do Partido dos
Trabalhadores (NTs)], chegou à avenida e falou durante 20 minutos, sobre o teto
de um ônibus que fechava a passagem. "Não vai ter golpe," gritou Lula, ecoado
por milhares de vozes. "Democracia tem a ver com a voz do povo, trata da voz da
maioria" - disse ele, eletrizando a multidão.

A detenção de Lula energizou a esquerda brasileira. As ruas, desde 2013,
estavam dominadas pela direita. Agora, com os grupos de esquerda se
reorganizando, muitos temem o pior: violência e conflito social.

A disputa final

Brasileiros comuns podem estar-se preparando para brigas de rua, mas os
verdadeiros jogos estão sendo jogados em Brasília, capital do país. Um juiz da
Suprema Corte, Gilmar Mendes, suspendeu a nomeação de Lula para o ministério da
presidenta Dilma. Cunha uniu-se ao PSDB para acelerar o impeachment de Rousseff.
Michel Temer, o vice-presidente, estaria discutindo a formação do governo
pós-Dilma, com José Serra, hoje senador. Há rumores de que o processo de
impeachment estará concluído no fim de abril, e de que Temer - que aparece em
posição de destaque em vários casos de corrupção - assuma o governo do Brasil.

O Brasil está na corda bamba. Um ex-presidente que transformou o país pode ir
para a prisão. A atual presidenta, contra quem não há qualquer acusação de
corrupção, pode ser impedida. E tudo isso no ano em que o país hospedará os
Jogos Olímpicos. Pois por mais que alguns temam que a atual crise venha a causar
dano às instituições do país, e outros falem de uma ameaça à democracia, a elite
brasileira parece não se preocupar.

Indicação do que pode estar sendo cozinhado em Brasília, Ilimar Franco,
conhecido jornalista e blogueiro publicou foto de uma reunião de almoço, dia 16
de março, um dia antes de a nomeação de Lula para o ministério ter sido
suspensa. Na foto, Mendes, o juiz que, no dia seguinte, suspendeu a posse, é
visto almoçando com Serra e Armínio Fraga, [ex-presidente do Banco Central do
Brasil, de 1999 a 2002, assessor dos dois governos do PSDB de Fernando Henrique
Cardoso (NTs) e] ex-gerente do Fundo Quantum, de George Soros. A foto viralizou
nas mídias sociais, com muita gente se perguntando sobre o que estariam
discutindo o juiz; um ex-candidato à presidência e nome que aparece várias vezes
citados nos telegramas de Wikileaks [como 'contato' da Embaixada e de consulados
dos EUA no Brasil (NTs)], e um gerente de fundos que representa o interesse das
corporações financeiras dos EUA.

É. Podem ter sentado para almoçar e discutir futebol.

Mas com Serra, mestre de conspirações políticas, no centro da ação, depois da
humilhante derrota que sofreu nas eleições de 2010, quando Dilma o tirou da
corrida presidencial, as próximas poucas semanas serão cruciais para o Brasil,
para o PT e para a Petrobrás.

Em Brasília, a batalha está sendo chamada de "ou vai ou racha", com alianças
políticas dos dois lados do muro sob pressão intensa, para alcançar os números
necessários, seja para descartar seja para aprovar o impeachment de Dilma. Dilma
e Lula lutam pela democracia e pela própria sobrevivência política, mas já se
veem lobbyistas trabalhando freneticamente para quebrar o monopólio da Petrobrás
sobre o petróleo brasileiro.

Em meio a todas as mais ferozes disputas nos tribunais, no Congresso e nas
ruas, o Senado brasileiro aprovou recentemente uma lei que pode "cancelar a
exigência de que a Petrobrás seja operadora e fique com pelo menos 30% dos
lucros operacionais em todos os campos do pré-sal". Se essa lei, cujo projeto é
patrocinado pelo senador José Serra, vier a ser lei, terá acabado o controle que
a Petrobrás tem sobre os campos de petróleo do país. Embora fortemente rejeitado
por alguns senadores, como Roberto Requião, do Paraná, a lei foi aprovada no
Senado, por diferença mínima.

