terça-feira, 13 de dezembro de 2016

INACREDITAVEL !

  

      Chubais – A próxima cabeça neoliberal a rolar na Rússia?



       por F. William Engdahl 

       Aposto que pouca gente, fora da Federação Russa, conhecerá o nome de
      Anatoly Chubais, atual presidente de uma empresa russa de alta tecnologia,
      chamada Rusnano. Na sequência da escandalosa detenção, em 15 de novembro,
      de Alexei Ulyukaev, ministro da Economia do primeiro-ministro Dmitry
      Medvedev, acusado de aceitar luvas de pelo menos dois milhões de dólares
      numa privatização estatal envolvendo as empresas de energia Rosneft e
      Bashneft, os holofotes viraram-se para a empresa de Anatoly Chubais, o
      czar das privatizações dos anos 90, de Boris Yeltsin, e atual presidente
       da Rusnano, uma empresa estatal. [1] Se forem pronunciadas formalmente as
      acusações contra Chubais – inegavelmente um dos mais odiados "reformistas"
      cleptocratas da era Yeltsin, que trabalhou com a CIA durante os anos 90 na
      pilhagem do património estatal russo no valor de centenas de milhares de
       milhões, apenas em troca de tostões – isso significará que Putin se sente
      numa posição suficientemente forte para depurar a mafia liberal que
      defende o mercado livre e que ainda mantém um forte controlo no
      desenvolvimento da economia russa. 
      No dia 16 de novembro, um dia depois da dramática detenção de Ulyukaev,
      promotores públicos e polícia invadiram os escritórios da Rusnano de
      Chubais. [2] De notar que, nos relatórios do interrogatório de Chubais e
      de outros funcionários de topo da Rusnano, pelos promotores, vários deles
      fugiram da Rússia nos últimos meses para evitar a acusação. [3] Neste
      momento, Chubais mantém-se detido e afirma veementemente a sua inocência.
       Na minha opinião, há muito mais em jogo do que a inocência ou a culpa de
      Chubais. Esta ação, se combinada com a detenção de Ulyukaev, assinala uma
      importante limpeza de elementos corruptos que, começando ainda antes de
      1991, se organizaram para vender a Rússia à CIA e a especuladores
      ocidentais, como George Soros. Parte da história que, em geral, tem sido
      denegrida no Ocidente quanto ao verdadeiro papel de Anatoly Chubais e da
      presidência de Yeltsin, é muito instrutiva para também percebermos a raiva
       irracional de Washington e dos bancos e dos oligarcas norte-americanos
      contra Putin e contra tudo o que ele faz para restaurar a soberania e a
      estabilidade da Rússia.
       O Golpe 'democrático' de Yeltsin da CIA 
       A pilhagem da Rússia – da nação russa, do estado russo, do povo russo –
      que começou no final dos anos 80, foi um golpe de estado preparado pela
      CIA norte-americana, em conjunto com as redes vigaristas dirigidas pelo
      antigo diretor da CIA, na altura o presidente George Herbert Walker Bush,
      e continuado pelo sucessor de Bush, Bill Clinton. Relatos ocidentais do
      que ocorreu na Federação Russa, durante os anos 90 de Yeltsin, falam da
      "mafia russa" ou do "crime organizado russo". Nunca referem, nem sequer ao
      de leve, que os russos que pilharam o seu próprio país tinham sido
      organizados e pagos, enriquecendo, pelo Ocidente, ou seja, pelas redes Old
      Boy da CIA, leais ao anterior diretor e depois presidente dos EUA, George
      Herbert Walker Bush.
       O que ocorreu nos anos 90, sob a presidência russa de Boris Yeltsin, foi
       descrito por uma fonte interna conhecedora norte-americana, Mortimer
      Zuckerman, membro do Conselho de Nova Iorque para as Relações Externas e
       proprietário do  US News & World Report  , como "o maior desbarato da
      História da riqueza de uma nação". O desbarato, ou mais precisamente o
      roubo, foi feito através de roubo descarado, de guerra monetária e de um
      programa fraudulento de ações como empréstimos a empresas, dirigido por
      Anatoly Chubais. [4]
       O ataque da administração de Bush Senior à Rússia pós-comunista, batizado
      de "Operação Hammer", tinha quatro elementos secretos distintos. A CIA
      financiou secretamente o golpe dos generais, em agosto de 1991, contra o
      líder soviético Mikhail Gorbachev. Usou o seu orçamento de guerra secreto
      para desestabilizar o rublo. Usou os corruptos funcionários russos do
      banco nacional  Gosbank  para organizar o roubo das reservas de ouro
      oficiais do país, quase por inteiro. Depois, iniciou o controlo
      sistemático das indústrias energéticas estratégicas, das matérias-primas e
      das indústrias militares estatais na União Soviética, através de operações
      de privatização impostas pelo FMI, que foram dirigidas por Yegor Gaidar,
      ministro das Finanças de Yeltsin, e pelo seu estreito colaborador, Anatoly
      Chubais, o responsável pela privatização estatal. Gaidar e Chubais
       trabalharam em conjunto com Jeffrey Sachs, de Harvard, e com outros
      amigos do multimilionário George Soros, especulador de fundos de
      investimento, na pilhagem literal da Rússia, como uma fonte interna o
      descreveu. [5]
       À medida que os generais vigaristas ex-KGB e os seus protegidos,
       escolhidos a dedo, pilhavam as reservas de ouro da agora defunta União
       Soviética, assim como os significativos ativos financeiros do agora
       banido Partido Comunista, tudo isso com a bênção e a cumplicidade de
      Boris Yeltsin e do seu círculo interno, os Old Boys da CIA de Bush
      prepararam-se para desencadear a fase seguinte, o controlo sistemático das
      indústrias energéticas estratégicas, das matérias-primas e das indústrias
       militares estatais na União Soviética, através de operações de
      privatização impostas pelo FMI, que foram dirigidas por Yegor Gaidar,
      ministro das Finanças de Yeltsin, e pelo seu cúmplice Anatoly Chubais.
       Em novembro de 1991, Chubais passou a ministro do gabinete de Yeltsin,
      onde geria o portfólio da  Rosimushchestvo  – a Comissão para a Gestão do
      Património Estatal, que Yeltsin decretou ser uma organização responsável
      pela privatização das companhias estatais da Rússia definida. Gaidar e
      Chubais trabalharam com George Soros, o especulador de Wall Street e
       fundador da National Endowment for Democracy [Fundação Nacional para a
      Democracia – NT], uma fachada da CIA. Soros, por sua vez, levou Jeffrey
      Sachs, o arquiteto da "terapia de choque económico" da Polónia, e outros
      "amigos" americanos, para os círculos de Yeltsin.
       George Soros e as suas Fundações de Sociedade Aberta tinham sido ligados
      à CIA pelos serviços de informações chineses e outros. As suas
      instituições de Sociedade Aberta apareciam "por coincidência" em todas as
       situações em que a National Endowment for Democracy, fachada da CIA, e o
      Departamento de Estado norte-americano procuravam uma mudança de regime
      para um governo pró-Washington. Já em 1987, quando Gorbachev ainda
      chefiava a União Soviética, Soros aproveitou os esforços do regime para a
      reforma e para a abertura cautelosa ao Ocidente, para fundar o seu
      Instituto de Sociedade Aberta em Moscovo. Aí, podia dar dinheiro a
      investigadores importantes e a outros para apoiar a investigação sobre
      "economia do mercado". [6]
       Todas as ações de Yeltsin foram orientadas pela CIA e por vigaristas
      manipuladores da KGB, nomeadamente, pelos generais da KGB Filipp Bobkov,
      Alexei Kondaurov e pelo guarda-costas pessoal de Yeltsin, o general
       Alexander Korzhakov – o grupo conspirador que, em coordenação com George
      Bush Sénior e os seus Old Boys da CIA, descreveu e encenou a falsa
      tentativa de "golpe" da KGB contra Gorbachev que, com o apoio dos  media 
      ocidentais dominantes, projetou Yeltsin como o "paladino da democracia".
       Em dezembro de 1991, quatro meses depois, Yeltsin, na altura presidente
      da República Socialista Federativa Soviética da Rússia, a maior república"
      federada no seio da União Soviética, reuniu com os presidentes da Ucrânia
      e da Bielorrússia e assinou aquilo a que se chamou o Pacto de Belaveja,
      declarando a dissolução da URSS que existia formalmente desde 1922. Foi a
       tónica, no golpe apoiado pelos EUA, para começar a pilhagem da Rússia.
      Nessa altura, Gorbachev já estava completamente desacreditado e tinha-se
      demitido.