Surpreso ante o frenesi para privatizar os negócios do petróleo, Requião disse
que a tramitação da lei está avançando "na correria, sem passar pelas comissões,
com os gabinetes dos senadores cheios de lobbyistasque promovem interesses de
multinacionais como Shell e British Petroleum". Mas, ante a massiva pressão dos
lobbyistas, a oposição do senador Requião não foi suficiente. "Será que o Brasil
perdeu a maioria no Senado, para petroleiras multinacionais? Ainda espero que
não" - o veterano senador tuitou, depois da votação.

Agora o projeto de lei vai à Câmara de Deputados e, na sequência, terá de ser
sancionado pela presidenta. Rousseff ainda pode vetar o projeto de lei. Mas, se
o vice-presidente Michel Temer, que se separou de Dilma, assumir a presidência
em lugar dela, há bem pouca dúvida de que o projeto será sancionado e se
converterá em lei. Significaria que todo o drama que o Brasil está vivendo -
detenção de Lula, impeachment de Dilma e perseguição incansável ao PT -
resume-se, afinal, a petróleo.

Como voz do Big Oil, The Economist põe o Brasil outra vez na capa, essa semana.
"Time to go" [Hora de sair], diz a revista, sobre uma foto de Dilma com ar
desolado. Repetindo o mesmo velho script de "má administração da Economia", a
revista 'exige' a remoção, do governo, de uma governante eleita, que recebeu seu
mandato, de pleno direito, em eleições livres e justas, ocorridas há menos de 15
meses.

Hoje, a elite e o complexo midiático-judiciário brasileiro também seguem o
mesmo script. Como aconteceu com presidentes anteriores - Vargas, Quadros e
Goulart -, se Dilma Rousseff tiver de deixar o governo, as multinacionais do
petróleo terão vencido mais uma vez. E mais uma vez o Brasil terá sucumbido a um
golpe de Estado.*****+


25/3/2016, Shobhan Saxena,* de São Paulo, Br, para The Wire, Mumbai, Índia

http://thewire.in/2016/03/25/a-coup-is-in-the-air-the-plot-to-unsettle-rousseff-lula-and-brazil-25893/
+


* Shobhan Saxena é jornalista, indiano, que cobre assuntos da América do Sul,
com base em São Paulo.+

[1] Esse telegrama, datado de 13/2/2010, "coordenado entre os consulados do Rio
de Janeiro e São Paulo, foi distribuído para as embaixadas dos EUA em "ARGENTINA
BUENOS AIRES | BOLIVIA LA PAZ | BRAZIL BRASILIA | BRAZIL RIO DE JANEIRO | BRAZIL
SÃO PAULO | CHILE SANTIAGO | COLOMBIA BOGOTÁ | PERU LIMA | SECRETARY OF STATE |
URUGUAY MONTEVIDEO | VENEZUELA CARACAS".

Nele se lêem opiniões de William Waack, em conversas com o Cônsul Geral dos
EUA:

(C) O jornalista William Waack conversou detalhadamente com o [Cônsul Geral] CG
Sao Paulo, em recente fórum de negócios do qual participaram Serra, Rousseff,
Neves and Gomes. Segundo Waack, Gomes é o mais forte de todos; Neves, o mais
carismático (sic), Serra desligado mais claramente competente; e Rousseff a
menos coerente".

Sempre coerente na missão de desinformar, o portal G1.Globo des-noticiou que
"wikileaks não diz que Waack é informante dos EUA". Agora, já se sabe que sim,
Wikileaks diz e prova. A blogosfera noticiou tudo, na hora que aconteceu (NTs).+



In
port.pravda.ru.
http://port.pravda.ru/cplp/brasil/30-03-2016/40684-complo_brasil-0/
30/3/2016

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