       A terapia de choque da Rússia, Harvard e a CIA 
       Nos termos do acordo de dissolução, a Rússia assumiu a posse de todos os
      ativos estatais da anterior URSS, agora desaparecida, assim como assumiu
      todas as dívidas externas da URSS. Yeltsin recebeu ordens para que um
      amigo de George Soros, de 32 anos, chamado Yegor Gaidar, fosse o seu czar
      da Economia. Gaidar, que passou formalmente a ministro das Finanças da
      nova Federação Russa em fevereiro de 1992, nomeou chefe das privatizações
      outro jovem economista, Anatoly Chubais.
       Gaidar foi mandado para a Polónia para estudar o modelo "Terapia de
       Choque" polaco, o processo que tinha sido introduzido por Jeffrey Sachs,
      o jovem economista de Harvard, protegido de George Soros. De volta a
      Moscovo, Yegor Gaidar, usando o exemplo polaco de Sachs, convenceu Yeltsin
      a "deixar subir os preços para aumentar a oferta e a abolir as barreiras
      comerciais para que as mercadorias estrangeiras pudessem encher as
       prateleiras das lojas".
       Era uma mentira. A economia soviética era auto-suficiente em tudo, exceto
      talvez em bananas e café. As lojas estavam cheias até que Yeltsin
      anunciou, em novembro de 1991, a data exata em que os controlos dos preços
      seriam abolidos, em 31 de dezembro desse ano. Os proprietários das lojas
      retiveram as suas mercadorias, à espera da anunciada bonança de lucros do
      descontrolo de preços. De repente, as lojas ficaram vazias. Uma semana
      depois do discurso de Yeltsin, foi imposto o racionamento aos moscovitas.
       Gaidar era instruído pelo Tesouro dos EUA da nova administração Clinton
      que tomou posse em janeiro de 1993. A pessoa chave no Tesouro para a
      subsequente pilhagem Gaidar-Chubais da Rússia de Yeltsin era um antigo
      economista de Harvard chamado Lawrence Summers. Summers usou a poderosa
      influência do Departamento do Tesouro norte-americano para arranjar
      dólares do Fundo Monetário Internacional para o governo Yeltsin, sedento
      de dinheiro vivo, dizendo a Yeltsin e a Gaidar que a Rússia tinha que se
      abrir a importações sem restrições se quisessem receber empréstimos do FMI
      e de outras agências internacionais.
       Gaidar em breve seguiu uma política que servia as exigências de
       Washington e dos novos oligarcas banqueiros do KGB, em volta do Banco
      Menatep de Mikhail Khodorkovsky e de outros. Com os decretos de Gaidar, as
      manufaturas russas iriam à falência em face da competição externa sem
      restrições, mas a banca interna, tal como o Menatep, controlada pelos
      generais do KGB e pelos bancos ocidentais ligados à CIA, seriam protegidos
      contra a competição.
       Depois da vitória eleitoral de novembro de 1992, de Bill Clinton, Larry
       Summers, o novo vice-secretário do Tesouro dos EUA, responsável pelas
      "reformas" da Rússia, também antigo professor economista de Harvard, levou
      para Moscovo um grupo dos seus antigos colegas de Harvard, incluindo
      Jeffrey Sachs, o conselheiro de George Soros da Terapia de Choque polaca,
      e Andrei Shleifer, professor de economia, sob os auspícios do Instituto
      Harvard para o Desenvolvimento Internacional (HIID). O triângulo
      Sachs-Shleifer-Summers orquestrou essencialmente todos os aspetos chave na
      implementação da "terapia de choque" de Gaidar-Chubais no início dos anos
      90 de Yeltsin.
       Em 1991, Summers tinha sido economista chefe no Banco Mundial, onde
      Summers nomeara o seu antigo aluno de Harvard, Shleifer, russo-americano,
      como "conselheiro" do Banco Mundial para o governo de Yeltsin. Pouco
       depois de Summers passar a vice-secretário do Tesouro na administração
      Clinton em 1993, Shleifer entrou para o Instituto Harvard para o
      Desenvolvimento Internacional (HIID) de Jeffrey Sachs, como chefe das
      operações em Moscovo.
       O HIID foi inteligentemente escolhido por Summers como a principal
       organização consultora para trabalhar com Gaidar e Chubais, para
       organizar a colossal pilhagem, conhecida por privatização da Rússia.
      Summers, a partir do seu gabinete do Tesouro em Washington, nomeou todos
      os principais agentes na privatização/pilhagem da Rússia de Chubais no
      início dos anos 90. Era aquilo a que se viria a chamar uma mafia de
      Harvard. Summers contratou David Lipton de Harvard, um antigo sócio
      consultor da Jeffrey D. Sachs & Associates, para vice-secretário adjunto
      do Tesouro para a Europa de Leste e Antiga União Soviética. Sachs foi
      nomeado diretor do HIID em 1996. O HIID recebia subsídios USAID para o
      "trabalho" do Instituto na Rússia. [10]
       A USAID era conhecida como uma agência de fachada da CIA, mantendo o
       papel da CIA de mudança de regime escondido por detrás do véu de uma
      organização caritativa do governo dos EUA, que fomentava o desenvolvimento
      económico. Era um elo fundamental de dinheiro para dirigir cada passo das
      operações de privatização de Chubais, através dos Boys de Harvard
       Summers-Sachs. [11]
       Harvard foi uma escolha inteligente para ser o operador prático da CIA
       para a privatização de Chubais. Os dinheiros da CIA, via Universidade de
      Harvard, davam uma aura de respeitabilidade académica imparcial e de
      negação plausível de que era a CIA a responsável. Shleifer, um emigrante
      nascido na Rússia, e protegido de Summers, já era professor titular de
      economia em Harvard desde os 30 anos. Passou a chefe do projeto Rússia do
      HIID de Sachs, com sede em Moscovo. Depois, Summers levou mais um Boy de
      Harvard, outro antigo consultor de Summers no Banco Mundial, chamado
      Jonathan Hay. Em 1991, na Escola de Direito de Harvard, Hay também passara
      a ser consultor legal sénior para a GKI, a organização de privatização
      estatal de Chubais. No ano seguinte, em 1992, Hay passou a diretor geral
      do HIID em Moscovo. Hay assumiu amplos poderes sobre empreiteiros,
      políticas e especificações de programas. Não só controlava o acesso ao
      círculo de Chubais como era o seu porta-voz. [12]
       Tanto Jonathan Hay como Andrei Shleifer foram posteriormente
      identificados como agentes da CIA.
       Vladimir Putin, no diálogo anual de abril de 2013, com os cidadãos
      russos, embora discretamente não tenha referido nomes, referiu-se a Hay e
      a Shleifer como agentes identificados da CIA que trabalhavam com Chubais e
      Gaidar na privatização criminosa da Rússia. Putin disse: "Soubemos agora
      que funcionários da CIA dos Estados Unidos funcionavam como consultores de
      Anatoly Chubais. Mas o mais engraçado é que, quando eles regressaram aos
      EUA, foram acusados de violarem as leis do seu país e de terem enriquecido
      ilegalmente no decurso da privatização na Federação Russa". [13]
       Em 2006, o Tribunal Distrital norte-americano em Boston tinha multado Hay
      e Shleifer, pessoalmente, em 2 milhões de dólares e a Universidade de
      Harvard em 26,5 milhões de dólares por fraude e por desvio de fundos
      governamentais para enriquecimento privado. Nesse mesmo ano de 2006,
       Summers – que, na altura, já era presidente de Harvard, foi forçado a
      demitir-se, aquando da revelação do seu papel nos escândalos do HIID de
      Moscovo. Antes disso, tinha conseguido atribuir a Shleifer uma cadeira de
      professor em Harvard. Hay posteriormente, reapareceu como fundador do ramo
      ucraniano do Centro Polaco para Investigação Social e Económica (CASE) de
      "mercado livre", durante o golpe de estado da CIA em Kiev, em 2014. [14]
       A privatização criminosa da Rússia de valiosos ativos estatais que Hay e
      Shleifer criaram, em conjunto com Anatoly Chubais e Yegor Gaidar, após
      1992, foi feita até ao último pormenor por Chubais, em cooperação com os
      seus novos consultores americanos. Quando o anúncio da privatização dos
      propostos "vales-por-ações"  ("vouchers-for-shares")  obteve uma resposta
      fria dos russos, já vacilantes sob o choque da liberalização de preços,
      Hay e Shleifer arranjaram astutos especialistas norte-americanos das
      Relações Públicas da Burson-Marsteller e do Grupo Sawyer Miller, para
      traçarem uma campanha a ser transmitida nos canais da TV dos recém-criados
      oligarcas russos para convencer os russos a aceitar o programa.
       Chubais, enquanto chefe do GKI, a organização de propriedade estatal,
      emitiu 150 milhões de "vales" para cada um de todos os cidadãos. Por seu
      turno, eles podiam investir esse vale numa pequena ação numa empresa ou
      loja estatal russa privatizada ou vendê-lo a um preço de mercado
      instituído, indexado ao dólar norte-americano, claro. Como a maior parte
      dos russos nem sequer sabia se receberiam o próximo pagamento das suas
      pensões, ou se encontrariam trabalho na economia industrial em colapso,
      havia um resultado previsível na Terapia de Choque Sachs-Harvard-Chubais.
      Milhões venderam os seus vales pelo mesmo preço. Teria sido uma ideia
      louca se Chubais e Gaidar se tivessem preocupado com o futuro económico da
       Federação Russa. Foi brilhante, se o que eles queriam era criar oligarcas
      multimilionários em dólares, e foi isso que eles fizeram.
       Os vales podiam ser comprados ou vendidos em cada esquina na Rússia, no
       início de junho de 1992. Eram trocados segundo as novas trocas de
       mercadorias não regulamentadas em Moscovo, instituídas por Jonathan Hay
      de Harvard com o dinheiro da USAID canalizado via HIID. Fundos de
       investimento em vales não regulamentados (deliberadamente, um decisão de
      Gaidar, Chubais e seus consultores Harvard da CIA) surgiram por toda a
      parte para recolher os milhões de vales dos cidadãos. O rublo foi
      equiparado internamente ao dólar americano, por conselho da equipa HIIF de
      Sachs. Nos vinte meses que durou o programa vales-por-ações, o preço
      passou de 20 dólares para 4 dólares por vale. Como se transacionavam
      livremente, chegara a altura de os oligarcas multimilionários em volta de
      Yeltsin que já tinham acumulado enormes quantias, poderem comprá-los, e
      foi o que eles fizeram. [15]
       Cerca de seiscentos fundos de vales obtiveram 45 milhões de vales. O
       maior, intitulado Primeiro Vale, recolheu 4 milhões de vales. [16]
       Ao preço fixado para os vales, Chubais e os seus Boys de Harvard tinham
       avaliado toda a economia russa – o que incluía a maior empresa de níquel
      do mundo, algumas das maiores empresas mundiais de petróleo e gás,
      incluindo a Sibneft e a Gazprom, a RUSAL, a maior empresa do mundo de
      alumínio – num total que era menor do que o valor de mercado da empresa
      General Electric dos EUA. O valor facial de cada vale era de 10 mil
      rublos, que Chubais promoveu mentindo ao público, afirmando que um vale
      seria suficiente para pagar dois ou mesmo três automóveis Volga.
       Como tinham sido autorizados pelas redes da CIA de Bush, que controlavam
      o lado financeiro da mafia de Yeltsin, a serem os primeiros russos com
      muito dinheiro, os oligarcas selecionados de Yeltsin puderam comprar
      centenas de milhares de vales e trocá-los por indústrias inteiras, que
      posteriormente seriam despojadas e vendidas. Embora supostamente
      estivessem a agir por conta do estado, os leiloeiros dos bancos de
      propriedade dos oligarcas manipularam o processo. Foi assim que Mikhail
      Khodorkovsky do Banco Menatep obteve uma quota de 78% como proprietário da
      petrolífera Yukos, no valor de cerca de cinco mil milhões de dólares, por
      apenas 310 milhões de dólares. Foi assim que Boris Berezovsky obteve a
      Sibneft, outro gigante do petróleo, no valor de três mil milhões de
       dólares, por cerca de cem milhões. [17]
       Usando as suas ligações, Khodorkovsky pôde comprar várias fábricas em
      concursos de investimento, e grandes blocos de ações em madeira, titânio,
      tubagem e fundições de cobre. No total, assumiu o controlo de mais de cem
       empresas antes de obter a Yukos. Nos leilões, com base no número total de
      vales que estavam em circulação, todo o sistema industrial russo, minas,
      empresas petrolíferas, fábricas, tinham um valor total de menos de 12 mil
      milhões de dólares. [18]
       Sob a pressão do Parlamento, Chubais concordou proibir a venda de vales
       de empresas estatais a investidores estrangeiros. Mas houve duas exceções
      dignas de nota feitas por Chubais. Em 1995, na sequência da vitória do
      referendo de Yeltsin, financiado por Soros, a Harvard Management Company
      (HMC), que investe o maior donativo da universidade, e George Soros, que
      levou Sachs de Harvard para Chubais, foram as únicas entidades
      estrangeiras que foram autorizadas a participar. Tanto a HMC como Soros
      passaram a ser os principais acionistas da Novolipetsk, a segunda maior
      siderurgia da Rússia, e da Sidanko Oil, com reservas que ultrapassam as da
      Mobil. A HMC e Soros também investiram no mercado interno russo de
      obrigações GKO, de alto rendimento, subsidiado pelo FMI. Em 1997, comprou
      24% da Sviazinvest, a gigante das telecomunicações, juntamente com
      Vladimir Potanin do Uneximbank, o porta-voz nominal dos novos oligarcas
      russos. A certa altura, Soros afirmou que tinha investido dois mil e meio
      milhões de dólares nesses ativos russos pelos sujos preços baixos que
      Chubais tinha estipulado deliberadamente. [19]
       Soros vai em socorro de Yeltsin 
       Isto fez com que os cidadãos russos se sentissem ludibriados, totalmente
       lixados, furiosos quando se desvaneceram os seus sonhos de um prometido
       quinhão na "propriedade privada capitalista", juntamente com as suas
      poupanças, durante a hiperinflação da impressão de moeda do Banco Central,
      outra parte da Operação Hammer de George H.W. Bush. Em 1993, aumentaram
       drasticamente as pressões de todos os lados, incluindo da Duma. A
       população exigia ação. O Supremo Soviete, a câmara alta, começou a
      redigir uma lei que congelaria todo o processo de privatizações. A
      oposição começava a ser tão grande que Chubais, por fim, teve que se
       basear principalmente nos decretos presidenciais de Yeltsin, em vez de na
       aprovação parlamentar, para a sua implementação. O homem de Moscovo do
      HIID de Harvard, o Jonathan Hay da CIA, e os seus associados do HIID,
      redigiram muitos desses decretos. Walter Coles, da USAI, cujo gabinete
      financiava as privatizações Chubais através do HIID, reconheceu: "Se
      precisávamos de um decreto, Chubais não tinha que passar pela burocracia".
      [20] Os esforços nascentes da Rússia para instituir uma certa forma de
      democracia parlamentar ou mesmo para vigiar o poder ditatorial
      presidencial pouco interesse tinham para os funcionários de Washington pu
      para Chubais e a sua cabala em volta de Yeltsin.
       O referendo Soros-Yeltsin 
       Nessa altura, quando a oposição ameaçava fugir ao controlo, Yeltsin
      sentiu-se forçado a concordar com um referendo nacional sobre todo o
      processo de privatização. A data iria ser 25 de abril de 1993.
       O referendo continha quatro perguntas sim/não: (1) Apoia Yeltsin? (2)
       Apoia a política económica de Yeltsin? (3) Quer eleições antecipadas para
      presidente? E (4) Quer eleições antecipadas para o parlamento?
       Convencido de uma derrota certa, Chubais, provavelmente a conselho dos
      seus mentores de Harvard, arranjou uma reunião secreta com o
       multimilionário norte-americano George Soros. Soros concordou financiar,
       a favor de Yeltsin, a campanha do referendo. Soros injetou um milhão de
       dólares, uma soma enorme na Rússia daquela época, em contas offshore,
      destinadas a Chubais usar para comprar a orientação dos "media". Yeltsin
      sobreviveu por uns magros 52% e a privatização das principais empresas
      industriais russas prosseguiu. [22] Yeltsin estava a entregar as joias da
      coroa e muito mais a um grupo conspirativo de oligarcas russos apoiados
      pela CIA, assim como posteriormente ao próprio Soros.
       A partir de Washington, Summers no Tesouro arquitetou a privatização
      Chubais-Gaidar, e Jeffrey Sachs e Andrei Shleifer transmitiram diretamente
      os planos aos consultores económicos de Yeltsin. A privatização
      Chubais-Washington dos ativos da Rússia foi um roubo numa escala sem
      precedentes em qualquer nação, mesmo em tempo de guerra. De 1992 a 1994, a
      propriedade de 15 mil empresas foi transferida do controlo estatal
      principalmente para os novos oligarcas multimilionários, como Khodorkovsky
      e Berezhovsky, através do programa de vales Chubais-Washington.
       Oligarcas compram a reeleição de Yeltsin 
       Em 1996, com a economia russa mergulhada profundamente numa
       hiperinflação, Yeltsin enfrentava uma derrota certa nas eleições
      programadas. O dirigente do Partido Comunista, Gennadi Zyuganov, que
      prometia o regresso à estabilidade, estava muito à frente nas sondagens.
      Alguns dos consultores mais próximos de Yeltsin até sugeriram o
      cancelamento das eleições e a declaração de uma ditadura de facto. Nessa
      altura, a filha de Yeltsin, Tatyana Borisovna Yumasheva, tinha passado a
      ser a consultora mais próxima do pai, juntamente com Berezhovsky, Guzinsky
      e os outros oligarcas criados pela USAID e pela CIA. Os  media  russos
      rotularam a clique que controlava a Rússia, em especial depois do ataque
      cardíaco de Yeltsin naquele ano, de "A Família", como na família da mafia,
      não uma família de sangue, embora fosse, de facto, a filha Tatyana a  Capo
      di tutti capi  da família devido à sua influência sobre o presidente. [23]
       Na sequência do êxito do Partido Comunista Russo nas eleições
      parlamentares, ou Duma, em dezembro de 1995, o Fundo Monetário
      Internacional fez um empréstimo extraordinário de 10,2 mil milhões de
      dólares ao governo de Yeltsin, em que mil milhões eram destinados
      secretamente por Washington à campanha para reeleger o presidente Yeltsin
      nas eleições de 1996. Posteriormente, vieram a público gravações de
      conversas entre Clinton e Yeltsin que mostraram que, em troca, entre
      outros favores, Yeltsin isentaria as exportações da Tyson Chicken para a
       Rússia – na altura um negócio na ordem dos 700 milhões de dólares por ano
      – da ameaça de um aumento da tarifa de 20%. A Tyson Chicken era um
      apoiante e contribuinte de campanha de Clinton de longa data, com sede em
      Arkansas.
       Berezhovsky e Guzinsky, os novos oligarcas russos, apoiados por
      Washington, receando a perda dos seus milhares de milhões roubados para os
       comunistas da oposição, formaram aquilo a que chamaram o "Grupo dos
      Sete", que incluía Berezhovsky, Guzinsky, Khodorkovsky, Potanin,
      Vinogradov, Smolensky e Friedman. Com a ajuda de comentadores políticos de
      Madison Avenue, o Grupo dos Sete – que possuíam as duas principais
      estações de TV, enquanto a terceira continuava estatal, assim como a
      principal imprensa – realizaram uma campanha mediática ao estilo dos EUA,
      enquanto bloqueavam Zyuganov de comprar tempo de antena. Os pósteres de
      Yeltsin tinham o slogan "Escolhe com o Coração". Outro anúncio apresentava
      fotos de família de Yeltsin, enquanto clips na TV recordavam
       acontecimentos da sua infância: como atleta, como rebelde, como pai, e
       como avô. E, em tudo, música sentimental…
      Os oligarcas contrataram Anatoly Chubais, o homem responsável pela criação
      das suas fortunas, como diretor da campanha de Yeltsin. Chubais criou um
      fundo privado chamado o Centro para a Proteção da Propriedade Privada e
      recebeu 5 milhões de dólares do Grupo dos Sete para a campanha. Criaram-se
      jornais falsos e imprimiram-se notícias, afirmando a descoberta de atas
      secretas de uma reunião de dirigentes do Partido Comunista em que Zyuganov
      teria dito: "Não poderemos dar ao povo nada do que prometemos". O fundo de
      Gaidar para a reeleição também canalizou centenas de milhares de dólares,
      uma fortuna na época da hiperinflação do rublo, para importantes
      jornalistas escreverem artigos fraudulentos elogiando Yeltsin e
      desacreditando Zyuganov. [26]
       O facto de os oligarcas terem quase o monopólio da TV e da imprensa russa
      tornou possível elevar a votação em Yeltsin até aos 54%. O Politburo
      Corporativo Russo ficou assim firme na sela, com os seus cavalos Yeltsin e
      Chubais. [27]
       O custo humano da Terapia de Choque russa, imposta pelos EUA, realizada
      por Anatoly Chubais, Yegor Gaidar, em conjunto com George Soros, Jeffrey
      Sachs e um grupo de operadores financeiros e legais, ligados à CIA, como
      Jonathan Hay e Andrei Shleifer, foi inacreditável. Entre 1991 e 1997, o
      PIB russo – o valor de todos os bens e serviços que a Rússia produz – caiu
      em 83%. A produção agrícola diminuiu 63%, quando acabou o apoio estatal à
      agricultura e as importações norte-americanas baratas, como os frangos
      Tyson substituíram a produção interna. O investimento industrial e não só
      diminuiu 92%. Foram fechadas mais de 70 mil fábricas. Isso fez com que a
      Rússia produzisse menos 88% de tratores, menos 76% de máquinas de lavar,
      menos 77% de tecidos de algodão, menos 78% de aparelhos de TV, etc, etc.
      Num país sem desemprego na era soviética, 13 milhões de pessoas perderam
      os seus empregos. Os que ainda tinham trabalho, viram os salários cortados
       por metade. A esperança média de vida dos homens reduziu-se em seis anos,
      ao mesmo nível da Índia, do Egito e da Bolívia. O alcoolismo tornou-se
      epidémico, à medida que a depressão e o desemprego se espalhavam pela
      população. Foi de facto um choque, o tipo de choque que um país só sofre
      numa grande guerra. A esperança média de vida dos homens reduziu-se em
      pouco anos ao mesmo nível da Índia, do Egito e da Bolívia.
       O facto de Anatoly Chubais estar agora sob enorme pressão e provavelmente
      vir a ser acusado vai muito para além da corrupção de um diretor
      empresarial. Vai direito ao coração dos círculos corruptos que, desde a
      subida ao poder de Vladimir Putin em dezembro de 1999, têm tentado retomar
      a pilhagem Wall Street da Rússia, até agora sem êxito. Para eles, Putin é
      o símbolo dessa derrota. Para a grande maioria dos russos que viveram no
      meio da pilhagem do seu país nos anos 90, Anatoly Chubais é o símbolo
      dessa devastação e destruição.
       Notas 
       1.  The Moscow Times,  Fearing Criminal Prosecution, Chubais Allies Flee
      Russia, 29 November, 2016,  www.themoscowtimes.com
       2. RAPSI, Police raid Moscow office of Rusnano corporation, 16 November,
      2016,  http://rapsinews.com/news/20161116/277151707.html
       3. Fearing Criminal Prosecution Chubais Allies Flee Russia – Report, July
       22, 2015  themoscowtimes.com/...
       4. Mort Zuckerman, cited in email from Karon von Gerhke-Thompson to the
      author, 14 August, 2011.
       5. E.P. Heidner, Collateral Damage US Covert Operations and the Terrorist
       Attacks on September 11, 2001,
       wikispooks.com/w/images/d/db/Collateral_Damage_-_part_1.pdf
       6. Sebastian Mallaby, More Money than God: Hedge Funds and the Making of
      the New Elite, Council on Foreign Relations, New York, 2010, p. 212.
       7. Anne Williamson, Testimony Before the Committee on Banking and
      Financial Services of the United States House of Representatives September
      21, 1999,  www.thebirdman.org/...
       8. Ibid.
       9. Janine R. Wedel, The Harvard Boys Do Russia,  The Nation,  May 14,
      1998,  www.thenation.com/article/harvard-boys-do-russia/
       10. Ibid.
       11. Mark Ames, The murderous history of USAID– the US Government agency
       behind Cuba's fake Twitter clone, April 8, 2014,  pando.com/...
       12. Janine R. Wedel, op. cit.
       13. Ibid.
       14. Vladimir Putin, Direct Line with Vladimir Putin April 25, 2013, 
      en.kremlin.ru/events/president/news/17976
       15. David E. Hoffman, The Oligarchs: Wealth and Power in the New Russia,
      New York, Public Affairs Press, Chapter 8, p. 193.
       16. Ibid., p. 197.
       17. Marshall I. Goldman, Putin and the Oligarchs, Foreign Affairs,
       November/December, 2004,  www.cfr.org/world/putin-oligarchs/p7517
       18. David E. Hoffman, op. cit., p.202.
       19. Janine R. Wedel, op. cit.
       20. Ibid.
       21. David E. Hoffman, op. cit., p.202.
       22. Ibid.
       23. Wikipedia, Tatyana Yumasheva.
       24. Anne Williamson, Testimony…,op. cit
       25. David E. Hoffman, op. cit., p. 345.
       26. Ibid, p. 345.
       27. Ibid., p. 327.
       28. Dan Josefsson, Shock Therapy: The Art of Ruining a Country, 1 April,
      1999,  josefsson.net/... 
       O original encontra-se em 
      thesaker.is/chubais-the-next-neoliberal-head-to-roll-in-russia/
       Tradução de Margarida Ferreira. 
 
In
RESISTIR.INFO
http://resistir.info/russia/engdahl_10dez16_p.html
14/12/2016

Nenhum comentário:

Postar um comentário